EMENTA: ICMS. CRÉDITO DO ATIVO PERMANENTE. ENTENDE-SE COMO “TOTAL DAS SAÍDAS DO PERÍODO” (RICMS/SC, ART. 39, § 1º) AS QUE SE AFIGUREM OPERAÇÕES DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS.
Disponibilizado na página da SEF em 21.12.11
1 - DA CONSULTA
A
empresa industrial acima, para a consecução de sua atividade produtiva, realiza
aquisições para seu ativo imobilizado.
Em
face disso, perquire se, para fins de apuração dos valores das operações de
saídas e prestações do período, a que se refere o § 1º do art. 39 do RICMS/SC, devem
compreender toda e qualquer saída, incluindo, por exemplo, remessas para
demonstração com posterior retorno, devoluções, remessa de ativo imobilizado
para uso fora do estabelecimento, dentre outros; ou, tão-somente as saídas
decorrentes das operações de vendas? A consulente cite alguns exemplos de
situações que, no seu entendimento, dizem respeito ao envio de remessas:
1. Nossa empresa, em muitos casos,
fatura o equipamento inteiro em uma nota fiscal onde são destacados todos os
impostos do equipamento, com base nesta nota são enviadas várias outras notas
de simples remessa para transporte do material, onde citamos nas informações
complementares os dados da nota de faturamento. Estas notas de remessa, entram
com primeiro exemplo;
2. Saídas de remessas para conserto
ou reparo;
3. Saída de remessa para
industrialização de terceiros, os quais fazem parte também do processo
produtivo;
4. Remessa para demonstração com
posterior retorno;
5. Devolução de compra para
industrialização;
6. Devolução de compra para uso e consumo;
7. Remessa de ativo imobilizado para
uso fora do estabelecimento;
8. Remessa para bonificação, doação
ou brinde;
9. Saída de remessa em garantia,
onde destacamos na nota fiscal todos os devidos impostos;
10. Venda de equipamento do ativo
imobilizado.
A
autoridade fiscal local, em atenção ao disposto no art. 152-B, § 2º, II, do
RNGDT/SC, não encontrou impedimento para que o pedido de consulta seja
analisado. Informa, ainda, que a matéria foi recentemente submetida à
apreciação desta Comissão e materializada na Consulta nº 105/2011.
É
o relato.
2 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
RICMS-SC/01, aprovado
pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, art. 39, § 1º.
3 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
De fato, a matéria já foi objeto de demanda recente
encaminhada a esta Comissão, ultimada na Consulta nº 105/2011, de minha lavra,
à qual recorro, extraindo o seguinte excerto:
“A Lei Maior prevê que o ICMS será não-cumulativo, compensando-se o que
for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação
de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo Estado ou pelo
Distrito Federal (art. 155, § 2º, inciso I).
Reparemos, em primeiro lugar, que,
muito embora em cada uma das operações relativas à circulação de mercadorias ou
prestação de serviços incida ICMS (é dito plurifásico, por incidir em cada
etapa de comercialização), ele é, ao mesmo tempo, um tributo não cumulativo, de
modo que o valor a recolher será a diferença entre o imposto relativo à
operação e o que incidiu nas operações anteriores. Esse imposto dedutível é que
chamamos de crédito fiscal.
Mas crédito aqui, não significa que
haja - no sentido obrigacional - um crédito do contribuinte contra o Estado. Em
outros termos, não constitui um débito do Estado para com o contribuinte ou um
dever de prestação patrimonial relativa ao imposto, mas um direito de dedução
resultante de incidências anteriores, oponível aos valores a recolher
supervenientes.
O crédito
fiscal a que me referi nas linhas anteriores é o chamado crédito físico, previsto
na Constituição Federal (art. 155, § 2º, I, proveniente da Emenda
Constitucional nº 3/93), que é aquele em que só o imposto relativo à entrada de
bens que são vendidos pelo estabelecimento, ou que integrem fisicamente o
produto industrializado a ser vendido, resultará em crédito a ser compensado
com o imposto devido na saída desses bens.
Porém,
todas as mercadorias e bens que são adquiridos por um estabelecimento, em
última análise, prestam-se ao cumprimento de seu objeto social,
independentemente de serem, ou não, consumidos em sua atividade principal.
Ciente disso, o legislador complementar inseriu no ordenamento jurídico
brasileiro, por intermédio da LC 87/96, o regime de créditos financeiros, em
substituição ao de créditos físicos. De absoluta pertinência, transcrevo o
escólio de Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo:
Dialética, 1997, p. 143), quanto ao novo regime introduzido pela lei
complementar:
Pelo
regime de crédito financeiro é assegurado o crédito do imposto pago em todas as
operações circulação de bens, e em todas as prestações de serviços, que
constituam custo do estabelecimento. Não importa se o bem, ou serviço, compõe o
bem a ser vendido. Importa, é que o bem vendido teve como custo aquele bem, ou
aquele serviço, já tributado anteriormente.
É um
regime de não-cumulatividade absoluta. Não-cumulatividade que leva em conta o
elemento financeiro, por isso mesmo regime denominado de crédito financeiro.
O regime de créditos financeiros
introduzido pela LC 87, entretanto, não entrou plenamente em vigor. No caso dos
bens de uso e consumo, por exemplo, terá de ser observado o disposto em seu
art. 33, I, que é taxativo: créditos, só a partir de janeiro de 2020 (LC
138/10)! (Avançando um pouco mais, os Tribunais, em relação aos produtos
intermediários de necessária aplicação nas diversas etapas do processo
produtivo, já vêm decidindo que o crédito só será possível em relação aos
materiais que se integrarem fisicamente ao produto ou que venham a ser
integralmente consumidos no processo produtivo. Nesse sentido: STJ, Recurso
Especial 235.324, SP, 2000; STJ, Recurso Especial 799.724, RJ, 2007; STJ, AgRg
no R Esp 738.905, RJ, 2008).
