ESTADO
DE SANTA CATARINA
SECRETARIA
DE ESTADO DA FAZENDA
DIRETORIA
DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA
GERÊNCIA
DE TRIBUTAÇÃO
NOTA TÉCNICA N° 012/2015
Base de Cálculo do ICMS sobre o Fornecimento de Energia Elétrica.
1. Introdução:
Questão inquietante para os
Estados é a da inclusão ou não da Tarifa de Uso de Sistemas de Distribuição
(TUSD) e da Tarifa de Uso de Sistemas de Transmissão (TUST) na base de cálculo
do ICMS relativo ao fornecimento de energia elétrica.
Com
efeito, decisões judiciais tem entendido que não fazem parte da base de cálculo
do ICMS
a TUST
(Taxa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica) e a TUSD (Taxa de Uso
do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica), como é o caso do AgRg no REsp 1.408.485, da Segunda
Turma do STJ, que tem por fundamento a Súmula 166/STJ: “não constitui fato
gerador do ICMS
o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo
contribuinte”.
Com
a devida vênia, tal entendimento nos parece equivocado, ao pretender excluir da
base de cálculo do imposto estadual as parcelas relativas à TUST e à TUSD, como
se o consumidor final pudesse adquirir apenas a energia elétrica fornecida
dissociada do uso dos sistemas de distribuição e de transmissão. Na verdade, o consumidor
contrata o fornecimento de energia elétrica ao seu estabelecimento, o que
compreende o uso dos sistemas de distribuição e transmissão. Em outras
palavras, para que o fornecimento de energia elétrica seja possível, o
consumidor deve necessariamente estar conectado fisicamente à rede, gerando, por conseguinte, as tarifas de uso do sistema.
Não
se aplica à hipótese a Súmula 166/STJ, pois não é o caso de incidência do ICMS
sobre a transferência da mercadoria (energia elétrica) entre estabelecimentos
do mesmo titular. Devido à natureza peculiar da energia elétrica, que existe
apenas naquele momento em que é utilizada pelo consumidor, a transmissão é
sempre da unidade geradora ao consumidor.
2. Fato
gerador e base de cálculo do ICMS:
Conforme
dispõe o art. 155, II, da Constituição Federal, os Estados têm competência para
instituir imposto sobre (i) operações relativas à circulação de mercadorias, (ii) prestação de serviço de transporte interestadual e
intermunicipal e (iii) prestar serviço de comunicação.
O fato gerador do ICMS abrange esses três núcleos possíveis.
Entende-se
que uma operação é relativa à circulação de mercadorias quando “impulsione a
mercadoria, na marcha normalmente por esta desenvolvida desde a fonte de
produção até o consumidor” (Hugo de Brito Machado. Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 25).
Mercadoria, por sua vez, é conceituada como um bem móvel adquirido para
revenda. Já Karl Marx dá um sentido mais abrangente ao termo como aquilo que é
produzido pelo trabalho humano com a finalidade de ser vendido.
Por
sua vez, o art. 156, III, dá competência aos Municípios para tributar serviços
de qualquer natureza, não compreendidos na competência dos Estados (transporte
e comunicação) e “definidos” em lei complementar. A lista de serviços em vigor
é a anexa à Lei Complementar 116/2003.
Então,
os Estados tributam as operações de circulação de mercadorias (obrigação de
dar) e os Municípios as prestações de serviço (obrigação de fazer) listadas
pela Lei Complementar 116/2003.
O
que acontece no caso de operações mistas que envolvem tanto o fornecimento de
mercadoria quando a prestação de serviço? Temos três possibilidades:
a)
o serviço consta da Lista de Serviços: nesse caso incide apenas o imposto
municipal;
b)
o serviço consta da Lista de Serviços, mas com ressalva da incidência do ICMS
sobre os materiais empregados ou das mercadorias fornecidas: incide o imposto
municipal sobre o serviço e o imposto estadual sobre as mercadorias fornecidas;
e
c)
o serviço não consta da Lista de Serviços: nesse caso, conforme art. 155, § 2º,
IX, b, da Constituição Federal, incide apenas o ICMS “sobre o valor total da
operação”, ou seja, a base de cálculo será o total cobrado, compreendendo
mercadoria e serviço.
Até
aqui vimos as disposições constitucionais relativas ao ICMS. Vejamos agora as
disposições da Lei Complementar 87/1996, editada pela União no exercício da sua
competência para editar normas gerais de direito tributário, conforme dispõe o
art. 24, I, c/c art. 146, III, ambos da Constituição Federal. Entre as matérias
reservadas ao legislador complementar está a definição da base de cálculo.
O
art. 13 da Lei Complementar 87/1996 dispõe que a base de cálculo na saída de
mercadoria do estabelecimento do contribuinte é o valor da operação (inciso I).
Entende-se por valor da operação o preço cobrado do adquirente. Já no caso de
fornecimento de mercadoria com prestação de serviço não compreendido na
competência tributária dos Municípios (i.e. que não constam da Lista de
Serviços), a base de cálculo é o valor da operação (inciso IV).
