CONSULTA N° 005/2012
EMENTA: ICMS. IMPORTAÇÃO DE BEM PARA O ATIVO IMOBILIZADO DO CONTRIBUINTE. OPERAÇÃO REALIZADA NA MODALIDADE DE “LEASING” INTERNACIONAL. IMPOSTO RECOLHIDO POR OCASIÃO DO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. APROVEITAMENTO DE CRÉDITO ASSEGURADO PELO PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE.
CONTUDO É INAPLICAVEL À HIPÓTESE O DISPOSTO NO ART. 53 DO ANEXO 2 DO RICMS-SC QUE TRATA DE BENEFÍCIO FISCAL, CONCEDIDO POR CONVÊNIO ENTRE OS ESTADOS, CELEBRADO NA FORMA PREVISTA NA LC 24/75, CUJA CONDIÇÃO NÃO SE CONFIGURA NO CASO PRESENTE.
Disponibilizado na página da
SEF em 29.02.12
01 - DA CONSULTA
Cuida-se de consulta formulada por indústria
de materiais plásticos sobre o direito de aproveitamento de crédito relativo ao
ICMS recolhido por ocasião do desembaraço aduaneiro de equipamentos adquiridos
mediante operação de leasing
internacional (CF, art. 155, § 2°, IX, a).
Argumenta
em favor do direito ao crédito que “a possibilidade de utilização do crédito
sob a justificativa da própria incidência do tributo”.
A
consulente levanta ainda os seguintes pontos:
1
– “de acordo com o regulamento do IFRS, a consulente se vê obrigada ao lançamento
societário como ativo imobilizado do bem adquirido, restando senão a condição
de tratamento do bem como se sua propriedade fosse, mesmo estando efetivamente
apenas sob posse e domínio”;
2
– o art. 53 do Anexo 2 do RICMS-SC autoriza o crédito
de ICMS na hipótese de aquisição de bem de empresa com CCICMS do Estado de
Santa Catarina, previsão normativa que não consta da LC 87/96;
3
– manifesta entendimento de que o dispositivo regulamentar mencionado representa
restrição ilegítima à utilização do crédito, com fundamento no princípio da não-cumulatividade;
4
– invoca a Resolução Normativa n° 20, desta
Comissão, do seguinte teor:
“ICMS.
Ocorre o fato gerador do imposto na importação de mercadoria do exterior, adquirida
por arrendamento mercantil. O fato gerador, na hipótese, não é o arrendamento
contratado com a empresa estrangeira, mas a própria entrada do equipamento
importado do exterior do país”.
Informação
da 5ª Gerfe examinou os requisitos de
admissibilidade da consulta.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição
Federal, art. 155, § 2°, I, II e XII, “c”;
Lei
Complementar 87, de 13 de setembro de 1996, art. 20;
RICMS-SC,
aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, art. 53;
03 - FUNDAMENTAÇÃO E
RESPOSTA
A
consulta restringe-se ao direito ao crédito relativo ao ICMS pago por ocasião
do desembaraço aduaneiro. Assim, não será abordada a questão, apenas
tangenciada pela consulta, da incidência de ICMS sobre os contratos de leasing.
O
direito ao crédito tem sede no próprio texto constitucional (art. 155, § 2°,
I e II), como uma garantia dada ao contribuinte: “o imposto será não
cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à
circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.
No escólio de Roque Antonio Carrazza (ICMS.
6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 209):
“A
Constituição, ao aludir à “compensação”, consagrou a idéia que a quantia a ser
desembolsada pelo contribuinte a título de ICMS é o resultado de uma subtração em que o minuendo é o montante de imposto devido e o subtraendo é o montante do imposto anteriormente cobrado”.
“O
realizador da operação ou prestação tem o direito constitucional subjetivo de
abater do montante de ICMS a recolher os
valores cobrados (na acepção acima fixada), a esse título, nas operações ou
prestações anteriores. O contribuinte, se for o caso, apenas recolhe, em dinheiro,
aos cofres públicos a diferença
resultante da operação matemática”.
Ainda
conforme disposto na Constituição, o crédito somente não será permitido no caso
de isenção ou não incidência, relativa a (i) entrada
da mercadoria no estabelecimento ou (ii) na saída subseqüente. A competência do
legislador infraconstitucional, nessa matéria, é limitada, já que as normas
constitucionais não podem ser modificadas ou contraditadas por normas de inferior hierarquia.
Nesse
sentido, já decidiu a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento do Recurso Especial 773.675 RS (RDDT 141: 230):
“4. Destarte, o direito à
compensação consubstancia um direito subjetivo do contribuinte, que não pode
ser restringido, senão pela própria Constituição Federal. Evidenciado resulta
que a norma constitucional definiu integralmente a forma pela qual se daria a não-cumulatividade do ICM, deixando patente que somente nos
casos de isenção ou não-incidência não haveria crédito para compensação com o
montante devido nas operações seguintes ou exsurgiria
a anulação do crédito relativo às operações anteriores (art. 155, § 2°, II)”.
