EMENTA:
ICMS. IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM
DE TERCEIRO. IMPORTADOR BENEFICIADO PELO PROGRAMA PRÓ-EMPREGO.
1.
a legislação tributária catarinense não distingue entre importação por conta
própria e importação por conta e ordem de terceiro, aplicando-se o benefício indiferentemente
a uma e outra modalidade (Convênio ICMS 135/2002);
2.
para a caracterização do fato gerador, basta que a saída da mercadoria do
estabelecimento importador se caracterize como operação de circulação de mercadorias,
não importando qual tenha sido o negócio jurídico, desde que tenha resultado em
mudança de titularidade das mercadorias;
3.
o art. 8º, III, do Decreto 105/2007, refere-se à destinação dada à mercadoria
importada pelo importador, não importando se o adquirente lhe der outra
destinação (industrialização, incorporação ao ativo imobilizado etc.).
Disponibilizado na página da
SEF em 15.08.12
01 - DA
CONSULTA
A consulente em epigrafe, identifica-se como
empresa que opera no comércio exterior. Informa que realiza importações tanto
por conta própria como por conta e ordem de terceiros. Para tanto é detentora
de regime especial que lhe permite diferir o ICMS devido por ocasião do desembaraço
aduaneiro de mercadorias destinadas à comercialização, nos termos do art. 10,
III, do Anexo 3 do RICMS-SC.
Isto posto, formula as
seguintes questões a esta Comissão:
a) o diferimento do ICMS
relativo à importação aplica-se a todas as importações autorizadas pela Receita
Federal: por conta própria, por conta e ordem de terceiros ou por encomenda?
b) o diferimento aplica-se à
importação por conta e ordem de terceiro, ainda que a operação subseqüente à
importação consigne apenas “remessa por conta e ordem” ao real adquirente e não
“venda de mercadorias”?
c) as mercadorias importadas
revendidas ou remetidas aos seus clientes entende-se como “destinadas à
comercialização”, ainda que seja utilizadas pelos adquirentes como matérias-primas
em processo de industrialização?
A consulta foi informada,
fls. 25-36, pela Gerência de origem que verificou os pressupostos formais ao
recebimento da consulta. No tocante ao TTD, informa que a consulente é
beneficiada pelo Programa Pró-Emprego (Decreto 105/2007, art. 8º, III, § 6º, I
e II, e § 10) e não pelo art. 10, III, do Anexo 5, como declara a consulente.
No mérito, analisa as diferentes modalidades de importação, revisa as consultas
Copat pertinentes à matéria consultada e conclui nos seguintes termos:
“a) a legislação catarinense
não conceitua ou trata de modo específico e diferenciado a denominada
importação por conta e ordem de terceiro;
b) tal modalidade de
importação é tratada como as demais espécies de modalidades de importação (por
conta própria ou por encomenda), respeitadas as respectivas peculiaridades
(existe fato gerador para o ICMS no desembaraço aduaneiro e fato gerador para a
saída subseqüente, não importando a que título se dê tal fato);
c) para fins de fruição dos
benefícios fiscais em operações realizadas por trading detentora de TTD relativo à importação para comercialização
(diferimento do ICMS devido no desembaraço aduaneiro, crédito presumido na
saída subseqüente à importação, e diferimento parcial na saída interna
subseqüente), as operações de importação por conta e ordem de terceiro
(importação e saída subsequente) são equiparadas à comercialização, embora tecnicamente
não o sejam;
d) considerando a conclusão
da alínea “c” acima, não importa qual o destino a ser dado a mercadoria
importada pela trading em nome do
adquirente (se para comercialização, para industrialização, para consumo ou
para integração ao ativo imobilizado). Para fins fiscais, perante o ICMS catarinense,
a operação realizada pela trading é
equiparada à comercialização”.
02 -
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Decreto 105, de 14 de março
de 2007, art. 8º, III, § 6º, I e II, e § 10;
Convênio ICMS 135/2002.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Antes de entrar na matéria da
consulta propriamente dita, seria proveitoso estabelecer alguns conceitos
básicos.