Em
suma, o preço cobrado do adquirente e que será considerado para a determinação
da base de cálculo do ICMS compreende diversas parcelas, como: (i) custo de
aquisição da mercadoria ou, no caso de indústria, o custo de fabricação; (ii) despesas administrativas; (iii)
despesas de manutenção do estabelecimento; (iv)
salários e despesas com funcionários; (v) lucros, reservas e provisões; (vi)
qualquer outro custo ou despesa incorrida.
Toda a empresa deve ser financiada com o resultado de sua atividade
comercial ou industrial. Em princípio não existem outras fontes de recursos.
A
mecânica do ICMS poderá ser melhor entendida com um exemplo simples: suponhamos
a empresa A que vende uma mercadoria por R$ 100,00, recolhendo R$ 17,00 de
imposto (alíquota de 17%). A própria empresa entrega a mercadoria no domicílio
do adquirente, utilizando veículo próprio. Esse transporte não é tributável
pelo ICMS porque não há prestação de serviço (transporte de carga própria).
Para incidir o ICMS é necessário que o serviço de transporte seja prestado a um
terceiro (tomador do serviço).
Suponhamos
agora que a empresa A contrata a empresa B para efetuar o transporte. Nesse
caso, há uma prestação de serviço de transporte que é tributada pelo ICMS. O
prestador do serviço é a empresa B e o tomador do serviço é a empresa A.
Portanto não se cogita de deduzir o serviço da base de cálculo. O adquirente
continua recebendo a mercadoria em seu domicílio por conta do negócio de
circulação de mercadoria, já que não é ele que contrata o transporte. Temos
então:
Valor da mercadoria entregue no domicílio do
adquirente ............... R$ 100,00
Valor do transporte contratado pelo vendedor
................................. R$ 30,00
ICMS devido pela empresa A
...................................... R$ 17,00
(-) crédito (=ICMS pago pelo transportador)
.............. R$ 5,10
Imposto a recolher pela empresa A
............................ R$ 11,90
Para
consolidar o entendimento, vejamos outro exemplo: a empresa A vende divisórias,
colocadas no estabelecimento do adquirente, por R$ 300,00 (ICMS de R$ 51,00). O
serviço não consta da Lista de Serviços. Portanto incide apenas o ICMS sobre o
valor total, compreendendo mercadoria e serviço (conforme regra do art. 155, §
2º, IX, b, da Constituição Federal). Com efeito, o subitem 7.06 da Lista de
Serviços anexa à Lei Complementar 116/2003 prevê expressamente: “Colocação
e instalação de tapetes, carpetes, assoalhos, cortinas, revestimentos de parede,
vidros, divisórias, placas de gesso e congêneres, com material fornecido
pelo tomador do serviço”.
Porém, se a empresa A
contratar a empresa B para fazer a colocação das divisórias, passa a incidir
ISS sobre a prestação de serviço. Mas o tomador não é o adquirente das
divisórias que contratou a compra das divisórias colocadas. O tomador é a
empresa A. A empresa B recolhe o ISS relativo ao serviço que prestou. Porém, o
preço cobrado do adquirente continua sendo R$ 300,00 e o ICMS devido continua sendo
R$ 51,00.
Pesquisando
a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, encontramos os seguintes
acórdãos:
No
julgamento do REsp. 6.219 MG, rel. Min. Milton Luiz
Pereira (DJ 23-5-1994, p. 12555) decidiu que incide apenas o ICMS no caso de
venda e instalação ou montagem de aparelhos de refrigeração – a mesma empresa
que vende, monta e instala os aparelhos, ainda que fabricados por outra
indústria – sem fornecimento de qualquer material pelo adquirente (Lista de
Serviços anexa ao DL 406/68, item 48).
No
julgamento do REsp. 115.641, rel. Min. José Delgado
(DJ 15-12-1997) tratou explicitamente da incidência do ICMS na venda de
mercadoria com prestação de serviços (divisórias, de sua fabricação, entregue
instaladas ao comprador).
Finalmente,
o REsp. 88087 MG, rel. Min. Demócrito (DJ 30-6-1997,
p. 30890; RDR vol. 9, p. 231; RSTJ vol. 100, p. 80), reconheceu a incidência
exclusiva do ICMS na venda de vidros, fabricados pela vendedora, entregues
colocados, com a formação de boxes ou divisórias.
Em
síntese, no caso de fornecimento de mercadorias com prestação de serviços,
incide apenas o ICMS se o serviço não constar da Lista de Serviços e incide
apenas o ISS se o serviço constar da Lista de Serviços, sem ressalva sobre a
incidência do ICMS sobre a mercadoria fornecida.
Essas
são regras gerais aplicáveis a todas as hipóteses. Porque deveria ser diferente
no caso da energia elétrica, por mais peculiar que seja essa mercadoria?
3. A
“mercadoria” energia elétrica:
Afinal,
o que vem a ser “energia elétrica”?
Partículas
subatômicas (elétrons, prótons etc) são dotadas de
cargas elétricas que permitem interações eletromagnéticas. O efeito produzido
por uma carga elétrica no espaço denomina-se de campo elétrico. A capacidade de
uma carga elétrica de produzir trabalho ao se deslocar constitui o potencial
elétrico (medido em volts).
