EMENTA: ICMS. SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. A INFRA-ESTRUTURA UTILIZADA NA PRESTAÇÃO DESTE SERVIÇO PÚBLICO CLASSIFICA-SE COMO BEM PÚBLICO DE USO ESPECIAL, LOGO, QUANDO AS EMPRESAS PRIVADAS CONCESSIONÁRIAS DO SERVIÇO PÚBLICO DE ÁGUA E SANEAMENTO  ADQUIREM AS  PEÇAS E PARTES (CANOS, CONEXÕES, REGISTROS, ETC) PARA APLICAR NA CONSTRUÇÃO DESTA INFRA-ESTRUTURA,  FAZEM-NO SOB A CONDIÇÃO DE CONSUMIDORES FINAIS NÃO CONTRIBUINTES DO ICMS.  DEVEM, PORTANTO, OS FORNECEDORES DESTAS PEÇAS E PARTES  ADOTAR, NESTAS OPERAÇÕES, A ALÍQUOTA INTERNA, EX VI  DO ART. 155, VII, “B” DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

CONSULTA Nº: 70/05

PROCESSO Nº: GR05 27186/059

01- DA CONSULTA.

A Consulente acima identificada, devidamente qualificada nos autos deste processo de consulta, tendo como atividade principal a fabricação de produtos e artefatos à base de plástico, resina ou similares, vem perante esta Comissão indagar se nas operações interestaduais destinadas a empresas  privadas concessionárias de serviço público de fornecimento de água natural canalizada   deve aplicar as alíquotas previstas no artigo 27 do RICMS/SC.

Desenvolve sua tese embasada nas seguintes premissas: (a) o fato de a água natural canalizada gozar de isenção (Convênio-CONFAZ Nº 98/89), induz à conclusão de que se trata de mercadoria; (b) muitas empresas privadas concessionárias do serviço público de fornecimento de água são inscritas nos Cadastros de Contribuintes do ICMS das unidades federadas, e (c) que a simples concessão do benefício fiscal [isenção] não retira das empresas privadas concessionárias do serviço público de fornecimento de água a condição de contribuintes do ICMS.

Logo, conclui que, nas operações interestaduais  que destine seus  produtos a essas empresas deve aplicar as alíquotas interestaduais, previstas no artigo 27 do RICMS/SC, ou seja,  12% ou 7% conforme o caso.

Acrescenta, ainda, que aplica o mesmo tratamento tributário às empresas privadas que se ocupam do saneamento básico  público em Santa Catarina, quando fornece produtos oriundos de sua planta fabril localizada em São Paulo, recolhendo assim, o diferencial da  alíquota (12% - 17%) para o Estado de  Santa Catarina.

Por fim, indaga se  o seu entendimento está correto, ou seja:

a)       As alíquotas previstas no art. 27 do RICMS/SC, devem ser aplicadas nas operações interestaduais que destinem tubos, conexões e acessórios sanitários a empresas privadas dedicadas ao fornecimento de água natural canalizada, proveniente de serviço público de captação, tratamento e distribuição, inscritas como contribuintes em outros entes da Federação?

b)      Nestas mesmas operações, quando a empresa-consulente vende as mercadorias à empresa privada do Estado de Santa Catarina, dedicada ao fornecimento de água natural, inscritas como contribuintes do ICMS, está correto o pagamento do tributo, no Estado de origem, mediante aplicação da alíquota interestadual.

A autoridade fiscal no âmbito da Gerência Regional em Joinville, analisou as condições formais de admissibilidade do pedido, opinando pelo encaminhamento da consulta a esta Comissão. (fls.20 – 21).

É o relatório, passo à análise.

02 - DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

Constituição Federal, art. 155, II,  § 2º, VII “b”;

Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, art. 2º;

Código Civil Brasileiro, Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, arts. 99, 100 e 103;

Lei nº 9.433, de 5 de julho de 1997, art. 2º, II e art. 12;

Lei nº 8.989, de 13 de fevereiro de 1995, art. 35, § 1º, § 2º, e § 3º e  art. 36;

RICMS/SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 28 de agosto de 2001, art. 7º , e Anexo 5, art. 1º, § 2º.

03 – DA FUNDAMENTAÇÃO DA RESPOSTA.

A matéria é inédita no âmbito desta Comissão e, pouco focada pela doutrina e jurisprudência pátrias, fato que impõe um esforço exegético considerável para que se chegue a uma solução juridicamente plausível.

