CONSULTA 37/2015

EMENTA: ICMS. BENEFÍCIOS FISCAIS. LEI Nº 13.992/07 QUE AUTORIZA O PODER EXECUTIVO A IMPLEMENTAR BENEFÍCIO FISCAL CONSISTENTE NA POSSIBILIDADE DE CRÉDITO DO ICMS NAS AQUISIÇÕES DE PARTES E PEÇAS DE REPOSIÇÃO DE EQUIPAMENTOS E MÁQUINAS UTILIZADAS NA PRODUÇÃO CERÂMICA. ENQUANTO NÃO HOUVER EDIÇÃO DE DECRETO DO PODER EXECUTIVO IMPLEMENTANDO O BENEFÍCIO, NÃO HÁ DIREITO AO CRÉDITO.  

Publicada na Pe/SEF em 02.07.15

Da Consulta

Narra o consulente que é empresa que atua no ramo de industrialização de pisos e revestimentos cerâmicos. Informa que a Lei nº 13.992/07, através de seu artigo 22, autorizou o Poder Executivo a implementar benefícios fiscais consistentes em prazo reduzido para apropriação do ICMS nas aquisições de bens destinados ao ativo imobilizado e possibilidade de crédito do imposto nas aquisições de partes e peças de reposição, destinadas a equipamento e máquinas utilizadas diretamente na produção cerâmica.

Diante disso, pergunta se pode efetuar o crédito do ICMS nas aquisições de material de uso e consumo discriminados no inciso II do art. 22 da Lei nº 13.992/07 independentemente da existência de decreto implementando tal benefício.

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

É o relatório, passo à análise. 

 

Legislação

Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, artigo 30, I;

Lei nº 13.992, de 15 de fevereiro de 2007, artigo 22.

 

Fundamentação

O artigo 22 da Lei nº 13.992, de 15 de fevereiro de 2007 concedeu ao Poder Executivo autorização para implementar os seguintes benefícios fiscais:

Art. 22. O Poder Executivo fica autorizado a implementar programa de revigoramento de empresas nas áreas de extração de carvão mineral e indústria cerâmica, consistente na apropriação, na escrita fiscal, de créditos relativos ao ICMS, decorrente da entrada no estabelecimento. (NR)

I - de bens destinados ao ativo imobilizado, em prazo inferior àquele previsto na Lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996; e

II - de partes e peças de reposição destinadas a equipamento e máquinas utilizadas diretamente na exploração mineral e produção cerâmica.

 

Conforme doutrina inaugurada por Hans Kelsen em sua obra Teoria Pura do Direito, as normas que regulam as condutas dos indivíduos devem buscar sua fundamentação de validade em normas hierarquicamente superiores. Existem normas, portanto, que não tratam de disciplinar condutas humanas diretamente, mas sim de assegurar validade a tais normas, estruturando o ordenamento jurídico. Cuidam indiretamente das condutas dos indivíduos e diretamente da atribuição de validade às normas que tratam destas condutas:

"A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da conexão de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental - pressuposta. A norma fundamental - hipotética, nestes termos - é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta interconexão criadora." Teoria Pura do Direito, Martins Fontes, São Paulo, 1987, p. 240.

 

As normas jurídicas são assim classificadas pela doutrina em i. normas de conduta, voltadas direta e imediatamente à regulação dos comportamentos das pessoas e ii. normas de estrutura, dirigidas diretamente a regular a produção de outras normas.

Paulo de Barros Carvalho afirma que as normas de conduta "estão diretamente voltadas para a conduta das pessoas, nas relações de intersubjetividade" (Curso de Direito Tributário, Saraiva, São Paulo, 2000, p. 136), enquanto que, para Daniel Monteiro Peixoto, as regras de estrutura são "aquelas que prescrevem a autoridade competente e o procedimento segundo o qual as normas devem ser produzidas (...), bem como as que regem os limites materiais desta atividade". (Competência Administrativa na Aplicação do Direito Tributário, Quatir Latin, São Paulo, 2006, p. 62).

Nota-se que as regras de estrutura são direcionadas à autoridade competente para a edição das normas de conduta e não às pessoas diretamente.

Segundo ensinamento de Lourival Villanova, todas as normas jurídicas, por serem prescritivas, são estruturadas pela Lógica Deôntica, apresentando, necessariamente, um dos três modalizadores possíveis do dever ser: obrigatório, permitido ou proibido. Norberto Bobbio, ao detalhar os modais deônticos das normas de estrutura, acaba por classifica-las em nove subcategorias decorrentes das três possibilidades do dever ser: normas que comandam comandar, normas que proíbem comandar, normas que permitem comandar, normas que comandam proibir, normas que proíbem proibir, normas que permitem proibir, normas que comandam permitir, normas que proíbem permitir e normas que permitem permitir.

A tese apresentada pelo consulente não se sustenta em razão da errônea identificação do tipo de norma constante no art. 22 da Lei nº 13.992/07 e de seu modalizador deôntico. Não se trata de norma de conduta, apta por si só a permitir comportamentos concretos dos contribuintes. E nem mesmo é norma de estrutura na modalidade que comanda permitir. Antes, trata-se de norma de estrutura que permite permitir.

Havendo, assim, uma norma de estrutura na modalidade que permite permitir, a conduta humana decorrente desta permissão somente seria possível se houvesse a normatização da conduta permitida. Mas note-se, não existe a obrigação da permissão, mas puramente a permissão de permitir, que pode ou não ser exercida pelo destinatário da norma de estrutura.

O art. 22 da Lei nº 13.992/07 não criou benefícios fiscais, mas somente permitiu ao Poder Executivo implementá-los para a indústria carbonífera e cerâmica. Até a presente data o Poder Executivo não editou decreto implementando e regulamentando os benefícios fiscais inicialmente narrados.

O que deve ser bem compreendido é a diferença existente entre uma pessoa estar "autorizada" a realizar um ato e estar "obrigada" à realização deste ato. A autorização é uma permissão concedida para a realização de um ato. Não se encontra embutida na carga semântica do vernáculo "autorizar" a ideia de obrigar à realização do ato. De fato, no direito positivo, são modalidades diferentes de normas, como já dito.  

Havendo permissão legislativa para a realização de um ato, cabe ao Administrador, no caso o Chefe do Poder Executivo, segundo critérios de conveniência e oportunidade, optar pela realização ou não do ato permitido. A autorização concedida tem natureza discricionária.

Assim, se é necessária edição de decreto para fixação do prazo em que seriam tomados os créditos do ICMS nas aquisições de bens para o ativo imobilizado, como bem afirmado pelo peticionante, é correto afirmar-se pela necessidade de decreto para disciplinar a forma como se dará o crédito do ICMS nas aquisições de material de uso e consumo, se o crédito será total ou parcial, por qual período vigorará o benefício fiscal etc.

Conclui-se que a previsão contida na norma jurídica transcrita não é autoaplicável, necessitando, conforme consta no caput do art. 22 da Lei nº 13.992/07, de Ato do Poder Executivo permitindo o crédito e regulamentando sua forma de apropriação.   

 

Resposta

Pelo exposto, responda-se ao consulente que não há direito à apropriação do crédito do ICMS nas aquisições de partes e peças de reposição de equipamentos e máquinas utilizadas  na produção cerâmica enquanto não editado decreto pelo Poder Executivo implementando o benefício.

 

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários. 



PAULO VINICIUS SAMPAIO
AFRE II - Matrícula: 9507191

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 11/06/2015.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

 

Nome                                                                                      Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM                                           Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA                                             Secretário(a) Executivo(a)