Define-se
potencial elétrico de um ponto como a energia necessária para mover uma unidade
de carga elétrica à velocidade constante de um ponto no infinito (onde o campo
elétrico é nulo) até o ponto em questão. A energia necessária para deslocar uma
unidade de carga entre dois pontos específicos chama-se de “diferença de
potencial elétrico” ou voltagem. A potência elétrica, por sua vez, é uma
grandeza física que mede a quantidade de energia que está sendo convertida em
eletricidade ou de eletricidade em outras formas de energia. A potência
elétrica não se confunde com o potencial elétrico ou com a diferença de
potencial elétrico. Enquanto o potencial e a diferença de potencial (tensão) são
medidos em volts, a potência elétrica é medida em watts. Para determinada
tensão, determinada quantidade de energia elétrica é convertida em outras
formas de energia. Então, para cada nível de tensão, importa saber que
quantidade de energia (capacidade de produzir trabalho) está sendo convertida.
Daí,
chegamos ao conceito de corrente elétrica que pode ser conceituada como um
fluxo ordenado de partículas portadoras de carga elétrica (medida em ampéres). De outro modo, podemos dizer que se trata do
deslocamento de cargas elétricas em um condutor, resultado de uma diferença de
potencial elétrico entre as extremidades. A quantidade de energia elétrica
convertida por unidade de tempo, então constitui a potência elétrica (medida em
watts). A energia elétrica é distribuída comercialmente, mediante a conexão
física (fiação) a uma central elétrica, por empresas distribuidoras de energia
elétrica.
Todavia,
para que tenhamos corrente elétrica, é preciso haver partículas livres no
interior dos corpos (íons ou elétrons). Ao se estabelecer um campo elétrico, as
cargas livres, inicialmente em movimento aleatório, passam a ter um movimento
ordenado. Os corpos que possuem
partículas eletrizadas livres são denominados de condutores, pois, permitem o
estabelecimento de corrente elétrica em seu interior. É o caso dos metais, que
possuem grande quantidade de elétrons livre em movimento desordenado.
Existem
dois tipos de corrente elétrica: (i) a corrente contínua, cujo sentido
permanece constante ao longo do tempo, e (ii) a corrente
alternada, cujo sentido varia no tempo. A fonte da corrente contínua é
constituída pelos polos, positivo e negativo. Já a fonte da corrente alternada
é composta por fases.
Agora
já podemos entender essa “mercadoria” chamada energia elétrica. Embora seja
indubitavelmente física, a energia elétrica não tem natureza material
(corpuscular), resultando, para cada diferença de potencial ou tensão (energia
necessária para deslocar uma unidade de carga elétrica entre dois pontos), em
uma quantidade de eletricidade que está sendo convertida em outras formas de
energia (Watt). Essa diferença de potencial entre duas extremidades produz um
fluxo ordenado de partículas eletrificadas, ou seja, em uma corrente elétrica
que se desloca no interior de um condutor.
Ora,
a “mercadoria” energia elétrica existe apenas naquele momento em que o
consumidor está conectado à rede. Por isso, ela não pode ser estocada,
armazenada, posta em um depósito etc. Pelo mesmo motivo, a produção,
distribuição e consumo da energia elétrica não ocorrem em momentos sucessivos
do tempo. Pelo contrário, ocorrem todos simultaneamente. Daí que não podemos
separar, a rigor, a produção da distribuição e do consumo.
A
produção, transmissão e comercialização de energia elétrica no Brasil é
regulamentada e fiscalizada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL),
que tem a natureza de autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia,
criada pela Lei 9.427/1996. Entre suas atribuições está o de estabelecer
tarifas para o suprimento de energia elétrica às concessionárias e
permissionárias de distribuição, bem como às cooperativas de eletrificação
rural, considerando parâmetros técnicos, econômicos e operacionais e, ainda, a
estrutura dos mercados consumidores.
Entre
os componentes da tarifa de energia elétrica, estão a TUST e a TUSD, tarifas de
uso dos sistemas elétricos de transmissão e distribuição. A tarifa de
transmissão é fixada de acordo com as seguintes diretrizes:
a)
assegurar recursos suficientes para cobrir os custos dos sistemas de
transmissão; e
b)
assegurar maiores encargos para os agentes que mais onerem o sistema de
transmissão.
A
Lei 8.631/1993 passou a fixar a tarifa por concessionária, de acordo com as
características de cada empresa. Por sua vez, a Lei 8.987/1995 veio a garantir
o equilíbrio econômico-financeiro às concessões. A partir daí, as tarifas
passaram a ser estabelecidas por área de concessão (i.e. o território
geográfico onde cada empresa é obrigada, por disposição contratual, a fornecer
energia elétrica). As tarifas variam, então, de acordo com as características
de cada região, como número de consumidores, extensão da rede, tamanho do
mercado, custo da energia comprada, tributos etc.