A consulente desenvolve na exordial um raciocínio elogiável, porém, incorreto, porque partiu de premissas falsas. Ou seja, o pensamento está correto, mas os dados estão incorretos.

Para demonstrar esse equívoco é necessário que se desenvolva, a priori, um detalhado estudo sobre a natureza jurídica da água enquanto recurso natural, bem como do seu fornecimento à população pelo Poder Público, para, então, delinear-se os  conseqüentes reflexos tributários  envolvidos na questão. É o que passo a fazer.

Segundo a Constituição da República, compete à União instituir o sistema nacional de gerenciamento dos recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso (art. 21, XIX). Este dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei Federal nº 9.433/97,  que dispõe em seu artigo 2º, inciso I: “A água é um bem de domínio público” . Segundo Hely Lopes Meireles, o domínio público “...pode ser tomado como o conjunto de bens destinados ao uso público (direto ou indireto – geral ou especial – uti singuli  ou uti universi), como pode designar o regime a que se subordina esse complexo de coisas afetadas de utilidade pública” (in Direito Administrativo Brasileiro. 26ª Ed. São Paulo:Malheiros.2001. pág. 477).

Segundo Clóvis Beviláqua, há coisas que formam objeto normal de atos jurídicos (venda, compra, doação, empréstimo, penhor, hipoteca, etc), mas há, também, coisas para as quais  essa possibilidade não é admitida. Estas são denominadas coisas fora do comércio, sobre as quais os particulares não podem exercer direitos exclusivos, ou que não podem alienar. (in Teoria geral do direito civil, 2ª ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 1929) . Complementa-lhe a lição, Paulo Dourado de Gusmão fazendo ver que, geralmente, as coisas fora do comércio pertencer ao domínio público: as coisas que não podem ser objeto de direitos privados, e que estão submetidas à normas especiais e não do direito privado. (in  Elementos de direito civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1969).

Sendo a  água um bem de domínio público, pode-se classificá-la, segundo o art. 99, I,  do Código Civil, como bem de uso comum do povo; advirta-se, porém, que esta classificação não lhe retira o seu valor econômico (Lei nº 9.433/97, art. 2ª , II); mas,  também, não autoriza classificá-la como mercadoria, que segundo De Plácido e Silva, “...é designação genérica dada a toda coisa móvel, apropriável, que possa ser objeto de comércio. As coisas fora do comércio não se entendem mercadorias e não são suscetíveis de venda.  Tecnicamente, portanto, somente se denomina de mercadoria objeto ou a coisa adquirida pelo comerciante ou mercador, para servir de objeto de seu comércio, isto, é para ser revendida” (in Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense. 1993. Vol III, pág. 181).

De onde se conclui que a água (bem público de uso comum) é insuscetível de ser apropriada pelos particulares, estando, portanto, fora do comércio, isto é,  não pode ser vendida, logo, não é mercadoria, mas, o seu uso pode ser oneroso (CC, arts. 100 e 103).

Sabe-se que é vetusta a pratica da humanidade de, via de regra, apenas regular o uso da água e não vendê-la como mercadoria. Aliás, esta é posição adotada pelo ordenamento jurídico pátrio, conforme se apura  na leitura do artigo 12 da lei acima citada, in verbis:

Art. 12. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos: (grifei).

    I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;

(....)

Se a água não é objeto de mercancia, então, indaga-se: qual é o objeto do serviço público de fornecimento de água?

Nas palavras de Maria Sylvia Zanella Di Prieto, “Não é tarefa fácil definir [serviço público], pois a sua noção sofre consideráveis transformações no decurso do tempo, quer no que diz respeito aos seus elementos constitutivos” (In  Direito Administrativo, 14º Ed. São Paulo: Atlas, pág. 95).  Sem embargo a essa sapiente advertência e compulsando-se  a consagrada  doutrina de Hely Lopes  Meirelles, tem-se que: “serviço público é todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade.” (In Direito Administrativo Brasileiro. 26ª Ed. São Paulo:Malheiros.2001. pág. 311).

No entanto, para uma melhor exegese, deve-se, inicialmente, investigar o termo “serviço”. Com sua costumeira precisão,  De Plácido e Silva afirma:

“Do Latim servitium (condição de escravo) exprime, gramaticalmente, o estado de que é escravo, encontrando-se no dever de servir, ou de trabalhar para o amo. Extensivamente, porém, a expressão designa hoje o próprio trabalho a ser executado, ou que se executou definindo a obra, o exercício do ofício, a ocupação, ou a função. (...) Onde quer que haja um encargo a cumprir, obra a fazer, trabalho a realizar, empreendimento a executar,(...) há um serviço a fazer ou que se fez”. ( Op. Cit. Vol. IV, pág,215).

