CONSULTA Nº: 02/07

EMENTA:  ICMS/ISS. - A FABRICAÇÃO DE JANELAS, GRADES E PORTAS PANTOGRÁFICAS SOB ENCOMENDA CARACTERIZA-SE INDUSTRIALIZAÇÃO, CONSEQUENTEMENTE, A VENDA DESTES PRODUTOS RESULTA EM OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA, FATO QUE SE SUBSUME NA HIPÓTESE INCIDÊNCIA DO ICMS, RESTANDO IN CASU AFASTADA A  INCIDÊNCIA DO ISS.

01  -  CONSULTA.

A Consulente acima identificada, devidamente qualificada nos autos deste processo, informa que desenvolve a atividade de serralheria, ou seja, dedica-se a confecção de janelas, grades e portas pantográficas sob medida, para tal, adquire matéria-prima (chapas e barras de ferro), bem como o material secundário e intermediário (parafusos, eletrodos, etc) necessários à atividade.

Acrescenta que, por ocasião das vendas efetivadas, inicia o preparo da mataria-prima, cortando e soldando as partes integrantes do produto conforme a encomenda do cliente e, a seguir, remete a peça para ser galvanizada e pintada em outras empresas especializadas, por fim, após revisão final do produto, instala-o no local solicitado pelo cliente.

 Considerando que a Lei Complementar nº 116/03 traz, em sua Lista de Serviços, a atividade de serralheria como fato gerador do ISS, há dúvida sobre a incidência ou não do ICMS sobre o produto resultante dessa atividade. E para dirimi-la formula a presente consulta.

A autoridade fiscal no âmbito da Gerência Regional em Joinville analisou as condições de admissibilidade do pedido, acrescentando que a matéria já foi objeto de analise desta Comissão consoante a Consulta nº 65/95.

É o relatório, passo à análise.

02  -  DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

Lei complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, art. 2º;

Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, lista anexa, item 14.13;

RIPI, aprovado pelo Decreto Federal nº 4.544, de 26 de dezembro de 2002, arts. 2º, 3º e 4º.

03 – DA FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

De acordo com o liame fático descrito pela consulente, há um aparente conflito entre os campos de incidência do ICMS e do ISS, ou seja, entre a Lei Complementar nº 87/96 que dispõe sobre as normas gerais relativas ao ICMS e a Lei Complementar nº 116/03 que dispõe sobre as normas gerais relativas ao ISS.

Antes, porém, impõe-se estabelecer qual atividade preponderante da consulente. Ou seja, em que reside a atividade por ela desenvolvida?  A resposta a esta indagação será encontrada através de outra indagação, isto é: a fabricação de janelas, grades e portas pantográficas sob encomenda trata-se de industrialização (IPI) ou de prestação do serviço de serralheria (ISS) previsto no item 14.13 da Lei Complementar nº 116/03?

Por primeiro, registre-se que o conceito de serviços vem da economia, onde o trabalho é um dos fatores de produção. De fato, o trabalho aplicado à produção pode dar como resultado duas classes de bens: i) bens materiais ou mercadorias; e ii) bens imateriais, conhecidos, estrito senso, como serviços.

Focalizando, especificamente, o trabalho humano como um serviço lato sensu conclui-se que este é um fator indispensável na produção de quaisquer bens ou mercadorias, sendo, portanto, um fator de produção indispensável ao processo industrial. Ou seja, toda industrialização (transformação, beneficiamento, acondicionamento, etc) se efetiva, indubitavelmente, pela ação do trabalho humano (serviço lato sensu) que, agregando valor à matéria-prima básica, transforma-a num produto final acabado (bens materiais ou mercadorias) pronto para o uso ou consumo.

O Superior Tribunal de Justiça analisando conflito entre o IPI (industrialização) e o ISS (prestação de serviço) apresentado no REsp nº 395633/RS, cujo relatório é da lavra da Eminente Ministra Eliana Calmon, decidiu pela preponderância do IPI, nas hipóteses em que o trabalho humano é aplicado sobre matéria-prima para a produção de um bem ou mercadorias, conforme se apura na ementa abaixo:

TRIBUTRIO - IPI - PRODUTO INDUSTRIALIZADO - MÓVEIS SOB ENCOMENDA
AFASTAMENTO DA INCIDNCIA DO ISS.
1. Constitucionalmente, é o IPI imposto prioritário para incidir em todas as matérias-primas que, trabalhadas, têm sua destinação alterada.
2. A fabricação de móveis de madeira não se confunde com as artes gráficas de impressos personalizados, em que prepondera sob o material a prestação de serviço.
3. A incidência do IPI é tão rigorosa, que até mesmo as madeiras polidas e serradas são geradoras de IPI, segundo a jurisprudência do STF.
4. Recurso improvido.

