CONSULTA 57/2014

EMENTA: ICMS. ENQUANTO NÃO ENTRAR PLENAMENTE EM VIGOR O REGIME DE CRÉDITOS FINANCEIROS, CONSTITUI CONDIÇÃO NECESSÁRIA PARA O DIREITO À APROPRIAÇÃO DE CRÉDITOS DO IMPOSTO, QUE O RESPECTIVO MATERIAL SE INTEGRE FISICAMENTE AO PRODUTO OU SE CONSUMA IMEDIATA E INTEGRALMENTE NO PROCESSO FABRIL.

a) Assim, a etiqueta que integra o produto final, de modo definitivo, para indicar marca, numeração e outras informações, autoriza o contribuinte adquirente a apropriar-se do crédito do ICMS correspondente à sua aquisição.

b) Contudo, o mero desgaste do material empregado, a exemplo de agulha, lixa, grampo, escova ou a utilização de etiqueta descartável que não integra o produto final, não dão direito ao crédito do ICMS.

Disponibilizado na página da PSEF em 22.04.14

 

Da Consulta

A Consulente, devidamente qualificada, exerce a atividade de indústria de calçados. No seu processo industrial faz uso, dentre outros, dos seguintes materiais:

a) Agulha utilizada para costurar o material sintético ou couro do calçado;

b) Lixa usada no processo de desgaste do material para uma melhor colagem da sola no couro;

c) Grampo que serve para anexar a palmilha a forma, para auxiliar no processo produtivo e que é retirado no final da produção.

d) Escova usada para passar no produto final, visando dar brilho, ou marcar o produto.

e) Etiquetas de dois tipos: a primeira vai anexada no produto final, demonstrando marca, numeração e outras informações do produto ou da embalagem e, a segunda, serve para auxiliar no processo produtivo, mas retirado no final.

Questiona se lhe é permitido apropriar o crédito relativo às entradas dos referidos materiais.

Informa ainda que a matéria objeto do pedido não está sujeita aos impedimentos do artigo 152-C do Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário - RNGDT/SC.

A consulta foi informada na GERFE de origem, conforme determina o artigo 152-B, § 2°, II, do RNGDT/SC, aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984, manifestando-se favoravelmente ao recebimento e análise do pedido em face do atendimento dos critérios de admissibilidade.

 

Legislação

 

Constituição Federal, art. 155, § 2°, I e XII, c;

Lei Complementar 87, de 13 de setembro de 1996, artigos 19, 20 e 33, I;

Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1996, artigos 21, 22 e 103, IV;

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, artigos 28, 29 e 82, I.

 

Fundamentação

Preliminarmente cabe destacar que das informações prestadas no pedido, aduz-se que os materiais (agulha, lixa, grampo, escova e etiqueta descartável, não compõem o produto final. De outro modo, as etiquetas demonstrando marca, valor, numeração e outras informações do produto que são anexadas ao produto final, integram-no de modo definitivo. 

O deslinde da matéria diz respeito, portanto, à possibilidade de creditamento do ICMS relativo à aquisição de produtos que, aplicados no processo produtivo, não integram fisicamente o produto final, ressalvado o último produto informado (etiqueta constando dados do produto)

Considerando tratar-se de matéria exaustivamente debatida nesta Comissão, opta-se por apensar excerto da COPAT nº 146/2011, pela clareza dos fundamentos indicados.

 

"Dispõe o art. 155, § 2°, I, da Constituição Federal, que o ICMS é imposto não cumulativo, 'compensando-se o que for devido em cada operação [..] com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal'. A não-cumulatividade do ICMS é operacionalizada através do mecanismo da compensação: incide sobre o valor total de cada operação, dele se abatendo o crédito correspondente ao montante cobrado nas operações anteriores pelo mesmo ou outro Estado.

Portanto, a não-cumulatividade do ICMS ocorre através do mecanismo da compensação entre débitos e créditos do imposto. A referência ao ¿crédito¿ do ICMS, é referência ao imposto que onerou a entrada da mercadoria no estabelecimento ou o insumo que será integrado à mercadoria produzida. É 'crédito' somente no sentido de que irá compensar, no todo ou em parte, o imposto devido em cada operação e, neste sentido se destina exclusivamente a compensar o imposto devido.

Até a edição da Lei Complementar 87/96, vigorava o regime de créditos físicos. Crédito físico porque corresponde ao imposto incidente nas operações anteriores (art. 155, § 2°) sobre as mercadorias empregadas fisicamente na industrialização, comercialização ou prestação de serviços, bem como nas operações de que tenha resultado o recebimento de serviços sujeitos ao ICMS.  