Estribado na teoria geral das  obrigações, pode-se afirmar que  “serviço” é o objeto da prestação de uma obrigação de fazer. Consoante o Código Civil,  obrigação de fazer é a que vincula o devedor à prestação de um serviço ou ato positivo, material ou imaterial, seu ou de terceiro, em benefício do credor ou de terceira pessoa. Por exemplo:  fazer a captação, purificação e a entrega [canalizada] de água natural potável, e/ou  recolher e purificar água não potável e impura [esgoto].

Aduz-se às razões da análise, as inferências de que os serviços públicos constituem-se em obrigações de fazer algo necessário e de utilidade pública, e que, estas obrigações foram imputados ao Poder Público pela  Constituição da República, ressaltando-se que a Lei Maior traz  extenso rol de serviços públicos, distribuindo-os  entre as entidades estatais quanto à competência/dever de prestá-los.

Especificamente  sobre os serviços públicos de fornecimento de água e de tratamento do esgoto e considerando-se a falta de referência expressa na Magna Carta, conclui-se que estes serviços foram imputados aos municípios, conforme disposto no artigo 30, V que diz: “Compete aos Municípios: V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial.”

Segue neste norte o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Como exemplo tem-se o acórdão da lavra do Ministro Antonio Villas Boas no Rp 654/ MG de 04/10/66 , cuja ementa está assim emoldurada:

EMENTA: 1) AUTONOMIA MUNICIPAL. OS SERVIÇOS DE ÁGUA E ESGOTOS PERTENCEM AO MUNICÍPIO 2) NÃO E INCONSTITUCIONAL LEI QUE AUTORIZE O ESTADO, EM CONVENIO COM O MUNICÍPIO, A ORGANIZAR O ABASTECIMENTO DE ÁGUAS DA CIDADE. 3) REPRESENTAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.

Aliás, também é pacífica a posição pretoriana no sentido de que a água canalizada disponibilizada à população pelo Poder Público trata-se de “serviço de fornecimento”. Como exemplo cita-se a decisão do STJ no  Recurso Especial nº 2001/0098419-1, da lavra da  Eminente Ministra Eliana Calmon:

EMENTA: ADMINISTRATIVO - SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA - PAGAMENTO À EMPRESA CONCESSIONÁRIA SOB A MODALIDADE DE TARIFA - CORTE POR FALTA DE PAGAMENTO: LEGALIDADE.

Estribado no raciocínio acima desenvolvido, estabeleço as seguintes premissas básicas: (a) a água é um bem publico insuscetível de comercialização, sendo a regulamentação de seu uso de competência da União; (b) em bases empíricas, pode-se afirmar que a água potável é indispensável à sobrevivência dos seres vivos, mormente dos seres humanos, razão pela qual deve ser considerada necessidade pública, sendo o seu fornecimento uma  utilidade pública; (c) ao Poder Público incumbe  buscar a satisfação das necessidades públicas que, no caso da água, resulta em se ter acesso a água potável  e própria para o consumo; e (d) segundo a Constituição da República, compete aos municípios  prestarem  os “serviços” de captação, purificação e distribuição de água potável, bem como, de coleta e tratamento desta água, após o seu uso normal (esgoto), ou seja, torná-la potável novamente.

Passo à análise dos aspectos tributários envolvidos no caso em tela.

Sendo a Administração Pública Municipal direta ou indiretamente, através de concessão, a quem compete prestar à população os serviços necessários ao fornecimento de água potável e ao saneamento do esgoto, serviços estes que decorrem diretamente de obrigação de fazer. Pode-se  inferir que tais “serviços” constituem-se em fatos que não encontram subsunção nas hipóteses de incidências legalmente previstas para o ICMS.(LC nº 87/96, art. 2º).

