EMENTA:
ICMS. CRÉDITO DE BENS DO ATIVO IMOBILIZADO. ESTORNO
PROPORCIONAL ÀS SAÍDAS ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS, EM CADA PERÍODO DE
APURAÇÃO. O CRÉDITO SOMENTE EXISTE PARA COMPENSAR O DÉBITO RELATIVO À OPERAÇÃO
TRIBUTADA SUBSEQUENTE. NO CASO DA OPERAÇÃO NÃO SER TRIBUTADA, INCLUSIVE POR NÃO
TER OCORRIDO O FATO GERADOR, DEVE SER ESTORNADO O CRÉDITO CORRESPONDENTE.
NO
CASO DE SAÍDA DE BEM DO ATIVO IMOBILIZADO, A TÍTULO DE ALUGUEL OU COMODATO, NÃO
OCORRE O FATO GERADOR DO IMPOSTO - OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE
MERCADORIA - MAS, COMO O BEM PERMANECE NO ATIVO IMOBILIZADO DO LOCADOR OU
DO COMODANTE, TAMBÉM NÃO ESTÁ OBRIGADO AO ESTORNO DO CRÉDITO.
Disponibilizado na página da
SEF em 28.06.13
Da Consulta
O contribuinte em epígrafe, formula
consulta sobre o sentido atribuído à expressão "saídas ou prestações
isentas ou não tributadas", como utilizadas no art. 39, II, do RICMS-SC:
Art. 39. Na
hipótese do art. 37, §§ 2º e 3º, a apropriação dos créditos relativos a bens do
ativo permanente:
....................
II - em
cada período de apuração do imposto, não será admitido o creditamento
de que trata o inciso I, em relação à proporção das saídas isentas ou não
tributadas sobre o total das saídas e prestações efetuadas no mesmo período.
Informa a consulente que
"pretende dedicar-se ao comércio varejista de máquinas e equipamentos
industriais, assim como peças e acessórios novos, realizando ainda a locação de
máquinas e a prestação de serviços de manutenção, assistência técnica,
transporte rodoviário e movimentação de cargas".
Acrescenta que "dada a
natureza de suas atividades e a pretensão, inclusive, da abertura de filiais em
outras Unidades da Federação, a Consulente realizará operações internas e
interestaduais, inclusive entre seus estabelecimentos, seja efetuando remessas
decorrentes de operações de venda e/ou locação, seja efetuando transferência de
estoque e ativo imobilizado".
Argumenta a consulente que, conforme a legislação
tributária do Estado de Santa Catarina, é assegurado à
empresa, enquanto sujeito passivo da relação jurídico-tributária, o direito de
creditar-se do imposto relativo à operação de que tenha resultado a entrada de
bem destinado ao seu ativo permanente, não sendo admitido, contudo, o creditamento em relação à proporção das saídas isentas ou
não tributadas sobre o total das saídas e prestações efetuadas no mesmo
período.
Sucede que algumas das atividades desenvolvidas pela
Consulente, estão total e absolutamente fora do campo
de incidência do ICMS, o que remete à dúvida do que seriam consideradas
"saídas", para efeito de vedação da apropriação do crédito sobre a
aquisição de bens destinados ao ativo imobilizado.
Seria o caso das atividades de locação e comodato, cuja não
incidência do ICMS é consagrada e inconteste, podendo-se afirmar que não há,
para fins de aplicação da legislação tributária, operação de circulação de
mercadoria, assim entendida a transferência de propriedade dos bens cedidos.
Logo, as remessas de bens do ativo imobilizado a esse título,
entende a Consulente, não poderiam representar uma efetiva
"saída".
O entendimento sustentado pela consulente é que "seria
adequado a manutenção dos créditos decorrentes de aquisição de bens para o
ativo imobilizado, sendo inaplicável o estorno referente à parcela dos créditos
correspondentes às remessas para locação, eis que decorrente de razoável
interpretação da legislação tributária, estando este entendimento, data venia, em total consonância com os princípios da legalidade
e não-cumulatividade".
Ao final, consulta: "considerando que a legislação
tributária estadual emprega a expressão 'saídas ou prestações isentas ou não
tributadas' (art. 39, II, do RICMS/SC) em sentido amplo, sem fazer
qualquer restrição e/ou menção às atividades que a esta regra estariam
sujeitas; as operações relativas às remessas para locação
e para comodato, não abrangidos pelo ICMS, por não corresponderem a uma efetiva
circulação de mercadoria, não poderiam ser consideradas saídas, e,
conseqüentemente, permitiriam a manutenção do crédito decorrente de aquisição
de bem para o ativo imobilizado em sua integralidade, nas condições previstas
no art. 39, I, do RICMS/SC. Assim, a dúvida limita-se a interpretação do
sentido a ser empregado ao termo 'saídas', se abrange todas as operações, ou
somente aquelas que efetivamente representam efetiva circulação de
mercadorias/bens".