“5. Ressoa inequívoco,
portanto, que o direito de abatimento , quando presentes os requisitos constitucionais,
é norma cogente, oponível ao Estado ou ao Distrito Federal. A seu turno, os
sucessivos contribuintes devem, para efeito de calcular o imposto devido pela
operação de saída da mercadoria do seu estabelecimento, abater o que antes e, a
título idêntico, dever-se-ia ter pago, a fim de evitar a oneração
em cascata do objeto tributado, dando, assim, plena eficácia à norma constitucional
veiculadora do
princípio da não-cumulatividade. Percebe-se, assim,
que o creditamento não é mera faculdade do
contribuinte, mas dever para o ordenamento jurídico objetivo, não lhe sendo
possível renunciar ao lançamento do crédito do imposto, mesmo que tal prática
lhe fosse conveniente. Sequer a própria lei poderia autorizá-lo a tanto, sob
pena de patente inconstitucionalidade.”
O regime de compensação pode
ser físico ou financeiro, conforme dispuser lei complementar. Com efeito, o
art. 155, § 2°, XII, “c” dispõe que “cabe à lei complementar disciplinar
o regime de compensação do imposto”. Sobre a distinção entre os dois regimes, o
leciona Hugo de Brito Machado (Aspectos
Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 131):
“Entende-se como regime de
crédito financeiro aquele no qual todos os custos, em sentido amplo, que vierem
onerados pelo ICMS, ensejam o crédito respectivo. Sempre que a empresa suporta
um custo, seja ele consubstanciado no preço de um serviço, ou de um bem, e quer
seja ele destinado à revenda, à utilização como matéria-prima, produto
intermediário, embalagem, acondicionamento, ou mesmo ao consumo ou à
imobilização, o ônus do ICMS respectivo configura um crédito desse imposto”.
O regime de créditos
financeiros foi adotado pela Lei Complementar 87/96, que dispõe em seu art. 20:
“Para a compensação a que se
refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de
creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operação de que tenha resultado
a entrada de mercadoria, real ou simbolicamente, no estabelecimento,
inclusive a destinada ao seu uso e consumo ou ao ativo permanente, ou o
recebimento de serviço de transporte intermunicipal ou de comunicação”.
Ordinariamente, o contrato de
leasing não caracteriza fato gerador
do ICMS, por não haver efetiva circulação de mercadoria, circunstância que
somente ocorre quando o arrendatário exerce a opção de compra do bem arrendado
ao final do contrato. A exceção é precisamente o leasing internacional, quando o bem for destinado ao ativo fixo,
conforme decidido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento dos Embargos no Recurso Especial 783.814 RJ.
O disposto no art. 53 do Anexo 2 é norma prevista no Convênio ICMS 4/97, celebrado
entre os Estados e o Distrito Federal, nos termos da Lei Complementar 24/75.
Trata-se portanto de benefício fiscal e não de aplicação do princípio da não-cumulatividade. Com efeito, dispõe a Cláusula Primeira
do referido Convênio: “na operação de arrendamento mercantil, ficam os Estados
e o Distrito Federal autorizados a conceder ao estabelecimento arrendatário do
bem o crédito do imposto pago quando da aquisição do referido bem pela empresa arrendadora”.
Pelas regras previstas no
art. 155, § 2°, I e II, da Constituição Federal, o arrendatário somente
teria direito a crédito do ICMS por ocasião do exercício da opção de compra e
correspondente à incidência do tributo sobre essa operação. Entretanto, o
Convênio 4/97 trata da apropriação do crédito pelo arrendatário correspondente
ao imposto relativo à aquisição do bem pelo arrendante.
Neste caso, está caracterizado o benefício fiscal.
Esse o contexto em que deve
ser entendido o disposto no § 1° da Cláusula Primeira do Convênio 4/97:
“para fruição deste benefício a empresa arrendadora
deverá possuir inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS da unidade federada
de localização do arrendatário, através da qual promoverá a aquisição do respectivo
bem”.
Então estamos falando de
benefício fiscal (regra do “caput”) e da condição para o gozo do benefício
(regra do parágrafo).
Posto
isto, responda-se à consulente:
a)
o crédito do ICMS corresponde a imposto pago em etapas anteriores de comercialização
– no caso, relativo à importação do bem para o ativo imobilizado;
b)
não se aplica à hipótese o disposto no art. 53 do Anexo 2
do RICMS-SC que não trata de aplicação do princípio da não-cumulatividade,
mas de benefício fiscal, concedido por convênio entre os Estados, celebrado na
forma prevista na LC 24/75.
À
superior consideração da Comissão.
Copat, em Florianópolis, 6 de janeiro de 2012.
Velocino Pacheco
Filho
AFRE – matr. 184244-7
De
acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat
na Sessão do dia 16 de fevereiro de 2012.
A
resposta à presente consulta poderá, nos termos do
art. 11 da Portaria SEF 226/2001, ser modificada a qualquer tempo, por
deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em
decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução
Normativa que adote diverso entendimento.
Marise Beatriz Kempa Carlos Roberto Molim
Secretária Executiva
Presidente da Copat