ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
RESPOSTA CONSULTA 77/2025

N° Processo 2570000018874


Ementa

ICMS. CISÃO PARCIAL. RECOLHIMENTO PARCELADO DO ICMS DEVIDO NA IMPORTAÇÃO DE BEM DESTINADO AO ATIVO IMOBILIZADO. A transferência de bens do ativo imobilizado para nova empresa, ainda que resultante de cisão parcial, caracteriza-se como alienação para fins do art. 53, §7º, I, §8º, III e §25, do RICMS/SC, com a consequente necessidade de recolhimento do montante proporcional ao número de meses restantes para encerramento do período previsto para se completar o pagamento do imposto, contado a partir do mês da ocorrência da alienação ou sua transferência. O saldo credor em relação ao patrimônio transferido poderá ser apropriado pela empresa cindenda, que receberá o bem, conforme o regramento previsto nos arts. 37 e seguintes, do RICMS/SC.


Da Consulta

Trata-se a presente de consulta formulada por empresa em processo de reorganização societária por meio de cisão parcial.

 

A consulente informa que, como parte dessa reorganização, irá transferir para uma nova empresa (cindenda) máquinas e equipamentos de seu ativo imobilizado. Esclarece que tais ativos foram importados com o benefício previsto no art. 53, §7º, I, do RICMS/SC, que consiste no lançamento parcelado do ICMS devido na importação.

 

A legislação condiciona a manutenção do benefício à permanência do bem no ativo imobilizado do importador original, prevendo o recolhimento antecipado do saldo devedor em caso de “alienação” ou transferência para outra unidade da Federação. A dúvida da consulente reside em saber se a transferência dos bens por meio da cisão parcial para uma empresa do mesmo grupo econômico configura a "alienação" mencionada na legislação, o que implicaria na perda do benefício.

 

A consulente entende que a operação de cisão não se caracteriza como alienação, mas sim como uma sucessão de direitos e obrigações, conforme a legislação societária (Lei 6.404/76). Argumenta que os bens permanecem sob o mesmo controle econômico, não havendo transferência de titularidade para terceiros ou ganho econômico que justifique a interrupção do benefício.

 

Diante do exposto, a consulente apresenta os seguintes questionamentos:

 

a) Caso se entenda que a cisão não configura alienação, existe algum impedimento para que a empresa cindenda mantenha o benefício originalmente auferido pela consulente, continuando o pagamento parcelado do ICMS?

b) Sendo possível a manutenção do benefício, como deve ser operacionalizada a transferência do benefício nos registros da Secretaria da Fazenda?

c) Na hipótese de o entendimento ser de que a cisão configura alienação, o ICMS proporcional a ser recolhido poderá ser apropriado como crédito pela empresa cindenda?

d) Em caso afirmativo, o crédito poderá ser apropriado integralmente no momento da cisão ou deverá ser realizado de forma parcelada, conforme as regras de crédito sobre o ativo imobilizado?

 

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

 

É o relatório, passo à análise.


Legislação

RICMS/SC, Anexo 2, art. 53, §7º, I, §8º, III e §25. LC nº 87/96, art. 3º, VI. CTN, arts. 109, 110 e 123. Lei nº 6.404/76, art. 229.


Fundamentação

A matéria objeto da consulta cinge-se a definir a natureza jurídica da transferência de bens do ativo imobilizado no bojo de cisão parcial e seus efeitos sobre benefício fiscal de recolhimento parcelado do ICMS na importação.

 

O benefício em questão, previsto no art. 53, § 7º, I, do RICMS/SC, estabelece a possibilidade de lançamento em parcelas mensais iguais e sucessivas do imposto devido na entrada de máquinas e equipamentos importados e destinados ao ativo permanente do importador adquirente.

 

Não obstante, o § 8º, III do mesmo artigo impõe condição resolutiva ao benefício:

 

“§ 8° A aplicação do disposto no § 7º fica condicionada a que:

[...]

III – o bem importado permaneça no ativo imobilizado do importador até que se complete o pagamento do valor integral do imposto devido no desembaraço aduaneiro.

[...]

§ 25. Na hipótese do inciso III do § 8º deste artigo, deverá ser recolhido o imposto no caso de alienação do bem ou sua transferência para uso em outra unidade da Federação, em montante proporcional ao número de meses restantes para encerramento do período previsto para se completar o pagamento do imposto, contado a partir do mês da ocorrência da alienação ou sua transferência”.

 

A controvérsia, portanto, reside na interpretação do termo "alienação".

 

O art. 109 do CTN prescreve que, na interpretação da norma tributária, os princípios gerais de direito privado devem ser utilizados para a pesquisa da definição, conteúdo e alcance dos institutos, conceitos e formas, mas não para a definição dos efeitos tributários correspondentes.

 

Desse modo, o legislador tributário detém autonomia para criar seus próprios institutos, ficando, no entanto, adstrito ao que dispõe a norma de direito privado, mas somente para pesquisar a definição, conteúdo e alcance dos institutos, conceitos e formas. Com relação aos efeitos fiscais, a norma dispõe que o legislador tributário detém autonomia para fixá-los, sem, no entanto, desconsiderar os princípios gerais de direito privado.

 

O art. 110, por sua vez, estabelece norma de natureza distinta: caso o constituinte tenha se valido de institutos de direito privado na discriminação de competências, a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance dos institutos de direito privado utilizados para tal função.

 

Analisando-se as normas de direito civil, verifica-se que o termo “alienação” tem sentido genérico (vide, por exemplo, arts. 86, 307, 386, 443, 447, 459, 533, 1.245, § 1º, 1.275, entre outros), abarcando, assim, diversos negócios jurídicos específicos e distintos, ainda que sem contraprestação.

