EMENTA: ICMS. CRÉDITO. ATIVO PERMANENTE. OPERAÇÃO INTERESTADUAL ENTRE ESTABELECIMENTOS DE MESMA EMPRESA. NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO. IMPOSSIBILIDADE DE APROVEITAMENTO DO CRÉDITO EM RELAÇÃO A OPERAÇÕES ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS. PREVISÃO CONSTITUCIONAL.

CONSULTA Nº: 37/2002

PROCESSO Nº: GR14 52.066/98-3

01. CONSULTA

Informa a consulente acima identificada que recebe em transferência bens do ativo permanente de seu estabelecimento matriz, situado no Estado de São Paulo. Em relação a tais operações, o estabelecimento remetente emite, na forma da legislação do estado de origem, nota fiscal sem destaque do ICMS, em razão da não incidência do imposto na operação. Dá ainda notícia de que em função da saída não tributada, o estabelecimento de origem fica obrigado, segundo a legislação paulista, ao estorno proporcional do crédito já apropriado em relação àquele bem.

Na seqüência, a consulente tece considerações no sentido da impossibilidade de incidência do imposto em operações como as descritas, sustentando que "a transferência de quaisquer espécies de coisas corpóreas entre estabelecimentos da mesma empresa, não podem constituir fatos geradores do ICMS". Aduz que "o judiciário firmou jurisprudência no sentido de que a circulação de bens do ativo imobilizado está fora do campo de incidência do ICMS, por não configurar, na essência, circulação de mercadorias", citando jurisprudência nesse sentido.

Contudo, apesar da não incidência do imposto na operação de que decorre a entrada de bens para a integração do ativo permanente de seu estabelecimento, entende a consulente ter direito ao aproveitamento de crédito do imposto, em função do princípio constitucional da não-cumulatividade do imposto. Afirma, nesse sentido:

A inteligência da norma constitucional permite firmar a tranqüila diretriz de que o crédito não pode constituir uma mera faculdade outorgada ao contribuinte, traduzida em um procedimento discricionário. Como o débito deve ser exigido, lançado e liquidado, o mesmo ocorre com o crédito, sem o que o princípio resultaria ineficaz, frustrando-se a dicção constitucional.

 Por fim, a consulente solicita manifestação da COPAT no sentido de que:

a) poderá efetuar o aproveitamento de créditos do ICMS relativamente à entrada de bens do ativo imobilizado remetidos em transferência, não tributada, por seu estabelecimento matriz, situado no Estado de São Paulo;

b) que poderá efetuar o aproveitamento extemporâneo de tais créditos, relativamente a entradas ocorridas anteriormente à consulta.

02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Constituição Federal, art. 155, § 2º, II;

Lei Complementar no 87/96, art. 11.

03. FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

A pretensão manifestada pela consulente, que a seu ver teria base constitucional, encontra obstáculo intransponível na própria Constituição Federal. De fato, a Carta de 1988 consagra o princípio da não-cumulatividade do ICMS, obtida, nos termos do inciso I do § 2o do art. 155, mediante a compensação do "que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal".

Ao mesmo tempo porém, a Constituição cuidou de dar uma disciplina específica ao princípio no que respeita a operações que sejam isentas ou em que não haja a incidência do imposto. Essa disciplina está contida no inciso II do mesmo § 2o do art. 155 da Constituição Federal, que estabelece, verbis:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

(...)

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;

II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:

a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;

b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores;

A necessidade de estorno do crédito pelo estabelecimento remetente, a que se refere a consulente, além de regra específica contida na Lei Complementar no 87/96, obedece ao disposto na alínea b, acima transcrita. Com efeito, a realização de operação sem incidência do imposto, como seria, segundo informado, de acordo com a legislação do estado de origem, a saída de bem do ativo imobilizado, implica a anulação de créditos relativos a operações anteriores com o mesmo bem.

Por outro lado, no que respeita ao estabelecimento destinatário de bem objeto de operação isenta ou não tributada, como é o caso do estabelecimento consulente, esse tratamento tributário da operação de que decorre a entrada do bem em seu estabelecimento não implica crédito para compensação com o montante do imposto devido em operações ou prestações seguintes, como de forma bastante clara estabelece a alínea a do dispositivo mencionado.

Destarte, é impossível concluir com a consulente, no sentido de que, não obstante não haja incidência do imposto, torna-se possível o aproveitamento do crédito a cujo estorno fica obrigado o estabelecimento remetente, em razão, também, da não tributação da mesma operação.

A propósito, importa observar que para os fins da tributação do ICMS, os diversos estabelecimentos de uma empresa constituem unidades dotadas de total autonomia e independência, especialmente quando situadas em unidades distintas da federação.

