CONSULTA N° 033/2011
EMENTA: ICMS. CONSUMIDORES LIVRES. OS DESCONTOS AUTORIZADOS PELA RESOLUÇÃO ANEEL 77/2004 NÃO INTEGRAM A BASE DE CÁLCULO DO ICMS, POR REPRESENTAREM DESCONTOS INCONDICIONAIS, NÃO TENDO QUALQUER CONTRAPRESTAÇÃO DO FORNECEDOR PARA COM O FORNECEDOR DE ENERGIA ELÉTRICA.
A MERA CESSÃO DE USO DA REDE DE
DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA NÃO CONSTITUI FATO TRIBUTÁVEL PELO ICMS, CONFORME
RESPOSTA À CONSULTA 36/2007, DESTA COMISSÃO, INTEGRANDO A BASE DE CÁLCULO DO
IMPOSTO APENAS QUANDO COBRADO DO CONSUMIDOR.
DOE de 04.05.11
01 - DA CONSULTA
Cuida-se de consulta de empresa que atua na distribuição e
comercialização de energia elétrica. Informa que alguns de seus clientes se
enquadram como consumidores potencialmente livres (potência utilizada entre 500
e 3.000 KW) que, conforme Resolução Normativa ANEEL 77/2004, podem adquirir
energia de outras fontes.
Acrescenta que “para que esta energia chegue ao seu destino (clientes),
são utilizados os sistemas elétricos de transmissão e distribuição da consulente,
onde, nessas situações, a consulente cobra apenas uma tarifa de seus clientes
pela concessão do uso de seus sistemas elétricos de transmissão e distribuição,
bem como a demanda contratada”. Nessa hipótese, a Câmara de Comercialização de
Energia Elétrica (CCEE) concede um desconto de 50% sobre o total da taxa de
utilização. A consulente esclarece que o valor do desconto é recuperado
mediante aumento da tarifa dos demais consumidores, de modo que a “consulente
mantém o seu nível de faturamento e, conseqüentemente, mantém o volume da base
para o recolhimento do ICMS”.
Ao final, formula a seguinte consulta a esta Comissão:
a) os descontos concedidos, com base na Resolução Normativa ANEEL,
integram a base de cálculo do ICMS?
b) ou são considerados descontos incondicionais, por não estarem
vinculados a qualquer evento futuro, sendo inclusive destacados no documento
fiscal?
A informação fiscal confirma que a consulta satisfaz as condições
exigidas para sua admissibilidade.
Solicitada a manifestação do Grupo Especialistas Setoriais Energia –
Gesene (Diligência 2/2011, fls. 8), foi dada a seguinte informação: (i) esta
Comissão, ao analisar a Consulta 36/2007, definiu que a TUSD “quando cobrada do
consumidor da energia elétrica, integra a base de cálculo do imposto”; (ii) a
TUSD, no presente caso, é cobrada por remeter energia elétrica ao usuário
final; (iii) em Santa Catarina apenas uma decisão judicial foi favorável ao
contribuinte, reformada pelo Tribunal de Justiça; e (iv) há recurso pendente de
julgamento no STJ.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1966, art. 8°;
RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, art. 22,
II, “a”;
Anexo 3, arts. 8°, VII, e 99, I e II;
Anexo 6, arts. 98-A e 237, I, a.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Com efeito, o art. 2° da Resolução Normativa 77, de 18 de agosto de
2004, da ANEEL, prevê redução de 50% (cinqüenta por cento), a ser aplicado às
tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição,
incidindo na produção e no consumo da energia comercializada pelos empreendimentos
hidrelétricos com potência igual ou inferior a 1.000 (mil) kW, para aqueles
caracterizados como pequena central hidrelétrica e àqueles com base em fontes
solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, conforme regulamentação da
ANEEL, cuja potência injetada nos sistemas de transmissão ou distribuição seja
menor ou igual a 30.000 (trinta mil) kW.
Contudo, esta Comissão já manifestou entendimento sobre a incidência de
ICMS sobre uso dos sistemas de transmissão, na resposta à Consulta 36/2007:
“ICMS. O FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA E O ACESSO E USO DOS SISTEMAS
DE TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO CONSTITUEM NEGÓCIOS DISTINTOS. O MERO USO DE REDE
DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA PELO FORNECEDOR, REMUNERADO PELA TUSD
(TARIFA DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO), NÃO CONSTITUI FATO GERADOR DO ICMS
QUE IMPLICA NECESSARIAMENTE OBRIGAÇÃO DE DAR.”
Da fundamentação do parecer que deu embasamento à resposta, extraímos os
seguintes trechos:
“O único fato gerador possível, no caso da energia elétrica, é a
operação relativa à circulação de mercadoria. Efetivamente, a energia elétrica,
independentemente de sua natureza física, é considerada ‘mercadoria’ por
determinação legal (Código Penal, art. 155, § 3°). A própria Constituição
reconhece expressamente a incidência do ICMS (art. 155, § 2°, X. b) sobre
operações com energia elétrica.”
“Ora, o fato gerador do ICMS, na modalidade de circulação de
mercadorias, consiste sempre em obrigação de dar. O imposto somente incide
sobre obrigações de fazer, no caso da prestação de serviços de transporte e de
comunicação.”
“A Lei Complementar n° 87/96, art. 9°, § 1°, II, permite que a
responsabilidade pelo imposto possa ser atribuída às geradoras ou às
distribuidoras de energia elétrica, desde a produção até a última operação. A
base de cálculo, neste caso, será o preço praticado na operação final.”
