EMENTA: ICMS/ISS. RECAUCHUTAGEM DE PNEUS. NÃO É DEVIDO COMPLEMENTAÇÃO DE ICMS, CORRESPONDENTE À DIFERENÇA ENTRE A INCIDÊNCIA DAS ALÍQUOTAS INTERNA E INTERESTADUAL, SOBRE A ENTRADA DE MERCADORIAS UTILIZADAS EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇO SUJEITA EXCLUSIVAMENTE AO ISS, MESMO QUE TENHAM SIDO TRIBUTADAS NA ORIGEM PELA ALÍQUOTA INTERESTADUAL.
PORÉM, SERÁ EXIGIDA COMPLEMENTAÇÃO DO IMPOSTO NO CASO DE COMÉRCIO DE PNEUS RECAUCHUTADOS, AINDA QUE SOB A MODALIDADE DE “TROCA”, EM QUE O CONSUMIDOR LEVA UM PNEU PREVIAMENTE RECAUCHUTADO, DEIXANDO O PNEU VELHO.
TAMBÉM SERÁ EXIGIDA COMPLEMENTAÇÃO SE FOREM EXERCIDAS AMBAS AS ATIVIDADES: RECAUCHUTAGEM DE PNEUS PARA TERCEIROS E COMÉRCIO DE PNEUS RECAUCHUTADOS (RN 60/91).

CONSULTA Nº: 94/05

PROCESSO Nº: PSEF 87.060/05-1

01 - DA CONSULTA

         Cuida-se de consulta formulada por associação nacional das empresas que operam no ramo de reforma de pneus (recauchutagem ou regeneração), em nome de seus representados, sobre o tratamento tributário da recauchutagem de pneus, considerando o seguinte:

         a) os pneus em questão são de propriedade de terceiros, devendo, após a recauchutagem ou regeneração, ser devolvidos aos encomendantes;

         b)  os produtos utilizados no serviço de recauchutagem ou regeneração são adquiridos em outros Estados;

         c) os filiados da consulente recolhem ISS – imposto sobre serviços, de competência municipal, relativamente ao serviço de recauchutagem de pneus.

         Posto isso, formula a seguinte consulta a esta Comissão: “é devido o ICMS diferencial de alíquotas sobre as mercadorias, como por exemplo a borracha, adquirida em outra Unidade da Federação à alíquota interestadual de 12%, quando estas são utilizadas na prestação de serviço de recauchutagem ou regeneração de pneus sujeitas exclusivamente ao imposto municipal?”

         Como a consulente é entidade representativa de segmento econômico, de âmbito nacional, com sede no Município de São Paulo, Estado de São Paulo, fica dispensada a informação prevista no inciso II do § 2º do art. 6º da Portaria SEF nº 226/01.

         A taxa relativa à apresentação de consulta foi recolhida, conforme documento de arrecadação a fls. 8.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

         Constituição Federal, art. 155, § 2º, VII e VIII; art. 156, III;

         Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, art. 1º, § 2º; Lista de serviços, item 14.4;

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

         A consulta será respondida em seus próprios termos. Assim, a resposta somente terá validade se presentes os seguintes pressupostos:

         a) os pneus recauchutados destinam-se exclusivamente ao uso pelo próprio autor da encomenda (não se destinam à comercialização);

         b) a prestação de serviço de recauchutagem está sujeita exclusivamente ao ISS.

         A consulta refere-se à exigibilidade de ICMS, correspondente à aplicação da diferença entre as alíquotas interna e interestadual, em relação aos materiais adquiridos de outros Estados e empregados na prestação de serviço.

         Inicialmente, vamos ponderar que a alíquota interestadual não se refere à graduação do imposto, mas à repartição da receita tributária entre o Estado de origem e o Estado de destino. Assim a mercadoria adquirida para revenda, será tributada na origem pela alíquota interestadual, no pressuposto de que haverá operação subseqüente, tributada pela alíquota interna. A diferença entre a aplicação das alíquotas interna e a interestadual será receita do Estado de destino.

         Já no caso de mercadorias adquiridas de outro Estado para uso ou consumo do próprio adquirente, será tributada pela alíquota interna, se o destinatário não for contribuinte do ICMS, e pela alíquota interna, se o for. Neste último caso, cabe ao Estado de destino cobrar uma complementação do imposto, correspondente à diferença entre as alíquotas, conforme dispõe os incisos VII  e VIII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal. A regra também visa à repartição de receita do imposto entre os Estados de origem e destino.

         Disto resulta que, se o destinatário não for contribuinte do ICMS, o Estado de destino não poderá cobrar qualquer valor a título de diferencial de alíquota, mesmo que o Estado de origem tenha tributado a mercadoria pela alíquota interestadual. Porém, a condição para o Estado de destino exigir essa complementação é que o destinatário seja contribuinte do ICMS, mesmo que exerça atividades sujeitas ao ICMS ou não. Tão pouco afasta a exigibilidade do imposto o fato da mercadoria ser utilizada na atividade não sujeita ao ICMS.          

