CONSULTA Nº      025/2008.

EMENTA: A ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DEVE DIRIMIR AS DÚVIDAS DO CONTRIBUINTE SOBRE A INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA ATRAVÉS DO INSTITUTO DA CONSULTA, ENTRETANTO, ESTA FICARÁ IMPEDIDA DE SE MANIFESTAR PELA VIA ADMINISTRATIVA, QUANDO O CONTRIBUINTE TIVER PROPOSTO  QUALQUER MEDIDA JUDICIAL SOBRE A MATÉRIA, EM HOMENAGEM AO PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DA DUPLICIDADE DAS VIAS, JUDICAL E ADMINISTRATIVA.

 

01 -  A CONSULTA.

 

A Consulente acima identificada, devidamente qualificada nos autos deste processo, vem perante esta Comissão expor o seguinte:

 

 a)  que possui crédito, em favor do Estado de Santa Catarina, decorrente de sentença condenatória, que determinou a restituição dos valores recolhidos indevidamente a título de Adicional Estadual de Imposto de Renda - AEIR, devidamente corrigidos e acrescidos de juros legais;

 

 b) que o valor total a ser restituído pelo Estado já foi discutido na ação ordinária nº 023.94.039313-2 e na respectiva ação de execução de sentença, a qual foi parcialmente embargada pelo Estado, e está aguardando julgamento; entretanto, o valor incontroverso de R$ 596.538,12 é líquido e certo.

 

Em conformidade com o disposto na Lei Complementar nº 313/05, art. 26, os créditos referentes a imposto do contribuinte, decorrente de relação tributária, assim reconhecido em decisão administrativa definitiva ou sentença judicial transitada em julgado, poderá, por opção sua, ser compensado com débitos relativos à Fazenda Pública; e considerando que a consulente é contribuinte do ICMS, entende que poderá compensar os valores que tem direito a restituição referente ao AEIR, com os débitos apurados mensalmente em sua contra gráfica do ICMS.

 

Razão pela qual indaga se poderá compensar o seu crédito incontroverso referente ao AEIR com os débitos vencidos e vincendos de ICMS, e qual a forma desta compensação. Situação que a levará desistir da Ação de Execução da parte incontroversa, para afastar a duplicidade de aproveitamento.

 

A autoridade fiscal no âmbito da Gerência Regional de Blumenau, após a análise das condições formais de admissibilidade, opina, no mérito, pela impossibilidade jurídica da compensação pretendida em virtude de ausência da lei que a autorize.

 

É o relatório, passo à análise.

 

 

02 - A LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

 

Lei nº 3.938, de 26 de dezembro de 1966, art. 209;

 

Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984, art. 152-A.

 

 

03 - A FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

 

Inicialmente, conforme o liame fático constante dos autos, apura-se que a dúvida da consulente repousa sobre a aplicação do art. 26 da Lei Complementar nº 313/05 - Código de Direitos e Deveres do Contribuinte do Estado de Santa Catarina, que preceitua:

Art. 26. O crédito referente a imposto do contribuinte, decorrente de relação tributária, assim reconhecido em decisão administrativa definitiva ou sentença judicial transitada em julgado, poderá, por opção sua, ser compensado com débitos relativos à Fazenda Pública.

Parágrafo único. Ao crédito tributário do contribuinte, objeto da compensação a que se refere o caput deste artigo, aplicam-se os mesmos índices de correção monetária incidentes sobre os débitos fiscais, contados desde o pagamento indevido, bem como juros contados da decisão definitiva que o reconheceu.

Sem embargo a salutar intenção do legislador catarinense, o dispositivo acima, além da imprecisão redacional, está matizado por gritante ineficácia, e evidente inaplicabilidade.  Entre muitas possibilidades de análise, destacam-se abaixo apenas duas.

 

Por primeiro, o legislador catarinense ao determinar que o contribuinte poderá, por opção sua, compensar crédito referente a imposto, decorrente de relação tributária, assim reconhecido em decisão administrativa definitiva ou sentença judicial transitada em julgado, com débitos relativos à Fazenda Pública, ignorou comezinhos princípios de Direito Tributário e de Direito Financeiro.