“Revendo a legislação pertinente, vemos que o art. 98-A do Anexo 6
determina que a empresa distribuidora de energia elétrica deve emitir o competente
documento fiscal para ‘cada consumidor livre ou autoprodutor que estiver
conectado ao seu sistema de distribuição, para recebimento de energia comercializada
por meio de contratos a serem liquidados no âmbito da Câmara de Comercialização
de Energia Elétrica, ainda que adquirida de terceiros (Convênio ICMS 95/05)’.”
“O art. 237 do mesmo Anexo atribui ao ‘consumidor de energia elétrica
conectado à rede básica a responsabilidade pelo pagamento do imposto devido
pela conexão e uso dos sistemas de transmissão na entrada de energia elétrica
no seu estabelecimento. (Convênios ICMS 117/04 e 135/05)’. A base de cálculo,
nesta hipótese, será ‘o valor total pago a todas as empresas transmissoras pela
conexão e uso dos respectivos sistemas de transmissão de energia elétrica, ao
qual deve ser integrado o montante do próprio imposto’.”
“O art. 8°, VII do Anexo 3 difere para a etapa seguinte de
circulação o imposto relativo à saída de
energia elétrica para estabelecimento de empresa concessionária, distribuidora
do produto.”
“Finalmente, o art. 99 do mesmo Anexo atribui a responsabilidade pelo
recolhimento do imposto, em operação interestadual, ao estabelecimento gerador
ou distribuidor ou ao agente comercializador de energia elétrica, quando esta
for destinada a estabelecimento situado neste Estado que não promova nova
saída.”
“Depreende-se dos dipositivos citados que a legislação tributária
distingue entre ‘fornecimento’ de energia elétrica e ‘conexão e uso dos respectivos sistemas de
transmissão de energia’. O primeiro constitui obrigação de dar – fornecimento
de energia elétrica ao usuário, de produção própria ou adquirida de terceiro.
Já o segundo caso, não parece constituir ‘obrigação de dar’, mas de mera ‘cessão
de uso’ do sistema de transmissão de energia.”
[........]
“Ora, o art. 2° da Resolução ANEEL n° 166/05 define a TUSD como tarifa
de uso dos sistemas de distribuição de energia elétrica, relativo ao serviço de
transmissão e distribuição de energia elétrica. A mesma Resolução define que o
faturamento mensal referente a contrato de compra de energia será remunerada
pela Tarifa de Energia Elétrica – TE.”
[......]
“Com efeito, o art. 9° da Lei n° 9.648/98 dispõe que ‘para todos os
efeitos legais, a compra e venda de energia elétrica entre concessionários ou
autorizados, deve ser contratada separadamente do acesso e uso dos sistemas de
transmissão e distribuição’. Assim, se o negócio contratado é apenas de acesso
e uso dos sistemas de transmissão e distribuição não se configura o fato
gerador do ICMS. Para haver incidência do imposto, deve haver fornecimento de
energia, consubstanciado em contrato de compra e venda.”
Na hipótese, a tarifa pelo uso dos sistemas de transmissão é cobrada dos
consumidores finais da energia elétrica, a quem, nos termos do art. 237 do
Anexo 6 do RICMS-SC, fica atribuída a “responsabilidade pelo pagamento do
imposto devido pela conexão e uso dos sistemas de transmissão na entrada de
energia elétrica no seu estabelecimento”. Acrescenta o § 1°, I, “a” do mesmo
artigo, que a base de cálculo, nessa hipótese, seria “o valor total pago a
todas as empresas transmissoras pela conexão e uso dos respectivos sistemas de
transmissão de energia elétrica, ao qual deve ser integrado o montante do
próprio imposto”.
Ora, o art. 13, § 1°, II, a, da Lei Complementar n° 87/96,
dispõe que não integra a base de cálculo do ICMS as diminuições de preço
(descontos ou abatimentos) dados sem qualquer condição que implique
contrapartida por parte do consumidor. Cuida-se de jurisprudência sumulada do Superior
Tribunal de Justiça – Súmula STJ 457: “Os descontos incondicionais nas
operações mercantis não se incluem na base de cálculo do ICMS”.
Nesse sentido, o acórdão da Segunda Turma do referido Sodalício, no
Recurso Especial 996.096 SP (RDDT 162: 216): “É firme a jurisprudência desta
Corte quanto à não-incidência do ICMS sobre os descontos concedidos a título de
desconto-crediário, pelo qual se abate certo valor da mercadoria sem qualquer
contraprestação do consumidor para com o comerciante.”
Com efeito, as especificações previstas no art. 1° da Resolução ANEEL
77/2004 constituem requisitos para a concessão do desconto, mas não representam
“contraprestação do consumidor” para com o fornecedor da energia.
Posto isto, responda-se à consulente:
a) os descontos autorizados pela Resolução ANEEL 77/2004 não integram a
base de cálculo do ICMS, por representarem descontos incondicionais, não tendo
qualquer contraprestação do fornecedor para com o fornecedor de energia
elétrica;
b) a mera cessão de uso da rede de distribuição de energia elétrica não
constitui fato tributável pelo ICMS, conforme resposta à Consulta 36/2007,
desta Comissão, integrando a base de cálculo do imposto apenas quando cobrado
do consumidor.
À superior consideração da Comissão.
Getri, em Florianópolis, 21 de março de 2011.
Velocino Pacheco Filho
AFRE – matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado
pela Copat na Sessão do dia 31 de março de 2011.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do art. 11 da Portaria
SEF 226/2001, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão,
mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação
superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.
Marise Beatriz Kempa Carlos Roberto Molim
Secretária Executiva
Presidente da Copat