As
concessionárias de distribuição são obrigadas a levar a energia elétrica aos
seus consumidores, arcando com custos que devem ser cobertos com a tarifa de
energia elétrica. Esses custos compreendem:
a)
custos da geração da energia;
b)
custos de transporte da energia até os consumidores, tanto da transmissão
quanto da distribuição; e
c)
custos de encargos e tributos.
O
valor da energia comprada pelas distribuidoras, para revender aos consumidores,
passou, com a Lei 10.848/2010, a ser determinado em leilões públicos, com o
objetivo do garantir maior transparência no custo de compra da energia,
competição entre as distribuidoras e melhores preços. Entretanto, o transporte
da energia, do local de geração até o consumidor é um monopólio natural, já que
a competição nesse setor não traz benefícios econômicos. A tarifa de energia é
o preço cobrado por unidade de energia – R$/kWh. Contudo, é preciso esclarecer
que se paga não somente pelo consumo propriamente dito, mas também pela sua
disponibilidade (24 horas por dia, 7 dias por semana).
Os
consumidores, por sua vez, compreendem os consumidores cativos (residenciais),
que não podem escolher a distribuidora, e os consumidores livre (empresas), que
podem escolher a distribuidora.
A
tarifa de energia para os consumidores cativos é constituída por (i) custos de
aquisição de energia, (ii) custos relativos ao uso do
sistema de distribuição, (iii) custos relativos ao
uso do sistema de transmissão, (iv) perdas técnicas e
não técnicas e
(v) encargos diversos e impostos.
Os
custos com a aquisição de energia são os decorrentes da contratação de
montantes de energia por meio de leilões públicos. Constitui a Tarifa de
Energia (TE) e são repassados integralmente aos consumidores, sem qualquer
margem de lucro.
Além
disso, temos custos relativos ao uso do sistema de distribuição (TUSD – Tarifa
de Uso do Sistema de Distribuição), que compreende as despesas de capital e os
custos de operação e manutenção das redes de distribuição, e os custos
relativos ao uso do sistema de transmissão (TUST).
A
tarifa para os consumidores livres (Grupo A) compreende dois componentes
(tarifa binômia): a tarifa pelo consumo de energia (expresso em kWh) e a tarifa
de demanda, cobrada pela potência disponibilizada (expressa em kW).
A
tarifa para os consumidores cativos (Grupo B), por sua vez, é monômia, correspondendo ao consumo de energia atendidas em
baixa tensão (expresso em kWh).
Isto
não quer dizer, porém, que os consumidores cativos não tenham custo de demanda,
apenas ele não é discriminado na fatura. Se a corrente elétrica depende da
diferença de potencial entre duas extremidades, não é possível consumo de
energia sem que haja a corrente (kWh) e a diferença de potência (kW).
Os
custos relativos ao uso do sistema de distribuição (TUSD) e ao uso do sistema
de transmissão (TUST) não tem qualquer semelhança com uma carga material
(corpórea) que é transportada fisicamente de um lugar para outro, por caminhão,
trem, navio ou avião.
4. Tratamento
tributário do fornecimento de energia elétrica:
O
caráter de mercadoria da energia elétrica decorre da lei penal que, para poder
caracterizar o crime de furto nos desvios de energia (“gatos”), equiparou a
energia elétrica à coisa móvel (CP, art. 155, § 3º). Ora, se a energia elétrica
é “coisa móvel” produzida para ser vendida, então ela é mercadoria, pela
própria definição de mercadoria. É o que explica Roque Antonio
Carrazza (ICMS.
3ª ed. ver. am. São Paulo: Malheiros, 1997, pg. 104): “a energia elétrica, para
fins de tributação por via de ICMS, foi considerada, pela Constituição, uma
mercadoria, o que, aliás, não é novidade em nosso direito positivo, que para
que se caracterize o furto, há muito vem equiparando a energia elétrica à coisa
móvel”. Acrescenta esse autor que:
Nos termos da
Constituição Federal, este imposto tem por hipótese
de incidência possível a circunstância de uma pessoa produzir, importar, fazer circular, distribuir ou consumir energia
elétrica. O legislador ordinário (estadual ou distrital), ao criar “in
abstrato”, este imposto, poderá colocar em sua hipótese de incidência todos, alguns ou um desses fatos.
Com
efeito, a Constituição Federal reconhece expressamente a incidência do ICMS
sobre o fornecimento de energia elétrica. Assim, o imposto não incide sobre
operações que destinem energia elétrica a outros Estados (art. 155, § 2º, X,
b), hipótese em que todo o imposto pertence ao Estado de destino, onde a
energia deve ser consumida. Mais explicitamente, o § 3º do mesmo artigo dispõe
que, além do ICMS e dos impostos de importação e exportação, nenhum outro
imposto poderá incidir sobre operações relativas à energia elétrica. Por outro
lado, o § 9º do art. 34 do ADCT atribui às distribuidoras de energia elétrica,
na condição de contribuintes substitutos, a responsabilidade pelo ICMS devido
sobre a energia elétrica, “até que lei complementar disponha sobre a matéria” –
condição que veio a ser atendida com a edição da Lei Complementar 87, de 1996.
