EMENTA: ICMS. OBRAS E LINHAS DE TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. CARACTERIZADA OBRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. VEDADO APROPRIAÇÃO DO CRÉDITO RELATIVO AOS MATERIAIS UTILIZADOS EM OBRAS E LINHAS DE TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTIRICA OU NA RESTAURAÇÃO, RECUPERAÇÃO OU MANUTENÇÃO DE REDES JÁ EXISTENTES.

 

CONSULTA Nº: 30/06

D.O.E. de 19.10.06

01 - DA CONSULTA

             A consulente, entidade que representa as cooperativas de eletrificação rural, informa que suas filiadas adquirem produtos que comporão o seu ativo imobilizado, como subestações, linhas de transmissão, linhas e redes de distribuição, geradores, sistemas de medição, geradores, postes, fiações e assim por diante.

             Ao final, formula consulta a esta Comissão sobre a possibilidade de creditamento, como bens do ativo permanente, do ICMS relativo:

             a) aos materiais utilizados em obras e linhas de transmissão e de distribuição;

             b) aos materiais utilizados na restauração, recuperação ou manutenção de redes já existentes;

             c) máquinas e equipamentos.

             A consulta foi encaminhada ao Grupo Setorial de Comunicações e Energia – GTCOM – para manifestação. Este informou que tem orientado as cooperativas de eletrificação rural, verbalmente e por escrito, que o imposto relativo à “aquisição de materiais utilizados na construção de redes de distribuição de energia elétrica, bem como os materiais ou peças utilizadas na reparação ou restauração das redes existentes, não ensejam direito ao crédito do imposto”. A seguir, transcreve parte de correspondência enviada às Cooperativas de Energia Elétrica, na qual argumenta louvando-se em manifestações desta Comissão, entre elas a Resolução Normativa nº 19, de 1997.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

             Constituição Federal, art. 155, § 2º, II;

             Lei Complementar nº 87/96, art. 20;

             Lei n° 10.297/96, arts. 21 e 22.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

             A consulente pretende aproveitar como crédito o ICMS relativo a “subestações, linhas de transmissão, linhas e redes de distribuição, geradores, sistemas de medição, geradores, postes, fiações e assim por diante” que, por sua própria natureza, aderem ao solo, caracterizando obra de construção civil.

             O ICMS é imposto plurifásico não-cumulativo. Isto significa que o imposto incide em todas as etapas de circulação da mercadoria. Mas, em cada etapa, o imposto cobrado nas anteriores, pela mesma ou por outra unidade da Federação, é dedutível  do imposto devido. Desta forma, o imposto a recolher será sempre a diferença a maior entre o imposto debitado por ocasião da saída da mercadoria e aquele que a onerou por ocasião da sua entrada, de modo que o ônus tributário suportado pelo consumidor final será sempre equivalente à aplicação da alíquota sobre o preço de comercialização.

             A não-cumulatividade é, portanto, técnica de tributar a circulação de mercadorias que distribui o ônus tributário entre todos os que participaram do ciclo de comercialização. No seu resultado final, equivale a uma tributação monofásica incidindo sobre a última operação, realizada com o consumidor.

             Entretanto, o direito ao crédito não é absoluto. Para haver crédito, é necessário que a operação seja tributada, pois cuida-se de um direito de compensar (ou deduzir). O crédito é o subtraendo da operação aritmética. Se não há débito (minuendo) não há que se falar  em crédito. Por outro lado, como o crédito é imposto cobrado nas operações anteriores, é necessário que a aquisição de mercadoria tenha sido onerada pelo imposto. Este é o sentido da regra contida no inciso II do § 2° do art. 155 da Constituição Federal.

             A regra da não-cumulatividade visa evitar a tributação em cascata (incidência de imposto sobre imposto) e preservar os mecanismos de mercado, na medida em que distribui o ônus tributário por toda a cadeia de comercialização da mercadoria.

             Tratando-se de indústria, é utilizável ainda como crédito o imposto que incidiu sobre as matérias-primas, insumos, material secundário e material  de embalagem, ou seja, os materiais adquiridos (tributados) e aplicados na produção. Esses  créditos são conhecidos como créditos físicos, pois correspondem a materiais que se integram ao produto final ou são consumidos no processo industrial.

             A Constituição Federal promulgada em outubro de 1988 ampliou o campo de incidência do imposto que passou a incidir sobre serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Em contrapartida, o imposto cobrado pela prestação de serviço de transporte e a comunicação passou a representar crédito fiscal, apropriável pelo destinatário do serviço (tomador), quando este for contribuinte.

             A Lei Complementar n° 87, de 13 de setembro de 1996, admitiu expressamente (art. 20) o aproveitamento, como crédito fiscal, do imposto que incidiu sobre a entrada de mercadorias destinadas ao uso e consumo do estabelecimento ou à integração ao ativo permanente. Esses bens, que não se integram ao produto final nem são consumidos no processo industrial, dão origem aos chamados créditos financeiros. No regime anterior à Lei Complementar n° 87/96 não eram admitidos os créditos financeiros, apenas os créditos físicos. Fernando Brockstedt,  (O ICM. Porto Alegre, 1972, p. 245) assim caracteriza os dois tipos de créditos:

             Com o crédito físico (ou valor acrescido bruto), a lei admite a dedução do imposto apenas em relação às entradas físicas de mercadorias que, fisicamente, irão sair do estabelecimento, mesmo que integradas a outras mercadorias. Cogita, assim, apenas, dos créditos da própria mercadoria que irá sair, de suas matérias-primas e componentes (“mercadorias entradas para utilização, como matéria-prima ou material secundário, na fabricação e embalagem dos produtos”, diz o § 3º do art. 3º do D.L. nº 406).