A repartição fazendária local verificou a presença dos
requisitos de admissibilidade da consulta.
Informa também que se trata de empresa enquadrada no Simples
Nacional.
Legislação
C.F. art. 155, II, e § 2º, I e II;
LC 87/96, arts. 19, 20 e 21.
Fundamentação
Parece evidente que a consulta não se refere a uma situação
presente com a qual a consulente se defronte, mesmo porque está enquadrada no
regime do Simples Nacional. Por conseguinte, a situação descrita é uma
perspectiva futura que, para realizar-se, depende da ampliação da empresa e de
seu desenquadramento do regime do Simples. Entendo,
todavia, que, apesar de tratar de situação hipotética e futura, não restou
caracterizada consulta sobre lei em tese - que não poderia ser recebida
por esta Comissão.
Discute-se na presente consulta o direito a crédito
correspondente a entrada de bens para o ativo imobilizado do adquirente. Mais
precisamente, em que hipóteses é obrigatório o estorno
desse crédito.
Para bem situar a questão, vamos revisitar alguns conceitos
fundamentais, relativos ao ICMS.
Conforme dispõe o art. 155, II, da Constituição Federal,
compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre operações
relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as
operações e as prestações se iniciem no exterior.
O fato gerador do ICMS desdobra-se, portanto, em três
situações típicas: (i) operação de circulação de mercadorias, (ii) prestação de serviço de transporte e (iii) prestação de
serviço de comunicação. A consulta envolve apenas a primeira situação: operação
de circulação de mercadorias.
A doutrina e a jurisprudência nacionais têm convergido no
sentido de que as operações a que se refere o constituinte não é o mero deslocamento físico da mercadoria. Entende-se que
essa circulação refere-se ao deslocamento da mercadoria, no sentido (vetorial)
do produtor para ao consumidor ou, nas palavras de Hugo de Brito Machado (Aspectos
Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 25), que se trate de
"uma operação que impulsione a mercadoria, na marcha normalmente por esta
desenvolvida desde a fonte de produção até o consumidor".
Cada operação de circulação de mercadorias, individualmente
considerada, constitui um fato gerador do imposto. O ICMS é um imposto plurifásico (incide em cada fase do ciclo de
comercialização), sendo devido em cada operação de circulação de mercadorias.
Por outro lado. O "crédito" do ICMS refere-se ao
princípio da não-cumulatividade, insculpido no art.
155, § 2º, I e II, da nossa Carta Magna. Assim, dispõe o inciso I que o imposto
"será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação
relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante
cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito
Federal".
O "crédito", portanto, nada mais é que o imposto
que onerou a mercadoria (ou os insumos, no caso de indústria) entrada no
estabelecimento. Então, o imposto devido em cada operação poderá ser compensado
com o imposto (crédito) que onerou a mercadoria nas operações anteriores. O
imposto a recolher é a diferença entre o imposto que onerou a saída da
mercadoria e o imposto que já havia sido suportado nas fases anteriores de
comercialização. O ICMS pode, então, ser definido como um imposto plurifásico não-cumulativo, ou seja, incide em todas as
fases de comercialização, mas, em cada fase, é recolhido apenas o imposto
correspondente ao valor que foi acrescido à mercadoria (sem entrar na discussão
acadêmica, se o ICMS é ou não um imposto sobre o valor acrescido).
Conforme esclarecido magistério de Geraldo Ataliba e Cleber Giardino (ICM - Abatimento constitucional -
Princípio da não cumulatividade. RDT 29/30: 110-126, p. 115): "o chamado `princípio da não-cumulatividade do ICM acaba resolvendo-se, em termos
jurídicos - porque jurídica é a sua vocação - num singelo direito
de abater; um simples direito de abatimento".
O sentido da não-cumulatividade
fica melhor esclarecido pela dicção do inciso II, b,
do mesmo parágrafo: "a isenção ou não-incidência, salvo determinação em
contrário da legislação, acarretará a anulação do crédito relativo às operações
anteriores". Vemos, assim, que a própria Constituição já fala em isenção
ou não-incidência.
O sentido é claro: o "crédito" do imposto não é
propriamente um haver contra a Fazenda Pública, mas um direito de abater do
imposto a recolher. Ou seja, trata-se de "crédito" especialmente vocacionado à compensação do imposto devido. Essa a sua
razão de existir. Por conseguinte, não havendo débito (não sendo a operação
subseqüente tributada), também não haverá crédito. O crédito deve ser anulado,
por expressa disposição constitucional.
