EMENTA: ICMS.
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. LEGALIDADE.
- É LEGAL A EXIGÊNCIA DO RECOLHIMENTO ANTECIPADO, PELA EMPRESA FABRICANTE, DO
ICMS, INCIDENTE NA REVENDA, PELO COMERCIANTE ATACADISTA OU VAREJISTA, DAS
MERCADORIAS SUJEITAS A ESSE REGIME.
- A LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL (LEI COMPLEMENTAR 44/83, DECRETO-LEI 406/68
E CTN), ATINENTE À CHAMADA SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA "PARA FRENTE"
CONTINUA EM VIGOR, RECEPCIONADA QUE FOI PELA CARTA FEDERAL DE 1988, COM ENDOSSO
DA EMENDA CONSTITUCIONAL 3/93.
- NA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, POR VIA INCIDENTAL, PARA QUE ESTA
PRODUZA EFEITOS ERGA OMNES, O SENADO FEDERAL, A TEOR DO DISPOSTO NO
ART.52, X, DA CARTA MAGNA, DEVE SUSPENDER A EXECUÇÃO DA NORMA, SE ASSIM
DECLARADA PELA CORTE SUPREMA.
CONSULTA Nº: 22/96
PROCESSO Nº: UF14 -
28529/95-2
01 - DA CONSULTA
A empresa acima identificada,
através de seu representante legal, formula consulta visando dirimir dúvidas
sobre a aplicação de dispositivos da legislação tributária, esclarecendo que:
a) a mesma tem como ramo de atividade
a industrialização e o comércio de diversos produtos, entre eles, alguns
sujeitos ao regime de substituição tributária, o que implica no recolhimento do
imposto devido pelo contribuinte substituído;
b) ocorre, porém, que esse
recolhimento antecipado do tributo tem sido julgado inconstitucional por
diversos tribunais;
c) sendo assim, como pretende
comercializar produtos sujeitos a tal regime, indaga se tem o dever de
recolher, com base nos dispositivos legais vigentes, o imposto devido pelo
substituído.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal art. 155, I,
"b" e § 2°, XII, "b".
Decreto-Lei n° 406/68, arts: 2°,
§§ 9° e 10 e 6°, §§ 3° e 4°.
Lei Complementar n° 44/83.
Convênio ICM 66/88, arts: 2°, §
3°; 15; 17 e 25.
Lei 7.547/89, arts: 20; 27, IX,
"b" e 39, § 4°, item III.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
A resposta ao questionamento
suscitado pela consulente envolve a análise mais acurada de dois tópicos, a
saber:
1 - se o regime de substituição
tributária instituído no Estado de Santa Catarina através de lei ordinária e
mediante a celebração de Convênios (Lei Complementar 24/75) está embasado nas
disposições constitucionais e infraconstitucionais e,
2 - se a declaração de
inconstitucionalidade de uma norma (Convênio 66/88), por via incidental,
legitimaria a consulente a não reter, conforme preconizado na legislação
específica, o imposto devido pelo substituído nas operações a serem por ele
praticadas.
Analisaremos, separadamente, cada
um desses tópicos.
Em primeiro lugar, as operações
que a consulente pretende realizar estão, hoje, sujeitas à incidência do ICMS,
imposto bem mais abrangente e complexo que o antigo ICM.
A Constituição de 1988 (art. 155,
I, "b"), em seus artigos 146, III, "a" e 155, § 2°, XII,
"b", atribui à Lei Complementar a definição do tributo, dos
respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes, bem como a
disposição sobre substituição tributária, regime de compensação, concessão e
revogação de isenções, incentivos e benefícios fiscais, etc.
No § 8° do artigo 34 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, entretanto, a Nova Carta dispôs que "se, no
prazo de 60 dias contados da promulgação da Constituição, não for editada a lei
complementar necessária à instituição do imposto de que trata o art. 155, I, b,
os Estados e o Distrito Federal, mediante Convênio celebrado nos termos da Lei
Complementar n° 24, de 07 de janeiro de 1975, fixarão normas para regular
provisoriamente a matéria".
Com base nessa autorização, os
Estados e o Distrito Federal celebraram, em 14 de dezembro de 1988, o Convênio
n° 66/88, que fixou normas para regular provisoriamente o ICMS e deu outras
providências.
Esse convênio tratou
especificamente do fato gerador, da base de cálculo e da sujeição passiva do
ICMS, inclusive por substituição tributária (arts. 2°, § 3°; 15; 17 e 25 do
mesmo) cumprindo as disposições dos artigos 146 e 155 da Carta Federal
supramencionados.
Quando dispõe sobre a sujeição
passiva por substituição, o Convênio n° 66/88 estabelece, no art. 25, inciso II
e parágrafo único, que a lei poderá atribuir a condição de substituto
tributário ao industrial pelo pagamento do imposto devido nas operações
subsequentes dependendo tal substituição de acordo entre os Estados, caso o
responsável e o substituído estejam situados em Unidades Federadas distintas.
Veremos, em seguida, que tal
dispositivo, longe de inovar ou de, como se tem alegado, pretensamente
instituir, in casu, a substituição tributária mediante a antecipação do
recolhimento do ICMS, limitou-se, isto sim, a reproduzir uma disposição
que já existia desde o advento da Lei Complementar n° 44, de 07/12/83.
Os outros artigos (§ 3° do art.
2° e art. 15) tratam, respectivamente, da possibilidade dos Estados exigirem o
pagamento antecipado do imposto e da base de cálculo deste.
Nunca é demais lembrar que o
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina já se manifestou
inúmeras vezes pela legalidade e constitucionalidade do Convênio n° 66/88 e de
outros que o seguiram (ver acórdãos das apelações cíveis n° 38.163 de Ibirama e
36.768 de Videira, além dos proferidos nos julgamentos das apelações cíveis em
mandado de segurança n° 3.161 de Itajaí, 3.131 de Mafra, 3.225 de Chapecó,
3.228 e 3.160, ambos de Joinville).
Em respeito ao princípio da
legalidade foi editada, então, a Lei n° 7.547, de 27 de janeiro de 1989, que
reproduziu e complementou as disposições do Convênio n° 66/88, instituindo o
ICMS no Estado.
