EMENTA:  ICMS. CESTA BÁSICA. NÃO SE INCLUI NO TRATAMENTO TRIBUTÁRIO MAIS FAVORECIDO A FARINHA DE TRIGO ADICIONADA DE FERMENTO. TRATA-SE DE DESVIO DE FINALIDADE DO BENEFÍCIO QUE VISA BARATEAR OS PRODUTOS ALIMENTÍCIOS DE CONSUMO POPULAR.

CONSULTA Nº: 85/2001

PROCESSO Nº: GR05 25811/01-0

01 - DA CONSULTA

         Informa a consulente que comercializa farinha de trigo com adição de fermento "cuja composição foi desenvolvida com o objetivo de atender as necessidades do mercado e facilitar na elaboração de pães, pois esta mistura homogênea propicia resultado visivelmente melhor, pois o crescimento da massa é uniforme".

         A consulente entende que o produto supra descrito deve ser considerado como pertencente à cesta básica, conforme art. 11 do Anexo 2  do RICMS/SC, argumentando que a preponderância é essencialmente de farinha de trigo que representa 97% da mistura.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.870/01, Anexo 2, art. 11, I, e.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

         A matéria não é nova, tendo sido debatida inúmeras vezes por esta Comissão. Assim, na resposta à Consulta n° 6/97:

ICMS. CESTA BÁSICA. OS PRODUTOS BENEFICIADOS COM BASE DE CÁLCULO REDUZIDA SÃO EXCLUSIVAMENTE OS ELENCADOS NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. NÃO CABE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA INCLUINDO OUTROS PRODUTOS.

         Do corpo do parecer, extraímos o seguinte trecho:

         "O tratamento diferenciado justifica-se, teleologicamente, para baratear os bens de consumo popular, pela via da desoneração tributária. Sob esse prisma, é descabido incluir, no indigitado tratamento, defumados de carne suína e outros produtos que raramente freqüentam a mesa do trabalhador. O benefício não visa o contribuinte, mas determinada categoria de consumidores. Se o preço a varejo dos produtos da cesta básica não for reduzido na mesma proporção que a base imponível do imposto, a finalidade do tratamento tributário não estará sendo atingida.

         Para o contribuinte, dada a natureza indireta do tributo, deve ser indiferente o quantum da incidência do imposto, pois o benefício deve ser repassado integralmente ao consumidor."

         No mesmo sentido as respostas às consultas n° 43/98, 16/98, 85/96, 30/99 e a Resolução Normativa n° 2/95:

ICMS. CESTA BÁSICA. OS PRODUTOS SUJEITOS A REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO SÃO SOMENTE OS EXPRESSAMENTE PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO. NÃO CABE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA PARA INCLUIR PRODUTOS SEMELHANTES. SAL TEMPERADO OU TEMPEROS A BASE DE SAL NÃO PODEM SER EQUIPARADOS A SAL DE COZINHA, PARA FINS DE FRUIÇÃO DO BENEFÍCIO.

         Mais recentemente foi editada a Resolução Normativa n° 29/01 que trata da questão em termos mais abrangentes, sem referir-se a nenhum produto em particular:

ICMS. CESTA BÁSICA. INTERPRETA-SE NOS SEUS ESTRITOS TERMOS A LEGISLAÇÃO EXCEPCIONAL, NÃO PODENDO SER AMPLIADA PARA ACOMODAR ARTIGOS MAIS SOFISTICADOS. CRITÉRIO DA FINALIDADE PELO QUAL O DISPOSITIVO LEGAL VISA BARATEAR OS ITENS ORDINARIAMENTE CONSUMIDOS PELA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA.

         Dos fundamentos do parecer, destacamos o seguinte trecho:

"A - Critério da excepcionalidade:

         O financiamento do Estado é dever de todos, na medida da capacidade contributiva de cada um. Leciona Aliomar Baleeiro (Direito Tributário Brasileiro, 1999) que "todos devem contribuir para os serviços públicos, segundo sua capacidade econômica, nos casos estabelecidos em lei". Por isso, toda regra que exclui, no todo ou em parte, a exigência tributária deve ser tida como "regra de direito excepcional, porque subtrai bens ou pessoas ao princípio da generalidade da tributação (Souto Maior Borges, Isenções Tributárias, 1980).

