EMENTA: ICMS. CRÉDITO
PRESUMIDO DE MAÇÃS. O BENEFÍCIO APLICA-SE NA PRIMEIRA OPERAÇÃO TRIBUTADA COM O
PRODUTO. A OPÇÃO PELO CRÉDITO PRESUMIDO AFASTA QUALQUER OUTRO CRÉDITO.
NAS DEMAIS HIPÓTESES, ASSEGURA-SE O DIREITO AOS CRÉDITOS ESCRITURAIS, INCLUSIVE
OS RELATIVOS A BENS DO ATIVO IMOBILIZADO, EM HOMENAGEM AO PRINCÍPIO DA
NÃO-CUMULTIVIDADE.
NO CASO DE EXPORTAÇÃO PARA O EXTERIOR, A OPÇÃO PELO CRÉDITO PRESUMIDO NÃO
AFASTA O DIREITO DO EXPORTADOR MANTER OS CRÉDITOS ESCRITURAIS E DELES DISPOR NA
FORMA PREVISTA NA LEGISLAÇÃO.
CONSULTA Nº: 82/2001
PROCESSO Nº: GR09
49248/014
01 - DA CONSULTA
Informa
a consulente que tem como atividade principal a pomicultura, abrangendo tanto a
produção de maçãs em pomares próprios, a comercialização, a importação, a
exportação e a industrialização (produção de polpa de maçã). Além da produção
própria, também adquire maçã "in natura" de outros produtores. Diz
ainda que é optante pelo crédito presumido autorizado pelo Convênio n° 6/97
(RICMS-SC, Anexo 4, art. 20).
A
consulente entende que:
1. Poderá
utilizar o crédito presumido (primeira operação tributável):
1.1 - nas
vendas de maçãs de produção própria para clientes de outros Estados;
1.2 - nas
vendas, no território de Santa Catarina, de maçãs de produção própria, para
consumo;
1.3 -
vendas de maçãs adquiridas de outros produtores com diferimento;
2. Não
poderá utilizar o crédito presumido:
2.1 -
exportação de maçãs;
2.2 -
venda de maçãs de produção própria para compradores estabelecidos no Estado,
para comercialização ou industrialização;
2.3 -
venda de maçãs adquiridas de produtores de outros Estados;
2.4 -
venda de maçãs importadas;
2.5 -
venda de polpa de maçãs;
3. A
utilização do crédito presumido exclui o crédito relativo às entradas de
matéria-prima, mercadorias, material secundário e embalagem, além do ativo
imobilizado e serviços de transporte e comunicação;
4. Nas
hipóteses em que não é utilizado o crédito presumido (item 2), a consulente
teria direito a escriturar os créditos relativos à matéria prima, mercadorias,
material secundário e de embalagem, bem como ativo imobilizado e serviços de
transporte e comunicação, observada a legislação aplicável.
A
autoridade fiscal, em suas informações de estilo, fls. 15-17, manifesta-se nos
seguintes termos:
"O
crédito presumido para a maçã foi concedido para o momento em que ocorrer a
primeira operação tributável pelo ICMS, em substituição aos créditos normais a
que o contribuinte tenha direito.
Quando
a legislação fala em primeira operação tributável entendemos que a idéia
foi conceder o crédito presumido para a primeira operação com débito do
ICMS. Se o entendimento não for esse, diversas dificuldades surgem,
principalmente quando houver diferimento do ICMS.
Nessas
primeiras linhas já podemos concluir que na saída de maçã cuja produção é da
própria consulente, nos limites do Estado de Santa Catarina, não se aplica o
crédito presumido para a consulente, mas no destinatário, eis que a operação
goza de diferimento, pois que a consulente, neste caso, é estabelecimento
produtor agropecuário (RICMS/SC-97, Anexo 3, art. 4°, inc. I). Se porém,
considerar-se diferimento como operação tributável, entendimento este
manifestado pela COPAT na resposta à consulta n° 18/99 (Processo GR09
30.599/97-0), a consulente terá o direito ao crédito presumido relativo à saída
de maçã de produção própria.
A
maçã adquirida de outros produtores rurais goza do diferimento aplicável à
saída de produto agropecuário do estabelecimento produtor. A saída posterior
dessa maçã já é tributada, na primeira operação efetivamente tributável da
fruta, por isso que nesta operação, a consulente tem o direito ao crédito
presumido. Se o entendimento for de que no diferimento ocorre operação
tributável, o crédito presumido é do produtor agropecuário, em geral, pessoa
física.