Nos artigos 20 e 27, a Lei
7.547/89 tratou da base de cálculo do imposto nos casos de substituição
tributária e dos possíveis substitutos tributários. A redação desses artigos
foi depois alterada pela Lei n° 7.924/90, que manteve as mesmas disposições,
mas alterou a estrutura dos artigos.
De se frisar, ainda, que a Emenda
Constitucional n° 3/93, reforçou a constitucionalidade deste regime,
autorizando, expressamente, a cobrança antecipada do imposto na chamada
substituição tributária "para frente".
Não há, ao nosso ver, portanto,
qualquer mácula ao princípio da legalidade na instituição de tal regime. Ao
contrário, todo este disciplinamento citado, em termos de hierarquia jurídica,
dá o devido embasamento legal (e constitucional) ao regime de substituição
tributária especialmente no tocante aos Convênios celebrados já sob a égide do
ICMS (107/89, 10/89, entre outros).
Neste ponto, é necessário que
abramos um parênteses para que demonstremos nosso ponto de vista no que diz
respeito à celeuma que se criou em torno do Convênio ICM 66/88.
Algumas decisões judiciais, em
especial as proferidas pela 1ª Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça -
e aí estamos nos referindo, inclusive, a essa anexada ao processo pela
consulente a qual, pelo seu conteúdo, gerou a dúvida pela mesma suscitada -,
tem cristalizado o entendimento de que, a uma, referido convênio, embora
respaldado no artigo 34, § 8° do ADCT, não é lei complementar, única norma
constitucional capaz de instituir a substituição tributária nos moldes em que
foi disciplinada; a duas, a dicção desse mesmo artigo 34 é de que os Estados
poderão celebrar convênios para regulamentar provisoriamente o ICMS, porém, tão
somente, no que diz respeito às lacunas existentes e sobre matéria tratada em
dispositivos de lei complementar (Decreto-lei 406/68 e CTN) que não foram
recepcionados pela nova Carta Magna.
Segundo elas, ao instituir a
substituição tributária mediante a "antecipação do recolhimento do
ICMS", o Convênio 66/88 teria ultrapassado os limites, extrapolado a
legislação de regência (Decreto-Lei n° 406/68, art. 1° e 128 do CTN) a que
subordinado.
Por outro lado - e isto explica o
porquê de adentrarmos nessa discussão - esta mesma corrente de pensamento que
defende tal ponto de vista é unânime em reconhecer e entender aplicável um
princípio de hermenêutica, ratificado pela própria Constituição Federal
vigente, a que se convencionou chamar "princípio da recepção".
É oportuno que se transcreva dois
pequenos excertos do voto do Exmo. Sr. Ministro relator, na assentada de
julgamento do Recurso Especial anexado ao presente pela consulente (pgs.09 e
10, respectivamente) e que demonstram, com meridiana clareza, qual o alcance
deste princípio:
....
Com efeito, no sistema jurídico-constitucional
brasileiro, a promulgação de nova Constituição não acarreta, ipso facto, a
ineficácia da legislação preexistente, mas, somente derroga aquela que, com
ela, se mostre incompatível. Embora essa concepção constitua um princípio de
hermenêutica, o legislador constituinte, em relação às questões Tributárias,
foi cauteloso, ou, até mesmo redundante, ao estabelecer no parágrafo 5° do
mesmo artigo 34 do ADCT, verbis:
"§ 5° - Vigente o novo sistema tributário
nacional, fica assegurada a aplicação da legislação anterior, no que não seja
incompatível com ele e com a legislação referida nos §§ 3° e 4°."
O Constituinte, ao editar o parágrafo citado (5°)
pretendeu deixar absolutamente claro o princípio da "recepção", isto
é, que a legislação tributária preexistente continua em vigor, salvante naquilo
que conflitasse com a nova ordem. Portanto, o Decreto-Lei n° 406/68 e o Código
Tributário Nacional, que são Leis Complementares Federais estão em vigor, por
determinação mesma da Constituição (salvante nos pontos que, com ela, foram
incongruentes). Destarte, a teor de regras constitucionais, somente a Lei
Complementar poderá estabelecer normas gerais sobre o fato gerador e base de cálculo,
não podendo a competência para legislar sobre estas matérias, ser conferida aos
Estados, pela via do Convênio. Neste sentido estão cônsones a doutrina e a
jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, como se verá, adiante.
.........
A Constituição, a prevê a possibilidade de convênios,
na órbita dos Estados, se refere a omissão de Lei Complementar para a
"instituição" do imposto de que trata o art. 155, I, b. Instituir
significa "criar, fundar, estabelecer, organizar". Só se cria o que
"inexiste". A Constituição, por isso mesmo, ao permitir, aos Estados,
a fixação de normas, através de Convênio, referiu-se a impostos
"novos", criados pela própria Carta e que, por essa razão, não tinham
disciplinamento em Lei Complementar ou ordinária. E o artigo 155, I, b,
atribui, aos Estados, não só o ICMS, como o "imposto sobre prestação de
serviços de transporte intermunicipal e de comunicação". Foi em relação a
esse último tributo - a incidir sobre serviços de transporte e comunicação -
somente nascido com a promulgação da Carta, que o constituinte outorgou a
regulação provisória, através de convênio. Entretanto, em relação ao ICM, já
existia, antes da Constituição, toda uma legislação disciplinadora (Código
Tributário Nacional e Decreto-Lei n° 406/68), dispensando-se, por óbvio, a
regulamentação por convênio. E essa legislação foi recepcionada (art. 34, § 5°
do ADCT). Nesta Corte, as 1ª e 2ª Turmas já se manifestaram em igual sentido.
É neste argumento, ao nosso ver,
que se encontra a resposta a toda essa discussão que se criou acerca da
legalidade, ou não, da instituição do regime de antecipação do recolhimento do
ICMS através de convênios, em especial, o de n° 66/88.