 

Destarte, interpretando-se o artigo em comento através do método lógico-sistemático constata-se a sua inexorável inaplicabilidade.  

 

Por segundo, no dispositivo acima transcrito, o legislador estadual tratou genericamente o instituto da compensação tributária, isto é, fixou uma norma geral de compensação tributária, exorbitando, assim, a sua competência para legislar sobre a matéria, pois, segundo a CF, art. 146, III, compete à lei complementar, frise-se, à lei complementar nacional estabelecer as normas gerais em matéria de legislação tributária.

 

As normas gerais citadas pela Magna Carta encontram-se, atualmente, dispostas no Código Tributário Nacional, ao qual o Estado de Santa Catarina deverá submeter-se em virtude do princípio federativo. 

 

No tocante à compensação tributária, o Codex tributário dispõe o seguinte:

 

Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública.

Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% (um por cento) ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.

Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial.  

 

Tem-se, portanto, que o legislador catarinense poderia dispor sobre a compensação tributária no âmbito dos tributos estaduais, desde que estipulasse as condições e as garantias pertinentes à compensação pretendida. A ausência destes requisitos implica a ineficácia total do art. 26 do Código de Direitos e Deveres do Contribuinte do Estado de Santa Catarina.

 

Em que pese os argumentos acima expostos, a matéria vertente dos autos não poderá ser analisada por esta Comissão, em respeito ao princípio da vedação da duplicidade das vias, administrativa e judicial.

 

Segundo Araken de Assis, “empregando algum remédio processual, o contribuinte renuncia ao poder (rectius: faculdade) de recorrer e desiste do recurso, porventura interposto na esfera administrativa (...) Face à preponderância do órgão judiciário sobre a autoridade administrativa, submetendo-a sempre aos seus pronunciamentos, a decisão administrativa restaria mesmo prejudicada: idêntica ao teor do provimento judicial, se mostraria redundante; contrária, inútil. Por este motivo, e considerando razões de economia e orientação aos órgãos administrativos, o único destino admissível do procedimento administrativo, na hipótese de sobrevir iniciativa judicial do contribuinte, é a extinção”.(in Manual do Processo de Execução. 6º Ed. RT: 2003, pág. 801).

 

Este é o posicionamento da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, conforme se apura na ementa do REsp. 240040/RJ, onde foi o relator o Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, in verbis:

 

TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA QUE ANTECEDE A AUTUAÇÃO. RENÚNCIA DO PODER DE RECORRER NA VIA ADMINISTRATIVA E DESISTÊNCIA DO RECURSO INTERPOSTO.

 

No caso em tela, não obstante o trânsito em julgado da sentença que determinou ao Estado de Santa Catarina restituir os valores pagos indevidamente a titulo de AEIR, a Procuradoria do Estado embargou a correspondente Ação de Execução. Segundo José Frederico Marques, “os embargos tratam-se de processo de conhecimento, que tem por objeto sentença constitutiva destinada a desfazer, no todo ou em parte, o título executivo, ou anular a execução”.

 

Se o objetivo dos embargos à execução é a obtenção de uma sentença constitutiva, fica evidente a impossibilidade de a matéria suscitada na presente consulta ser analisada no âmbito administrativo, antes da solução da lide pelo Poder Judiciário.

 

Concluí-se, portanto, que a questão levantada pela consulente, somente poderá ser analisada na esfera administrativa, depois de o Poder Judiciário ter decidido os embargos, que segundo consulta ao sistema de acompanhamento do TJSC (fls. 92), encontra-se tramitando na Vara de Precatórias, Precatórios, Falência e Concordata da Comarca da Capital. 

 

Isto posto, informe-se a consulente da impossibilidade de a presente consulta ser respondida por este órgão da Administração Tributária.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 17 de abril de 2008.

 

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402.2

 

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 17 de abril de 2008.

 

 

            Alda Rosa da Rocha                                                    Almir José Gorges

            Secretária Executiva                                                  Presidente da COPAT