Se
a energia elétrica é mercadoria submetida à incidência do ICMS, o seu
tratamento tributário deve ser semelhante ao das demais mercadorias,
respeitadas as peculiaridades da energia elétrica.
Esclarecedor
nesse sentido é a resposta à Consulta Copat 36/2007,
da Secretaria de Estado da Fazenda/SC. A matéria consultada é a seguinte: a
empresa A é geradora de energia elétrica e utiliza a rede de distribuição de
energia da empresa B, para entrega de sua mercadoria. A empresa A (geradora)
remunera a empresa B pelo uso de sua rede de distribuição pela Tarifa de Uso do
Sistema de Distribuição (TUSD). Incide ICMS sobre o pagamento da TUSD, nesse
caso específico? A consulta foi respondida nos seguintes termos:
EMENTA: ICMS. O
FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA E O ACESSO E USO DOS SISTEMAS DE TRANSMISSÃO E
DISTRIBUIÇÃO CONSTITUEM NEGÓCIOS DISTINTOS. O MERO USO DE REDE DE DISTRIBUIÇÃO
DE ENERGIA ELÉTRICA PELO FORNECEDOR, REMUNERADO PELA TUSD (TARIFA DE USO DO
SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO), NÃO CONSTITUI FATO GERADOR DO ICMS QUE IMPLICA
NECESSARIAMENTE OBRIGAÇÃO DE DAR.
POR OUTRO LADO, A TUSD, QUANDO COBRADA DO
CONSUMIDOR DA ENERGIA ELÉTRICA, INTEGRA A BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO.
Na hipótese da consulta, a
TUSD remunerou apenas o uso da rede de distribuição, sem ter havido fornecimento
de energia elétrica. Porém, quando do fornecimento ao consumidor final, o ICMS
incidirá sobre o valor total cobrado do consumidor.
De fato, a Lei 9.074, de 7 de
julho de 1995, que trata da outorga e prorrogações das concessões e permissões
de serviços públicos, dispõe em seu art. 15 que as novas concessões e as
prorrogações das atuais serão feitas sem
exclusividade de fornecimento de energia elétrica a consumidores com carga
igual ou maior que 10.000 kW, atendidos em tensão igual ou superior a 69 kV,
que podem optar por contratar seu fornecimento, no todo ou em parte, com
produtor independente de energia elétrica. O § 6º desse artigo assegura aos
fornecedores e respectivos consumidores livre acesso aos sistemas de
distribuição e transmissão de concessionário e permissionário de serviço
público, mediante ressarcimento do custo de transporte envolvido, calculado com
base em critérios fixados pelo poder concedente.
Todavia, isso não exclui
necessariamente a remuneração pelo uso dos sistemas de distribuição e
transmissão da base de cálculo do imposto, no fornecimento de energia elétrica
ao consumidor final. O art. 9º da Lei 9.648/98 dispõe que a compra e venda de energia elétrica entre
concessionários ou autorizados, deve ser contratada separadamente do acesso e
do uso dos sistemas de transmissão e distribuição. Mas, não se trata, no caso
em tela, de operações ou prestações entre concessionários ou autorizados, mas
entre esses e o consumidor final.
Contudo,
a base de cálculo do ICMS rege-se, não pela legislação federal relativa à
concessão ou permissão de fornecimento de energia elétrica e serviços
auxiliares, mas pela Lei Complementar 87, de 1996, mesmo porque leis ordinárias
não podem modificar dispositivo de lei complementar, que exige quorum qualificado
para sua modificação.
Pois bem, dispõe
o art. 8º, II, da Lei complementar 87, de 1996, que a base de cálculo, para
fins de substituição tributária, em relação às operações ou prestações
subsequentes, será obtida pelo somatório das parcelas seguintes:
a) o valor da
operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo
substituído intermediário;
b) o montante
dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou
transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;
c)
a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou
prestações subseqüentes.
Ou
seja, qualquer valor cobrado do consumidor final, relativo ao fornecimento de
energia elétrica – inclusive sua transmissão e distribuição – deve integrar a
base de cálculo do ICMS. Não há possibilidade de fornecer energia elétrica sem
a respectiva transmissão ou distribuição.
Considerando que a natureza
peculiar da corrente elétrica não implica efetivo deslocamento de matéria entre
o estabelecimento de origem e o de destino, ou seja, não há, a rigor, um
transporte (= levar algo de um lugar para outro). A transmissão não é de
matéria, mas de energia enquanto fenômeno eletro-magnético.
O fato gerador do ICMS, na
modalidade de circulação de mercadorias, consiste sempre em obrigação de dar. O
imposto incide sobre obrigações de fazer somente no caso da prestação de
serviços de transporte e de comunicação.
Porém, a Lei Complementar
87/96, art. 9°, § 1°, II, permite que a responsabilidade pelo imposto possa ser
atribuída às geradoras ou às distribuidoras de energia elétrica, desde a
produção até a última operação. Nesse caso, a base de cálculo será o preço
praticado na operação final de entrega da energia ao consumidor.