Se a saída da mercadoria não for tributada, o contribuinte
somente estará dispensado de estornar o crédito correspondente se houver expressa disposição em contrário da legislação, como
ocorre no caso das exportações para o exterior, em que a legislação assegura
expressamente o não estorno do crédito, apesar da saída subseqüente para o
exterior estar ao abrigo da imunidade.
A Lei Complementar 87/96 introduziu no direito tributário
brasileiro o "regime de créditos financeiros", no lugar do
"regime de créditos físicos", até então adotado. Segundo Misabel Derzi e Sacha Calmon
Navarro Coelho (Direito Tributário Aplicado. Del Rey, 1997, art. 27),
"para a realização do princípio da não cumulatividade,
é possível a adoção de dois sistemas diferentes". O regime de crédito
físico "restringe o direito à compensação ao imposto pago na aquisição de
bens que fisicamente se incorporam ao produto final ou que se consomem no curso
do processo de produção, dele se excluindo as máquinas, ferramentas e outros
integrantes do ativo fixo". Já o regime de crédito financeiro
"abrange o imposto pago relativo a qualquer bem entrado no estabelecimento,
essencial e imprescindível à atividade".
Com efeito, o art. 20 da Lei Complementar 87, de 13 de
setembro de 1996, assegura "ao sujeito passivo o direito de creditar-se do
imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no
estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo
permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal ou de comunicação".
No caso da entrada de bens para o ativo imobilizado, o
direito ao crédito resulta de dois fatores: (i) a entrada do bem no
estabelecimento foi onerada pelo ICMS e (ii) esse bem
compõe o custo de produção/comercialização da mercadoria vendida pelo
estabelecimento. Assim, se a saída da mercadoria sofrer tributação pelo ICMS, o
contribuinte terá o direito de compensar com o ICMS que onerou o bem do ativo
imobilizado.
Por outro lado, se a saída da mercadoria não sofrer
tributação pelo ICMS, o correspondente crédito do ativo imobilizado terá de ser
estornado (conforme regra inserta no art. 155, § 2º, II, b, da
Constituição Federal). Essa é a origem da regra do art. 20, § 3º, I, da LC
87/96: "é vedado o crédito relativo a mercadoria
entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita para
integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando
a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto,
exceto se tratar-se de saída para o exterior".
O § 5º, I, do mesmo artigo limita a apropriação dos créditos
decorrentes da entrada de mercadorias no estabelecimento, destinadas ao ativo
permanente, ao percentual de um quarenta e oito avos por mês.
O inciso II desse parágrafo determina que, em cada período
de apuração, não será admitido o creditamento de que
trata o inciso I, em relação à proporção das operações de saídas isentas ou
não-tributadas sobre o total das operações de saídas no mesmo período.
Além disso, o inciso VII determina que "ao final do
quadragésimo oitavo mês contado da data da entrada do bem no estabelecimento, o
saldo remanescente do crédito será cancelado".
Resposta
A consulta diferencia entre saídas sujeitas à tributação
pelo ICMS e saídas não sujeitas à tributação pelo ICMS. Menciona também saída
de bens do ativo imobilizado, a título de aluguel ou comodato.
Responda-se à consulente:
a) a saída a que se refere a
legislação não é a mera saída física da mercadoria, mas aquela que constitua
operação de circulação de mercadorias;
b) de acordo com o art. 155, § 2º, II, b, da CF/88,
somente existe "crédito" se a saída subseqüente for tributada -
a isenção ou não-incidência obriga o estorno do crédito, inclusive o relativo a
bens do ativo imobilizado;
c) no caso da isenção, a incidência do imposto é afastada
por expressa determinação legal;
d) a expressão "não-tributada" ou
"não-incidência" refere-se toda e qualquer situação em que não ocorre
tributação, seja em virtude de norma expressa (isenção ou imunidade) ou seja porque não corresponde ao fato gerador do imposto;
e) a saída de bens do ativo imobilizado, a título de aluguel
ou comodato, não constitue fato gerador do ICMS (não
se caracteriza como operação de circulação de mercadorias);
f) como continua a fazer parte do imobilizado da empresa (e
deve a ela retornar, ao fim do contrato de aluguel ou comodato), não se
caracteriza como operação de circulação de mercadorias, mas também não obriga
ao estorno do crédito correspondente. À evidência, a falta de retorno
do bem para o ativo imobilizado descaracteriza o aluguel ou comodato, como
acontece com os equipamentos celulares cedidos ao tomador do serviço pelas
empresas de telefonia móvel..
VELOCINO PACHECO FILHO
AFRE IV - Matrícula: 1842447
De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela
COPAT na Sessão do dia 06/06/2013.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do §
4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT),
aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer
tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à
consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de
Resolução Normativa que adote diverso entendimento.
Nome Cargo
CARLOS ROBERTO MOLIM Presidente
COPAT
MARISE BEATRIZ KEMPA Secretário(a) Executivo(a)