CONSULTA Nº  049/2010

 DOE de 16.12.10

 

EMENTA:   ICMS / ISSQN – 1) A FABRICAÇÃO DE ESQUADRIAS METÁLICAS A PARTIR DE MATÉRIA PRIMA (CHAPAS, PERFILADOS, ETC) REMETIDA POR EMPRESA DA CONSTRUÇÃO CIVIL, EQUIPARA-SE À SITUAÇÃO EM QUE A PRÓPRIA CONSTRUTURA ESTEJA PRODUZINDO MERCADORIA FORA DO LOCAL DA PRESTAÇÃO, PARA APLICÁ-LAS NA OBRA CONTRATATA, SITUAÇÃO QUE, SEGUNDO A LC Nº 116/03, ITEM 7.02 DA LISTA DE SERVIÇOS, CONFIGURA O FORNECEIMENTO DE MERCADORIAS PRODUZIDAS PELO PRESTADOR DE SERVIÇO FORA DO LOCAL DA PRESTAÇÃO, FICANDO  A OPERAÇÃO SUJEITA À INCIDÊNCIA DO ICMS. 2) NESTE CASO, A CONFECÇÃO DE ESQUADRIAS METÁLICAS A PARTIR DE MATÉRIA PRIMA REMETIDA PELO  ENCOMENDANTE CARACTERIZA-SE INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA, CONSEQUENTEMENTE, A DEVOLUÇÃO DAS MERCADORIAS PARA A EMPRESA ENCOMENDANTE RESULTARÁ EM OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA, FATO QUE, TAMBÉM, SE SUBSUME NO CRITÉRIO MATERIAL DA REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ICMS.

A Consulente acima identificada informa que opera exclusivamente no atendimento de empresas da construção civil, fazendo o levantamento dos materiais (chapas, perfilados, etc) necessários à confecção das esquadrias metálicas  (portas, janelas, etc) pertinentes a determinada obra cuja construção é de responsabilidade da construtora encomendante.  Após, aprovação do encomendante, faz o pedido do material aos respectivos  fornecedores, os quais faturam para a construtora encomendante, remetendo as mercadorias diretamente para a consulente, através de operação “por conta e ordem de terceiro, industrialização por encomenda”. Após a confecção das esquadrias  a consulente devolve-as ao encomendante, cobrando o valor correspondente à mão-de-obra e outros materiais aplicados, de acordo com o disposto no RICMS/SC, Anexo 3, art. 8º.

Acrescenta que esta operação vem sendo, segundo entendimento de alguns municípios, à luz do que dispõe a Lei Complementar nº 116/03, Lista de Serviço, item 14.06  como fato gerador do ISSQN. Destaca ainda, o entendimento neste sentido do STJ no REp nº 888.852.

A consulente entende que não se trata de prestação de serviço, mas sim de industrialização por encomenda, sujeitando-se, portanto, a incidência do ICMS  e não do ISSQN,  mas para evitar a possível dupla tributação (ICMS e ISSQN)  solicita a essa Comissão a solução da dúvida apresentada, ou seja, se esta atividade (industrialização) caracteriza-se como prestação de serviço a ser tributada pelo ISSQN, ou, como industrialização por encomenda, e conseqüentemente, uma operação de circulação de mercadorias a ser tributada pelo ICMS.

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme preceitua a Portaria Sef nº 226/01.

É o relatório, passo a análise.

-  LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

Lei Complementar nº 116/03, Lista de Serviços item nº  7.02; 

RICMS/SC, aprovado pelo Dec. nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 6, art. 71.

-  FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

De acordo com o liame fático descrito pela consulente, há um aparente conflito entre os campos de incidência do ICMS e do ISS, ou seja, entre a Lei Complementar nº 87/96 que dispõe sobre as normas gerais relativas ao ICMS, e a Lei Complementar nº 116/01 que dispõe sobre as normas gerais relativas ao ISS.

Porém, antes há outro conflito a ser resolvido no caso em análise, este reside na necessidade de se definir qual atividade preponderante da consulente, isto é, a fabricação de esquadrias metálicas  sob encomenda como atividade industrial (IPI) ou de prestação do serviço (ISS) previsto no item 14.13 da Lei Complementar nº 116/03 (Carpintaria e serralheria), senão vejamos.