Tem certo fundamento lógico a
assertiva de que a Constituição, ao permitir aos Estados, a fixação de normas,
através de convênio, se referia a impostos "novos", criados pela
própria Carta e que, por esta razão, não tinham disciplinamento em lei
complementar ou ordinária. É o caso, por exemplo, do "imposto sobre
prestação de serviços de transporte intermunicipal e de comunicação"
incluído no campo de incidência do ICMS pela Constituição de 88 - impostos
únicos que pertenciam à União - e, por isso mesmo, sem disciplinamento
anterior. No entanto, segundo esse mesmo entendimento, em relação ao ICM já
existia, antes da Constituição, toda uma legislação disciplinadora (Código
Tributário Nacional e Decreto-Lei n° 406/68) dispensando-se, evidentemente, a
regulamentação por convênio.
Daí a conclusão a que chegou Ives
Gandra Martins quando escreveu que, se referindo ao Convênio n° 66/88 (in
Sistema Tributário na Constituição de 1988, Saraiva, 1989, p. 288):
"Não há nele nem estrutura, nem perfil de Lei Complementar".
Com igual ponto de vista,
preleciona Geraldo Ataliba, em parecer não publicado:
Ora, se as normas infraconstitucionais anteriores - na
medida em que são compatíveis com a Constituição de 1988, foram recebidas,
passando a integrar a nova ordem jurídica, elas só podem ser modificadas pelo
Congresso Nacional, por maioria absoluta, mediante lei complementar.
(apud Martins, Ives Gandra
- Comentários à Constituição do Brasil, 6° volume, Tomo I, pág. 496, Ed.
Saraiva, 1990).
Parece evidente, portanto, que o
Convênio ICM 66/88, embora respaldado no § 8°, art. 34 do ADCT não é lei
complementar nos estritos termos do inciso XII, § 2°, art. 155 da Carta Magna,
uma vez que convênios celebrados por Secretários de Estado não tem o condão nem
de alterar legislação recepcionada pela nova ordem, nem tampouco de introduzir
inovações legislativas, senão no restrito espaço em que o ICMS foi, por assim
dizer, "expandido".
A lei complementar, portanto, de
que trata esse artigo da Constituição, ainda estaria por ser editada e, por
óbvio, pelo Congresso Nacional e não pelo CONFAZ.
Ocorre, entretanto, que a
pretensa inconstitucionalidade do Convênio 66/88, nessa linha de argumentação,
não acarreta, concomitantemente, a ineficácia dos convênios elaborados com o
intuito de disciplinar o regime de substituição tributária, especialmente,
aqueles celebrados antes do advento da Constituição Federal de 1988 e,
portanto, do próprio Convênio 66/88.
Vejamos porque.
É ponto pacífico tanto entre
aqueles que atacam o referido convênio, quanto entre os que o defendem, que o
Decreto-Lei n° 406/68 - naquilo obviamente que respeita à tributação das
operações de circulação de mercadorias, e excluída a nova tributação incidente
sobre serviços de transporte interestadual e intermunicipal, e de comunicação -
foi recepcionado pelo ordenamento Constitucional de 1988, segundo o princípio
da continuidade da ordem jurídica expresso, sem necessidade, no § 5°, art. 34
do ADCT.
Se assim o é - e sem que se
faça necessário invocar o art. 25, I do Convênio ICM n° 66/88, e emprestar-lhe
eficácia de lei complementar, à sombra do § 8° do art.34 do ADCT - há de
entender-se lícito ao legislador estadual do ICMS atribuir a qualidade de
responsável ao produtor, industrial ou comerciante atacadista pelo tributo
devido nas operações subsequentes, que haverão de ser levadas a cabo por outros
atacadistas ou varejistas.
E isto por uma razão simples: com
o advento da Lei Complementar n° 44, de 7 de dezembro de 1983, foram
acrescentados ao citado Decreto-Lei 406/68, os §§ 3° e 4° ao art. 6° e § 9° ao
art. 2°, estabelecendo, respectivamente, que:
Art. 6° - (Omisso)
..............
§ 3° - A lei estadual poderá atribuir a condição de
responsável:
a) ..........
b) ao produtor, industrial ou comerciante atacadista,
quanto ao imposto devido pelo comerciante varejista;
c) ao produtor ou industrial, quanto ao imposto devido
pelo comerciante atacadista e pelo comerciante varejista;
...........
§ 4° Caso o responsável e o contribuinte substituído
estejam estabelecidos em Estados diversos, a substituição dependerá de convênio
entre os Estados interessados.
Art. 2° - (Omisso)
...............
§ 9° - Quando for atribuída a condição de responsável
ao industrial, ao comerciante atacadista ou ao produtor, relativamente ao
imposto devido pelo comerciante varejista, a base de cálculo do imposto será:
a) o valor da operação promovida pelo responsável,
acrescido da margem estimada de lucro do comerciante varejista obtida mediante
aplicação de percentual fixado em lei sobre aquele valor;
Como se vê, é possível, no
sistema tributário vigente, que recepcionou a legislação tributária
preexistente naquilo que não conflitou com a nova ordem, consoante o preceito
transcrito, atribuir-se ao industrial a responsabilidade pelo tributo devido
pelo atacadista e varejista, onde a base de cálculo da substituição será o
valor da operação promovida pelo responsável, acrescido da margem estimada de
lucro do comerciante varejista.
É portanto, falacioso o argumento
de que o Convênio 66/88 teria "instituído" a substituição tributária
mediante a antecipação do recolhimento do ICMS.
O Convênio 66/88, e aqui voltamos
num ponto que já havíamos tocado anteriormente, não instituiu coisa
alguma a este respeito; ao contrário, ele limitou-se pura e simplesmente a
repetir, com outras palavras, nos artigos já citados anteriormente que
tratam desse assunto, as disposições contidas na referida Lei Complementar
44/83.
Não houve, no tocante à definição
do responsável e da base de cálculo do tributo, qualquer inovação em relação ao
disciplinamento jurídico anterior.
Não se trata, portanto, de
fixação do tributo, nem de sua antecipação, com base em pautas fiscais (ou
outro sistema de fixação de valores prévios). Muito menos se cuida da
instituição do regime de substituição tributária através de convênios. A
consulente industrializa alguns produtos sujeitos a esse regime e a sujeição
passiva, na hipótese, por substituição é aquela disciplinada no art. 6°, § 3°,
do Decreto-Lei 406/68, com a redação que lhe atribuiu a Lei Complementar 44/83.
