EMENTA: ICMS. REGIME ESPECIAL PREVISTO NO ART. 61, II, “E”, DO RICMS-SC/01. NA AQUISIÇÃO DE COURO E PELE EM ESTADO FRESCO, SALGADO OU SALMOURADO, DE CONTRIBUINTE CATARINENSE, O ESTABELECIMENTO INDUSTRIAL ADQUIRENTE DEVE RECOLHER O IMPOSTO DEVIDO PELO REMETENTE NO PRAZO ESTABELECIDO NO REGIME ESPECIAL, ENQUANTO ESTE ESTIVER EM VIGOR, AINDA QUE A OPERAÇÃO POSTERIOR SEJA ISENTA OU NÃO TRIBUTADA COM MANUTENÇÃO DO CRÉDITO.

CONSULTA Nº: 63/05

PROCESSO Nº: GR14 82012/040

1 - DA CONSULTA

A consulente tem como atividades o curtimento e comercialização de couro, em operações no mercado interno e internacional. Informa que, na comercialização dos produtos resultantes da transformação do couro verde, predominam as exportações.

Argumenta que, nas aquisições internas de couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado, o imposto deve ser recolhido antecipadamente, segundo o disposto no art. 60, § 1º, I, “m” do RICMS-SC/01. Pondera também que a única exceção a este dispositivo é aquela constante do inciso IV, do art. 8º, do Anexo 3 do RICMS-SC/01, que prevê o diferimento do imposto nas saídas das aludidas mercadorias, promovidas por pessoas desobrigadas da emissão de documentos fiscais.

Observa que as normas da legislação catarinense estabelecem um tratamento tributário diferente para as empresas sediadas neste Estado, em relação às “estabelecidas no vizinho Paraná, que dispõe de diferimento em todas as suas aquisições internas”. Como sua empresa é preponderantemente exportadora, a obrigação de recolher antecipadamente o imposto nas aquisições internas acarreta saldos credores acumulados, o que corresponde a “maiores custos e concorrência desigual com as empresas paranaenses do mesmo ramo”.

Informa, ainda, que obteve a concessão de regime especial, segundo o qual passou a assumir a responsabilidade pelo recolhimento do imposto devido pelo remetente, conforme prescrito no art. 61, II, “e”, do RICMS-SC/01, o que permite o “diferimento do imposto incidente sobre as aquisições internas de couro e pele em estado natural, salgado ou salmourado”.

O prazo para o recolhimento do imposto, pactuado mediante o regime especial, para as operações por ele abrangidas, passou a ser “até o 10º (décimo) dia do mês subseqüente àquele em que ocorrerem as entradas das mercadorias, em única quota, englobando todas as operações realizadas com o mesmo remetente, cabendo o  crédito fiscal, somente mediante comprovante de pagamento”.

Após a exposição, apresenta sua dúvida, que consiste no seguinte: em virtude de possuir saldo credor em conta gráfica, e por não necessitar do crédito, por ser preponderantemente exportadora, se “pode simplesmente não pagar o ICMS sobre as aquisições internas, não ficando devedora perante o Fisco Estadual, como responsável tributária”? Ou seja, aplica-se o § 5º, do art. 1º, do Anexo 3 do RICMS-SC/01 nestas operações?

O processo encontra-se devidamente instruído e informado pela Gerência Regional (fls. 13 e 14), e a consulente prestou, na fl. 04, a declaração prevista no art. 5º, inciso III, da Portaria SEF nº 226/01.

2 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996, art. 37, I;

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 28 de agosto de 2001: art. 60, § 1º, I, “m”e art. 61, II, “e”;

Anexo 3, art. 1º, § 5º e art. 8º, IV e XIII;

Anexo 6, art. 1º.

3 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

3.1 Considerações preliminares

Destaque-se, inicialmente, que a alínea “m” do art. 60, § 1º, I, do RICMS-SC/01 foi revogada mediante a Alteração nº 579 do RICMS-SC/01, implantada pelo Decreto nº 2.023/04. Este dispositivo previa: “o imposto será recolhido por ocasião do fato gerador nas saídas internas de couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado, ressalvado o disposto no Anexo 3, art. 8º, IV”. Assim, a partir de 25 de junho de 2004, não é mais exigido o recolhimento antecipado do imposto para estas operações, pois a norma revogada excepcionava o disposto no “caput” do art. 60 do RICMS-SC/01.

O decreto citado introduziu também a Alteração nº 580 no RICMS-SC/01, que acrescentou o inciso XIII ao art. 8º do Anexo 3 do Regulamento. Este dispositivo prevê o diferimento do imposto para a etapa seguinte da circulação na:

“XIII – saída de couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado promovida por contribuinte, desde que o destinatário:

a) seja estabelecimento industrial;

b) entregue na Gerência Regional da Fazenda a que jurisdicionado até o dia 15 (quinze) do mês subseqüente, relatório das aquisições realizadas no mês anterior, contendo as seguintes informações relativas ao fornecedor:

1. nome ou razão social;

2. inscrição estadual;

3. CNPJ;

4. número, série e data de emissão das notas fiscais para fins de entrada emitidas no período.”