Revendo a legislação
pertinente, vemos que o art. 98-A do Anexo 6 do RICMS/SC determina que a
empresa distribuidora de energia elétrica deve emitir o competente documento
fiscal para “cada consumidor livre ou autoprodutor que estiver conectado ao seu
sistema de distribuição, para recebimento de energia comercializada por meio de
contratos a serem liquidados no âmbito da Câmara de Comercialização de Energia
Elétrica, ainda que adquirida de terceiros (Convênio ICMS 95/05)”.
O art. 237 do mesmo Anexo
atribui ao “consumidor de energia elétrica, conectado à rede básica, a
responsabilidade pelo pagamento do imposto devido pela conexão e uso dos
sistemas de transmissão na entrada de energia elétrica no seu estabelecimento.
(Convênios ICMS 117/04 e 135/05)”. Nessa hipótese, a base de cálculo será “o
valor total pago a todas as empresas transmissoras pela conexão e uso dos
respectivos sistemas de transmissão de energia elétrica, ao qual deve ser
integrado o montante do próprio imposto”.
Conforme art. 8°, VII do
Anexo 3 o imposto relativo à saída de energia elétrica para estabelecimento de
empresa concessionária, distribuidora do produto, é diferido para a etapa
seguinte de circulação.
A legislação tributária,
portanto, distingue entre “fornecimento” de energia elétrica e
“conexão e uso dos respectivos sistemas de transmissão de energia”. O
primeiro constitui obrigação de dar – fornecimento de energia elétrica ao
usuário, de produção própria ou adquirida de terceiro. Já o segundo caso, não
parece constituir “obrigação de dar”, mas de mera “cessão de uso” do sistema de
transmissão de energia.
Ora, o art. 2° da Resolução
ANEEL 166/05 define a TUSD como tarifa de uso dos sistemas de distribuição de
energia elétrica, relativo ao serviço de transmissão e distribuição de energia
elétrica. A mesma Resolução define que o faturamento mensal referente a
contrato de compra de energia será remunerada pela Tarifa de Energia Elétrica –
TE.
Assim, a hipótese aqui
considerada não se caracteriza como obrigação de dar, o que exclui a
exigibilidade do ICMS. A energia é fornecida pela contratante, que apenas
utiliza a rede de distribuição da outra empresa, a qual é remunerada pela TUSD
e não pela TE. Diferente é a situação de quem compra a energia e a revende a
terceiros.
Com efeito, o art. 9° da Lei
n° 9.648/98 dispõe que “para todos os efeitos legais, a compra e venda de
energia elétrica entre concessionários ou autorizados, deve ser contratada
separadamente do acesso e uso dos sistemas de transmissão e distribuição”.
Assim, se o negócio contratado é apenas de acesso e uso dos sistemas de
transmissão e distribuição não se configura o fato gerador do ICMS. Para haver
incidência do imposto, deve haver fornecimento de energia, consubstanciado em
contrato de compra e venda. A mera disponibilização de rede de distribuição ao
fornecedor de energia elétrica não constitui fato gerador do ICMS.
Questão diversa é se a TUSD
deve ou não integrar a base de cálculo do ICMS, enquanto valor cobrado do
consumidor final.
A Lei Complementar 87/1996,
art. 9º, § 1º, II, dispõe que a responsabilidade pelo pagamento do tributo, na
condição de substituto tributário, poderá ser atribuída às empresas geradoras
ou distribuidoras de energia elétrica, nas operações internas e interestaduais,
desde a produção ou importação até a última operação, sendo seu cálculo
efetuado sobre o preço praticado na operação final, assegurado seu
recolhimento ao Estado onde deva ocorrer essa operação.
Assim, como acontece na
comercialização de qualquer outra mercadoria, os valores pagos pelo fornecedor
pela utilização da rede, quando cobrados do consumidor final, devem integrar a
base de cálculo do ICMS.
Vejamos o caso de quem entra
em uma loja para comprar roupa pronta. O ICMS será calculado sobre o preço
cobrado do consumidor. Não é excluída da base de cálculo, por exemplo, a
facção. Do mesmo modo, não deve ser retirado da base de cálculo o acréscimo
relativo à venda faturada.
O caso particular de Santa
Catarina, em que os acréscimos financeiros cobrados nas vendas a prazo a consumidor
final são excluídos da base de cálculo, decorre de expressa disposição legal –
Lei 10.297/1996, art. 12, II. Porém, na falta de disposição expressa em
contrário, os acréscimos financeiros cobrados pelo próprio comerciante integram
a base de cálculo do ICMS. Nesse sentido tem decidido o Superior Tribunal de
Justiça, como no caso do Ag. Rg. no R. Especial 848.723 RS, da Segunda Turma,
rel. Min. Eliana Calmon (DJe de 10.11.2008; RDDT 160,
p. 215):
Tributário.
ICMS. Venda a Prazo sem Intermediação Financeira. Art. 13 da LC 87/96. Base de
Cálculo. Inclusão de Encargos da Venda no Valor da Operação. Precedentes do
STJ. Sucumbência. Fixação.
1.