         Ora, a regra de direito excepcional deve, por afastar-se da regra geral, ser interpretada nos seus estritos termos, vedada a interpretação extensiva. Ensina Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direito, 1998) que:

Em regra geral, as normas jurídicas aplicam-se aos casos que, embora não designados pela expressão literal do texto, se acham no mesmo virtualmente compreendidos, por se enquadrarem no espírito das disposições: baseia-se neste postulado a exegese extensiva. Quando se dá o contrário, isto é, quando a letra de um artigo de repositório parece adaptar-se a uma hipótese determinada, porém se verificar estar esta em desacordo com o espírito do referido preceito legal, não se coadunar com o fim, nem com os motivos do mesmo, presume-se tratar-se de um fato da esfera do Direito Excepcional, interpretável de modo estrito.

Estriba-se a regra numa razão geral, a exceção, numa particular; aquela baseia-se mais na justiça, esta na utilidade social, local ou particular. As duas proposições devem abranger coisas da mesma natureza; a que mais abarca, há de constituir a regra; a outra, a exceção.

         Tanto a regra que institui o tributo quanto aquela que o excepciona referem-se a idêntica "ordem de relação": o nascimento (ou não) de uma relação jurídica entre o Estado, no pólo ativo, e o contribuinte, no pólo passivo, sempre que ocorra no mundo fenomênico o fato descrito em lei como hipótese de incidência tributária. Sendo que a norma exonerativa impede a incidência da norma tributária. Continua o autor citado:

Os privilégios financeiros do fisco não se estendem a pessoas, nem a casos não contemplados no texto; porém não se interpretam de modo que resultem diminuídas as garantias do erário. Constituíram estas o fim, a razão do dispositivo excepcional.

As mercadorias integrantes da cesta básica sujeitam-se ao imposto sob base de cálculo reduzida. O imposto onera apenas parcialmente tais bens. Portanto, trata-se de regra de direito excepcional que deve ser interpretada literalmente, sem ampliar o seu sentido para abranger outros bens no referido benefício.

B - Critério da finalidade:

         A norma jurídica visa a um fim; dirige-se a obter um determinado resultado. É tarefa do  aplicador do direito pesquisar qual seria essa finalidade. O art. 5° da Lei de Introdução ao Código Civil determina que a aplicação da lei "atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum". Nesse passo, nos socorremos ainda da autoridade de Carlos Maximiliano (op. cit.):

Considera-se o direito como uma ciência primariamente normativa ou finalística; por isso mesmo a sua interpretação há de ser, na essência, teleológica. O hermeneuta sempre terá em vista o fim da lei, o resultado que a mesma precisa atingir em sua atuação prática. A norma enfeixa um conjunto de providências protetoras, julgadas necessárias para satisfazer a certas exigências econômicas e sociais; será interpretada de modo que melhor corresponda àquela finalidade e assegure plenamente a tutela de interesses para a qual foi regida.

         Ora, qual seria a finalidade perseguida pelo legislador ao instituir a cesta básica? Certamente, tal finalidade nada tem a ver com o contribuinte de direito. Dada a natureza indireta do imposto (ICMS), o ônus tributário repercute sobre o consumidor (contribuinte de fato) que é o verdadeiro destinatário da norma exonerativa. O legislador pretendeu favorecer o consumidor, principalmente o de baixa renda, reduzindo, via exoneração tributária, o preço dos gêneros de primeira necessidade. É essa a finalidade social almejada pela norma e esse o resultado pretendido pelo legislador.

         Uma vez definidos os critérios pelos quais cada mercadoria pode enquadrar-se ou não no tratamento excepcional previsto para a cesta básica, podemos examinar alguns casos concretos. De modo geral, os itens constantes do rol de mercadorias integrantes da cesta básica devem ser entendidos na sua forma mais corriqueira, como normalmente consumidos pela população de baixa renda, excluídos os produtos mais sofisticados."

         Isto posto, responda-se à consulente que o seu produto (farinha de trigo com adição de fermento) não está incluído na cesta básica. O benefício não pode ser estendido a produtos semelhantes ou misturas ainda que predomine a farinha de trigo na sua composição. Como alega a própria consulente, o produto foi desenvolvido para "facilitar na elaboração de pães". Trata-se pois de produto mais sofisticado, voltado para outro mercado diverso do visado pela cesta básica.

À superior consideração da Comissão.

Getri, em Florianópolis, 6 de setembro de 2001.

Velocino Pacheco Filho

FTE - matr. 184244-7

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia   11 de dezembro de 2001.

Laudenir Fernando Petroncini                                      João Paulo Mosena

    Secretário Executivo                                              Presidente da Copat