Roque Antonio Carraza  trata desta matéria com peculiar maestria. Senão Vejamos:

“De uns tempos a esta parte tem-se notado em alguns Estados (v.g. no Estado da Bahia) a tendência de tributar-se, por meio do ICMS, o fornecimento domiciliar de água potável (água tratada), quando não a própria água em estado bruto (in natura, sem tratamento).
Essa postura absolutamente não se ajusta  aos ditames constitucionais ...
Em primeiro lugar, a água em estado bruto não é uma mercadoria, porquanto não se destina ao comércio. È um bem que a todos pertence (domínio público) e integra o patrimônio da Nação.
(...)
Muito bem, na medida em que as águas são incontendivelmente bens públicos, segue-se que não são mercadorias, não podendo, só por isso, ensejar a tributação por meio de ICMS. (...).
Por outro lado, o serviço de fornecimento domiciliar de água (água encanada e tratada), por que serviço público específico e divisível, possibilita apenas um tipo de tributação: a tributação por meio de taxa de serviço (art. 145, II, 2ª parte, da CF). Não de imposto, muito menos de ICMS, cujas regras-matrizes estão perfeitamente delineadas no Texto magno e não podem ter seu traçado alterado pelo legislador ordinário ou pelo agente fiscal”.
(CARRAZA. ICMS 9ª Ed. São Paulo: Malheiros. 2003. pág.128).

Registre-se aqui, que o fato de os estados brasileiros terem, no âmbito do CONFAZ, através do Convênio nº 98/89, acordado em conceder  isenção para as saídas de água canalizada, não tem força para contraditar a afirmação de que o fornecimento de água canalizada trata-se de “serviço” e não de “mercadoria”, posto que esta constatação repousa em raciocínio fundamentado numa lógica dedutiva e juridicamente irrepreensível.

Ademais, o Pretório Excelso lucidamente já afirmou que entende não ser a água canalizada mercadoria sujeita à tributação pelo ICMS, por tratar-se de serviço público, é o que se depreende da  decisão relativa à ADI nº 2224/ DF, relatado pelo eminente Ministro Néri da Silveira, cuja ementa abaixo transcrevo e destaco:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. RESOLUÇÃO Nº 98/89 QUE APROVOU CONVÊNIO NA FORMA DA LC 24/75, EM QUE AUTORIZA ESTADOS E O DISTRITO FEDERAL A CONCEDERAM 'A ISENÇÃO DO ICMS EM OPERAÇÕES COM ÁGUA NATURAL CANALIZADA, NAS HIPÓTESES PREVISTAS NA LEGISLAÇÃO ESTADUAL'. EDIÇÃO DO CONVÊNIO 77/95, DO MINISTÉRIO DA FAZENDA, QUE AUTORIZA RIO DE JANEIRO E RIO GRANDE DO SUL A REVOGAREM A ISENÇÃO DO ICMS PARA A ÁGUA CANALIZADA. RESOLUÇÃO Nº 2.679/96, QUE LEVA A EFEITO O CONVÊNIO 77/95. REQUERIDA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS DOIS ÚLTIMOS ATOS NORMATIVOS, SOB A ALEGAÇÃO DE: 1)ERRÔNEA CLASSIFICAÇÃO DE ÁGUA CANALIZADA COMO MERCADORIA; 2)LEGITIMIDADE DOS ESTADOS E DISTRITO FEDERAL PARA FIRMAR CONVÊNIOS QUE TRATEM DE ISENÇÃO DE ICMS, NA FALTA DE LEI COMPLEMENTAR. NECESSÁRIA A COMPREENSÃO DA EXTENSÃO DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ICMS - ART. 155, II, CF, PARA IDENTIFICAR O QUE CONSTITUI OU NÃO FATO GERADOR DO ICMS. JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL QUE ENTENDE NÃO SER A ÁGUA CANALIZADA MERCADORIA SUJEITA A TRIBUTAÇÃO PELO ICMS, POR TRATAR-SE DE SERVIÇO PÚBLICO. EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, SE A SUSPENSÃO DA NORMA IMPUGNADA FIZER RESSURGIR NORMA ANTERIOR TAMBÉM INCONSTITUCIONAL, ESTAS DEVERÃO SER IMPUGNADAS NA INICIAL. O QUE NÃO SUCEDEU. SE DECIDIR ESTE TRIBUNAL PELA INCONSTITUCIONALIDADE DO CONVÊNIO 77/95, HAVERÁ A REPRISTINAÇÃO DO CONVÊNIO ANTERIOR - Nº 98/89. AÇÃO NÃO CONHECIDA.

De outro norte, verifica-se que toda a infra-estrutura empregada na prestação do serviço de fornecimento de água (captação, purificação e distribuição), ou de saneamento (coleta e tratamento de esgoto) deve ser classificada como bem público de uso especial (CC, art. 99, II); logo, quando a Administração Pública Municipal adquirir os materiais necessários a sua construção (canos, registro, conexões, etc) o fará na condição de  consumidora final, não contribuinte do ICMS.