Sobre a venda a prazo sem intermediação de instituição financeira incide ICMS.
Precedentes das Turmas da 1ª Seção.
2.
A discussão sobre a incidência ou não de ICMS sobre o valor acrescido pela
venda a prazo é exclusivamente de direito, estranha à análise dos fatos e
provas, e restou devidamente prequestionada na
origem.
3.
Agravo regimental não provido.
O acréscimo financeiro
somente deve ser excluído da base de cálculo quando houver intermediação
financeira. Nessa última hipótese, estarão sendo celebrados dois negócios
simultâneos, porém distintos: (i) a venda da mercadoria e (ii)
o financiamento, que estará sujeito a outro imposto, a saber, o IOF, de
competência da União. Mas se a venda for financiada pelo próprio vendedor, o
acréscimo deve integrar a base de cálculo do ICMS. Sobre a matéria, leciona
Hugo de Brito Machado (A Base de Cálculo do ICMS nas Vendas a Prazo. RDDT 194,
p. 63 e ss.):
[...] em se tratando de juros
que sejam receita do próprio vendedor, fica muito fácil para este fixar um
preço inferior à realidade e cobrar, a título de juros, valor maior, de forma a
compensar a redução do preço, com a consequente redução fraudulenta da base de
cálculo do ICMS.
[.....]
[...] em um contrato de
compra e venda, é possível a existência de um preço da mercadoria e, ainda
assim, separadamente deste, a definição dos juros a serem pagos pelo comprador
em razão do prazo que terá para fazer o pagamento.
[....]
Já a palavra valor, quando referida à saída da
mercadoria, como ocorre na disposição legal que define a base de cálculo do
ICMS, designa a quantia total relativa àquela operação, na qual podem estar
incluídos o preço da mercadoria e os juros.
[....]
Se o contrato de
financiamento é feito pelo comprador com terceiros, evidentemente os juros e
demais custos financeiros não integram a base de cálculo do ICMS. [...] O
financiamento, embora de algum modo relacionado com a compra e venda, é
consubstanciado em contrato inteiramente autônomo.
[....]
Sempre que tais contratos são
celebrados pelas mesmas partes, de um lado o vendedor, que também é o
financiador, e de outro o comprador, que é também o tomador do crédito, a lei
manda que se considere um único valor para a operação, representado pela soma
do preço da mercadoria e dos juros. Essa é a regra, que tem por finalidade
evitar a fraude consistente no subfaturamento da mercadoria.
Se a regra no ICMS é incidir o imposto sobre o preço
cobrado do consumidor, mesmo que parcelas desse preço possam ser identificadas
com atividades como facção, venda a prazo, transporte, colocação,
industrialização por terceiros etc., porque na energia elétrica seria
diferente? Porque deveriam a TUST e a TUSD ser excluídas da base de cálculo?
Vimos
que o acréscimo financeiro somente não integra a base de cálculo do ICMS quando
um terceiro (instituição financeira) financia o parcelamento (o comerciante
recebe imediatamente o valor total da venda). De modo análogo, o ICMS não
incide sobre a TUSD somente quando ela remunera apenas a cessão de uso da rede
de distribuição, sem fornecimento da energia que será fornecida pela
contratante do uso da rede de distribuição. Mas, se há fornecimento de energia,
a base de cálculo do ICMS deve necessariamente ser o preço total cobrado, ou
seja, a tarifa plena com todos os seus componentes.
Quando a geradora de energia
elétrica contrata o uso da rede de distribuição de outra empresa, remunerada
pela TUSD, não ocorre o fato gerador do ICMS. Porém, esse valor vai compor o
preço cobrado do consumidor final que constitui a base de cálculo do ICMS. A
situação é análoga à da empresa que vende divisórias já colocadas e que
contrata outra empresa para fazer a colocação. O consumidor não contrata a
colocação, mas está contratando a compra de divisórias colocadas. O custo da
colocação está incluído no valor cobrado do consumidor, mesmo que a colocação
corra por conta de outra empresa. No caso do fornecimento da energia elétrica,
a base de cálculo do ICMS é o valor total cobrado do consumidor, aí incluída a
TUSD, ainda que seja utilizada a rede de distribuição de outra empresa. Não há
razão para o fornecimento de energia elétrica ser diferente de qualquer outra
mercadoria.
A diferença de tratamento
tributário, a teor do art. 150, II, da Constituição Federal, deve estar
relacionada à diferença nas características da mercadoria – que justifique a
diferença de tratamento. O citado dispositivo constitucional veda a instituição
de tratamento desigual entre
contribuintes em situação equivalente. O seguinte escólio de Celso Antônio
Bandeira de Mello (Conteúdo Jurídico do
Princípio da Igualdade. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 29):
É
inadmissível, perante a isonomia, discriminar pessoas ou situações ou coisas (o
que resulta, em última instância, na discriminação de pessoas) mediante traço
diferencial que não seja nelas mesmas residentes. Por isso, são incabíveis
regimes diferentes determinados em vista de fator alheio a elas; quer-se dizer:
que não seja extraído delas mesmas.