 

Pontes de Miranda leciona que a alienação representa negócio jurídico bilateral, pressuposto das alienações, em que duas partes, mediante atos voluntários, acordam e efetivam a transmissão da propriedade de um bem (MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. São Paulo: RT, 2012, t. XIV, p. 217-218).

 

Logo, sendo gênero, o conceito de alienação abarca todas as suas espécies: compra e venda, permuta, doação, subscrição de capital social, dação em pagamento, entre outros. Qualquer negócio jurídico que tenha por objeto e que efetivamente implique a transmissão da propriedade de um bem a terceiro é espécie de alienação.

 

A cisão, por sua vez, é instituto de direito societário, definido pelo art. 229 da Lei nº 6.404/76 como a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

 

Destarte, embora a cisão seja forma de reorganização societária, implica, inegavelmente, em transferência de titularidade patrimonial. Os bens, antes integrantes do patrimônio da pessoa jurídica cindida (consulente), passam a integrar o patrimônio de uma nova e distinta pessoa jurídica (a cindenda), com cadastro e inscrição própria, em obediência ao princípio da autonomia dos estabelecimentos (art. 6º, §2º, Lei nº 10.297/1996).

 

Portanto, ao transferir a propriedade do bem para a nova empresa (cindenda), a consulente deixa de atender à condição imposta pela norma: a permanência do bem no ativo imobilizado do estabelecimento importador. A transferência do bem, mediante cisão, importa na necessidade de recolhimento do montante proporcional ao número de meses restantes para encerramento do período previsto para se completar o pagamento do imposto, contado a partir do mês da ocorrência da alienação ou sua transferência.

 

Corrobora com esse entendimento a fundamentação da Consulta COPAT nº 39/2024, segundo a qual, a despeito de a operação de transformação societária ou alteração de titularidade estar fora do campo de incidência do ICMS, o mesmo não ocorre em relação aos bens e mercadorias envolvidos na transação negocial, que poderão estar ou não sujeitos à incidência do imposto.

 

Não se olvide que o art. 3º, VI, da Lei Complementar nº 87/1996 afasta a incidência do ICMS nas operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de propriedade de estabelecimento industrial, comercial ou de outra espécie. No presente caso, contudo, ocorre a saída das mercadorias e bens do ativo que são apartados do estabelecimento original para ingressarem em outro estabelecimento. Como não há transferência integral do estabelecimento, não há que se falar em aplicação do referido dispositivo.

 

Ora, se a transferência de mercadorias em razão da cisão parcial é considerada operação tributada, não há outra conclusão senão a de que a efetivação da transformação societária configura implementação da condição resolutiva do art. 53, §7º, do RICMS/SC.

 

Ademais, resta claro o caráter intuitu personae da norma tributária; a beneficiária é a empresa importadora, que cumpriu os requisitos quando da fruição do benefício, inexistindo previsão de transferência a terceiro, de forma que as convenções particulares relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos não podem ser opostas à Fazenda Pública (art. 123, do CTN).

 

Por conseguinte, passa-se a responder as questões subsequentes.

 

Quanto ao creditamento, esta Comissão tem reiteradamente entendido que, se o estabelecimento a ser transferido possuir créditos de ICMS em sua escrita fiscal, o sucessor somente terá direito aos créditos relacionados ao estoque transmitido, após a transferência, pois passam a pertencer a ele, visto que se tornará o novo titular do estabelecimento (COPAT nº 03/2024). Sendo assim, o pagamento integral do imposto legitima o direito ao crédito correspondente em favor da empresa cindenda.

 

Contudo, a apropriação desse crédito não pode ser feita de forma integral e imediata. A legislação estabelece sistemática própria para o creditamento de bens do ativo imobilizado, por meio do Controle de Crédito de ICMS do Ativo Permanente (CIAP), disciplinado nos arts. 37 e seguintes do RICMS/SC. O crédito deve ser apropriado à razão de 1/48 (um quarenta e oito avos) por mês, proporcionalmente às saídas tributadas.

 

Assim, a empresa cindenda, ao receber o bem e diante do recolhimento integral do ICMS remanescente, poderá se creditar do valor do imposto efetivamente pago, mas deverá fazê-lo de forma fracionada, nos moldes do CIAP, a partir do mês em que o bem entrar em operação em seu estabelecimento.

 

Restam prejudicados os demais questionamentos.


Resposta

Diante do exposto, proponho que se responda à consulente que:

(a) A transferência de bens do ativo imobilizado para nova empresa, ainda que resultante de cisão parcial, caracteriza-se como alienação para fins do art. 53, §7º, I, §8º, III e §25, do RICMS/SC, com a consequente necessidade de recolhimento do montante proporcional ao número de meses restantes para encerramento do período previsto para se completar o pagamento do imposto, contado a partir do mês da ocorrência da alienação ou sua transferência.

(b) O saldo credor em relação ao patrimônio transferido poderá ser apropriado pela empresa cindenda, que receberá o bem, conforme o regramento previsto nos arts. 37 e seguintes, do RICMS/SC.

 

É o parecer que submeto à apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.



DANIEL BASTOS GASPAROTTO
AUDITOR FISCAL DA RECEITA ESTADUAL - Matrícula: 9507256

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 21/08/2025.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
DILSON JIROO TAKEYAMA Presidente COPAT
FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA Gerente de Tributação
NEWTON GONÇALVES DE SOUZA Presidente do TAT
CAROLINA VIEITAS KRAJNC ALVES Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 01/09/2025 16:55:36