EMENTA: ICMS. MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS IMPORTADOS.
REGIME ESPECIAL PERMITINDO LANÇAMENTO A DÉBITO NO LIVRO RAICMS.
NORMA REVOGADA. RESPOSTA APLICA-SE APENAS A PERÍODO ANTERIOR.
NÃO SE TRATA DE MERA POSTERGAÇÃO DO PAGAMENTO DO IMPOSTO, MAS DE ALTERAÇÃO DO REGIME
DE APURAÇÃO QUE DEIXA DE SER POR MERCADORIA POR OPERAÇÃO PARA SER POR PERÍODO
(CONTA-CORRENTE FISCAL).
ANULAÇÃO DO IMPOSTO A RECOLHER NÃO CONFIGURA ISENÇÃO QUE ATUA NA COMPOSIÇÃO DA
HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA.
CONSULTA Nº: 50/2001
PROCESSO Nº: GR14 81523/00-9
01 - DA CONSULTA
Cuida-se
de consulta, formulada por Fiscal de Tributos Estaduais, sobre a interpretação
do art. 53, § 7°, II do Regulamento do ICMS/97, na redação dada pelo Decreto n°
234/99. O indigitado dispositivo refere-se à possibilidade de, por regime
especial, ser permitido ao contribuinte lançar diretamente a débito no livro
Registro de Apuração o ICMS devido pela importação de máquinas e equipamentos,
destinados ao ativo imobilizado do importador. O consulente expõe o seu
pensamento nos seguintes termos:
.... o regime especial permite apenas que o
contribuinte postergue o pagamento do ICMS devido na importação, do momento do
desembaraço aduaneiro para um momento seguinte quando o bem já estará no
estabelecimento do contribuinte.
Desta forma, não seria lícito ao contribuinte lançar o
valor do imposto devido na importação, a débito e a crédito no mesmo período de
apuração, porque, se desta forma proceder, estará concedendo uma isenção de
imposto devido, o que, conforme o CTN, só poderá ser concedido por lei e não
por uma simples alteração do Regulamento do ICMS.
Se os lançamentos de débito e crédito forem efetuados
concomitantemente no mesmo período de apuração do ICMS, o efeito será nenhum,
sendo que ocorreu o fato gerador do imposto e não há nenhuma norma isentiva
prevista para acobertar esta falta de pagamento do imposto devido por ocasião
da importação.
Entendo que o contribuinte deve apenas fazer o
lançamento de débito, conforme autorização do regime especial, e no mês
seguinte por ocasião do recolhimento do imposto da importação que está embutido
no saldo devedor do contribuinte, o mesmo poderá creditar-se deste valor.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição
Federal, art. 155, § 2°, I;
Lei
Complementar n° 87/96, arts. 19 e 20;
Lei
n° 10.297/96, arts. 21, 22, 32 e 33, II;
RICMS-SC/97, arts. 39 e 53, § 7°, II.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Preliminarmente
deve-se observar que o dispositivo questionado (RICMS/97, art. 53, § 7°, II)
foi revogado pelo Decreto n° 2.150, de 12-03-01, que introduziu a Alteração n°
632 ao Regulamento, o que torna superada a matéria da consulta em relação a
fatos futuros. A presente consulta subsiste apenas em relação a fatos
anteriores à Alteração n° 632.
Por
outro lado, a Alteração n° 521, introduzida pelo Decreto n° 1.527, de 31-03-00,
deu nova redação ao art. 39 do RICMS/97: o crédito do ativo imobilizado deixa
de ser apropriado todo de uma só vez, passando a ser apropriado à razão de 1/48
(um quarenta e oito avos) por mês. Então, a regra de recolhimento do imposto é
diferente da regra de aproveitamento do crédito. Ao importar bens para
integração ao seu ativo imobilizado, o importador deve pagar todo o imposto de
uma só vez. Já o aproveitamento do correspondente crédito será feito
parceladamente ao longo de quatro anos.
O
campo da consulta fica portanto restrito ao período anterior à Alteração 521,
quando tanto o recolhimento do imposto quanto a apropriação do crédito eram
feitas pelos seus valores integrais.
Enfrentando
finalmente a questão proposta, iniciaremos por examinar em que consiste a
não-cumulatividade do ICMS. Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do
ICMS, 1997, p. 130) distingue entre a não-cumulatividade como princípio e como
técnica. É princípio "quando enunciada de forma genérica" como no art.
155, § 2°, I, da Constituição Federal:
Em tal enunciado não se estabelece exaustivamente o
modo pelo qual será efetivada a não-cumulatividade. Não se estabelece a
técnica. Tem-se simplesmente o princípio que, aliás, está mal expresso, como
adiante será demonstrado.
A técnica da não-cumulatividade, a seu turno, é o modo
pelo qual se realiza o princípio. Técnica é "maneira ou habilidade
especial de executar algo". Assim a técnica da não-cumulatividade é o modo
pelo qual se executa, ou se efetiva o princípio.
