CONSULTA Nº :
068/2008
EMENTA: CONSULTA. O INSTITUTO VISA EXCLUSIVAMENTE
DIRIMIR DÚ- VIDAS SOBRE A INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA ESTADUAL. NÃO
PODE SER RECEBIDO COMO TAL, PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO TRIBUTÁRIA. CARACTERIZADO
DESVIO DE FINALIDADE. CONSULTA NÃO RECEBIDA.
DOE de 16.12.08
01 - DA CONSULTA
A requerente, pessoa física qualificada nos autos, informa
que, com fundamento no art. 551 do Código Civil, em razão do falecimento de seu
cônjuge, solicitou ao Registro Imobiliário a averbação do óbito na matrícula do
imóvel que o cônjuge falecido recebeu em doação de seu falecido pai.
Mas por comunicação formal, a Oficial
de Registro requereu que fosse comprovada a quitação do ITCMD ou a não
incidência do imposto referente à fração do imóvel pertencente ao cônjuge
falecido.
Entende
que segundo o disposto no art. 551 do Código Civil, a parte do imóvel doada ao
seu cônjuge falecido não entra no acervo hereditário e, por isso, não incide qualquer
tributo para que se proceda a averbação relativa ao óbito.
Razão
pela qual vem a esta Comissão solicitar que lhe seja fornecida uma declaração de
que a averbação pleiteada está isenta de tributos.
É
o relatório, passo à analise.
02 -
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.
Constituição
da República Federativa do Brasil, art. 155, I,
Código Tributário
Nacional, art. 114;
Lei nº 3.938, de 26
de dezembro de 1966, arts. 209 e 212;
Lei nº
13.136, de 25 de novembro de 2004, art. 2º, I.
03 -
FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.
Sem embargo à situação fática que apresenta,
deve-se registrar, preliminarmente, que a requerente não manifesta dúvidas em
relação à interpretação de dispositivos da legislação tributária estadual. A
questão é de Direito Civil. Por entender que a situação que apresenta enquadra-se
no instituto do direito de acrescer previsto no art. 551, parágrafo único, do
Código Civil, vem a esta Comissão solicitar que lhe seja fornecida uma declaração
de que está isenta de tributação a averbação do óbito de seu cônjuge no
Cartório de Registro de Imóveis, local da matrícula do imóvel cuja fração foi doada
a seu cônjuge falecido.
Sendo assim, o pedido não pode ser
recebido como consulta, porque o instituto da consulta destina-se, exclusivamente, a dirimir
dúvidas quanto à interpretação da legislação tributária estadual, ex vi
do art. 209, da Lei nº 3.938, de 1966, com nova redação dada pela Lei nº
11.847, de 23 de janeiro de 2001, in verbis.
Art. 209. O sujeito passivo poderá, mediante petição escrita dirigida ao
Secretário de Estado da Fazenda, formular consulta sobre a interpretação de
dispositivos da legislação tributária estadual.
Razão por que a demanda não pode ser acolhida com os efeitos de consulta
referidos no art. 212, da Lei nº 3.938, de 1966, por não se tratar de
dúvida sobre a legislação tributária estadual. A questão é de Direito Civil o
que torna a consulta instrumento inadequado
para a satisfação do pleito, que requer
análise dos efeitos do instituto do direito de acrescer, sobre o qual a
administração está impedida de manifestar-se.
Contudo para não deixar
a requerente sem qualquer orientação, cabem os seguintes comentários.
O art. 551, parágrafo único da Lei nº
10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil Brasileiro, tem aplicação na
hipótese em que figurar como donatários ambos os cônjuges.
Art.
551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa
entende-se distribuída entre elas por igual.
Parágrafo
único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na
totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo.
O vocábulo subsistirá é utilizado para determinar que o bem fique integralmente
no domínio do cônjuge supérstite e, por isso, não integra o acervo hereditário.
Ou seja, o vocábulo tem o condão de produzir efeitos concernentes à transmissão
da parte ideal do de cujus,
que passará a pertencer ao cônjuge supérstite, acrescendo à parte ideal deste.
Em que pese a dicção do dispositivo não utilizar a expressão “direito de
acrescer”, a doutrina majoritária reconhece que o instituto de que trata o
parágrafo único é direito de acrescer. Nesse sentido leciona Sylvio Capanema de
Souza, ao comentar a art. 551 do Código Civil:
“No entender de Caio Mario ‘se forem os
donatários marido e mulher, a lei institui uma substituição recíproca,
estatuindo que, com a morte de um, não passa o bem a seus herdeiros, mas
subsiste na totalidade a doação para o cônjuge supérstite, como um direito de acrescer’”.
Sobre a matéria o Superior Tribunal de
Justiça já se pronunciou quando decidiu questão semelhante no Recurso Especial
324593/SP - 2003.
Civil.