O direito tributário, a teor
do disposto no art. 24, I, da Constituição Federal, é de competência
concorrente entre União, Estados e Distrito Federal. Conforme § 1º do mesmo
artigo, no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limita-se a
estabelecer normas gerais. Já o art. 146 da Carta reserva à lei complementar as
seguintes matérias: (i) dispor sobre conflitos de competência, (ii) regular as
limitações constitucionais ao poder de tributar e (iii) estabelecer normas
gerais em matéria de legislação tributária. Em suma, a competência da União em
matéria de direito tributário somente obriga os Estados e o Distrito Federal
apenas nas hipóteses expressamente previstas na Constituição. Por conseguinte,
nas demais hipóteses, não há relação de subordinação entre normas tributárias
federais e normas tributárias estaduais.
Superado esse ponto,
examinemos essa modalidade de importação que é a importação por conta e ordem.
A Medida Provisória 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, introduziu as seguintes
alterações aos arts. 32 e 95 do Decreto-lei 37/66:
O parágrafo único do art. 32
passou a prever responsabilidade solidária para o adquirente de mercadoria de
procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem,
por intermédio de pessoa jurídica importadora.
Já o art. 95 teve acrescido
inciso dispondo que responde por infração à legislação do Imposto de
Importação, conjunta ou isoladamente, o adquirente de mercadoria de procedência
estrangeira, no caso da importação realizada por sua conta e ordem, por
intermédio de pessoa jurídica importadora.
Como visto, a modalidade de
importação por conta e ordem de terceiro não foi criada pelo direito comercial,
mas por legislação tributária federal, para fins exclusivamente tributários. Com
efeito, as características e definições da nova modalidade foram estabelecidas
nas Instruções Normativas SRF 225/2002 e 247/2002: assim, define-se “importador
por conta e ordem de terceiros a pessoa jurídica que promover, em seu nome, o
despacho aduaneiro de importação de mercadoria adquirida por outra, em razão de
contrato previamente firmado, que poderá compreender, ainda, a prestação de
outros serviços relacionados com a transação comercial, como a realização de
cotação de preços e a intermediação comercial”. Por outro lado, “entende-se por
adquirente a pessoa jurídica encomendante da mercadoria importada”.
Assim, teríamos, nessa
modalidade de importação a participação de duas empresas, a saber: o importador
e o adquirente que contrata o importador para que providencie o despacho de
importação da mercadoria em seu nome, além de outros serviços como cotação de
preços e intermediação comercial. Assim, nessa modalidade aparece a figura do
“importador de fato” que é o adquirente, o qual promove a importação da
mercadoria, mediante compra internacional, restando ao “importador de direito”
o papel de mero mandatário do adquirente, o qual fornece os recursos financeiros.
Conforme Horácio Villen Neto
e Leonardo Freitas de Castro (Importação por conta e ordem e por encomenda
realizada por trading beneficiária do Fundap: reflexões atuais após o Protocolo
ICMS 23/2009 celebrado entre São Paulo e Espírito Santo. RDDT 181: 57):
“Assim, na importação por
conta e ordem, embora a atuação da empresa importadora possa abranger desde a
simples execução do despacho de importação até a intermediação da negociação no
exterior, contratação do transporte, seguro, entre outros, o importador de fato
é a adquirente, a mandante da importação, aquela que efetivamente faz vir a
mercadoria de outro país, em razão de compra internacional”.
Contudo, os Estados e o
Distrito Federal, coerentemente com o princípio da federação e considerando a
competência concorrente em matéria de direito tributário, celebraram o Convênio
ICMS 135/2002, cuja Cláusula Primeira dispõe o seguinte:
“Cláusula primeira Para efeito de
cumprimento das obrigações tributárias relativas ao ICMS, na saída promovida, a
qualquer título, por estabelecimento importador de mercadoria ou bem por ele
importado do exterior, ainda que tida como efetuada por conta e ordem de
terceiros, não tem aplicação o disposto nas Instruções Normativas SRF nº 247,
de 21 de novembro de 2002, nos artigos 12 e 86 a 88, e SRF nº 225, de 18 de
outubro de 2002, e no Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 7 de 13 de junho
de 2002, ou outros instrumentos normativos que venham a substituí-los”.