Somente com a Lei Complementar 87/96, com a autorização para a utilização do crédito correspondente às mercadorias adquiridas para uso ou consumo do estabelecimento ou para o seu ativo fixo, se percebe a adoção parcial do regime de créditos financeiros, recusando-se, ainda, uma adoção integral do sistema de crédito financeiro, no qual se aproveitam outras despesas necessárias à produção de mercadorias, tais como salários, ou entradas de mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento, como se presume sejam os veículos de transporte pessoal.

A matéria está sedimentada no STJ, a exemplo do Acórdão a seguir colacionado, proferido no REsp 1038918/SP:

 

TRIBUTÁRIO. ICMS. BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO. BENS DE USO E CONSUMO. CREDITAMENTO. CONVÊNIO ICMS Nº 66/88. LEI COMPLEMENTAR Nº 87/96 (LEI KANDIR).

1. Resume-se a controvérsia em saber se o contribuinte do ICMS pode ou não creditar-se do imposto incidente na aquisição de bens destinados ao ativo fixo e a uso e consumo do estabelecimento em período anterior à Lei Complementar nº 87/96.

2. Até a entrada em vigor da LC nº 87/96, as regras relativas à compensação de créditos referentes ao ICMS estavam dispostas no Convênio ICMS nº 66/88, que expressamente vedava o creditamento relativo a bens destinados ao ativo fixo e a uso e consumo do estabelecimento comercial.

(...)

Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 143) faz a seguinte distinção entre créditos físicos e financeiros: 'Pelo regime de crédito financeiro é assegurado o crédito do imposto pago em todas as operações de circulação de bens, e em todas as prestações de serviços, que constituam custo do estabelecimento. Não importa se o bem ou serviço compõe o bem a ser vendido. Importa é que o bem vendido teve como custo aquele bem, ou aquele serviço, já tributado anteriormente'.

Entretanto, o novo regime não foi adotado imediatamente na sua integralidade. No caso dos bens de uso e consumo terá de ser observado o disposto em seu art. 33, I, somente sendo implementado o direito ao creditamento do ICMS sobre estas entradas a partir de janeiro de 2020 (LC 138/10).

A matéria já foi analisada por esta Comissão em várias ocasiões, entre outras, nas respostas à Consulta n° 61/2009 e 64/2009: 

CONSULTA Nº  061/2009.

EMENTA: ICMS. ENQUANTO NÃO ENTRAR PLENAMENTE EM VIGOR O REGIME DE CRÉDITOS FINANCEIROS, CONSTITUI CONDIÇÃO NECESSÁRIA PARA O DIREITO À APROPRIAÇÃO DE CRÉDITOS DO IMPOSTO QUE O MATERIAL RESPECTIVO SE INTEGRE FISICAMENTE AO PRODUTO OU SE CONSUMA INTEGRALMENTE NO PROCESSO FABRIL. O MERO DESGASTE DO MATERIAL EMPREGADO ¿ NO CASO, A UTILIZAÇÃO DE SEGMENTOS DIAMANTADOS NA INDUSTRIALIZAÇÃO DA ARDÓSIA ¿ NÃO DÁ DIREITO A CRÉDITO DO ICMS.

CONSULTA Nº  064/2009.

EMENTA: ICMS. A TEOR DO QUE DISPÕE A LEI COMPLEMENTAR Nº 87/96, ART. 33, E NA ESTEIRA JURISPRUDENCIAL,  SOMENTE   DARÃO DIREITO AO CRÉDITO DO IMPOSTO RELATIVO AOS PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS QUE NÃO SE  CONSOMEM INTEGRAL E IMEDIATAMENTE NO PROCESSO INDUSTRIAL AQUELES CUJAS ENTRADAS NO ESTABELECIMENTO INDUSTRIAL OCORREREM APÓS 1º DE JANEIRO DE 2011.

A jurisprudência também já se consolidou no sentido de somente admitir o crédito dos materiais que se integrem fisicamente ao produto ou sejam integralmente consumidos no processo industrial. O mero desgaste de materiais, como é o objeto da presente consulta, não dá direito a crédito do imposto. Assim decidiu a Egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 799.724/RJ (Relator Ministro Luiz Fux, Julgamento em 13 de março de 2007):

 (...)

