CONSULTA 125/2014

EMENTA: ICMS. CONSTRUÇÃO NAVAL. DIFERIMENTO NAS OPERAÇÕES INTERNAS QUE DESTINEM MATÉRIA-PRIMA PARA USO EM PROCESSO INDUSTRIAL NO ESTABELECIMENTO DO ADQUIRENTE. A MATÉRIA-PRIMA COMPREENDE A SUBSTÂNCIA NATURAL OU RESULTANTE DE TRANSFORMAÇÃO INDUSTRIAL QUE SE AGREGA FÍSICAMENTE À EMBARCAÇÃO, TAIS COMO MADEIRA, AÇO, OUTROS METAIS OU LIGAS, TINTAS, VERNIZES ETC. NÃO ESTÃO COMPREENDIDOS OS MATERIAIS SECUNDÁRIOS, DE USO INTERMEDIÁRIO E DE ACONDICIONAMENTO.

Disponibilizado na página da Pe/SEF em 09.10.14

 

Da Consulta

A consulente em epígrafe, empresa dedicada à construção de embarcações para esporte e lazer, invocando o direito de petição (CF, art. 5º, XXXIV, a), formula consulta sobre a interpretação dos dispositivos que menciona da legislação estadual.

Informa que está enquadrada no Programa de Incentivo às Indústrias Náuticas - Pró-Náutica, conforme arts. 20 e 21 da Lei 14.967/2009, fazendo uso do diferimento previsto no art. 177 do Anexo 2 do RICMS-SC, relativo à operação interna de matéria-prima, para uso em processo industrial no estabelecimento do adquirente.      Contudo, além da matéria-prima, são utilizados materiais intermediários/secundários e material de embalagem que, em regime normal de apuração, dariam direito a crédito do ICMS. 

Por outro lado, o art. 176 prevê crédito presumido, calculado sobre o valor da operação própria do estabelecimento industrial, nas operações de saída das embarcações que produzir. O parágrafo único desse artigo dispõe que o crédito presumido será utilizado em substituição ao crédito efetivo.

Ao final, requer confirmação do seu entendimento:

a) sobre o alcance da expressão "para uso em processo industrial";

b) se o diferimento nas aquisições internas abrange todas as operações que dariam direito a crédito pelas entradas.

A repartição de origem, em suas informações, declara que a consulta atende aos requisitos para sua admissibilidade.

 

Legislação

Lei 14.967/09 arts. 20 e 21;

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, arts. 175 a 178.

 

Fundamentação

Preliminarmente, impõe-se observar que as autoridades administrativas são incompetentes para declarar a inconstitucionalidade de lei, decreto ou ato normativo de Secretário de Estado. A vedação é expressa para os membros do Tribunal Administrativo Tributário (TAT), nos termos do art. 4º da Lei Complementar 465, de 3 de dezembro de 2009; a fortiori sofrem a mesma limitação, os membros desta Comissão.

Devemos ainda ter em mente que os decretos e regulamentos não podem dispor diferentemente das leis, ampliando ou restringindo o seu sentido; sua competência normativa limita-se às regras necessárias para a fiel execução das leis, conforme dispõe o art. 71, III, da Constituição do Estado.

A Lei 14.967/2009, que resulta da conversão da Medida Provisória 160/2009, dispõe sobre a adoção de medidas para facilitar a liquidação dos créditos tributários inscritos em dívida ativa e a maior eficácia na sua cobrança. Sucede que seu art. 20 trata de matéria diversa, qual seja, a concessão de crédito presumido, nos percentuais que especifica, mediante tratamento tributário diferenciado autorizado pela Secretaria de Estado da Fazenda, e nos termos e condições previstas em regulamento, ao fabricante de embarcações classificadas nas posições 8903 e 8906 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM. O § 1º do mesmo dispositivo esclarece que o benefício não alcança o imposto devido na condição de substituto, aplicando-se apenas à saída de embarcações produzidas pelo próprio estabelecimento e que não poderá ser utilizado cumulativamente com qualquer outro benefício ou incentivo previsto na legislação estadual. Conforme dispõe o § 2º, o regulamento poderá autorizar a manutenção total ou parcial dos créditos relativos à entrada de bens, mercadoria e serviços.