Não foi nenhuma lei ou decreto do
Estado, tampouco, que criou nova base de cálculo . A alteração foi efetivada
por uma Lei Complementar Federal (LC 44/83), com força suficiente para
alterar outra Lei Complementar (DL 406/68).
Nunca é demais lembrar que a
própria Lei Complementar 44/83 deixou ao alvedrio dos Estados, através de lei
ordinária, atribuir a condição de responsável, ao industrial quanto ao imposto
devido nas operações subsequentes e, ao mesmo tempo, estabeleceu que caso
responsável e contribuinte substituído se localizassem em Estados distintos, a
substituição dependeria de convênio entre as Unidades Federadas em que
estabelecidos esses.
O Estado de Santa Catarina,
atendendo a essa disposição legal, editou, em 29/12/83, a Lei n° 6.322 que,
dando nova redação à Lei n° 4.283, de 13/02/69, estabeleceu em seu artigo 9°,
incisos X e SI e § 2°, o que segue:
Art. 9° - São responsáveis pelo pagamento do imposto
devido :
...........
X - o produtor, industrial ou comerciante atacadista,
quanto ao imposto devido pelo comerciante varejista, nas saídas, a ele
destinadas, das mercadorias arroladas na tabela anexa a esta Lei; e
XI - o produtor ou industrial, quanto ao imposto
devido pelo comerciante atacadista e pelo comerciante varejista, nas saídas,
com destino ao atacadista, das mercadorias arroladas na tabela anexa a esta
Lei.
...........
§ 2° - Nas operações interestaduais, a substituição
prevista nos incisos X e SI do "caput" deste artigo, dependerá de
Convênio a ser celebrado com o Estado de destino ou de procedência da
mercadoria.
O § 9° do art. 4° dessa mesma lei
previu a base de cálculo do imposto devido por esse regime.
Aí está a base legal a
justificar, por esse Estado, a cobrança do imposto devido em virtude da
substituição tributária, no que concerne ao antigo ICM e na Lei 7547/89, nos
artigos já mencionados, no tocante ao ICMS.
Além disso, e é bom que se frise,
todos os convênios celebrados a partir de então pelo Estado de Santa Catarina,
inclusive os referentes ao ICMS, no intuito de disciplinar tal regime,
especialmente nas operações envolvendo outras Unidades da Federação, o foram
porque a Lei Complementar 44, acrescentando parágrafos ao Decreto-Lei
406/88, assim o exigia.
Reiteramos uma vez mais que a
aleitava de que, a pretexto de disciplinar o instituto da substituição
tributária, o Convênio 66/88 e seus subseqüentes: a) instituíram hipótese de "antecipação"
do ICMS, estipulando uma base de cálculo do imposto fictícia; b) exigiram o
pagamento do tributo antes da ocorrência do fato gerador; c) elegeram um
substituto tributário que confronta com o artigo 128 do CTN - parafraseando
parte da ementa do acórdão juntado pela consulente - , se fundamenta no
pressuposto equivocado de que tal convênio teria "criado" o referido
regime como se esse fosse totalmente novo e desconhecido.
Isso não é verdade.
O regime de substituição
tributária foi estatuído através da Lei Complementar Federal n° 44/83, como
visto, norma constitucional recepcionada pelo ordenamento jurídico vigente,
tanto porque contida no Decreto-Lei 406/68, quanto pelo fato de que é
plenamente consentânea e compatível com o que estabelece o art. 155, inciso
XII, letra "b" da Carta Magna atual.
Os convênios, celebrados com o
intuito basicamente de uniformizar a aplicação do regime de substituição
tributária entre os Estados que o instituíram mediante leis próprias, nada mais
fizeram do que obedecer uma exigência expressa em uma norma jurídica
hierarquicamente superior.
Não devem, agora, ser taxados de
inconstitucionais porque se alguma inconstitucionalidade há em relação à
criação da substituição tributária esta, por certo, só pode ser analisada à luz
da Lei Complementar 44/83, esta sim, estatuidora da mesma.
É importante que se saliente que,
no caso específico da consulente, que pretende praticar operações sujeitas a
esse regime, nem há que se questionar a legalidade do Convênio ICM 66/88, no
intuito de se eximir do pagamento do imposto devido pelas operações
subseqüentes, porque os protocolos e convênios que disciplinam a substituição
tributária relativa a bebidas, remontam à época de 1984, muito antes, portanto,
da celebração desse tão discutido convênio, que sequer havia ainda sido
celebrado.
A exigência do pagamento
antecipado do imposto, neste caso, não tem como supedâneo legal o Convênio
66/88 mas os de n° 15/84, 22/85 e 37/85, além dos Protocolos ICM 09/84, 16/84,
05/85, entre outros, com o respaldo da Lei Complementar 44/83, além da já
mencionada Lei estadual n° 6.322/83.
Concluindo, entendemos, até como
dedução lógica do nosso ponto de vista, que o Convênio 66, ao reescrever, neste
particular, a legislação complementar já existente, tratou de matéria desnecessária
à implantação do ICMS.
Como assevera Miguel Reale, em
parecer não publicado, "o referido Decreto-Lei n° 406/68, de conformidade
com o que já tive oportunidade de salientar, nesse como na maior parte de seus
dispositivos, se harmoniza, "mutatis mutandis", com o novo sistema
tributário implantado pela nova Constituição no que se refere à questão basilar
de tributo sobre a circulação de mercadorias e sua incidência sobre
determinados serviços, não tendo cabimento que normas provisórias extralegais
venham tratar da matéria. O § 5° do art. 34, como já asseverei, ressalva
expressamente a vigência do Decreto-Lei n° 406/68, sob pena de
inconstitucionalidade, não havendo, por conseguinte, lacuna alguma a ser
preenchida, mediante Convênio ou leis estaduais, nesse ponto essencial"
(apud Martins, Ives Gandra, op. cit., pág. 487)
Preferimos, por conseguinte, ao
invés de taxar o Convênio 66/88 de inconstitucional, nominá-lo, pura e
simplesmente, de "redundante", neste aspecto.