4. O § 1º, do artigo 20, da Lei Complementar nº 87/96, restringiu expressamente as hipóteses de  creditamento  do  ICMS  à  entrada de mercadorias  que  façam  parte  da atividade  do estabelecimento. 

Dessas limitações  legais decorre, por imperativo lógico, que a utilização de supostos créditos  não  é ilimitada, tampouco  é do  exclusivo alvedrio  do  contribuinte.

5. In casu, consoante assentado no aresto recorrido, os bens cuja aquisição, segundo a recorrente, ensejariam o direito ao aproveitamento dos créditos de ICMS, não obstante o natural desgaste advindo do seu uso, não consubstanciam matéria-prima ou insumo a ser utilizado no processo de industrialização. Ao revés, integram o ativo fixo da empresa e fazem parte das várias etapas do processo de industrialização, sendo que sua substituição periódica decorre da própria atividade industrial, matéria insindicável pela Súmula 7/STJ.

Ou seja, haverá o direito de creditamento do ICMS pago anteriormente somente quando se tratar de insumos que se incorporam ao produto final ou que são consumidos integralmente no curso do processo de industrialização. A consulente expressamente declara em seu requerimento que a consulta se refere a materiais que 'se desgastam conforme a utilização', e que 'o mesmo não compõe o produto final, mas são necessários para o processo de industrialização'. Em relação aos mesmos, portanto, não cabe o creditamento do ICMS.¿

 

Conquanto os argumentos apontados evidenciem a impossibilidade de apropriação do crédito decorrente da aquisição de materiais que não integram o produto acabado, traz-se ainda o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a temática, destacando-se duas decisões em particular: 

 

¿EMENTA: CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. ICMS. PRINCIPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. I. - Pretensão da agravante de creditar do ICMS sobre a aquisição produtos intermediários. Não há saída do bem. Impossibilidade. Precedentes. II. - Em relação à alínea c do art. 102, III, da Constituição Federal, também não merece acolhida o prosseguimento do recurso extraordinário. É que o acórdão impugnado não apreciou lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição Federal. III. - Agravo não provido.¿ (Ag. Reg./SP nº 418.729-7. Relator: Min. Carlos Velloso, Segunda Turma. Julgamento: 01/02/2005)

 

¿EMENTA: TRIBUTÁRIO. ICMS. CREDITAMENTO. NÃO OCORRÊNCIA. OPERAÇÕES DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. UTILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO. AQUISIÇÃO DE BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO E DE MATERIAIS DE USO E CONSUMO. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. AQUISIÇÕES DE PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS. CONSUMIDOR FINAL. DIREITO AO CRÉDITO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I - A decisão agravada está de acordo com entendimento adotado por ambas as Turmas desta Corte, que consolidaram a jurisprudência no sentido de que não ofende o princípio da não cumulatividade a inexistência de direito a crédito de ICMS pago em razão de operações de consumo de energia elétrica, de utilização de serviços de comunicação ou de aquisição de bens destinados ao ativo fixo e de materiais de uso e consumo. Precedentes. II - A aquisição de produtos intermediários aplicados no processo produtivo que não integram fisicamente o produto final não gera direito ao crédito de ICMS, uma vez que a adquirente, nesse caso, mostra-se como consumidora final. Precedentes. III - Agravo regimental improvido.¿ (RE nº 503877, AgR/MG. Relator: Ricardo Lewandowski, Primeira Turma. Julgamento: 01/06/2010).

 

Trata-se, portanto, de matéria pacificada nas instâncias judiciais e, por consequência, também nesta Comissão de análise acerca da intepretação da legislação tributária no âmbito da administrativo.

 

Resposta

Isto posto, responda-se à Consulente que enquanto não entrar plenamente em vigor o regime de créditos financeiros, constitui condição necessária para o direito à apropriação de créditos do imposto, que o respectivo material se integre fisicamente ao produto ou se consuma imediata e integralmente no processo fabril. Assim, com base no exposto, conclui-se que é permitido à Consulente apropriar-se do crédito do imposto decorrente da entrada de etiqueta que é anexada ao produto final, de modo definitivo, visando demonstrar a marca, numeração e outras informações do produto ou da embalagem. Contudo, o mero desgaste do material empregado, a exemplo de agulha, lixa, grampo e escova ou a utilização de etiqueta descartável que não integra o produto final, não dão direito ao crédito do ICMS. 



JOACIR SEVEGNANI
AFRE IV - Matrícula: 1849336

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 27/03/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome

Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM

Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA

Secretário(a) Executivo(a)