             Com o crédito financeiro (ou valor acrescido líquido), admitir-se-ia (...) o crédito fiscal de todos os bens entrados no estabelecimento, inclusive de ativo fixo e de consumo que, embora não sejam fisicamente incorporados ao produto obtido, são considerados como despesas financeiras incorporadas.

             Entretanto, não é qualquer entrada de mercadorias que dá direito ao crédito. O § 1° do art. 20 excetua as mercadorias ou os serviços alheios à atividade do estabelecimento, como, entre outros, os veículos de transporte pessoal, expressamente mencionados na Lei (§ 2°).

             De qualquer modo, para haver direito ao crédito, é necessário que o bem ou serviço (tributados) estejam relacionados diretamente com a industrialização, a comercialização ou a prestação de serviços realizada pelo contribuinte. É o caso das máquinas e equipamentos (bens de produção) utilizados na produção de mercadorias. Esses bens sofrem um desgaste (perda de valor) em razão de sua utilização (depreciação). Igualmente, dão direito a crédito os bens consumidos pelo estabelecimento, em razão de sua atividade.

             Aroldo Gomes de Mattos (ICMS: o Montante dos Créditos Compensáveis, In ICMS: Problemas Jurídicos, Coord. Valdir O. Rocha, São Paulo: Dialética, 1996, p. 37) justifica o direito ao crédito fiscal, relativo à entrada de bens de capital, como gasto financeiro do produto final:

             “Integradas ao ativo fixo, tais máquinas não ficarão indefinidamente imobilizadas, estáticas, inertes, já que, ou serão revendidas depois de usadas, ou se desgastarão inexoravelmente na dinâmica do processo industrial; esse desgaste (depreciação) é repassado no custo das mercadorias fabricadas ou dos serviços prestados. Isso significa dizer que elas integrarão, em partículas, por mínimas que sejam, as etapas seguintes da circulação das mercadorias, até a sua completa exaustão.”

             “Nessas condições, são essas máquinas e insumos a mãe de todas as mercadorias, devendo, portanto, o ICMS que incidiu na sua entrada ser compensado com o que for devido nas operações subseqüentes.”

             No caso da construção civil, cuida-se de atividade não sujeita ao ICMS. O fato gerador do imposto é a circulação de mercadorias, por tal entendendo-se o bem móvel adquirido para revenda, sendo tal atividade exercida profissionalmente.

             Os materiais de construção não são adquiridos para revenda, nem são utilizados, direta ou indiretamente na industrialização ou comercialização de mercadorias, mas são utilizados em obra de construção civil, para uso próprio. Mesmo que a obra se  destinasse à revenda, não estaria sujeita ao ICMS por ser bem imóvel e não mercadoria. No caso da futura transmissão de propriedade do bem, incidem outros impostos, como o ITBI (na alienação) ou o ITCMD (na sucessão “causa mortis” ou doação), jamais o ICMS. A obra de construção civil é vendida como uma unidade e  não separadamente em suas partes componentes (a telha, o tijolo, o ferro, a brita, a areia etc.). A obra adere ao terreno onde edificada, formando uma unidade permanente, cuja transmissão de propriedade exige forma própria (assentamento no Registro de Imóveis).

             No caso em tela, não se trata simplesmente de equipamentos utilizados para a produção ou fornecimento de energia elétrica. Pelo contrário, subestações, linhas de transmissão, linhas e redes de distribuição, geradores, sistemas de medição, geradores, postes etc. são instaladas em pontos escolhidos ao longo da rede, integrando-se fisicamente ao solo.

             É considerada obra de construção civil, portanto não dando direito a crédito do imposto, tudo aquilo que adere de modo definitivo ao imóvel de modo que não possa ser retirado sem sofrer destruição ou dano irreparável que impossibilite a sua utilização em outro local. Assim, uma subestação ou um gerador não são equipamentos que podem ser facilmente movidos de um local para outro, mas estão assentados sobre uma base que adere ao solo. Da mesma forma, os elementos que compõe as redes e linhas não podem ser deslocados sem danos do local onde instalados, ainda que alguns deles possam ser reaproveitados em outro local.

             Posto isto, responda-se à consulente que:

             a) não dão direito a crédito o ICMS relativo aos materiais utilizados em obras e linhas de transmissão e de distribuição ou na restauração, recuperação ou manutenção de redes já existentes;

             b) o ICMS relativo à aquisição de máquinas e equipamentos somente poderá ser aproveitado como crédito se não tiverem aderido ao solo (obra de construção civil) e puderem ser deslocados de um lugar para outro.

À superior consideração da Comissão.

             Getri, em Florianópolis, 15 de março de 2006.

Velocino Pacheco Filho

AFRE – matr. 184244-7

             De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia  11 de abril de 2006.

Josiane de Souza Corrêa Silva                                              Pedro Mendes

Secretário Executivo                                                            Presidente da Copat