         Em princípio, a incidência de um imposto afasta a incidência do outro. Assim, as atividades sujeitas ao ISS não estão sujeitas ao ICMS, mesmo que a prestação de serviço envolva o fornecimento de mercadorias. Essa é a regra contida no § 2º do art. 1º da Lei Complementar nº 116/03. O inciso III do art. 156 da Constituição atribui aos Municípios competência para instituir imposto sobre serviços de qualquer natureza, definidos em lei complementar. Por definidos, entende-se os serviços relacionados na lista anexa à Lei Complementar nº 116/03.

         Por outro lado, incide o ICMS “sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios” (CF, art. 155, § 2º, IX, b), ou seja, os serviços não relacionados na lista.

         Uma terceira hipótese (incidência mista)  é da lista excepcionar expressamente da incidência do ISS as mercadorias fornecidas com a prestação de serviços. Neste caso, incidem os dois impostos simultaneamente: o ICMS sobre as mercadorias fornecidas e o ISS sobre o serviço prestado. A incidência mista caracteriza o prestador do serviço como contribuinte do ICMS, permitindo ao Estado de destino a cobrança de complementação do imposto, correspondente à diferença entre as alíquotas interna e interestadual.

         A recauchutagem de pneus está prevista no subitem 14.4 da lista. O item 14 trata de “serviços relativos a bens de terceiros”. Isto quer dizer que o fato gerador do imposto municipal somente fica caracterizado se os pneus forem fornecidos pelo encomendante do serviço. Não podem ser fornecidos pelo prestador do serviço, caso em que fica caracterizada a industrialização e venda de pneus recauchutados, com incidência exclusiva do ICMS. “Na prestação de serviços, não há venda de mercadorias mas simples aplicação de materiais. O objeto do contrato não é a coisa em si mesma, mas o fazer humano que requer a coisa como meio. A obrigação é de fazer e não de dar.”(Aires F. Barreto. ISS na Constituição e na Lei Complementar. São Paulo: Dialética, 2003, p. 208).

         A caracterização do fato gerador do ISS é descrita por Sérgio Pinto Martins (Manual do ISS. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p.37), nos seguintes termos:

“Os serviços, à evidência, pertencem ao grupo dos bens imateriais ou incorpóreos, da res incorporales. Quando se presta um serviço a terceiro, oferece-se um bem imaterial, não se lhe entregando um bem material.”

“Qualquer bem econômico, material ou imaterial, não possui, por si próprio, como qualidade essencial, a natureza de produto, de mercadoria ou de serviço. Conforme a natureza do bem (se material ou imaterial) e a etapa do circuito econômico que esteja atravessando (se a da produção, da circulação ou do consumo), referido bem receberá a denominação de ‘produto’, ou de ‘mercadoria’ ou de ‘serviço’, de acordo com as duas variáveis citadas.”

(....)

“Tais bens recebem a denominação de: produto, quando tenha a natureza de bem material e esteja na etapa econômica da ‘produção’; mercadoria, quando tenha a natureza de bem material e esteja na etapa econômica da ‘circulação’; ou serviço, quando tenha a natureza de bem imaterial e esteja na etapa econômica da ‘circulação’.”

         Posto isto, responda-se à consulente:

         a) não é devido o ICMS correspondente ao diferencial de alíquotas, relativamente às mercadorias utilizadas em prestação de serviço sujeita exclusivamente ao ISS, mesmo que tenha sido tributada pela alíquota interestadual pelo Estado de origem da mercadoria (supõe-se que a empresa seja apenas prestadora de serviço);

         b) porém o diferencial de alíquota será devido, se a empresa comercializar pneus recauchutados, mesmo que sob a forma de “troca” (o usuário leva um pneu já recauchutado previamente e deixa o pneu velho).

         Nesta última hipótese, não se trata de prestação de serviço, mas de venda de pneu recauchutado em que o pneu velho é dado como parte do pagamento.

         O imposto correspondente ao diferencial de alíquota é exigível mesmo quando o destinatário exerça ambas as atividades: recauchutagem de pneus de terceiro (sujeita ao ISS) e venda de pneu recauchutado (sujeita ao ICMS). O destinatário caracteriza-se como “contribuinte do ICMS”, condição para a exigência de complementação do imposto pelo Estado de destino, nos termos do art. 155, § 2º, VII, a, da Constituição Federal. A matéria já foi tratada por esta Comissão que expediu a Resolução Normativa nº 60, de 1991, do seguinte teor:

“ICMS. Diferença de alíquota. Ocorre o fato gerador do imposto nas entradas de matérias-primas oriundas de outra unidade da Federação, em estabelecimentos de contribuintes simultaneamente do ICMS e do ISS, que as utilizem na prestação de serviços.”

         À superior consideração da Comissão.

         Getri, em Florianópolis, 7 de dezembro de 2005.

Velocino Pacheco Filho

AFRE – matr. 184244-7

         De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 20 de dezembro de 2005.

Josiane de Souza Corrêa Silva                                             Renato Luiz Hinnig

Secretário Executivo                                                            Presidente da Copat