CONSULTA 106/2016

EMENTA: ICMS. CRÉDITO DO IMPOSTO NAS AQUISIÇÕES DE MATERIAL DE EMBALAGEM E PRODUTO INTERMEDIÁRIO.

1. A entrada de caixa de papelão utilizada para acondicionar bobinas e resmas e vendida como parte integrante da mercadoria, bem como a fita adesiva utilizada para seu fechamento, geram direito ao crédito do imposto

2. A entrada de faca utilizada para o corte do papel, por se caracterizar como produto intermediário que não se consome integral e imediatamente no processo de industrialização, não gera direito ao crédito do imposto até que entre plenamente em vigor o regime de crédito financeiro do ICMS previsto no art. 20 da Lei Complementar de nº 87/96, com sua limitação temporal de gozo prevista no art. 33, II, "d".

Publicada na Pe/SEF em 12.09.16

Da Consulta

Narra o consulente que atua na fabricação de folha de papel A4, bobinas térmicas e papel de impressão de imagens. As bobinas são embaladas em sacos plásticos e posteriormente acondicionadas em caixas de papelão. As folhas de papel A4 são embaladas em resmas e também acondicionadas em caixas de papelão. Informa que as caixas de papelão não retornam ao estabelecimento industrial, tampouco as bobinas e as resmas são vendidas sem a embalagem que as acondiciona para transporte (caixa de papelão), formando um só produto.

Informa, ainda, que utiliza faca de corte no processo de industrialização e que tal produto dura de 06 (seis) a 10 (dez) meses.

Diante do exposto, vem diante desta Comissão perguntar se a entrada da caixa de papelão e da fita adesiva utilizada para seu fechamento, bem como da faca de corte, geram direito ao crédito do ICMS.

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

É o relatório, passo à análise.

Legislação

Constituição Federal, art. 155, §2º, VII e VIII;

Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, art. 20; art. 21, II; art. 33, II, "d".

RICMS/SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, art. 82, II, "d".

 

Fundamentação

A Constituição da República, através do inciso I do §2º do artigo 155, prevê a não-cumulatividade para o ICMS. Para a operacionalização do instituto da não-cumulatividade, o constituinte adotou a técnica de débito do imposto pelas saídas e crédito do imposto pelas entradas de mercadorias. Ao se referir aos créditos pelas operações de circulação de mercadorias, nota-se que a Constituição garantiu o direito ao crédito físico do ICMS, ou seja, há direito ao crédito, para operacionalização da não cumulatividade, nas entradas de mercadorias que serão, em momento posterior, postas novamente em circulação, pela revenda ou pela sua integração a uma nova mercadoria.

Hugo de Brito Machado assim conceitua o regime de crédito físico do ICMS (Aspectos Fundamentais do ICMS, 1997, pp. 131 e 140):

No regime de não-cumulatividade conhecido como crédito físico, só ensejam crédito as entradas de mercadorias, em se tratando de empresa comercial. Na empresa industrial, ensejam crédito as entradas de bens que se integram fisicamente no produto, tais como matérias-primas, os materiais secundários, os intermediários e os de embalagem. Não os destinados ao ativo permanente. Ainda que se desgastem no processo produtivo.

O crédito do imposto nas aquisições de bens e mercadorias que não sofrerão nova circulação é denominado de crédito financeiro. A possibilidade de crédito do ICMS nestas aquisições são benefícios fiscais criados pela Lei Complementar nº 87/96 e não guardam qualquer conexão com o princípio da não-cumulatividade insculpido no inciso I, do §2º do artigo 155 da Constituição. Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS, 1997, pp. 131 e 140) conceitua o regime de crédito financeiro nos seguintes termos:

Entende-se como regime do crédito financeiro aquele no qual todos os custos, em sentido amplo, que vierem onerados pelo ICMS, ensejam o crédito respectivo. Sempre que a empresa suporta um custo, seja ele consubstanciado no preço de um serviço, ou de um bem, e quer seja este destinado à revenda, à utilização como matéria-prima, produto intermediário, embalagem, acondicionamento, ou mesmo ao consumo ou à imobilização, o ônus do ICMS respectivo configura um crédito desse imposto.