Uma vez que as alterações introduzidas no RICMS-SC/01 foram posteriores à formulação da consulta, é necessário fazer a análise da questão em dois momentos distintos: até 24 de junho de 2004, e a partir do dia seguinte em diante, quando passaram a vigorar as Alterações nº 579 e 580.

A dúvida da consulente refere-se à possibilidade de ser concedido o diferimento do imposto, na hipótese prevista no art. 61, II, “e”, do RICMS-SC/01, que se trata de regime especial para o recolhimento do imposto por responsabilidade tributária, pelo adquirente das mercadorias. Na sua visão, tratando-se de diferimento, seria aplicável o disposto no art. 1º, § 5º, do Anexo 3 do RICMS-SC/01, o que permitiria a dispensa do recolhimento do imposto diferido relativo às aquisições internas das mercadorias. Apresenta, como justificativa, o fato de seus produtos destinarem-se majoritariamente à exportação para o exterior do país e, portanto, tais operações são isentas com expressa manutenção de créditos.

Para uma melhor compreensão do problema, é preciso verificar na legislação, antes e após as alterações introduzidas, qual o regime tributário para as operações internas com o couro em estado fresco, salmourado ou salgado, o que dispõe o regime especial acerca das aquisições das mercadorias, bem como um breve estudo sobre o diferimento e suas regras.

3.2 Regime tributário nas operações internas com couro e pele

As operações internas com couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado submetiam-se à incidência normal do imposto, segundo a legislação tributária estadual vigente até 24 de junho de 2004. Como única exceção, a legislação previa, no art. 8º, IV, do Anexo 3, do RICMS-SC/01, o diferimento do imposto na “saída promovida por pessoa não obrigada à emissão de documento fiscal” destas mercadorias, “quando for emitida nota fiscal para fins de entrada para acobertar o transporte”.

Com a implementação das alterações na legislação tributária, a partir de 25 de junho de 2004, também as saídas internas de couro e pele, promovidas por contribuinte, a estabelecimento industrial, passaram a ser diferidas. Assim, a partir desta data foi equalizado o tratamento tributário para as saídas internas destas mercadorias à indústria, promovidas tanto por contribuintes como não-contribuintes.

3.3 O regime especial nas operações com couro e pele

O instituto do regime especial está previsto, de uma forma geral, no Título I do Anexo 6 do RICMS-SC/01. Objetiva-se, com a adoção do regime especial, compatibilizar os interesses do fisco e do contribuinte, de forma a facilitar o cumprimento da obrigação tributária principal, pelo responsável (art. 1º).

O regime especial em questão, autorizado pelo Diretor de Administração Tributária, está previsto no art. 61, II, “e” do RICMS-SC/01, e dispõe que:

“e) o estabelecimento adquirente de couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado assuma a responsabilidade pelo recolhimento do tributo devido pelo remetente, devendo recolher o imposto até o 10º (décimo) dia do mês subseqüente àquele em que ocorrerem as entradas dessas mercadorias, em uma única quota, englobando todas as operações realizadas com o mesmo remetente, cabendo o crédito fiscal mediante comprovante do pagamento, observado, no que couber, o disposto no § 1º”.

Enquanto vigente o regime especial, suas cláusulas devem ser cumpridas pelo beneficiário. Assim, a principal obrigação a este atribuída é a de que efetue o recolhimento do imposto devido pelo remetente, relativo às saídas das mercadorias a ele destinadas, no prazo estipulado – 10º (décimo) dia do mês seguinte ao da entrada das mercadorias no seu estabelecimento.

3.4 O diferimento

Dentre os vários estudiosos sobre a matéria, José Jayme de Macêdo Oliveira (Tributos Estaduais. Rio de Janeiro: Destaque, 2001, p. 141) informa que discute-se na doutrina se o diferimento do ICMS constitui “adiamento (retardamento) da incidência ou, simplesmente, do pagamento do imposto, depois de passar por teses que o vêem como moratória, isenção, tipo de sujeição passiva indireta por transferência, e, até mesmo, fenômeno vazio de conteúdo jurídico, eis que de natureza exclusivamente econômica”.

Observa esse autor que, “nas legislações estaduais, tem predominado a inteligência de que ‘diferimento’ é tipo de substituição tributária (para trás)”. Assim, o diferimento caracteriza-se pela atribuição a um terceiro, da responsabilidade pelo pagamento do imposto devido em operação anterior, afastando-se da relação jurídico-tributária o sujeito passivo originário.

Esse conceito de diferimento foi adotado pela legislação tributária catarinense, pois o situa no Anexo 3 do RICMS-SC/01, que trata, no Título I, da Substituição Tributária nas Operações Antecedentes. As regras gerais do diferimento encontram-se no art. 1º deste Anexo:

“Art. 1º. Nas operações abrangidas por diferimento, fica atribuído ao destinatário da mercadoria a responsabilidade pelo recolhimento do imposto na condição de substituto tributário.

