EMENTA: ICMS. CISÃO DE
EMPRESAS. O SALDO CREDOR DE ICMS, EXISTENTE EM CONTA GRÁFICA, NÃO PODE SER
INCLUÍDO NO ROL DE BENS E DIREITOS, PARA FINS DE CISÃO DO PATRIMÔNIO.
A SUCESSORA RESPONDE PELAS DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS DA SUCEDIDA, ATÉ O MOMENTO DA
CISÃO.
TRANSFEREM-SE À SUCESSORA OS CRÉDITOS DO IMPOSTO CORRESPONDENTES ÀS MERCADORIAS
EM ESTOQUE DA SUCEDIDA QUE LHE CAIBAM EM RAZÃO DA CISÃO.
PROCESSO Nº: GR08
58.730/04-4
01 - DA CONSULTA
Informa
a consulente que é empresa dedicada à atividade de prestação de serviços de
transporte nacional e internacional de mercadorias. Pretende promover uma
reorganização e transformação do seu patrimônio e quadro societário, com cisão
parcial de seu ativo e diminuição proporcional do capital social.
Ao
final, consulta a esta Comissão se pode incluir,além de bens imóveis , também o
saldo credor do ICMS registrado em seus livros fiscais.
A informação fiscal a fls. 15 limita-se a
afirmar que a consulta atende aos requisitos da Portaria SEF nº 226/01, sem
comentar ou refutar as informações prestadas pela consulente, o que permite
supor a concordância da referida autoridade com as mesmas.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
CF,
art. 155, § 2º, I e II;
CTN,
art. 132.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
O
chamado “crédito fiscal do ICMS” não é um crédito propriamente dito, no
sentido de compor o patrimônio da empresa como um exigível contra a Fazenda
Pública. Apesar da denominação utilizada, o “crédito” decorre da aplicação do
princípio da não-cumulatividade que preside a referida exação. Com efeito,
dispõe o art. 155, § 2º, I, da Constituição Federal que o ICMS “será
não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à
circulação de mercadoria ou prestação de serviços com o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”. Esse imposto
cobrado nas operações ou prestações anteriores constitui o referido “crédito”
que tem sua existência vinculada estritamente ao débito subseqüente que poderá
ser com ele compensado.
Tanto
o “crédito” existe apenas para compensar o “débito” correspondente à
subseqüente operação de saída, que na inexistência de “débito”, o crédito deve
ser estornado. Essa a regra do inciso II, “b”, do mesmo dispositivo citado: “a
isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação,
acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores”.
Conforme
magistério de Ricardo Lobo Torres (Sistemas Constitucionais Tributários. In:
Tratado de Direito Tributário Brasileiro. v. II, t. II, Rio de Janeiro:
Forense, 1986, p. 301): “O crédito deve ser real ou verdadeiro,
ou seja, deve corresponder a imposto pago na operação anterior. Crédito simbólico
ou presumido é incentivo fiscal, por não decorrer do mecanismo da
não-cumulatividade.” Esclarece ainda o
mesmo autor (op.cit., p. 297):
“O
que conta para o Direito Tributário é que o tributo incide sobre o valor
total de cada operação.
Posteriormente, para garantir a não-cumulatividade do tributo, atua o
mecanismo da compensação financeira, pelo qual se abate do débito
correspondente à alíquota aplicada sobre o valor da saída do estabelecimento o
crédito gerado na entrada da mercadoria. Não se trata, aí, rigorosamente, no
sentido técnico-jurídico, de compensação tributária, pois os créditos não são
líquidos e certos; cuida-se de uma operação que, no dizer de Berliri, apenas descritivamente
é uma compensação de créditos e débitos.”
Na
mesma senda, lecionam Geraldo Ataliba e Cléber Giardino, em artigo já clássico
(ICM – Abatimento constitucional – Princípio da não cumulatividade. RDT
29/30: 110-126):
“O
delineamento de um regime jurídico subjetivo peculiar (para o contribuinte), no
qual se envolve um direito constitucional de abater certa quantia do valor do
imposto a pagar, faz o ICM, juridicamente, um tributo com características
especiais, ou seja não-cumulativo. Daí que esta sua particular
compostura e natureza não se perde (o ICM absolutamente não se torna
cumulativo) se, à discrição do contribuinte, o abatimento in concretu
não se realiza. Fica frustrada e comprometida, isto sim, e inexoravelmente, se
e quando a ele – contribuinte – é negada a faculdade constitucional de abater
(embora presentes os requisitos constitucionais para tanto).”
Contudo,
a consulta, conforme informação da consulente, relaciona-se com uma planejada
cisão do ativo da empresa e redução do seu capital social. Ora, dispõe o art.
132 do Código Tributário Nacional que “a pessoa jurídica de direito privado que
resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra é responsável pelos
tributos devidos até a data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado
fusionadas, transformadas ou incorporadas”.
No
mesmo tratamento deve ser incluída a cisão, como, de resto, reconhece a
jurisprudência: “Transformação, incorporação, fusão e cisão constituem várias
facetas de um só instituto: a transformação das sociedades. Todos eles são
fenômenos de natureza civil, envolvendo apenas as sociedades objeto da
metamorfose e os respectivos donos de cotas ou ações. Em todo o encadeamento da
transformação não ocorre qualquer operação comercial” (STJ, 1ª Turma, REsp
242.721 SC).
A
seu turno, comenta Sacha Calmon N. Coelho (In: Comentários ao Código
Tributário Nacional. Coord. Carlos Valder do Nascimento, Forense, 1997, p.
313): “Entendemos que a disciplina legal
deve estender-se aos casos de cisão, por isso que configuram uma forma
de mutação empresarial. ‘Onde a mesma razão, a mesma disposição”, já ensinavam
os praxistas, com espeque na clarividência jurídica dos jurisconsultos
romanos”.
A
sucessora, portanto, responde pelas dívidas tributárias da sucedida, até o
momento em que ocorrer a mutação empresarial. Outra questão refere-se à saída
promovida pela sucessora de mercadorias de propriedade da sucedida que lhe
coube em razão da cisão. O art. 155 do Anexo 5 assegura a transferência para a
sucessora dos livros fiscais em uso da sucedida, quer dizer, dos créditos
correspondentes à aquisição das mesmas mercadorias. O dispositivo vem ao
encontro do princípio da não-cumulatividade prestigiado pela Lei Maior.
Posto
isto, responda-se à consulente:
a)
o saldo credor de ICMS existente em conta gráfica não pode ser incluído no rol
de bens e direitos em processo de cisão parcial do patrimônio da consulente;
b)
a empresa ou empresas sucessoras respondem pelas dívidas tributárias da
sucedida até o momento da cisão;
c)
fica assegurado às sucessoras o crédito fiscal correspondente à aquisição das
mercadorias da sucedida que lhe couberem no processo de cisão, em homenagem ao
princípio da não-cumulatividade.
À
superior consideração da Comissão.
Getri,
em Florianópolis, 5 de maio de 2005.
Velocino Pacheco Filho
AFRE – matr. 184244-7
De
acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat
na Sessão do dia 17 de maio de 2005.
Josiane de Souza Corrêa
Silva Vera Beatriz da
Silva Oliveira
Secretário Executivo
Presidente