Em recente decisão do ministro Joaquim Barbosa, no Recurso Extraordinário nº 447.470/PR, foi reafirmada a posição do Supremo Tribunal Federal acerca da divisão entre crédito físico e financeiro do ICMS, sendo o primeiro garantido pela Constituição Federal através da não cumulatividade do ICMS e o segundo, no qual se inserem as aquisições de ativo imobilizado e de material de uso e consumo, é um benefício fiscal criado por Lei Complementar:

Ementa: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERMUNICIAL E INTERESTADUAL. NÃOCUMULATIVIDADE. DIFERENÇA ENTRE CRÉDITO FÍSICO E CRÉDITO FINANCEIRO. DISCUSSÃO SOBRE O MODELO ADOTADO PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL.

1. Esta Corte tem sistematicamente entendido que a Constituição de 1988 não assegurou direito à adoção do modelo de crédito financeiro para fazer valer a não-cumulatividade do ICMS, em toda e qualquer hipótese. Precedentes.

2. Assim, a adoção de modelo semelhante ao do crédito financeiro depende de expressa previsão Constitucional ou legal, existente para algumas hipóteses e com limitações na legislação brasileira.

3. A pretensão do contribuinte, de assemelhar o ICMS a modelo ideal de Imposto sobre Valor Agregado - IVA, sem prejuízo dos inerentes méritos econômicos e de justiça fiscal, não ressoa na Constituição de 1988. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

Resta, assim, fácil a verificação que o material utilizado para a embalagem das mercadorias que sofrerão nova etapa de circulação, gera direito ao crédito do imposto, desde que, evidentemente, a saída da mercadoria seja tributada pelo imposto. É que as caixas de papelão, bem como a fita adesiva utilizada para sua vedação, são mercadoria tanto quanto as resmas ou bobinas, já que vendidas como um só produto, isto é, as caixas não retornam ao estabelecimento industrial e tampouco as resmas ou bobinas são vendidas sem a embalagem que as acondiciona para transporte da indústria até os estabelecimentos adquirentes, restando caracterizado o crédito físico do imposto. Esta Comissão já chegou à idêntica conclusão:

Consulta nº 55/2013:

EMENTA: EMBALAGEM. CRÉDITO DO IMPOSTO. CAIXAS DE PAPELÃO UTILIZADAS PARA ACONDICIONAR BISCOITOS. GERA DIREITO AO CRÉDITO DO IMPOSTO A SAÍDA DA EMBALAGEM VENDIDA COMO PARTE INTEGRANTE DA MERCADORIA QUE ACONDICIONA.

Resta a análise de a faca utilizada no corte da folha de papel a ser comercializada ter natureza de produto intermediário, consumido imediata e integralmente no processo produtivo. Caso se verifique a natureza de material intermediário, que se integra ao novo produto ou é imediata e integralmente consumido na produção, deve-se seguir a sistemática de crédito físico previsto pela Constituição, garantindo o direito ao crédito do ICMS em suas aquisições. Caso contrário, deve-se seguir a sistemática do crédito financeiro, previsto pelo artigo 20 da Lei Complementar 87/96, com sua limitação temporal de gozo prevista no art. 33, II, "d".

Isso porque o inciso II do art. 21 da Lei Complementar de nº 87, de 13 de setembro de 1996 prevê que o sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto de que tiver se creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento for integrada ou consumida em processo de industrialização quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto. Eis a base legal para a fixação do conceito de produto intermediário ao processo produtivo que gera direito ao crédito do imposto.

A interpretação a ser dada ao comando normativo supramencionado é que a mercadoria que se integra ou é consumida imediatamente no processo de industrialização gera direito ao crédito do imposto, desde que a respectiva saída seja tributada. Note-se que não basta que determinado produto seja caracterizado como intermediário: é necessário que também seja integrado ou consumido imediatamente no processo produtivo.

Neste ponto, o consulente esclareceu que a faca de corte tem um ciclo produtivo de 06 (seis) a 10 (dez) meses. Nota-se, assim, que não há o consumo imediato e integral do material. Antes ele é consumido ao longo do processo produtivo. O mero desgaste de materiais não gera direito ao crédito do imposto. Assim decidiu a Egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 799.724/RJ (Relator Ministro Luiz Fux, julgamento em 13 de março de 2007):

                         (...)

4. O § 1º, do artigo 20, da Lei Complementar nº 87/96, restringiu expressamente as hipóteses de creditamento  do  ICMS  à  entrada de mercadorias  que  façam  parte  da  atividade  do estabelecimento. Dessas limitações  legais decorre, por imperativo lógico, que a utilização de supostos créditos  não  é ilimitada, tampouco  é do  exclusivo  alvedrio  do  contribuinte.

