ESTADO DE SANTA CATARINA |
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA |
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS |
RESPOSTA CONSULTA 96/2022 |
N° Processo | 2270000025679 |
ICMS. NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE OS SERVIÇOS DE
TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO E ENCARGOS SETORIAIS VINCULADOS ÀS OPERAÇÕES COM
ENERGIA ELÉTRICA, NOS TERMOS DO ART. 3º, X, DA LEI COMPLEMENTAR FEDERAL Nº
87/1996 E DO ART. 7º, XI, DA LEI Nº 10.297/1996. O FORNECIMENTO DE ENERGIA
ELÉTRICA É INDISSOCIÁVEL E SUA CADEIA NÃO PODE SER SEGREGADA EM PARTES QUE
SERIAM A GERAÇÃO, A TRANSMISSÃO, A DISTRIBUIÇÃO E O CONSUMO DA ENERGIA. A
TRANSMISSÃO E A DISTRIBUIÇÃO DA ENERGIA NÃO SÃO SERVIÇOS PRESTADOS E NEM
POSSUEM EXISTÊNCIA OU VALOR ECONÔMICO AUTÔNOMOS, SENDO INTEGRANTES DO CUSTO DO
FORNECIMENTO DE ENERGIA COMO UM TODO, E, PORTANTO, COMPONENTES DA BASE DE
CÁLCULO DO ICMS. NÃO HOUVE QUALQUER ALTERAÇÃO LEGAL NA BASE DE CÁLCULO DO
IMPOSTO INCIDENTE NAS OPERAÇÕES COM ENERGIA ELÉTRICA, RAZÃO PELA QUAL O ICMS
INCIDE EM TODOS OS COMPONENTES DA TARIFA DE ENERGIA ELÉTRICA, INCLUINDO A TUSD
E A TE.
Trata-se de consulta formulada por concessionária de
serviço público de distribuição de energia elétrica, na qual entende que as
alterações promovidas pela Lei Complementar federal nº 194, de 23 de junho de
2022, e pela Medida Provisória nº 255, de 29 de junho de 2022, convertida na
Lei nº 18.521, de 3 de novembro de 2022, alteraram substancialmente a base de
cálculo do ICMS fixando novas hipóteses de não incidência do tributo nas
operações envolvendo energia elétrica, excluindo algumas parcelas que originalmente
a compunham.
Pretende saber, tendo em vista a divisão da tarifa de
energia elétrica pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), quais
componentes da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e a Tarifa de
Energia (TE) estariam relacionados aos serviços de transmissão, distribuição e
dos encargos setoriais que a consulente deveria considerar para não incidência
da base de cálculo do ICMS.
A autoridade fiscal manifestou-se favoravelmente
quanto às condições de admissibilidade, dando-lhe tramitação.
É o relatório, passo à análise.
Lei Complementar federal nº 87, de 13 de setembro de 1996,
art. 3º, caput, X.
Lei Complementar federal nº 194, de 23 de junho de 2022,
art. 2º.
Lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996, art. 7º, caput, XI.
Lei nº 18.521, de 3 de novembro de 2022, art. 1º.
O inciso X do caput
do art. 3º da Lei Complementar federal nº 87, de 1996, acrescentado pelo art.
2º da Lei Complementar federal nº 194, de 2022, procurou prever nova hipótese
de não incidência do ICMS, em relação aos serviços de transmissão e
distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia
elétrica:
Art. 3º O imposto não incide
sobre:
(...)
X - serviços de transmissão e
distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia
elétrica. (Incluído pela Lei
Complementar nº 194, de 2022)
(...)
Ressalte-se que não houve qualquer
alteração na base de cálculo do imposto. O inciso XI do caput do art. 7º da Lei nº 10.297, de 1996, acrescentado pela Lei
nº 18.521, de 2022, apenas reproduziu o teor da norma federal.
Sobre o tema, cumpre esclarecer que a decomposição da
tarifa de energia elétrica em TUSD e TE, decorrência da abertura do mercado de
energia, é uma divisão de tarefas (geração, transmissão e distribuição) de
cunho eminentemente administrativo e concorrencial entre os agentes econômicos
responsáveis por cada tarefa.