Com o único intuito de demonstrarmos
que o dissídio jurisprudencial em relação a esse assunto é patente, inclusive e
principalmente entre as duas Turmas que compõem o próprio Superior Tribunal de
Justiça, achamos conveniente citar, em abono a nossa tese, entre diversas
outras, as seguintes decisões judiciais:
ICMS - SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA - COMERCIALIZAÇÃO DE
VEÍCULOS - LEGALIDADE.
Embargos declaratórios - ICMS - Veículos -
Substituição tributária. Restou bem claro no V. aresto embargado que o regime
de substituição tributária é previsto pela própria Constituição Federal
vigente, nas Leis e Convênios firmados pelos Estados, com base no art. 34,
parágrafo 3° e art. (Sic) 8° do ADCT e que esta legislação não contraria os
artigos 121 e 128 do CTN - Embargos rejeitados.
(Ac. un. da 1ª T. do STJ - EDcl
no REsp 35.547-SP-Rel. Min. Garcia Vieira - j. 25.10.93 - DJU I 29.11.93, p.
25.857)
ICMS. BASE DE CÁLCULO. SISTEMA DE SUBSTITUIÇÃO
TRIBUTÁRIA.
I - Após o advento da citada Lei Complementar n° 44/83
ficou estabelecido que, quando for atribuída
a condição de responsável tributário ao comerciante atacadista,
relativamente ao imposto devido pelo comerciante varejista, a base de cálculo
será o valor da operação promovida pelo responsável tributário, acrescido da
margem de lucro atribuída ao revendedor, quando se tratar de mercadorias com
preço de venda máximo ou único, fixado pelo fabricante ou pela autoridade
competente.
II - Legítima a exigência antecipada do ICMS
III - Recurso improvido
(Ac. un. da 1ªT. do STJ - RMS n°
213-0 - MA - Rel. Min. Garcia Vieira - j. 10.12.93 - DJU 28.02.94, publ. LEX
58, pgs. 33 e segs.)
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ICMS. COBRANÇA
ANTECIPADA. VEÍCULOS AUTOMOTORES. CONVÊNIOS 66/88 E 107/89.
DECRETOS-LEI N° 406/68 - ADCT. ART 34. § 8°.
I - A exigência da antecipação do ICMS, na venda de
veículos automotores, não se reveste de ilegalidade ou abusividade.
II - O Decreto-Lei n° 406/68, recepcionado na Nova
Carta, alterado pela Lei Complementar n° 44/83 e o art. 128 do CTN, que se
complementam, consagram a regra da substituição tributária.
III - Recurso não conhecido
(Ac. un. da 2ª T. do STJ - REsp
n° 39.479 - 1 - SP - Rel. Min. Peçanha Martins - j. 06.12.93 - DJU 21.03.94,
publ. LEX 59, pgs. 249 e segs.)
TRIBUTÁRIO - ICMS - COBRANÇA ANTECIPADA -
SUBSTITUIÇÃOTRIBUTÁRIA - FATO GERADOR - OCORRÊNCIA - CONVÊNIOS ICMS 66/88 E
107/89 - PRECEDENTES STJ E STF.
- A exigência da antecipação do ICMS, na venda de
veículos automotores não se reveste de ilegalidade ou abusividade.
- O Decreto-Lei n° 406/68, alterado pela Lei Complementar
n° 44/83 e o art. 128 do CTN, que se complementam, consagram a regra da
substituição tributária.
- Conforme já decidiu esta Corte, "com o
pagamento antecipado não ocorre o recolhimento do imposto antes da ocorrência
do fato gerador. O momento da incidência da Lei não se confunde com a cobrança
do tributo. O fato gerador do ICM é a saída da mercadoria do estabelecimento do
contribuinte".
- Não discrepa deste entendimento orientação traçada
em decisões do STF.
- Recurso Provido.
Do corpo do acórdão, extraímos o
seguinte excerto :
Assim, a exigência do pagamento antecipado do ICMS
nada tem de ilegal ou inconstitucional. A uma, porque o Decreto-lei n° 406/68,
reconhecido como Lei Complementar, está recepcionado na Nova Carta. A duas,
porque amparada nos Convênios 66/88 e 107/89 editados de acordo com o art. 34,
§ 8° do ADCT.
(Ac.un. da 2ª T do STJ - REsp n°
35.534 - SP - Rel. Min. Peçanha Martins - J. 02.08.95).
Precedentes do STF citados no
corpo do acórdão:
ICM - Exigência de pagamento antecipado do imposto,
quando a mercadoria destinar-se a outro Estado. O § 1° do art. 3° do
Decreto-lei 406/68 deferiu à Lei estadual a competência para dispor sobre o
período de apuração do ICM, daí não existir alegado conflito entre a norma
local e a complementar, nem a ocorrência da cumulação vedada pela Constituição
(....).
RE conhecido em parte e, nesta parte, provido.
(STF,
RE n° 108.104, Rel. Min. Célio Borja, DJU
14/08/87, pág. 16.089); e
ICM - Pagamento antecipado. Previsão por Lei Especial
quando se tratar de mercadoria destinada a outro Estado. Admissibilidade.
Competência deferida pelo Decreto-Lei 406/68. Inexistência de conflito entre a
norma local e a complementar. Cumulação também não caracterizada. Observância
do princípio constitucional do abatimento do imposto cobrado na operação
anterior. Inconstitucionalidade afastada.
(STF, RE n° 107.104-O-ES, Rel.
Min.Célio Borja, DJU 14/08/84, RT 662/224).
Sobre o argumento de que, no caso
da substituição tributária, o pagamento do tributo (ICMS) é exigido antes da
ocorrência do fato gerador em concreto, vale destacar:
ICMS - SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA - FATO GERADOR -
INCIDÊNCIA.