Recurso Especial. Inventário. Imóvel obtido pelo falecido mediante doação.
Único donatário. Subsistência da doação em relação ao seu cônjuge, com
base no art. 1.178, parágrafo único do CC. Impossibilidade. – A aplicação de
art. 1.178, parágrafo único do CC, no sentido de subsistir a doação em
relação ao cônjuge supérstite, condiciona-se ao fato de terem figurado como
donatários marido e mulher. No contrato de doação, se apenas o marido
figura como donatário, ocorrendo a morte deste, eventual benefício à mulher
somente se configurará se o regime de bens, estabelecido no matrimônio,
permitir. Recurso Especial não conhecido (3ª T., REsp
324593/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 16.9.2003,
DJ, 1º.12.2003, p. 347). (original sem destaques).
Assim, subsistirá na totalidade a
doação para o cônjuge sobrevivo se ambos tiverem figurado no contrato de doação
como donatários. Se, porém, o ato de liberalidade tiver sido praticado a apenas
um deles, ainda que o casal tivesse adotado o regime da comunhão universal de
bens, não se poderá aplicar o direito de acrescer quando do falecimento de
qualquer dos cônjuges.
Mas é de se observar que aquele
dispositivo silencia sobre o direito de acrescer, na hipótese da morte de um
dos donatários, sobrevivendo os demais, só o disciplinando no parágrafo único,
e apenas para o caso de serem eles, os donatários, marido e mulher.
Situação que deve ser considerada,
já que na hipótese apresentada a doação não é feita apenas aos cônjuges, mas,
sim, a três pessoas distintas, entre as quais duas delas são marido e mulher.
Caso que não encontra proteção do instituto do direito de acrescer previsto no
art. 551, parágrafo único retro mencionado.
Todavia, cabe ressaltar que para se concluir pela
incidência do imposto na transmissão do bem doado ao falecido, é irrelevante
definir os efeitos do instituto do direito de acrescer. Porque, definidos tais efeitos,
ou o bem será transmitido aos herdeiros, ou ao cônjuge supérstite em
decorrência da morte de seu cônjuge.
Na medida em que a propriedade, antes
pertencente ao de cujus
passa a pertencer a outrem ocorre, para fins do Direito Tributário, a
transmissão causa mortis
do bem havido por doação pelo falecido, acrescendo esse ao patrimônio de outra
pessoa.
Transmissão
essa que é fato gerador do imposto de competência
estadual, prevista no art. 155, I, da Constituição Federal, que estabelece como
hipótese de incidência a transmissão de bens e direitos por causa mortis e por doação. Esta é a regra geral de incidência
do ITCMD.
É sabido que o
acontecimento do fato descrito na hipótese de incidência faz nascer a obrigação tributária. O Código Tributário Nacional, em seu
art. 114, estabelece que o fato gerador da obrigação tributária principal é a
situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
Assim, pelo simples fato de ter ocorrido a transferência da propriedade relativa à parte ideal,
pertencente ao falecido, do imóvel por ele recebido em doação para o patrimônio
do cônjuge supérstite ou para os herdeiros, acontece o fato gerador do tributo,
ainda que o Código Civil tenha adotado o vocábulo “subsistir” dando, numa
análise superficial, a falsa idéia de estagnação ou imobilidade, caso prevaleça
o direito de acrescer previsto no art.551, parágrafo único do Código Civil à
hipótese.
A Lei
nº 13.136, de 25 de novembro de 2004, art. 2º, I e § 1º, estabelece:
Art. 2º O imposto de que trata o art. 1º desta Lei, tem como fato gerador
a transmissão causa mortis ou a doação a qualquer
título, de:
I - propriedade ou
domínio útil de bem imóvel;
(...)
§ 1º Para efeitos deste artigo,
considera-se doação qualquer ato ou fato, não oneroso, que importe ou se
resolva em transmissão de quaisquer bens ou direitos.
Isto
posto, responda-se à requerente que:
a) a demanda não é acolhida com os
efeitos de consulta, referidos no art. 212, da Lei nº 3.938/66, porque não se
trata de dúvida quanto à interpretação da legislação tributária estadual, mas de
questão pertinente ao Direito Civil sobre o qual a administração está impedida de manifestar-se.
b) é
irrelevante a definição dos efeitos do instituto do direito de acrescer para se
concluir que haverá tributação sobre a transmissão da propriedade do cônjuge
falecido. Porque, definidos tais efeitos, ou o bem será transmitido aos
herdeiros, ou ao cônjuge supérstite em decorrência da mortis causa, o que é fato gerador
do ITCMD.
À superior consideração da
Comissão.
GETRI, 28 de agosto de 2008.
Alda Rosa da Rocha
AFRE IV – matr.
344171-7
De
acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na sessão do dia 16 de outubro de 2008.
Alda
Rosa da Rocha
Almir José Gorges
Secretária Executiva Presidente da Copat