Essa divisão não altera a regra
matriz de incidência do ICMS nem repercute na sua base de cálculo. Material e
economicamente, a cadeia de geração,
transmissão, distribuição e consumo de energia elétrica é una. Diferentemente
de uma operação com uma mercadoria comum, o
fornecimento de energia é indissociável, não podendo ser segregado em partes.
O que se vende é a energia
elétrica como um todo, pois não se compra a transmissão ou a distribuição da
energia elétrica separadamente. Essas últimas não são operações anteriores,
não são serviços prestados e não possuem existência ou valor econômico autônomos.
Todas as etapas concorrem para a concretização do negócio jurídico
tributável pelo ICMS a operação com energia elétrica, que é o próprio
fornecimento de energia elétrica ao
consumidor final. Dessa forma, todas as tarifas devem compor o preço
final, incidindo-se o ICMS sobre a operação como um todo, que abrange a
geração, a transmissão e a distribuição.
Em julgamento recente, posterior
às alterações legislativas em análise, o Tribunal de Justiça de São Paulo muito
bem discorreu sobre o tema:
Pensando-se agora em termos
maiores, como por exemplo, na rede de geração, transmissão e distribuição de
energia elétrica de um país, ou de uma região, é possível dizer que a corrente
elétrica gerada está presente e passa por toda esta rede, ficando disponível a
quem a ela se conectar. A energia
elétrica, então, não é gerada, armazenada, transportada, novamente armazenada,
de um ponto a outro desta rede, para enfim ser adquirida e consumida, como uma
mercadoria em um ciclo produtivo material.
A energia elétrica está na
corrente elétrica presente na usina de geração e nas redes de transmissão e de
distribuição, disponível aos consumidores que a ela se conectarem.
A usina de geração, as redes
de transmissão e as redes de distribuição, compõem o enorme condutor de
corrente elétrica de uma região ou país. E, assim, qualquer consumidor que se
conecte a este gigantesco condutor, terá energia disponível, na velocidade da
luz, isto é, instantaneamente, para consumo.
É errada, portanto, a ideia de que a energia elétrica seja uma
mercadoria transportável num ciclo produtivo plurifásico, de um estabelecimento
a outro, até chegar ao consumidor final. Neste contexto, a expressão operações
de energia elétrica, tais como utilizadas pelo constituinte, mais se adequam à
realidade da estrutura física necessária à geração, transmissão, distribuição e
consumo de energia elétrica.
(...)
Ora, se o ICMS sobre energia
elétrica incidisse sobre uma hipotética circulação desta mercadoria, em
processo produtivo multifásico, os princípios constitucionais exigiriam sua
não-cumulatividade. Não é isso que ocorre: justamente
porque a operação de fornecimento de energia elétrica tem especificidades
condizentes com a própria natureza da geração, transmissão e distribuição de
energia, como visto, sua incidência se dá de forma monofásica.
(...)
Não se pode tratar como transporte ou circulação de energia elétrica,
uma equivocadamente imaginária cadeia de geração, armazenamento, aquisição,
armazenamento, transporte e, enfim, consumo de energia, na qual se tributa
somente o consumo, sem relação com o custo de seu transporte, ou de sua
circulação entre estabelecimentos do mesmo fornecedor. A operação de energia
elétrica, sujeita à tributação, é feita da geração, da transmissão e da
distribuição de energia. O custo de cada uma destas operações compõe o preço final do consumo
da energia elétrica, sem o qual, este consumo seria inviável.
Para viabilizar a
concorrência entre os agentes econômicos do sistema de energia elétrica e,
assim, melhorar sua eficiência dentro dos imperativos constitucionais do
serviço público, é que se decompôs o preço da tarifa, em TE, TUSD e TUST,
viabilizando a contratação livre, nos termos regulados, pagando-se algumas ou
todas as tarifas, dependendo de sua contratação para viabilização do consumo.
Isso não significa que, no
caso de um consumidor cativo, não haja efetivo uso do sistema de distribuição e
de transmissão, como forma de viabilizar o consumo, de modo que as tarifas decompostas que remuneram
cada agente econômico devem, necessariamente, compor o preço final da energia consumida,
ou seja, da operação de energia elétrica.
