CONSULTA 83/2014

EMENTA: ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO. MATERIAL RECICLÁVEL. RETALHOS ORIUNDOS DA PRODUÇÃO PRÓPRIA DE PEÇAS DE ALUMÍNIO E SUCATAS ADQUIRIDAS DE OUTRAS INDÚSTRIAS SÃO SOBRAS DO PROCESSO INDUSTRIAL E NÃO SÃO CONSIDERADOS MATERIAIS RECICLÁVEIS, O QUE NÃO PERMITE A UTILIZAÇÃO DO BENEFÍCIO FISCAL PREVISTO NO ANEXO 2, ART. 21, INCISO XII, DO RICMS/SC.

Disponibilizado na página da SEF em 01.08.14

 

Da Consulta

A consulente é fabricante de esquadrias de metal e produz, dentre outros produtos, barras cilíndricas de alumínio, de 4, 5, 6 e 7 polegadas (NBM/SH/NCM 7601.20.00) denominadas tarugos de alumínio. Nesse processo produtivo utiliza lingotes de alumínio, retalhos da extrusão (sobras de seu processo produtivo), sucatas fornecidas por terceiros e metais de liga ou anteligas.

 Pondera que, além de suprir suas necessidades de tarugos de 6 polegadas, que são utilizados no processo de extrusão, e dar destino adequado aos resíduos sólidos (retalhos e sucatas) oriundos da fabricação de esquadrias de alumínio e da extrusão, apresenta-se como empresa recicladora, ao absorver os retalhos e sucatas de outras indústrias da região.

 Esclarece que o processo empregado no fabrico desses tarugos é a refusão do alumínio, que compreende as seguintes etapas: a) recepção da matéria-prima (lingotes de alumínio, retalhos, sucatas e anteligas ou metais de liga); b) seleção, preparação e pesagem das matérias-primas; c) fusão em forno, por aquecimento à temperatura entre 700 ºC a 1000 ºC, quando as matérias-primas tomam a forma líquida e preenchem a cavidade de um molde; d) resfriamento; e) inspeção final e embalagem.

 Informa que na produção de tarugos de alumínio o percentual de retalhos (sobras do processo produtivo) e sucatas adquiridas de terceiros representa, em média, 80% do custo total das matérias-primas.

 Diante do benefício fiscal do crédito presumido, previsto no art. 21, inciso XII, do Anexo 2 do RICMS/SC, indaga:

 1) Os materiais utilizados no processo produtivo descrito acima (retalhos e sucatas de alumínio adquiridas de terceiros) enquadram-se como material reciclável, permitindo pleitear o benefício fiscal previsto no citado dispositivo do RICMS/SC?

 2) Pode emitir nota fiscal de entrada diária ou por carga, endereçada a ela mesma, para cobertura fiscal e evidenciar o custo dos retalhos no seu processo produtivo?

 A consulente declara não estar submetida a nenhuma fiscalização por parte da Fazenda estadual, e que a matéria objeto da consulta não motivou a lavratura de notificação fiscal.

 Na sua informação, o Auditor Fiscal observa apenas que a consulta atende às condições de admissibilidade previstas na legislação pertinente, sem se manifestar quanto ao mérito. 

 

Legislação

Lei nº 14.967, de 7 de dezembro de 2009, art. 19;

RICMS/SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2.001: Anexo 2, art. 21, inciso XII; Anexo 5, art. 39.

 

Fundamentação

A previsão legal para o dispositivo sobre o qual a consulente tem dúvida encontra-se no art. 19 da Lei nº 14.967/2009, que instituiu o benefício do crédito presumido para o fabricante que utilizar material reciclável como matéria-prima na fabricação de seus produtos:

Art. 19. Ao fabricante de produtos industrializados em que o material reciclável corresponda a, no mínimo, 75% (setenta e cinco por cento) do custo da matéria-prima utilizada, poderá ser concedido, mediante tratamento tributário diferenciado autorizado pela Secretaria de Estado da Fazenda, e nos termos e condições previstas em regulamento, crédito presumido de até:

I - 75 % (setenta e cinco por cento) do valor do ICMS devido na operação sujeita à alíquota de 17 % (dezessete por cento);

II - 64,583 % (sessenta e quatro inteiros e quinhentos e oitenta e três milésimos por cento) do valor do ICMS devido na operação sujeita à alíquota de 12 % (doze por cento); e

III - 39,285 % (trinta e nove inteiros e duzentos e oitenta e cinco milésimos por cento) do valor do ICMS devido na operação sujeita à alíquota de 7% (sete por cento).

 O referido benefício fiscal está regulamentado no Anexo 2, art. 21, inciso XII, do RICMS/SC, que assim dispõe:

 Art. 21. Fica facultado o aproveitamento de crédito presumido em substituição aos créditos efetivos do imposto, observado o disposto no art. 23:

(...)