Portanto,
para fins de incidência do ICMS, é irrelevante se a importação foi em nome
próprio ou por conta e ordem de terceiros. A legislação tributária estadual não
trata diferenciadamente uma e outra circunstância. Basta que ocorra o fato gerador
do tributo.
Dispõe
o art. 2º, I, da Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1996, que o ICMS tem como
fato gerador as “operações de circulação de mercadorias, inclusive o
fornecimento de alimentação e bebidas em bares e restaurantes e
estabelecimentos similares”.
Discorrendo
sobre o fato gerador do ICMS, leciona Roque Antonio Carrazza (ICMS. 10ª ed. São
Paulo: Malheiros, 2005, p. 40 que “não é só a compra e venda de mercadorias que
abre espaço a este imposto, senão também a troca, a doação, a dação em
pagamento etc. Todas estas ‘operações’ propiciam a circulação jurídica de
mercadorias e, em tese, são passíveis de tributação por meio do ICMS”.
Tratando-se
de importação por conta e ordem de terceiro, a saída da mercadoria do estabelecimento
do importador para o do adquirente caracteriza uma operação de circulação de
mercadorias – ocorre a mudança de titularidade das mercadorias.
No
presente processo, discute-se ainda a abrangência do diferimento previsto no
art. 8º, III, do Decreto 105/2007. O dispositivo referido prevê o diferimento
para a etapa seguinte de circulação à da entrada da mercadoria no
estabelecimento importador, o ICMS devido por ocasião do desembaraço aduaneiro,
na importação realizada por portos, aeroportos ou pontos de fronteira alfandegados,
situados neste Estado de mercadorias destinadas à comercialização por empresa
importadora estabelecida neste Estado.
Com
efeito, a redação do dispositivo não esclarece se a mercadoria deve ser
destinada à comercialização pelo importador ou por quem a adquirir do importador.
Ora, em nome do princípio da razoabilidade não se pode exigir do importador a
pesquisa das intenções do adquirente, para o cumprimento da legislação
tributária. O princípio da razoabilidade exige a consideração das particularidades
individuais dos sujeitos atingidos pelo ato de aplicação concreta do Direito
(cf. Humberto Ávila. Proporcionalidade e direito tributário. Direito
Tributário: homenagem a Alcides Jorge Costa. Coordenação de Luis Eduardo
Schoiueri. Vol. I, São Paulo: Quartier Latin, 2003, pg. 334).
Embora
o dispositivo citado tenha sido revogado pelo art. 3º do Decreto 544, de 27 de
setembro de 2011, a vigência do tratamento tributário diferenciado já concedido
fica garantida pelo art. 23 da Lei 15.510, de 26 de julho de 2011.
Posto isto, responda-se à
consulente:
a) a legislação tributária
catarinense não distingue entre importação por conta própria e importação por
conta e ordem de terceiro, aplicando-se o benefício indiferentemente a uma e outra
modalidade;
b) para a caracterização do
fato gerador, basta que a saída da mercadoria do estabelecimento importador se
caracterize como operação de circulação de mercadorias, não importando qual
tenha sido o negócio jurídico, desde que tenha resultado em mudança de
titularidade das mercadorias;
c) o dispositivo refere-se à
destinação dada à mercadoria importada pelo importador, não importando se o
adquirente lhe der outra destinação (industrialização, incorporação ao ativo
imobilizado etc.)
À superior consideração
da Comissão.
Copat, em Florianópolis, 24
de julho de 2012.
Velocino Pacheco
Filho
AFRE – matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à
consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 2 de
agosto de 2012.
A resposta à presente
consulta poderá, nos termos do art. 11 da Portaria SEF 226/2001, ser modificada
a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à
consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de
Resolução Normativa que adote diverso entendimento.
Marise Beatriz Kempa Carlos Roberto Molim
Secretária Executiva
Presidente da Copat