A incidência do ICMS energia elétrica, por sua vez, monofásica, dá-se
sobre a operação de energia elétrica, o que abrange, como não poderia deixar de
ser, a geração, a transmissão e a distribuição de energia, pois sem qualquer
deles, não há corrente elétrica disponível, não há consumo possível.
(...) (TJSP - 1ª Câmara de
Direito Público; Agravo de Instrumento 2147056-37.2022.8.26.0000; Relator Des.
Marcos Pimentel Tamassia; publicado em 20/09/2022) Grifou-se
No mesmo sentido é a jurisprudência reiterada do Superior
Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. ICMS.
FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. BASE DE CÁLCULO. TARIFA DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO (TUSD). INCLUSÃO.
1. O ICMS incide sobre todo o processo de fornecimento de energia
elétrica, tendo em vista a indissociabilidade das suas fases de geração,
transmissão e distribuição, sendo que o custo inerente a cada uma dessas etapas
entre elas a referente à Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD)
compõe o preço final da operação e, consequentemente, a base de cálculo do
imposto, nos termos do art. 13, I, da Lei Complementar n. 87/1996.
2. A peculiar realidade
física do fornecimento de energia elétrica revela que a geração, a transmissão
e a distribuição formam o conjunto dos elementos essenciais que compõem o
aspecto material do fato gerador, integrando o preço total da operação
mercantil, não podendo qualquer um
deles ser decotado da sua base de cálculo, sendo certo que a etapa de
transmissão/distribuição não cuida de atividade meio, mas sim de atividade
inerente ao próprio fornecimento de energia elétrica, sendo dele indissociável.
3. A abertura do mercado de energia elétrica, disciplinada pela
Lei n. 9.074/1995 (que veio a segmentar o setor), não infirma a regra matriz de incidência do tributo, nem tampouco
repercute na sua base de cálculo, pois o referido diploma legal, de
cunho eminentemente administrativo e concorrencial, apenas permite a atuação de
mais de um agente econômico numa determinada fase do processo de circulação da
energia elétrica (geração). A partir dessa norma, o que se tem, na realidade, é
uma mera divisão de tarefas de geração, transmissão e distribuição entre os
agentes econômicos responsáveis por cada uma dessas etapas, para a
concretização do negócio jurídico tributável pelo ICMS, qual seja, o
fornecimento de energia elétrica ao consumidor final.
(...) (STJ - Primeira Seção;
REsp nº 1.163.020/RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 21/03/2017).
Grifou-se
O mesmo
entendimento tem sido adotado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, como,
por exemplo, nas apelações cíveis nº 0300509-69.2015.824.0006,
0321375-47.2015.8.24.0023 e 0330826-96.2015.8.24.0023 e nos agravos de
instrumento nº 0155240-17.2015.8.24-0000, 4004960-29.2016.8.24.0000 e
4004953-37.2016.8.24.0000.
Pelos fundamentos acima expostos, responda-se à consulente
que:
·
Material e economicamente, a cadeia de geração,
transmissão, distribuição e consumo de energia elétrica é una. Todas essas
etapas concorrem para o fornecimento de energia elétrica, que é indissociável,
não podendo ser segregado em partes;
·
Não existem, nessa cadeia, serviços de transmissão
e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia
elétrica. A transmissão e a distribuição da energia não são serviços prestados
e nem possuem existência ou valor econômico autônomos, sendo partes do custo do
fornecimento de energia, e, portanto, componentes da base de cálculo do ICMS
incidente nas operações com energia elétrica; e
·
A Lei complementar federal nº 194, de 2022, e a Lei
nº 18.521, de 2022, não promoveram qualquer alteração da base de cálculo do
ICMS devido nas operações com energia elétrica, razão pela qual o ICMS incide
em todos os componentes da tarifa de energia elétrica, incluindo a TUSD e a TE.
É o parecer que submeto à apreciação desta Comissão
Permanente de Assuntos Tributários.
Nome | Cargo |
LENAI MICHELS | Presidente COPAT |
BERNARDO FRECHIANI LARA MACIEL | Secretário(a) Executivo(a) |
Data e Hora Emissão | 21/11/2022 15:14:01 |