No
terceiro caso citado pela consulente, que é a importação da maçã, não há
duvidas de que não cabe o crédito presumido, já que a importação é operação
tributada, cujo imposto deve ser pago por ocasião do desembaraço aduaneiro,
conforme já se manifestou a COPAT na consulta n° 18/99 (Processo GR09
30.599/97-0), além de que o crédito presumido foi concedido em 35% nas
operações internas e de 60% nas operações interestaduais, não havendo qualquer
referência à operação internacional.
Restam
duas dúvidas:
a) O contribuinte
que optar pelo crédito presumido pode aproveitar créditos normais em proporção
às saídas que não gozam do benefício? Entendemos que sim, em obediência ao
princípio da não-cumulatividade do ICMS. Porém, a simples leitura do
RICMS/SC-97, Anexo 2, art. 20 c/c art. 23 dá a entender que o contribuinte que
optar pelo crédito presumido, em hipótese nenhuma poderá aproveitar outros
créditos de ICMS.
b) Se o
interessado, optante pelo crédito presumido do ICMS nas saídas de maçãs, puder
registrar créditos normais em proporção às saídas não beneficiadas, pode
fazê-lo de forma integral e estornar proporcionalmente às saídas com crédito
presumido? Ou não pode registrar os créditos na entrada e recuperá-los
proporcionalmente quando da saída de maçã em operações que não gozam do
benefício? Entendemos que as duas situações estão corretas, numa porque o
contribuinte não sabe antecipadamente que as aquisições serão utilizadas em
saídas de maçãs com crédito presumido, devendo estornar posteriormente o ICMS
creditado a maior, e noutra situação, o optante sabe que utilizando o crédito
presumido não pode aproveitar-se de créditos normais, mas terá direito
posterior proporcionalmente às operações não alcançadas pelo benefício."
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal, art. 155, §
2°, I e II;
Lei Complementar n° 87/96, arts. 20, § 3°, 24, I, e
25, § 1°;
RICMS-SC/97,
Anexo 2, art. 20;
RICMS-SC/01,
Anexo 2, art. 20.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Quando
falamos em "créditos do ICMS" estamos falando do princípio da não-cumulatividade.
No magistério de Roque Antonio Carrazza (O ICMS, 2000, p. 203), "o ICMS
deve necessariamente sujeitar-se ao princípio da não-cumulatividade,
que, tendo sido considerado, pela Constituição, um dos traços característicos
deste tributo, não pode ter seu alcance nem diminuído nem, muito menos, anulado
por normas infraconstitucionais". Iniciaremos a nossa análise precisamente
do ponto de vista do princípio da não
cumulatividade que rege toda a sistemática de créditos do imposto.
Com
efeito, a Constituição Federal, ao delinear a moldura institucional do ICMS,
dispõe que "será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em
cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com
o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo
Distrito Federal" (art. 155, § 2°, I).
Hugo
de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS, 1997, p. 130) distingue entre
o princípio e a técnica da não cumulatividade. Leciona esse autor
que "é um princípio quando enunciada de forma genérica, como está na
Constituição".
"A
técnica da não cumulatividade, a seu turno, é o modo pelo qual se realiza o
princípio", prossegue o mestre.
O
legislador infra constitucional tem competência para dispor sobre a técnica da
não-cumulatividade, desde que não contrarie o princípio correspondente, tal
como enunciado na Constituição. A Lei Complementar n° 87/96 adotou a apuração
por período, de modo que "as operações consideram-se liquidadas por
compensação até o montante dos créditos escriturados no mesmo período"
(art. 24, I). Ou seja, são considerados como crédito do ICMS o imposto
relativo à todas as entradas de mercadorias ocorridas durante o período de
apuração.
Sendo
o crédito um direito de compensar o imposto devido com o imposto cobrado
anteriormente, quando não houver imposto a ser compensado também não haverá
crédito. Ou seja, o crédito existe apenas para compensar o imposto devido.
Esta regra está expressa no art. 155, § 2°, II, b, da Constituição Federal:
"a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da
legislação, acarretará anulação do crédito relativo às operações
anteriores". Então, no caso da operação subseqüente não sofrer a
incidência do imposto, a regra é a anulação do crédito correspondente. A sua
manutenção é a exceção que deve estar expressa na legislação (no caso,
entenda-se a lei e não outra espécie normativa).
Esse
é o caso das exportações que, apesar de não incidir o imposto, o crédito correspondente é mantido, por
força do art. 20, § 3° c/c art. 25, § 1°, ambos da Lei Complementar n° 87/96.