Advirta-se, também, que a empresa  privada concessionária de serviço público  não é a proprietária da infra-estrutura que construir durante a vigência do contrato de concessão, pois,  quando da extinção deste contrato, impõe-se  a reversão de toda a infra-estrutura (bens reversíveis) utilizada na prestação do serviço público objeto do contrato. É o que se depreende do disposto nos §§ 1º, 2º e 3º , do art. 35  e art 36  da Lei nº 8.989/95, in verbis:

 § 1º Extinta a concessão, retornam ao poder concedente todos os bens reversíveis, direitos e privilégios transferidos ao concessionário conforme previsto no edital e estabelecido no contrato.

    § 2º Extinta a concessão, haverá a imediata assunção do serviço pelo poder concedente, procedendo-se aos levantamentos, avaliações e liquidações necessários.

    § 3º A assunção do serviço autoriza a ocupação das instalações e a utilização, pelo poder concedente, de todos os bens reversíveis.

Art. 36. A reversão no advento do termo contratual far-se-á com a indenização das parcelas dos investimentos vinculados a bens reversíveis com o objetivo  de garantir a continuidade e atualidade do serviço concedido.

Outro ponto a ser ponderado no caso em tela, deve-se à alegação da consulente de que muitas empresas concessionárias do serviço público de fornecimento de água canalizado e de saneamento básico são  inscritas no Cadastro de Contribuintes do ICMS - CCICMS.

A legislação tributária relativa ao CCICMS prevê  que: “Poderão também inscrever-se no CCICMS as pessoas físicas ou jurídicas, não contribuintes do imposto, que mantiverem bens em estoque e necessitarem transportá-los” ( RICMS/SC, Anexo 5, art. 1º, § 2º).  Observe-se, então, que o simples fato de as empresas prestadoras do serviço público em comento possuírem inscrição no CCICMS, não lhes confere a condição de contribuintes  do ICMS, pois, tratam-se de empresas privadas que prestam, através de concessão do município, serviços públicos, cujo fato gerador não se subsume nas hipóteses de incidência do ICMS.

Mesmo porque, a condição de contribuinte está vinculada ao que dispõe o art. 7º do RICMS/SC: “Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadorias ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.”

Ora, as empresas privadas concessionários de serviço fornecimento de água canalizada, não realizam operações com mercadorias e o serviço público que prestam não encontra tipificação nas hipóteses de incidência do ICMS, logo, não há que se falar em contribuinte do ICMS.

Nessa altura do raciocínio impõe-se estabelecer novo resumo contendo mais algumas premissas indispensáveis à conclusão: ( a ) toda a rede empregada na captação, purificação e distribuição de água e esgoto constitui-se em  bem público de uso especial, especificamente afetados à infra-estrutura básica necessária ao fornecimento de água e ao  saneamento básico; ( b )  os canos, conexões, registros, etc, adquiridos pelas empresas privadas concessionárias do serviço público de água e saneamento destinam-se  a construção da infra-estrutura (bem público de uso especial) necessária à prestação do serviço, ( c ) a Administração Pública Municipal, direta ou indireta,  quando adquiri as peças e partes necessárias à construção desta infra-estrutura, o faz na condição de consumidora final, e não de contribuinte do ICMS  ( d )  o fato de as  empresas privadas concessionárias do serviço público de água e saneamento básico possuírem inscrição no CCICMS  não lhes atribui a condição de contribuintes do ICMS, porque, na verdade, não são comerciantes, mas sim prestadores de serviços público.

Fulcrado no que foi exposto, concluo que a água canalizada não é mercadoria, e que as empresas privadas responsáveis pelo seu fornecimento não são contribuintes do ICMS, em que pese poderem inscrever-se no CCICMS. Portanto, quando adquirem peças e partes, a serem empregados na construção da infra-estrutura pública de água e saneamento, fazem-no sob a condição de  consumidores finais, não contribuintes do ICMS.

Frente ao exposto, responda-se à consulente que, nas operações que destinarem seus produtos (canos, conexões, registros, etc) para empresas privadas, concessionárias de serviço público de fornecimento  de água canalizada e de saneamento básico,  deverá adotar a alíquota interna, conforme previsto no art. 155, § 2º , VII, “b” da Constituição da República.

Com referência ao segundo questionamento, informe-se à consulente  que a interpretação exarada nesta resposta restringe-se aos fatos geradores  praticados por contribuintes deste Estado.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 22 de novembro  de 2005.

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402.2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 22 de novembro   de 2005.

Josiane de Souza Corrêa Silva                                    Renato Luiz Hinnig

Secretária Executiva                                                  Presidente da COPAT