Extrai-se ainda, do sapiente voto da relatora, o seguinte: Assim limita-se a controvérsia em saber o que é preponderante na atividade da empresa: o caráter pessoal no fornecimento dos móveis (prestação de serviço) ou a transformação que modifica a natureza e finalidade do produto (industrialização)".

(...).

A incidência do IPI é tão prioritária que a jurisprudência do STF já está assentada no entendimento de que a exação é devida na madeira serrada, no peixe vivo acondicionado, nos camarões cozidos e congelados, na carne congelada, em prova inconteste quanto ao rigor do conceito de mercadoria industrializada".

Mutatis mutantis, infere-se que o mesmo raciocínio jurídico aplica-se ao caso em análise, pois quando a consulente produz janelas, grades ou portas pantográficas sob encomenda ela está realizando uma transformação da matéria-prima em um novo produto, ou seja, transformação de chapas e barras de ferro em porta pantográfica consubstancia-se num processo industrial.

Registre-se, também, que o novo produto resultante do processo industrial acima descrito é destinado ao comércio. Ou seja, a consulente vende a janela, a grade, ou a porta como produto pronto e acabado. Assim, é evidente que o objeto do contrato realizado entre o encomendante e a consulente não é a prestação de serviço de serralheria, mas sim a venda do produto final fabricado sob encomenda.

De outro norte, considerando-se que a produção industrial, via de regra, destina-se ao comércio, aduz-se às razões da análise o ensinamento de Aires Fernandino Barreto sobre a distinção entre os campos de incidência do ICMS e do ISS:

...[é] critério de demarcação dos campos de incidência do ICMS e do ISS os conceitos de atividade-meio e de atividade-fim. No caso do ICMS, a utilidade disponibilizada ao consumidor é um bem material (mercadoria) que não pode ser separado, para fins de tributação, das atividades-meio incorridas. O fornecimento da mercadoria ao fornecedor final envolve uma série de serviços que beneficiam a esse mesmo consumidor, mas que não se constituem em fatos geradores distintos. Pelo contrário, subsumem-se na atividade preponderante da empresa, o fornecimento da mercadoria.

Alvo de tributação é o esforço humano prestado a terceiros como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas intermediárias, necessárias a obtenção do fim. Não a ação desenvolvida como requisito ou condição do facere (fato jurídico posto no núcleo da hipótese de incidência do tributo).

As etapas, passos, processos, tarefas, obras, são feitas, promovidas, realizadas “para” o próprio prestador e não “para terceiros”, ainda que estes os aproveitem (já que, aproveitando-se do resultado final, beneficiam-se das condições que o tornam possível).

(...)

Em conclusão, somente podem ser tomadas, para sujeição ao ISS (e ao ICMS) as atividades entendidas como fim, correspondentes à prestação de um serviço integralmente considerado. No caso específico do ISS, podem decompor um serviço – porque previsto, em sua integridade no respectivo item específico da lista da lei municipal – nas várias ações meio que o integram, para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço autônomo, independente. Isso seria uma aberração jurídica, além de constituir-se em desconsideração à hipótese de incidência desse imposto.” (ISS – Atividade-Meio e Serviço-Fim. Revista Dialética de Direito Tributário n° 5, São Paulo: Oliveira Rocha, fevereiro/ 1996, pp. 72 a 97):

Aliás, é esse o entendimento desta Comissão em precedentes já analisados, conforme se apura na Consulta nº 65/95, cuja ementa está assim emoldurada:

EMENTA: A FABRICAÇÃO DE JANELAS ESTÁ SUJEITA AO ICMS, POIS CARACTERIZA INDUSTRIALIZAÇÃO, MESMO SENDO REALIZADA COM MATERIAIS DE TERCEIROS (ENCOMENDANTES). JÁ A CONFECÇÃO E MONTAGEM DE JANELAS NO CANTEIRO DE OBRAS, É CARACTERIZADO COMO SERVIÇO, ESTANDO NO CAMPO DE INCIDÊNCIA DO ISS, DESDE QUE COMPROVADA A PRESTAÇÃO MEDIANTE CONTRATO DE ADMINISTRAÇÃO, EMPREITADA OU SUB-EMPREITADA.

Pelo exposto, responda-se à consulente que a fabricação de janelas, grades e portas pantográficas sob encomenda caracteriza-se processo de industrialização ex vi do RIPI, artigos 2º a 4º, e, conseqüentemente, a venda destes produtos resulta em operação de circulação de mercadorias, fato que configura hipótese de incidência do ICMS, restando afastada, in casu, a incidência do ISS.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 08 de fevereiro de 2007.

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402.2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia  08 de fevereiro de 2007.

Alda Rosa da Rocha                                                    Renato Vargas Prux

Secretária Executiva                                                    Presidente  da COPAT