XII  nas saídas de produtos industrializados em cuja fabricação haja sido utilizado material reciclável correspondente a, no mínimo, 75% (setenta e cinco por cento) do custo da matéria-prima, realizadas pelo estabelecimento industrial que os tenha produzido, calculado sobre o imposto relativo à operação própria, nos seguintes percentuais (Lei 14.967/09, art. 19):

 a) 75% (setenta e cinco por cento), nas operações sujeitas à alíquota de 17% (dezessete por cento);

 b) 64,583% (sessenta e quatro inteiros e quinhentos e oitenta e três milésimos por cento), nas operações sujeitas á alíquota de 12% (doze por cento); e

 c) 39,285% (trinta e nove inteiros, duzentos e oitenta e cinco milésimos por cento), nas operações sujeitas á alíquota de 7% (sete por cento).

 O assunto sobre o qual a consulente tem dúvida não é novo perante a COPAT, e já foi tratado por diversas vezes, podendo ser citadas as Consultas nº 31/2011, 49/2012 e 48/2013. Dentre essas, merece destaque para este caso, a resolução de consulta nº 49/2012, cuja ementa é transcrita a seguir:

CONSULTA Nº 049/2012:

EMENTA:  ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO PREVISTO NO ART. 21, XII DO ANEXO 2  DO RICMS/SC. (LEI Nº 14.967/09, ART. 19). 

1. O benefício fiscal de crédito presumido, previsto no artigo 21, Inciso XII do Anexo 2 do RICMS/SC, destina-se ao estabelecimento industrial que utilizar no mínimo 75% (setenta e cinco por cento) do custo da matéria-prima composta de material reciclável.

2. O estabelecimento industrial que utilizar como insumo material reciclado não tem direito ao benefício fiscal.

Disponibilizado na página da SEF em 03.10.12.

 

Extrai-se da fundamentação para a resposta a essa consulta o seguinte trecho:

"Da simples leitura do dispositivo, conclui-se, inicialmente, que a autorização para a utilização do benefício do crédito presumido do ICMS está vinculada à utilização de materiais recicláveis, como matérias-primas, em percentual mínimo de 75% do custo da matéria-prima utilizada.

(...)

Um segundo ponto é a questão da definição do que seja material reciclável. Além de reciclável, o material deve, para fazer jus ao benefício do crédito presumido, ser reciclado e utilizado no processo industrial pela própria empresa beneficiária. A matéria-prima não poderá, portanto, ter sido reciclada por terceiros. Neste contexto, para determinar se a matéria-prima utilizada é de material reciclável dependerá do próprio processo industrial da empresa beneficiada. Há que se verificar qual a matéria-prima utilizada no processo industrial e verificar se a própria empresa realiza etapa de reciclagem desta matéria-prima."

A questão central enfocada pela consulente consiste em saber se as sobras de seu próprio processo industrial e sucatas adquiridas de outras indústrias podem ser classificadas como materiais recicláveis, de forma a permitir a opção pelo crédito presumido, previsto no art. 21, XII, do Anexo 2 do RICMS/SC.

Para compreender o que é material reciclável, é preciso esclarecer o que significam os termos reciclar e reciclagem.

Reciclar, segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira[1], origina-se [de re + ciclo + ar].V.t.d. 1. Fazer a reciclagem de. Esse verbo vem do inglês recycle (re = repetir, e cycle = ciclo). Nesse mesmo dicionário encontra-se para o verbete reciclagem: [de re + ciclo + agemS.f. 1. Alteração da ciclagem. ... 4. Tratamento de resíduos ou de material usado, de forma a possibilitar sua reutilização.

 Reciclagem é, assim, o processo que visa transformar em produtos novos, materiais já utilizados e inservíveis para o uso a que se destinavam, mediante processo industrial que os reutiliza como matéria-prima. Dessa forma, materiais que antes eram descartados, ou integrantes do lixo, podem ser reaproveitados. É processo industrial que tem larga utilização nos dias atuais, ante sua importância na preservação dos recursos naturais e do meio ambiente.

É possível reciclar diversos materiais, como o vidro, o plástico, o papel ou o alumínio. A reciclagem do alumínio resume-se no derretimento do metal, o que é menos dispendioso e consome muito menos energia do que produzir alumínio através da mineração de bauxita. É um processo que propicia uma utilização mais racional de recursos naturais não renováveis e uma redução da poluição ambiental.

Para a indústria a reciclagem tem a vantagem de diminuir os custos de produção, especialmente o consumo de energia. Por sua vez, a população também se beneficia da reciclagem, pois esta constitui a fonte de renda de muitos trabalhadores, que obtêm no lixo urbano materiais que podem ser vendidos para empresas recicladoras.