Por primeiro, registre-se que o conceito de serviços vem da economia, onde o trabalho é um dos fatores de produção. De fato, o trabalho, aplicado à produção, pode dar como resultado duas classes de bens: i) bens materiais ou mercadorias; e ii) bens imateriais, conhecidos, estrito senso, como serviços.

Focalizando especificamente o trabalho humano como um serviço lato sensu conclui-se que este é um fator indispensável na produção de quaisquer bens ou mercadorias, sendo, portanto, um fator de produção indispensável ao processo industrial. Ou seja, toda industrialização (transformação, beneficiamento, acondicionamento, etc) se efetiva, indubitavelmente, pela ação do trabalho humano (serviço lato sensu) que, agregando valor à matéria-prima básica, transforma-a num produto final acabado (bens materiais ou mercadorias) pronto para o uso ou consumo.

O Superior Tribunal de Justiça analisando conflito entre o IPI (industrialização) e o ISS (prestação de serviço) apresentado no REsp nº 395633/RS, cujo relatório é da lavra da Eminente Ministra Eliana Calmon, decidiu pela preponderância do IPI, nas hipóteses em que o trabalho humano é aplicado sobre matéria-prima para a produção de um bem ou mercadorias, conforme se apura na ementa abaixo:

TRIBUTÁRIO - IPI - PRODUTO INDUSTRIALIZADO - MÓVEIS SOB ENCOMENDA, AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DO ISS.

1. Constitucionalmente, é o IPI imposto prioritário para incidir em todas as matérias-primas que, trabalhadas, têm sua destinação alterada.

2. A fabricação de móveis de madeira não se confunde com as artes gráficas de impressos personalizados, em que prepondera sobre o material a prestação de serviço.

3. A incidência do IPI é tão rigorosa, que até mesmo as madeiras polidas e serradas são geradoras de IPI, segundo a jurisprudência do STF.

4. Recurso improvido.

Extrai-se ainda, do sapiente voto da relatora, o seguinte: “Assim limita-se a controvérsia em saber o que é preponderante na atividade da empresa: o caráter pessoal no fornecimento dos móveis (prestação de serviço) ou a transformação que modifica a natureza e finalidade do produto (industrialização).”

(...)

“A incidência do IPI é tão prioritária que a jurisprudência do STF já está assentada no entendimento de que a exação é devida na madeira serrada, no peixe vivo acondicionado, nos camarões cozidos e congelados, na carne congelada, em prova inconteste quanto ao rigor do conceito de mercadoria industrializada.”

Isto posto, infere-se que todo serviço empregado na transformação, no beneficiamento ou no acondicionamento de produto será absorvido pela atividade industrial aplicada em sua elaboração.

De outro norte, considerando-se que a produção industrial, em regra, destina-se ao comércio, aduz as razões da análise o ensinamento de Aires Fernandino Barreto  sobre a distinção entre os campos de incidência do ICMS e do ISS:

“...[é] critério de demarcação dos campos de incidência do ICMS e do ISS os conceitos de atividade-meio e de atividade-fim. No caso do ICMS, a utilidade disponibilizada ao consumidor é um bem material (mercadoria) que não pode ser separado, para fins de tributação, das atividades-meio incorridas. O fornecimento da mercadoria ao fornecedor final envolve uma série de serviços que beneficiam a esse mesmo consumidor, mas que não se constituem em fatos geradores distintos. Pelo contrário, subsumem-se na atividade preponderante da empresa, o fornecimento da mercadoria.

Alvo de tributação é o esforço humano prestado a terceiros como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas intermediárias, necessárias a obtenção do fim. Não a ação desenvolvida como requisito ou condição do facere (fato jurídico posto no núcleo da hipótese de incidência do tributo).

As etapas, passos, processos, tarefas, obras, são feitas, promovidas, realizadas “para” o próprio prestador e não “para terceiros”, ainda que estes os aproveitem (já que, aproveitando-se do resultado final, beneficiam-se das condições que o tornam possível).

(...)