5. Conclusões:
O
fato gerador do ICMS, conforme a competência dada aos Estados pelo art. 155,
II, da Constituição Federal, compreende os seguintes núcleos: (i) operações relativas
à circulação de mercadorias, (ii) prestação de
serviço de transporte interestadual e intermunicipal e (iii)
prestação de serviço de comunicação.
A
energia elétrica foi equiparada à coisa móvel, para caracterizar como crime de
furto os desvios de energia (“gatos”), conforme CP, art. 155, § 3º. Ora, se a
energia elétrica é “coisa móvel” produzida para ser vendida, então ela é
mercadoria, pela própria definição de mercadoria. Por conseguinte, a energia
elétrica submete-se à incidência do ICMS e o seu tratamento tributário deve ser
semelhante ao das demais mercadorias, respeitadas as peculiaridades da energia
elétrica.
A
base de cálculo na saída de mercadoria do estabelecimento do contribuinte, a
teor do disposto no art. 13, I, da Lei Complementar 87/1996, é o valor da
operação, entendendo-se por tal o preço total cobrado do adquirente. O preço
cobrado do adquirente (base de cálculo do ICMS) deve cobrir todos os custos e
despesas incorridos pela empresa, inclusive lucro, já que tudo deve ser financiado
pelo resultado de seu negócio.
A
“mercadoria” energia elétrica difere das demais mercadorias porque não tem
natureza corpórea, resultando, para cada diferença de potencial (tensão
elétrica), em uma quantidade de eletricidade que está sendo convertida em
outras formas de energia (Watt). Por isso, a energia elétrica existe apenas no
momento em que o consumidor está conectado à rede. Então, ela não pode ser
estocada, armazenada ou posta em um depósito. Também, a produção, distribuição
e consumo não ocorrem em momentos sucessivos no tempo, mas simultaneamente.
A
base de cálculo do ICMS não é definida pela legislação ordinária federal
relativa à concessão ou à permissão de serviço público de fornecimento de
energia elétrica, mas pela legislação tributária, em particular pela Lei
Complementar 87, de 1996. A esse propósito, convém lembrar que lei complementar
não pode ser modificada por lei ordinária, mas apenas por outra lei
complementar.
Ora,
dispõe o art. 8º, II, b, da referida lei complementar que a base de cálculo
para fins de substituição tributária, em relação a operações subsequentes,
compreende quaisquer “encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes”, o
que compreende os valores relativos ao uso dos sistemas de transmissão e
distribuição de energia. Mais explicitamente, o art. 9º, § 1º, II, da mesma Lei
Complementar dispõe que a responsabilidade pelo recolhimento do imposto pode
ser atribuído às empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica, na
condição de substituto tributário, calculado sobre o preço praticado na
operação final.
Portanto,
devem aplicar-se à energia elétrica todas as regras que se aplicam às
mercadorias em geral. TUST e a TUSD são tarifas de uso dos sistemas elétricos
de transmissão e distribuição para (i) assegurar recursos suficientes para
cobrir os custos dos sistemas de transmissão; e (ii)
assegurar maiores encargos para os agentes que mais onerem o sistema de
transmissão. As concessionárias de distribuição são obrigadas a levar a energia
elétrica aos seus consumidores, arcando com custos que devem ser cobertos com a
tarifa de energia elétrica inclusive a sua disponibilidade, 24 horas por dia, 7
dias por semana. O consumidor espera que, a qualquer momento, quando ligar um
aparelho elétrico, ele funcione. Como em qualquer outra mercadoria, esses
custos devem ser financiados pelo preço cobrado dos consumidores. As empresas,
ordinariamente, não têm outra fonte de recursos.
Os custos
relativos ao uso do sistema de distribuição (TUSD – Tarifa de Uso do Sistema de
Distribuição) compreendem as despesas de capital e os custos de operação e
manutenção das redes de distribuição, e os custos relativos ao uso do sistema
de transmissão (TUST).
O
consumidor contrata o fornecimento de energia elétrica ao seu estabelecimento o
que implica necessariamente o uso dos sistemas de distribuição e transmissão.
Em outras palavras, para que o fornecimento de energia seja possível, o
consumidor deve necessariamente estar conectado fisicamente à rede. Por isso,
não faz sentido pretender excluir da base de cálculo do imposto estadual as
parcelas relativas à TUST e à TUSD.
Portanto,
como acontece na comercialização de qualquer outra mercadoria, os
valores pagos pelo fornecedor pela utilização da rede, quando cobrados do
consumidor final, devem integrar a base de cálculo do ICMS. Para ser dado
tratamento tributário à energia elétrica, diferente das demais mercadorias
sujeitas ao imposto, deve ser justificado pela relação com as características
mesmas da mercadoria, conforme art. 150, II, da Constituição Federal. A
diferença de tratamento tributário deve estar relacionada com a diferença entre
a energia elétrica e as demais mercadorias.
Getri, em Florianópolis, 27 de outubro de 2015.
Velocino
Pacheco Filho
Danielle Kristina dos Anjos Neves
AFRE – mat. 184244-7
Gerente de Tributação