 5. In casu, consoante assentado no aresto recorrido, os bens cuja aquisição, segundo a recorrente, ensejariam o direito ao aproveitamento dos créditos de ICMS, não obstante o natural desgaste advindo do seu uso, não consubstanciam matéria-prima ou insumo a ser utilizado no processo de industrialização. Ao revés, integram o ativo fixo da empresa e fazem parte das várias etapas do processo de industrialização, sendo que sua substituição periódica decorre da própria atividade industrial, matéria insindicável pela Súmula 7/STJ.

A mesma Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial nº 235.324/SP, já apresentava o seguinte precedente sobre a matéria (Relator Ministro José Delgado, julgamento em 03 de fevereiro de 2000):

TRIBUTÁRIO. ICMS. PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS UTILIZADOS NO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO DE ICMS. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

1. A aquisição de produto ou mercadoria que, apesar de integrarem o processo de industrialização, nele não são completamente consumidos e nem integram o produto final, não gera direito ao creditamento do ICMS, posto que ocorre quanto a estes produtos apenas um desgaste e a necessidade de sua substituição periódica é inerente à atividade industrial.

Da fundamentação do voto do relator, Ministro José Delgado, destacamos as seguintes passagens:

Exatamente pelo fato desta consumação não ser total e completa e sim corresponder, em verdade, a várias etapas do processo de industrialização, é que a aquisição desses insumos e mercadorias não gera direito ao crédito pretendido.

Dessa forma, a perda de óleo lubrificante e outros insumos, desgastes naturais de máquinas e ferramentas, com a necessidade de sua substituição periódica é inerente à atividade industrial. São evidentemente coadjuvantes do processo, mas não integram nem se consomem no produto final. São necessários ao processo de industrialização, mas de modo a compô-lo e transformá-lo, perdendo a identidade ou se dando a extinção de entidade participe.

Suas aquisições, portanto, não têm influência na sistemática do ICM ou do ICMS ou do princípio da não-cumulatividade. Não tendo essa repercussão, não há falar-se em crédito, pelas aquisições, ao intermediário do imposto.

A matéria já foi analisada por esta Comissão em várias ocasiões, entre outras, nas respostas às Consultas n° 61/2009 e nº 146/2011:

Consulta nº  061/2009:

EMENTA: ICMS. ENQUANTO NÃO ENTRAR PLENAMENTE EM VIGOR O REGIME DE CRÉDITOS FINANCEIROS, CONSTITUI CONDIÇÃO NECESSÁRIA PARA O DIREITO À APROPRIAÇÃO DE CRÉDITOS DO IMPOSTO QUE O MATERIAL RESPECTIVO SE INTEGRE FISICAMENTE AO PRODUTO OU SE CONSUMA INTEGRALMENTE NO PROCESSO FABRIL. O MERO DESGASTE DO MATERIAL EMPREGADO - NO CASO, A UTILIZAÇÃO DE SEGMENTOS DIAMANTADOS NA INDUSTRIALIZAÇÃO DA ARDÓSIA - NÃO DÁ DIREITO A CRÉDITO DO ICMS.

Consulta nº 146/2011:

EMENTA: ICMS. REGIME DE CRÉDITOS FINANCEIROS ADOTADO PELO ART. 20 DA LEI COMPLEMENTAR 87/96. SOMENTE   DARÃO DIREITO AO CRÉDITO DO IMPOSTO RELATIVO AOS PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS QUE NÃO SE CONSOMEM INTEGRAL E IMEDIATAMENTE NO PROCESSO INDUSTRIAL AQUELES CUJAS ENTRADAS NO ESTABELECIMENTO INDUSTRIAL OCORREREM APÓS 1º DE JANEIRO DE 2020.

Resposta

Pelo exposto, responda-se ao consulente que a entrada de caixa de papelão utilizada para acondicionar resmas ou bobinas e vendida como parte integrante da mercadoria, bem como a fita adesiva utilizada para seu fechamento, geram direito ao crédito do imposto. Já a faca utilizada para o corte do papel não gera direito ao crédito do imposto até que entre plenamente em vigor o regime de crédito financeiro do ICMS previsto no art. 20 da Lei Complementar de nº 87/96.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

 PAULO VINICIUS SAMPAIO

AFRE II - Matrícula: 9507191 

 

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 11/08/2016. A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome                                                                                       Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM                                                     Presidente COPAT

ADENILSON COLPANI                                                            Secretário(a) Executivo(a)