Ora
a Constituição enuncia o princípio como a compensação do que "for
devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou
prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo
ou outro Estado ou pelo Distrito Federal". A redação da Lei Maior sugere
uma relação temporal entre a incidência do imposto e o crédito, na medida em
que este é conceituado como imposto cobrado nas operações anteriores relativas
à circulação de mercadorias ou prestação de serviços. Entretanto essa relação
de temporalidade não permanece quando examinamos os dispositivos que tratam da
não cumulatividade como técnica.
Em
sede de ICMS, não basta aplicar a alíquota sobre a base de cálculo para
determinar-se o valor do imposto a ser recolhido. É preciso ainda compensar o
imposto cobrado nas operações anteriores. É o que chamamos apuração do
imposto. A Lei n° 10.297/96 elege como técnica genérica a apuração por período:
"o imposto a recolher será apurado mensalmente, pelo confronto entre os
débitos e os créditos escriturados durante o mês, em cada estabelecimento do
sujeito passivo" (art. 32). Essa forma de apuração, conhecida como conta-corrente
fiscal, admite a escrituração de créditos do imposto no mês em que as
mercadorias ou insumos entrarem no estabelecimento e sua utilização para
compensar o imposto devido no mês, sem levar em conta se a mercadoria a que se
referem já gerou débito. Assim, o conta corrente fiscal não leva em conta
qualquer relação de temporalidade entre o crédito e o débito do imposto.
O
art. 33 prevê outras formas de apuração, "em substituição ao regime de
apuração mencionado no art. 32", quais sejam: a) por mercadoria ou serviço
dentro de determinado período, b) por mercadoria ou serviço em cada operação ou
prestação e c) por operação ou prestação. O ICMS devido na entrada de
mercadoria importada do exterior do país será apurado por mercadoria em cada
operação (art. 33, II).
A
consulta reporta-se ao inciso II do parágrafo 7° do art. 53 do RICMS-SC/97. O
art. 53 trata da apuração por período (conta-corrente fiscal). O § 7°, II, diz
o seguinte:
O imposto devido na entrada de máquinas e equipamentos
importados diretamente do exterior do país, destinados ao ativo permanente do
importador adquirente, poderá, mediante regime especial concedido pelo
Diretor de Administração Tributária, ser lançado diretamente a débito no
livro Registro de Apuração do ICMS, no período de apuração em que for efetuado
o desembaraço.
O
dispositivo comentado não "permite apenas que o contribuinte postergue o
pagamento do ICMS devido na importação, do momento do desembaraço aduaneiro
para um momento seguinte quando o bem já estará no estabelecimento do
contribuinte". Mais que isso, o regime especial muda o regime de apuração
do imposto para o regime de conta-corrente fiscal. Ou seja, não se exige
nenhuma relação de temporalidade para que se proceda à compensação do imposto.
O
dispositivo é questionável, do ponto de vista da política fiscal, precisamente
porque não produz qualquer efeito: o crédito anula o débito. Ou melhor, produz
o efeito adverso de tornar os bens importados mais competitivos que os
nacionais, que vêm onerados pelo imposto. Com razão o dispositivo foi revogado.
Mas,
ao contrário do que pensa o consulente, não corresponde à isenção concedida por
regime especial e sem respaldo em lei. Conforme a tipologia exonerativa
proposta por Sacha Calmon Navarro Coelho (Teoria Geral do Tributo e da
Exoneração Tributária, 1999), a isenção atua na hipótese de incidência do
tributo:
Os dispositivos isencionais assim como os imunizantes
"entram" na composição das hipóteses de incidência das normas de
tributação, delimitando o perfil impositivo do "fato jurígeno" eleito
pelo legislador.
A isenção como também a imunidade não excluem o
crédito, obstam a própria incidência, impedindo que se instaure a obrigação.
À
evidência, não é disso que se trata. Não se nega a ocorrência do fato gerador
do imposto e a incidência da norma de tributação. Porém o débito do imposto é
no mesmo momento compensado pelo crédito fiscal correspondente. O fenômeno é
radicalmente distinto da isenção, residindo não na hipótese de incidência mas
na apuração do imposto a recolher. Ademais, o aproveitamento do crédito acha-se
condicionado ao tratamento tributário das operações subseqüentes, devendo ser estornado
se isentas ou não tributadas.
Isto
posto, responda-se ao consulente:
a) o dispositivo sobre o qual
versa a consulta foi revogado, ficando a resposta restrita ao período anterior;
b) o regime especial não se
limitava a postergar o momento do recolhimento do imposto, mas efetivamente
mudava o regime de apuração, permitindo que o crédito fosse apropriado no mesmo
período de apuração do registro do débito (onde a lei não distingue, não cabe
ao intérprete distinguir);
c) não se cuida de isenção de tributos
que atua na composição da hipótese de incidência, mas de regime de compensação
do imposto.
À superior consideração da
Comissão.
Getri, em Florianópolis, 14 de
agosto de 2001.
Velocino
Pacheco Filho
FTE -
matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 4 de outubro de 2001.
Laudenir Fernando Petroncini João
Paulo Mosena
Secretário Executivo Presidente da Copat