Conectada à questão ambiental, a Lei Federal nº 12.305, de 02.08.2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos define em seu art. 3º, inciso XIV, o processo de reciclagem: "processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em insumos ou novos produtos, (...)".

Essa mesma lei também define o que são resíduos sólidos (art. 3º, XVI): "material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, (...)".

Destaque-se que a Lei Federal nº 12.375, de 30.12.2010, estabeleceu também o benefício fiscal do crédito presumido, no âmbito do IPI Imposto sobre Produtos Industrializados. Porém, expressamente restringiu esse benefício à aquisição de resíduos sólidos descartados, resultantes de atividades humanas em sociedade:

Art. 5º Os estabelecimentos industriais farão jus, até 31 de dezembro de 2014, a crédito presumido do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI na aquisição de resíduos sólidos utilizados como matérias-primas ou produtos intermediários na fabricação de seus produtos.

§ 1º Para efeitos desta Lei, resíduos sólidos são os materiais, substâncias, objetos ou bens descartados resultantes de atividades humanas em sociedade.

A restrição estabelecida pelo legislador federal visa contemplar apenas os estabelecimentos industriais que utilizarem, como matérias-primas ou produtos intermediários, os resíduos sólidos oriundos de atividades humanas em sociedade (materiais recicláveis). Como atividades humanas em sociedade figuram as cooperativas ou empresas destinadas à coleta, limpeza, classificação e venda de materiais recicláveis.

O dispositivo regulamentar previsto no art. 21, inciso XII, do Anexo 2 do RICMS/SC também deve ser interpretado nesse sentido, conectado à questão sócio-ambiental. Ou seja, a concessão do crédito presumido só se admite a estabelecimentos industriais que utilizem como matéria-prima materialreciclável na fabricação de seus produtos, na proporção mínima de 75% do custo de aquisição da matéria-prima.

Material reciclável, no contexto da produção industrial de peças de alumínio apontada pela consulente, vem a ser o produto feito de alumínio que, tendo cumprido seu ciclo de utilização, e se tornado inservível, é reintroduzido no ciclo produtivo como matéria-prima e transformado em novo produto, mediante a sua fusão e colocação em um molde.

As vantagens da utilização de material reciclável como matéria-prima na industrialização de produtos são, como visto acima, de ordem econômico-financeira, social, política e, especialmente, ambiental. A reciclagem do alumínio cria uma cultura de combate ao desperdício, difunde e estimula o hábito do reaproveitamento de materiais, com reflexos positivos na formação da cidadania e no interesse pela melhoria da qualidade de vida da população, propiciando melhor proteção ao meio ambiente.

 Feitas essas considerações, e vistos os conceitos de reciclagem e material reciclável, compreende-se, nitidamente, que a intenção do legislador catarinense ao instituir o benefício fiscal sob comento é a de incentivar a indústria que utilizar material reciclável como matéria-prima na fabricação de seus produtos.



[1] Novo Dicionário Aurélio da Língua portuguesa. 3.ed. Curitiba: Positivo, 2004, p. 1709.

 

Resposta

Quanto à primeira questão colocada pela consulente, responda-se que os retalhos oriundos daprodução própria de peças de alumínio e as sucatas adquiridas de outras indústrias são sobras do processo industrial e não são considerados materiais recicláveis, pois sequer chegaram a constituir qualquer produto. Com efeito, produto é o bem material ou insumo que tenha passado por todas as etapas de um processo de industrialização, até sua colocação no mercado para uso ou consumo.

 Esses retalhos ou sobras de produção são classificáveis como sucatas de processamento ou subprodutos, materiais que nunca constituíram um produto, o que não permite pleitear o benefício do crédito presumido, previsto no RICMS/SC, Anexo 2, art. 21, XII.

 Relativamente ao segundo questionamento proposto pela consulente, se pode emitir nota fiscal de entrada diária ou por carga, endereçada a ela mesma, para cobertura fiscal e evidenciar o custo dos retalhos no seu processo produtivo, observe-se o que dispõe o art. 39 do Anexo 5 do RICMS/SC:

Art. 39. A Nota Fiscal será emitida sempre que no estabelecimento entrarem bens ou mercadorias, real ou simbolicamente:

I - novas ou usadas, remetidas a qualquer título por particulares, produtores primários ou pessoas físicas ou jurídicas não obrigadas à emissão de documentos fiscais;

 Ora, os retalhos de produção foram originados a partir de produto que já havia ingressado no estabelecimento. Assim, não há que se falar em qualquer operação correspondente que exija nota fiscal. Dessa forma, resulta claro que a resposta é negativa para esse questionamento.

 Este é o parecer que submeto à elevada apreciação desta Comissão.



FERNANDO CAMPOS LOBO 
AFRE IV - Matrícula: 1847252

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 26/06/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome                                                                                                           Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM                                                                           Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA                                                                            Secretário(a) Executivo(a)