É inconfundível o momento da incidência do tributo com
sua cobrança. O fato gerador do ICMS ocorre na saída da mercadoria do
estabelecimento contribuinte; a cobrança do tributo é a última fase concreta,
mas a exigência antecipada do ICMS, na venda de veículos automotores, não se
reveste de ilegalidade ou abusividade. Recurso improvido.
(STJ, 1ª Turma, Recurso Especial
n° 34.353, julgado em 07/06/93, Rel. Min. Garcia Vieira, DJU 16/08/93, pág.
15.972).
ICMS - VEÍCULOS. LEGITIMIDADE AD CAUSAM. SUBSTITUIÇÃO
TRIBUTÁRIA. SUJEITOS PASSIVOS. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA.
I - São sujeitos passivos por substituição, o
industrial, o comerciante ou o prestador do serviço, relativamente ao imposto
devido pelas anteriores ou subsequentes saídas de mercadorias ou prestações de
serviços.
II - Conforme já decidiu esta Corte, "com o
pagamento antecipado não ocorre o recolhimento do imposto antes da ocorrência
do fato gerador. O momento da incidência da lei não se confunde com a cobrança
do tributo. O fato gerador do ICM é a saída da mercadoria do estabelecimento do
contribuinte". Precedentes.
III - Recurso conhecido e provido, no âmbito desta
Corte.
(REsp. n° 50.844 - SP, DJU
10.10.94, Rel. Min. José de Jesus Filho - STJ - 2ª Turma).
Nesse mesmo sentido vide Acórdão
unânime da 1ª Turma do STJ, REsp 35.733-0 - SP, Rel. Min. Garcia Vieira,
julgado em 22.09.93 e publicado no DJU I de 18.10.93, pág. 21.849, além do
REsp. n° 35.570-2 - SP, mesmo Relator, julgado em 10.09.93 e publicado no DJU
de 04.10.94, pág. 20.519.
No que concerne à suposta
incompatibilidade entre a eleição do substituto legal tributário e a dicção do
art. 128 do CTN, que exige que o responsável seja pessoa vinculada ao fato
gerador, vale transcrever o entendimento da Subprocuradora-Geral da República,
Drª Leda Maria Soares Janot, cujo parecer foi transcrito, em parte, pelo Exmo.
Sr. Min. Peçanha Martins, relator do REsp. n° 35.534 - SP, 2ª Turma do STJ, no
julgamento desse, já citado anteriormente:
Em que pese o inconformismo da Recorrente, "data
venia", o apelo não merece prosperar, vez que a Lei Complementar n° 44, de
7 de dezembro de 1983, que alterou o Decreto-lei n° 406 de 31 de dezembro de
1968, - o qual já foi reconhecido como Lei Complementar Normativa do ICM pelo
Pretório Excelso - trouxe consagrado seu art. 6°, § 3°, "c", a
responsabilidade do produtor ou industrial quanto ao imposto devido pelo
comerciante varejista. Assim, não se pode dizer que este dispositivo esteja em
contradição com o art. 128 do CTN, vez que são leis que estão no mesmo nível
hierárquico, e ao invés de contradizerem elas se complementam.
Em segundo lugar, é mister que se
faça à consulente alguns esclarecimentos sobre os critérios em que se examina a
compatibilidade da lei com o Texto maior.
Dois são os sistemas de controle
de constitucionalidade de uma norma: o difuso e o concentrado.
Ambos partem do suposto de que a
presunção de constitucionalidade das leis é juris tantum, isto é, são
constitucionais até que se comprove o contrário. Milita, portanto, a presunção
de validade constitucional em favor de leis e atos normativos do Poder Público,
que só se desfaz quando incide o mecanismo de controle jurisdicional estatuído
na Constituição.
O sistema difuso decorre da
histórica experiência constitucional norte-americana. Admite que a
inconstitucionalidade de lei seja pronunciada por qualquer Juiz ou tribunal,
nos casos concretos a eles submetidos, embora a decisão final, em grau de
recurso, esteja concentrada no tribunal de jurisdição mais elevada e completa
existente no país. A declaração é incidental, afastando a aplicação da lei. Não
há declaração de inconstitucionalidade de lei, em tese.
O sistema concentrado, por sua
vez, tem como fonte a Constituição da Áustria de 1920. Por esse sistema, o
poder de controle se concentra em um único órgão judiciário, que pode ser um
tribunal especial ou o tribunal de jurisdição mais amplo.
No Brasil, este órgão é o STF.
Em suas estruturas clássicas, o
sistema difuso caracteriza-se pelo tipo de controle que se exerce em via
incidental e o sistema concentrado pelo tipo de controle que se exerce através
de ação direta (de inconstitucionalidade) ou de requerimento oriundo mas
desvinculado do caso concreto.
A Constituição brasileira de 1988
optou por um sistema misto: é difuso, na medida em que admite que todos os
juizes deixem de aplicar a lei e que julguem inconstitucional; é concentrado,
na medida em que o STF converteu-se em Corte Constitucional, competindo-lhe
"precipuamente, a guarda da Constituição" (art. 102) e julgar
originariamente a ação direta de inconstitucionalidade (em tese) de lei ou ato
normativo federal ou estadual, bem como, em grau de recurso, os casos concretos
decididos em última instância, cuja decisão declare a inconstitucionalidade de
lei.
Postas estas questões de ordem
conceitual, necessárias a uma melhor compreensão dos dois sistemas de controle
da constitucionalidade das leis e atos normativos, resta saber qual a eficácia
da sentença - ou que efeitos seriam decorrentes dela - que decide a
inconstitucionalidade no controle difuso (também denominado via de exceção) e
qual seria a da sentença proferida no processo da ação direta de
inconstitucionalidade genérica (via controle concentrado, em que a Suprema
Corte decide in abstrato).
Nas diferenças entre estes
efeitos, num e outro caso, é que poderemos encontrar a resposta aos segundo
tópico elencado no início deste parecer e, indiretamente, ao próprio
questionamento da consulente.
Uma das mais importantes
diferenças entre os dois sistemas, e é importantíssimo e conveniente ao caso
que se ressalte, é que apenas a Corte Suprema pode "declarar" por via
de ação direta, a eventual inconstitucionalidade da lei ou ato normativo em
tese, com efeito erga omnes.