Por outro lado, segundo o disposto no art. 21, poderá ser dispensado, na forma e condições previstas em regulamento o recolhimento do ICMS diferido, relativo à aquisição pela indústria náutica das mercadorias que relacionar.

Assim, o Programa de incentivo à Indústria Náutica - Pró-Náutica foi instituído pela Seção XXXVII do Capítulo V do Anexo 2 do RICMS-SC (arts. 175 a 178), com supedâneo nos dispositivos a cima referidos da Lei 14.967/2009, com vistas a fomentar o desenvolvimento da indústria náutica no Estado, dependendo o respectivo  enquadramento, de concessão de regime especial pelo Secretário de Estado da Fazenda.

Assim, o art. 176 trata da concessão de crédito presumido, que será utilizado em substituição aos créditos efetivos do imposto, nos percentuais que especifica, calculado sobre o valor do imposto devido na operação própria do estabelecimento beneficiado.

Já o art. 177 dispõe que poderá ser concedido diferimento do pagamento do imposto devido (i) por ocasião do desembaraço aduaneiro dos bens e mercadorias que especifica, (ii) pela realização de operação interna de mercadorias ou de matérias-primas com destino à indústria náutica e (iii) o relativo ao diferencial de alíquota, na aquisição interestadual de máquinas, equipamentos, peças, partes e acessórios destinados ao ativo permanente da indústria náutica.

O § 1º desse artigo permite a dispensa, total ou parcial, do recolhimento do imposto diferido, nas condições que especifica.

O diferimento consiste na postergação, de uma fase para outra do ciclo de comercialização, do pagamento do imposto devido, podendo caracterizar substituição tributária se a responsabilidade pelo recolhimento recair sobre pessoa distinta do contribuinte (definido como aquele que tem relação pessoal e direta com a situação eleita pelo legislador como fato gerador da respectiva obrigação). Por conseguinte, a dispensa do recolhimento do imposto diferido é totalmente estranha ao instituto. Quando a lei fala em subsunção do imposto diferido na operação tributada subsequente, está supondo que o imposto relativo a essa última é em montante superior ao que foi diferido. Se for inferior, subsiste a responsabilidade de recolher a diferença.

A dispensa do recolhimento do imposto diferido corresponde a uma isenção travestida de diferimento e sem observar os aspectos formais exigidos. Ora, o art. 111 do Código Tributário Nacional obriga à interpretação literal (i. e. sem ampliações) da legislação que disponha sobre isenção. 

 

Resposta

Posto isto, responda-se à consulente:

a) o art. 177, II, b, do Anexo 2 do RICMS-SC, concede diferimento na realização de operação interna que destine matéria-prima para uso em processo industrial no estabelecimento do adquirente;

b) entende-se por matéria-prima a substância, natural ou resultante de transformação industrial,  com a qual são fabricados novos bens: no caso da indústria naval, aquilo que se agrega fisicamente à embarcação como madeira, aço, ferro, outros metais e ligas, tintas, vernizes, máquinas, aparelhos e equipamentos - corresponde ao conceito aristotélico de causa material;

c) o diferimento nas aquisições internas (dentro do Estado) não abrange todas as operações que dariam direito a crédito pela entrada, mas apenas o que pode ser classificado como matéria-prima - estariam excluídos os materiais secundários, de uso intermediário e de acondicionamento.

À superior consideração da Comissão.



VELOCINO PACHECO FILHO 
AFRE IV - Matrícula: 1842447

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 25/09/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome

Cargo

FRANCISCO DE ASSIS MARTINS

Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA

Secretário(a) Executivo(a)