§ 1º. O imposto devido por substituição tributária subsumir-se-á na operação tributada subseqüente promovida pelo substituto.

§ 2º.  O contribuinte substituto deverá recolher o imposto diferido:

I – quando não promover nova operação tributada ou a promover sob regime de isenção ou não-incidência, salvo quanto às operações que destinem mercadorias diretamente para o exterior do país;

II – proporcionalmente à parcela não-tributada, no caso de operação subsequente beneficiada por redução da base de cálculo do imposto;

III – por ocasião da entrada ou recebimentro da mercadoria, nas hipóteses expressamente previstas neste Regulamento;

IV – se ocorrer qualquer evento que impossibilite a ocorrência do fato gerador do imposto.

(...)

§ 4º. É vedado o destaque do imposto em documento fiscal correspondente à operação abrangida por diferimento.

§ 5º. Nas operações praticadas pelo substituto, beneficiadas por isenção ou redução de base de cálculo, com expressa manutenção de créditos, fica dispensado o recolhimento do imposto diferido”.

O diferimento do imposto está previsto no art.37 da Lei nº 10.297/96, in verbis:

“Art. 37. Fica responsável pelo recolhimento do imposto devido, na condição de substituto tributário:

I – o destinatário da mercadoria ou usuário de serviço, em relação às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, amparadas por diferimento, nos casos previstos em regulamento;”

3.5 O mérito – objeto do regime especial

No caso sob exame, o regime especial produziu os seguintes efeitos: a) transferência da responsabilidade pelo recolhimento do imposto à consulente, adquirente das mercadorias, afastando o sujeito passivo originário e b) adiamento do pagamento do imposto para etapa posterior da circulação. Tais efeitos conferem ao objeto do regime especial a natureza de diferimento, conforme visto no item anterior.

Todavia, apesar do regime especial efetivamente atribuir o diferimento do imposto nas operações que menciona, não se aplica o § 5º, do art. 1º, do Anexo 3 do RICMS-SC/01. Isto porque a regra específica que prevalece é a ditada pelo regime especial, enquanto vigente, que determina o recolhimento do imposto relativo às entradas de couro bovino fresco, salgado ou salmourado, no estabelecimento da consulente, até o 10º (décimo) dia do mês seguinte àquele em que ocorrerem as entradas destas mercadorias. Esta obrigação prevalece enquanto vigorante o regime especial, mesmo que a operação posterior com a mercadoria seja isenta ou não tributada, com manutenção do crédito. O crédito somente será possível após o pagamento do imposto efetuado pela consulente. A compensação com créditos acumulados que possua não é permitida antes do recolhimento do imposto devido pelo remetente, a seu encargo.

O motivo da prevalência da regra do regime especial justifica-se por duas ordens de razões. A primeira delas deve-se ao fato de que o regime especial é instrumentalizado mediante um ato administrativo, o que o submete ao regime de direito público. Assim, o ato administrativo presume-se legítimo e imperativo. Seus comandos devem ser acatados pelo particular, no interesse da arrecadação tributária. A segunda razão diz respeito ao princípio da especialidade. Havendo duas normas emanadas pela Administração Tributária, igualmente válidas sobre determinada matéria, prevalece a que for mais específica.

Advirta-se a consulente que, nos termos do art. 9º, § 3º, da Portaria SEF nº 226/01, deverá “adequar seus procedimentos” conforme a resposta fornecida nesta consulta, no prazo de 30 (trinta) dias contados do ciente, sob pena de ser constituído de ofício o crédito tributário, com a incidência de multa e juros.

Registre-se, por fim, que a partir de 25 de junho de 2004, com o implemento das Alterações nº 579 e 580 no RICMS-SC/01, o regime especial perdeu a eficácia, eis que todas as operações internas com couro e pele em estado fresco, salmourado ou salgado, destinadas a estabelecimento industrial, passaram a ser diferidas.

Isto posto, responda-se à consulente:

a) não, enquanto vigente o regime especial, deve recolher o imposto devido pelo remetente, contribuinte catarinense, como responsável tributário, na aquisição de couro bovino, em estado fresco, salmourado ou salgado, no prazo previsto no regime especial;

b) não se aplica o § 5º, do art. 1º, do Anexo 3, do RICMS-SC/01 a essa operação, pois prevalece a obrigação do recolhimento do imposto, conforme dispõe o art. 61, II, “e” do RICMS-SC/01.

É este o parecer que submeto à apreciação da digna Comissão.

Gerência de Tributação, Florianópolis, 6 de setembro de 2005.

Fernando Campos Lobo

AFRE III – matrícula 184.725-2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 6 de setembro de 2005.

Josiane de Souza Correa Silva                                       Renato Luiz Hinnig

Secretária Executiva                                                     Presidente da COPAT