Incidentalmente (ou seja, no
curso de uma determinada ação de objetivo diverso), o Magistrado pode apenas e
tão somente "reconhecer" a inconstitucionalidade de um dado
dispositivo legal, por via de execução, com efeito inter partes.
É magistral a lição de Ives
Gandra da Silva Martins a este respeito, em parecer entitulado "Os Efeitos
das Liminares nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade" (publicado no
repertório IOB de jurisprudência n° 08/95, 2ª quinzena de abril, págs. 149/50):
...........
Ao contrário do controle difuso da norma, em que a
relação jurídica em questão é examinada pelo Supremo, valendo sua decisão entre
as partes do processo, no controle abstrato, a decisão da Suprema Corte,
declarando a inconstitucionalidade de determinada norma nasce com eficácia erga
omnes e efeito vinculante.
Discutiu-se se, no controle concentrado, tais efeitos
seriam peculiares apenas às ações declaratórias de constitucionalidade, tendo
em vista a expressa menção feita pelo constituinte de que neste tipo de ação as
decisões proferidas são dotadas de eficácia erga omnes e efeito vinculante,
mais o exame mais aprofundado do dispositivo revela que o efeito vinculante e a
eficácia erga omnes são inerentes ao controle concentrado por qualquer uma das
formas admitidas pelo texto constitucional.
Com efeito, se no controle difuso se exige - e não
entro no mérito da razoabilidade ou não dessa intervenção do legislativo - a
participação do Senado Federal para que dê os respectivos efeitos à decisão
judicial proferida pela Suprema Corte no exercício do controle difuso da
constitucionalidade, decididamente, não teria sentido que no controle
concentrado fosse obrigada a Suprema Corte a submeter-se à resolução do Senado
para estender a sua decisão a todos os cidadãos submetidos à imputação
normativa atingida.
...........
Desta forma no controle concentrado a eficácia é
sempre erga omnes assim como o efeito vinculante, não dependendo, tais
decisões, de resolução senatorial para ganhar tal perfil cogente.
No controle difuso, não. Vale a decisão da Suprema
Corte como sinalizadora para as instâncias inferiores, mas sem o aval do
Senado, não ganha a universalidade das decisões em sede de controle abstrato.
Vale entre as partes, mas não para todos, sequer vinculando a magistratura das
instâncias inferiores a segui-la. Apenas as partes do processo estão
vinculadas, de forma definitiva, no teor da decisão ofertada, exceção feita à
hipótese de rescisória nos casos legais previstos.
No que concerne à natureza da
decisão judicial, no controle por via de exceção, que é o que nos interessa
mais de perto, é conveniente que reproduzamos o pensamento de José Afonso da
Silva e Paulo Luiz Neto Lôbo, respectivamente:
Em primeiro lugar, temos que discutir a eficácia da sentença que decide a inconstitucionalidade
na via de exceção, e que se resolve pelos princípios processuais:
Nesse caso, a argüição da inconstitucionalidade é
questão prejudicial e gera um procedimento incidenter tantum, que busca a
simples verificação da existência ou não do vício alegado. E a sentença é
declaratória. Faz coisa julgada no caso e entre as partes. Mas, no sistema
brasileiro, qualquer que seja o tribunal que a proferiu, não faz ela coisa
julgada em relação à lei declarada inconstitucional, porque qualquer tribunal
ou juiz, em princípio, poderá aplicá-la por entendê-la constitucional enquanto
o Senado Federal, por resolução, não suspender sua executoriedade, como vimos.
O problema deve ser decidido, pois, considerando-se
dois aspectos. No que tange ao caso concreto, a declaração surte efeitos ex
tunc, isto é, fulmina a relação jurídica fundada na lei inconstitucional desde
o seu nascimento. No entanto, a lei continua eficaz e aplicável, até que o
Senado suspenda sua executoriedade; essa manifestação do Senado, que não revoga
nem anula a lei, mas simplesmente lhe retira a eficácia, só tem efeitos, daí
por diante, ex nunc. Pois, até então, a lei existiu. Se existiu, foi aplicada,
revelou eficácia, produziu validamente seus efeitos.
(in Curso de Direito
Constitucional Positivo, 8ª ed, 1992,
Malheiros Editora, pág. 54).
E ainda, do outro autor:
O julgamento incidental de inconstitucionalidade no
caso concreto atinge o plano de eficácia, isto é, nega-se eficácia jurídica ao
ato normativo, nega-se aplicabilidade, o que não pode ser confundido com
inexistência ou invalidade (nulidade ou anulabidade).
O ato normativo continua a existir no ordenamento; não
é revogado. Os tribunais só revogam sentenças dos tribunais. Por esta razão é
que o Poder Legislativo (Senado Federal) é o único competente a suspender a
execução da lei (art. 52, X, da CF) com eficácia erga omnes.
Esclarece ainda Paulo Luiz Neto
Lôbo no mesmo artigo entitulado "O Controle da Constitucionalidade das
Leis e o Direito Adquirido":
Somente quem dita a lei (Legislativo) pode suprimi-la.
O Judiciário revoga decisões judiciárias, não revoga leis ou atos normativos.
Pode deixar de aplicá-los, mas não retirá-los do sistema jurídico. O princípio
constitucional da separação dos poderes (independentes e harmônicos entre si -
art. 2° da CF) importa controle recíproco mas não hegemonia de um sobre outros.
(in Revista de Direito Civil, n°
48, ano 13, abr/jun 1989, págs 104 e 106).
Feitos estes esclarecimentos, já
é possível respondermos porque a consulente não poderia, se assim o desejasse,
escudar-se numa decisão judicial isolada com o escopo de eximir-se da retenção
do imposto devido por substituição tributária:
1° - não se trata, no caso, de
ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e, portanto, não
sendo o caso de controle abstrato de constitucionalidade, a sentença não tem
eficácia erga omnes e tampouco efeito vinculante;
2° - muito embora não haja, no
corpo do acórdão do Recurso Especial anexado ao presente pela consulente, o
reconhecimento expresso, por parte do STJ, da inconstitucionalidade do Convênio
66/88, admitamos que tácita ou implicitamente esse Tribunal assim procedeu.