"Cabe à lei complementar prever casos de manutenção de crédito,
relativamente à (...) exportação para o exterior, de serviços e
mercadorias" (CF, art. 155, § 2°, XII, f).
Quanto
ao diferimento, importa determinar o que está sendo diferido: se apenas o
pagamento ou a própria incidência do imposto. No caso da importação de
mercadorias ou bens, o diferimento é meramente do pagamento do imposto, como
analisado na resposta a Consulta n° 18/99. Já no caso do diferimento do ICMS
devido pelo produtor rural nas suas vendas a contribuinte, ocorre uma
translação do obrigado pelo adimplemento da obrigação tributária (substituição
tributária "para trás"). No
magistério de Sacha Calmon Navarro Coelho (Teoria Geral do Tributo e da Exoneração
Tributária, 1982, p. 180), o diferimento "caracteriza, quase sempre, a
chamada 'substituição tributária', na terminologia de Rubens Gomes de Sousa,
mas com o temperamento de que dita substituição é 'meramente econômica', porque
o substituto tributário, não substitui ninguém. É sujeito passivo direto de
fato gerador alheio (a dívida, note-se, é sua, e não alheia)".
Maria
Lúcia Santana em interessante ensaio (O Diferimento do ICMS, 1992, p. 41)
observa que "o objeto do diferimento é o adiamento do nascimento da
obrigação tributária pela modificação do regime temporal do tributo". É
precisamente o que falta no caso do diferimento nas importações: o sujeito
passivo da obrigação continua sendo o mesmo, o importador. Apenas o cumprimento
da obrigação (e não o nascimento da obrigação) é adiado para outra fase. O
importador é responsável, não por fato gerador alheio, mas por fato gerador
próprio, a importação.
No
caso de operações com maçãs, temos os seguintes casos:
a) saída no Estado de produtor
rural para contribuinte (diferimento);
b) saída de produtor rural para
consumo ou para outro Estado (tributada);
c) importação do exterior
(tributada);
d) exportação para o exterior
(não tributada);
e) saída de produto
industrializado (tributada).
O
crédito presumido de que se cuida na presente consulta é apropriável na primeira
operação tributada, em substituição aos créditos escriturais. Assim,
o benefício aplica-se apenas às operações tributadas (o que exclui as operações
não tributadas). Mais ainda, apenas à primeira operação tributada (o que exclui
as demais operações tributadas que não a primeira). As demais operações, em que
não se aplica o benefício, o imposto a recolher deve ser calculado levando em
conta os créditos escriturais, se a operação for tributada. No caso das
exportações para o exterior do país, fica assegurada a manutenção de créditos,
podendo a consulente deles dispor na forma prevista na legislação. A
substituição dos créditos escriturais pelos créditos presumidos dá-se apenas
nas operações contempladas pelo benefício. O crédito presumido não pode
sobrepor-se ao princípio da não-cumulatividade que é de natureza
constitucional.
O
uso de crédito presumido nada mais é que forma simplificada de apuração
do imposto em substituição aos créditos escriturais, por opção do contribuinte.
Presume-se que os créditos relativos a operações anteriores representem 35%
(trinta e cinco por cento) ou 60% (sessenta por cento), conforme o caso, do
imposto debitado na operação. A adoção dessa técnica deve-se à incerteza dos
créditos escriturais relativos à atividade rural que é o caso típico visado
pelo legislador.
Isto
posto, responda-se à consulente, caso opte pelo crédito presumido:
a) poderá
ser utilizado o crédito presumido nas vendas de produção própria para consumo
ou para outros Estados e de maçãs adquiridas com diferimento de outros
produtores;
b) não
poderá ser utilizado o crédito presumido nas exportações, nas vendas com
imposto diferido (para comercialização ou industrialização, no Estado), saídas
de maças adquiridas de outros Estados ou importadas e de polpa de maçã;
c) a
utilização do crédito presumido substitui todo e qualquer crédito escritural,
inclusive o relativo a bens do ativo permanente;
d) nos
casos em que não pode ser utilizado o crédito presumido, poderão ser utilizados
proporcionalmente os créditos escriturais, inclusive os relativos a bens do
ativo permanente, observada a legislação aplicável;
e) no
caso de exportação, os créditos escriturais correspondentes poderão ser
mantidos, dispondo deles a consulente na forma prevista na legislação.
À superior consideração da
Comissão.
Getri, em Florianópolis, 17 de
outubro de 2001.
Velocino Pacheco Filho
FTE - matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 11 de dezembro de 2001.
Laudenir Fernando Petroncini João
Paulo Mosena
Secretário Executivo Presidente da
Copat