Com efeito, a própria Lei Complementar no 87/96 encarrega-se de estabelecer a relevância da noção de estabelecimento da empresa, destacando a independência de cada um deles em relação aos demais. Diz a respeito o art. 11 da Lei Complementar no 87/96, verbis:

Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:

I - tratando-se de mercadoria ou bem

a) o do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do fato gerador;

b) onde se encontre, quando em situação irregular pela falta de documentação fiscal ou quando acompanhado de documentação inidônea, como dispuser a legislação tributária;

c) o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria por ele adquirida no Pais e que por ele não tenha transitado;

d) importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física;

e) importado do exterior, o do domicílio do adquirente, quando não estabelecido;

f) aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de mercadoria importada do exterior e apreendida;

g) o do Estado onde estiver localizado o adquirente, inclusive consumidor final, nas operações interestaduais com energia elétrica e petróleo, lubrificantes e combustíveis dele derivados, quando não destinados à industrialização ou à comercialização;

h) o do Estado onde o ouro tenha sido extraído, quando não considerado como ativo financeiro ou instrumento cambial;

i) o de desembarque do produto, na hipótese de captura de peixes, crustáceos e moluscos;

II - tratando-se de prestação de serviço de transporte:

a) onde tenha início a prestação;

b) onde se encontre o transportador, quando em situação irregular pela falta de documentação fiscal ou quando acompanhada de documentação inidônea, como dispuser a legislação tributária;

c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese do inciso XIII do art. 12 e para os efeitos do § 3º do art. 13;

III - tratando-se de prestação onerosa de serviço de comunicação:

a) o da prestação do serviço de radiodifusão sonora e de som e imagem, assim entendido o da geração, emissão, transmissão e retransmissão, repetição, ampliação e recepção;

b) o do estabelecimento da concessionária ou da permissionária que forneça ficha, cartão, ou assemelhados com que o serviço é pago;

c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese e para os efeitos do inciso XIII do art. 12;

c-1) o do estabelecimento ou domicílio do tomador do serviço, quando prestado por meio de satélite;" (AC)

d) onde seja cobrado o serviço, nos demais casos;

IV - tratando-se de serviços prestados ou iniciados no exterior, o do estabelecimento ou do domicílio do destinatário.

§ 1º O disposto na alínea "c" do inciso I não se aplica às mercadorias recebidas em regime de depósito de contribuinte de Estado que não o do depositário.

§ 2º Para os efeitos da alínea "h" do inciso I, o ouro, quando definido como ativo financeiro ou instrumento cambial, deve ter sua origem identificada.

§ 3º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado, ainda, o seguinte:

I - na impossibilidade de determinação do estabelecimento, considera-se como tal o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação, encontrada a mercadoria ou constatada a prestação;

II - é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular;

III - considera-se também estabelecimento autônomo o veiculo usado no comércio ambulante e na captura de pescado;

IV - respondem pelo crédito tributário todos os estabelecimentos do mesmo titular.

§ 4º (VETADO)

§ 5º Quando a mercadoria for remetida para armazém geral ou para depósito fechado do próprio contribuinte, no mesmo Estado, a posterior saída considerar-se-á ocorrida no estabelecimento do depositante, salvo se para retonar ao estabelecimento remetente.

§ 6º Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, tratando-se de serviços não medidos, que envolvam localidades situadas em diferentes unidades da Federação e cujo preço seja cobrado por períodos definidos, o imposto devido será recolhido em partes iguais para as unidades da Federação onde estiverem localizados o prestador e o tomador."(AC)

Essa independência entre os estabelecimentos assume extrema relevância por ser o ICMS um tributo que, apesar de estar atribuído constitucionalmente à competência tributária dos Estados e do Distrito Federal, possui nitidamente uma vocação nacional. Daí a necessidade de conformação das diversas legislações instituidoras do tributo a um padrão uniforme, estabelecido por legislação federal.

Dada essa natureza nacional do tributo, a identificação de cada estabelecimento do contribuinte, bem como a vinculação, segundo critérios fixados em lei, de cada operação realizada pelo contribuinte com um seu estabelecimento específico, é indispensável inclusive para determinar-se a titularidade ativa da competência tributária, uma vez que um mesmo contribuinte pode estender suas atividades a diversas unidades federadas.

Nesse caso, será, naturalmente contribuinte de cada uma delas, e a sujeição ativa da relação obrigacional tributária será definida, em cada caso, em função da vinculação da operação a um estabelecimento específico. Cada um desses estabelecimentos, por outro lado, relacionar-se-á com a respectiva unidade federada, onde situado, de forma absolutamente autônoma e independente, tal como se não existissem outros estabelecimentos da mesma empresa.

Diante de todo o exposto, responda-se à consulente que não é possível o aproveitamento de créditos do ICMS relativamente a entradas em seu estabelecimento de bens destinados a integrar o ativo permanente, decorrentes de operação não tributada, ainda que o estabelecimento seja outro estabelecimento do mesmo titular.

Fica, assim, prejudicada a resposta ao questionamento sobre a possibilidade de aproveitamento extemporâneo de tais créditos.

É o parecer. À consideração da Comissão.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 10 de setembro de 2002.

Laudenir Fernando Petroncini

FTE -  Matr. 301.275-1

De acordo. Responda-se a consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 2 de outubro de 2002.

          Laudenir Fernando Petroncini              João Paulo Mosena

         Secretário Executivo                           Presidente da COPAT