Se assim o é, a declaração de
inconstitucionalidade, propriamente dita, deve ser proferida por decisão
definitiva do Supremo Tribunal Federal e, mais que isso, a execução da norma
viciada deve ser suspensa pelo Senado Federal (art. 52, X, da C.F.) para que
essa decisão definitiva ganhe universalidade.
Não é o caso do acórdão desta
consulta.
Além disso, uma lei ou ato
normativo só pode ser declarada inconstitucional pelo voto da maioria absoluta
dos membros do órgão especial (art.97 da C.F.) o que, também, não se aplica ao
caso;
3° - Por conseqüência, o acórdão
em que se apega a consulente na tentativa de questionar a constitucionalidade do
regime de substituição tributária vincula, única e exclusivamente, as
partes do processo e não tem o poder de revogar dispositivos do Convênio66/88,
cuja competência para suspensão da execução é do Senado Federal, como visto. A
norma continua a existir no ordenamento, revelando eficácia. Seus efeitos só
são afastados no que se refere ao direito subjetivo apreciado no caso concreto.
Finalmente, e com o claro intuito
de demonstrarmos que nosso ponto de vista encontra amparo na mais recente
jurisprudência a respeito do assunto, vejamos o que decidiu a Primeira Seção do
Superior Tribunal de Justiça na assentada de julgamento dos Embargos de
Divergência no Recurso Especial n° 56.049-5-SP, relator o Exmo. Sr. Min.
Antônio de Pádua Ribeiro, julgado em 20 de junho de 1995 e publicado no DJU de
09/10/95, pág. 33.511:
EMENTA: TRIBUTÁRIO. ICMS. REVENDA DE VEÍCULOS
AUTOMOTORES. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PARA FRENTE. LEGALIDADE.
I - Não é ilegal a exigência do recolhimento
antecipado pela empresa fabricante, do ICMS, incidente na revenda de veículos
pela concessionária.
II - A legislação infraconstitucional, atinente à
chamada "substituição tributária para frente", continua em vigor,
hoje com endosso da Emenda Constitucional n° 3/93.
III - Constituição, art. 155. § 2°, XII, b; E.C. n°
3/93. Decreto-lei n° 406. Lei Complementar n° 44/83. C.T.N., art. 128. Convênio 66/88.
IV - Embargos de divergência conhecidos e recebidos.
Do corpo do acórdão, destacamos:
...........
Com efeito, não há olvidar que o Supremo Tribunal
Federal, teve por constitucional a chamada "substituição tributária para
frente", desde que instituída por lei complementar. Encampado o instituto
pela Constituição em vigor (art. 155, § 2°, XII, b) o Convênio 66/88, (que, por
força do art. 34, § 8°, do ADCT, tem força de lei complementar) o adotou em seu
texto, repetindo, em última análise, as normas da Lei Complementar n° 44, de
1983. Posteriormente, sobreveio a Emenda Constitucional n° 3/93 que, em termos
inequívocos, constitucionalizou o instituto, amplamente utilizado desde o
advento do ICM no nosso sistema tributário.
...........
Em suma: a legislação infraconstitucional, atinente a
chamada "substituição tributária para frente", continua em vigor,
hoje com expresso endosso do texto constitucional antes mencionado.
É cediço que só são admissíveis
os embargos de divergência, uma vez caracterizado o dissídio pretoriano. No
caso específico em análise, como se pode depreender pelo próprio acórdão
anexado pela consulente, a Egrégia Primeira Turma do STJ vinha decidindo pela
ilegalidade do regime de substituição tributária, enquanto que a Segunda Turma
tinha o posicionamento oposto.
A reunião das duas Turmas, no
julgamento dos Embargos de Divergência, tem o escopo justamente de procurar
uniformizar o entendimento a respeito do assunto, dicotômico até então.
Muito embora tal decisão tenha
sido por maioria dos membros que compõem as duas Turmas do STJ, essa representa
sólida manifestação do Poder Judiciário
a respeito, mormente quando não se tem conhecimento de qualquer decisão
recente, especificamente relacionada com este assunto, por parte do S.T.F.
Uma vez que essa decisão é, em
última análise, uma interpretação daquela Corte sobre a estruturalidade da
norma examinada, há de representar a correta exegese do bom direito, uma
orientação a ser seguida por todos aqueles a ela subordinada, em especial, a
própria consulente.
Por todo o exposto, deve-lhe ser
respondido que:
a) o regime de substituição
tributária disposto na Lei Complementar 44/83 e instituído no Estado de Santa
Catarina através de leis ordinárias próprias, tem base legal e constitucional.
Essa legislação infraconstitucional (CTN, L.C. 44/83 e D.L. - 406/68) foi
recepcionada pela nova Constituição sendo de todo despicienda, especialmente no
caso dos produtos a serem comercializados pela consulente, a discussão a
respeito da suposta inconstitucionalidade do Convênio 66/88, já que este, além
de não servir como supedâneo legal á instituição de tal regime, limitou-se a
repetir disposições já contidas em Lei Complementar anterior;
b) além do fato de que a decisão
do aresto da Primeira Turma do STJ, indicado como paradigma pela consulente -
caso entendamos esse como reconhecendo, de forma subentendida, a
inconstitucionalidade do Convênio 66/88 - não tem efeito vinculante nem muito
menos eficácia contra todos, é inquestionável que o STJ, reunindo o pleno, não
só através deste acórdão citado mas de diversos outros julgados publicados no
mesmo DJU de 09/10/95, tem sinalizado pela total legalidade do regime de
substituição tributária devendo portanto a peticionária compulsoriamente
recolher, com base nos dispositivos legais vigentes, o imposto devido pelo
substituído em função das operações por ele praticadas.
É o parecer que submeto à
Comissão.
Gerência de Tributação, em Florianópolis,
22 de março de 1996.
Neander Santos
FTE - Matr. 187.384-9
De acordo. Responda-se a consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 1°/04/1996.
Lauro José Cardoso João Carlos
Kunzler
Presidente da COPAT Secretário Executivo