Em conclusão, somente podem ser tomadas, para sujeição ao ISS (e ao ICMS) as atividades entendidas como fim, correspondentes à prestação de um serviço integralmente considerado. No caso específico do ISS, podem decompor um serviço – porque previsto, em sua integridade no respectivo item específico da lista da lei municipal – nas várias ações meio que o integram, para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço autônomo, independente. Isso seria uma aberração jurídica, além de constituir-se em desconsideração à hipótese de incidência desse imposto.” (ISS – Atividade-Meio e Serviço-Fim. Revista Dialética de Direito Tributário n° 5, São Paulo: Oliveira Rocha, fevereiro/ 1996, pp. 72 a 97):

Nesta esteira de raciocínio, chega-se, por óbvio, à inferência de que todos os serviços empregados nos processos industriais envolvidos na cadeia de produção de qualquer produto (mercadoria) estarão subsumidos nos tributos incidentes sobre a produção e a circulação desta mercadoria (IPI e ICMS).

Observa-se o caso descrito pela consulente, ou seja, a fabricação de esquadrias metálicas sob encomenda de uma empresa da construção civil equipara-se a situação em que mercadorias aplicadas na obra objeto do contrato de prestação de serviço sejam produzidas pelo próprio prestador (construtora) fora do local da prestação do serviço.

Assim sendo, cabe destacar que quando o próprio prestador de serviço de execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, venha a fornecer mercadorias, que ele próprio tenha produzido fora do local da obra, para  serem aplicadas na obra objeto do contrato, trata-se de operação de circulação de mercadoria,  não se confundindo com o objeto da prestação do serviço de construção civil.

Aliás, essa hipótese está claramente regulada na Lei Complementar nº 116/03, conforme se depreende da parte in fine do item 7.02 da lista de serviços a serem tributados pelo ISSQN:

7.02 – Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). (Grifei)

À evidência que objeto contratual, na situação fática descrita pela consulente, é a industrialização por encomenda, e não a prestação de serviço de construção civil ou de serralheria (item 14.13 da Lista de Serviços).

Em assim sendo, a legislação tributária catarinense trata a matéria de forma clara no RICMS/SC, Anexo 6, art. 71, in verbis:

CAPÍTULO VIII

DA REMESSA PARA INDUSTRIALIZAÇÃO

Art. 71. Nas operações em que um estabelecimento encomende a industrialização de mercadorias, fornecendo matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem adquiridos de terceiro, os quais, sem transitar pelo estabelecimento adquirente, sejam entregues pelo fornecedor diretamente ao industrializador, observar-se-á o seguinte:

I - o estabelecimento fornecedor deverá:

a) emitir Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, com destaque do imposto, se devido, em nome do estabelecimento adquirente, autor da encomenda, consignando, além dos demais requisitos exigidos, o nome, o endereço e os números de inscrição no CCICMS e no CNPJ do estabelecimento em que os produtos serão entregues, bem como a circunstância de que se destinam à industrialização;

b) emitir Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, para acompanhar o transporte das mercadorias, sem destaque do imposto, em nome do estabelecimento industrializador, consignando, além dos demais requisitos exigidos, o número, a série e a data da Nota Fiscal referida na alínea “a” e o nome, o endereço e os números de inscrição no CCICMS e no CNPJ do adquirente;

II - o estabelecimento industrializador, na saída do produto industrializado com destino ao adquirente, autor da encomenda, deverá emitir Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A consignando, além dos demais requisitos exigidos, as seguintes indicações:

a) o nome, o endereço e os números de inscrição no CCICMS e no CNPJ do fornecedor;

b) o número, a série e a data da Nota Fiscal emitida pelo fornecedor;

c) o valor da mercadoria recebida para industrialização e o valor das mercadorias empregadas;

d) o destaque do ICMS, se devido, calculado sobre o valor total cobrado do autor da encomenda.

Isto posto, responda-se à consulente que a fabricação de estruturas metálicas a partir de matéria prima remetida pelo encomendante classifica-se como processo industrial, logo, a operação relativa a essa atividade trata-se de operação de circulação de mercadoria, fato que se subsume ao critério material da Regra Matriz de Incidência do ICMS.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 14 de outubro de 2010.

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402.2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 14 de outubro de  2010, ressalvando-se o disposto no art. 11 da Portaria SEF 226/01, que as respostas a consultas poderão ser modificadas a qualquer tempo, por deliberação da COPAT, mediante comunicação formal ao consulente; em decorrência de legislação superveniente; ou pela publicação de Resolução Normativa que entenda de modo diverso.

Alda Rosa da Rocha                                                    Almir José Gorges

Secretária Executiva                                                  Presidente da COPAT