O objeto
da presente consulta - o aproveitamento dos créditos relativos a bens do ativo
permanente, levada a termo pela LC 102/00, que alterou a LC 87/96,
inserindo-lhe no art. 20, o parágrafo 5º - constitui hipótese, legalmente
prevista, de apropriação de créditos financeiros, cuja metodologia de cálculo
(contemplada em nossa legislação pelo já referido § 1º do art. 39), à luz do
que foi dito, visa a impedir que o estabelecimento arque com o imposto
referente às etapas anteriores relativas aos bens adquiridos pelo
estabelecimento e destinados ao seu ativo imobilizado. Antes de seguirmos com o
raciocínio, vejamos o teor do § 1º do art. 39:
Art. 39.
Na hipótese do art. 37, §§ 2º e 3º, a apropriação dos créditos relativos a bens
do ativo permanente (Lei Complementar nº 102/00):
(...)
§ 1º Para
a aplicação do disposto nos incisos I e II do “caput”, o montante do crédito a
ser apropriado será obtido multiplicando-se o valor total do respectivo crédito
pelo fator igual a 1/48 (um quarenta e oito avos) da relação entre o valor das
saídas e prestações tributadas e o total das saídas e prestações do período,
observado o seguinte:
(...)
(não há
grifo no original)
A
necessária proporcionalidade entre as operações/prestações tributadas em
relação ao total das operações/prestações praticadas no período fica evidente.
Assim como também está evidente (à exceção, obviamente, das hipóteses de manutenção
do crédito legalmente previstas) que o direito ao crédito fica condicionado à
posterior saída tributada da mercadoria/prestação. Noutros termos, o crédito de
um quarenta e oito avos só será permitido na mesma proporção que a existente
entre o total das saídas tributadas e as saídas totais em cada período. Assim,
se as vendas tributadas representarem 50% das vendas totais, somente metade do
crédito relativo ao período será havido (1/48 x 0,5).
Mas se é
assim, o mecanismo só fará sentido se a expressão grifada disser respeito (no
caso da consulente) a operações tributadas de circulação de mercadorias.
Nas situações aventadas pela consulente - remessas para conserto e remessas
para industrialização -, não há deslocamento de bens em direção ao consumo (uma
movimentação econômica, quero dizer), que justifique sua inserção no “total das
saídas do período”, porque não temos operações de circulação de mercadorias.
A
expressão “operações de circulação” utilizada no parágrafo anterior reclama
algum desenvolvimento. É o que faço a seguir.
O vínculo obrigacional equivalente ao conceito de tributo nasce da
ocorrência do fato imponível, sendo este o evento ocorrido no tempo e no espaço
que, por corresponder rigorosamente a uma hipótese legal previamente formulada,
e por ter sido formalizado, faz surgir a obrigação tributária.
O fato imponível é um fato juridicamente relevante a que a lei atribui a
conseqüência de determinar o surgimento do vínculo obrigacional tributário.
Esse fato relevante, no caso em análise, é a circulação de mercadorias.
Segundo a
Constituição, o ICMS incide sobre “operações relativas à circulação de
mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se
iniciem no exterior” (art. 155, II).
Pela ampla
abrangência dada ao imposto pela Magna Carta, podemos concluir que tantas
quantas forem as situações por intermédio das quais se promova a circulação de
mercadorias, ressalvadas, obviamente, as exceções legais, teremos incidência de
ICMS.
O caminho que se
impõe à mercadoria, numa seqüência de transmissões sucessivas entre uma pessoa
e outra, impulsionando-a em direção ao seu consumo, é que chamamos de
circulação.
Isso equivale
afirmar que qualquer negócio correspondente a uma etapa do circuito que ela
percorre da produção até o consumo constituirá situação potencial de incidência
do imposto (não é o caso das remessas para conserto ou industrialização, por
exemplo).
Nesse sentido, é o
magistério de Hugo de Brito Machado para quem “circulação quer dizer, aqui,
movimentação econômica. A marcha que as coisas realizam desde a fonte de
produção até o consumo” (Aspectos Fundamentais do ICMS, 2. ed., São Paulo:
Dialética, 1999, p. 27).”
Muito embora já tenhamos elementos suficientes para delimitar
o universo semântico da expressão “total das saídas e prestações do período”, questões
alheias à matéria consultada, mas que estão contidas nos exemplos de “envios de
remessas” trazidos pela consulente, merecem registro.
Refiro-me ao item 1, em que a consulente, admite a
prática de rotina, no que concerne à emissão de seus documentos fiscais, em
desacordo, não só com a legislação em vigor, mas com resposta outrora
exarada por esta Comissão e dirigida à própria consulente enquanto parte
interessada naquele processo (Consulta nº 59/2004)! Oportuno lembrar que a
presente demanda não constitui pedido de reconsideração em relação àquela
consulta, criando empeço à análise de seu objeto; de outro norte, há impedimento
imposto pelo § 3º do art. 5º da Portaria SEF nº 226/01 para que sejam apreciados
tais aspectos no presente pedido. De bom alvitre lembrar, ainda, a
obrigatoriedade de a consulente ter adequado seus procedimentos à resposta
exarada naquela ocasião (Lei nº 3.938/66, art. 212, inciso I).
À luz do que foi exposto responda-se à consulente que,
no total das saídas e prestações do
período, a que se reporta o § 1º do art. 39 do RICMS/SC, não devem constar
quaisquer saídas que não se afigurem como operações de circulação de
mercadorias, a teor do que já dispôs esta Comissão na Consulta nº 105/2011.
À crítica desta Comissão.
COPAT, 23 de novembro de
2011.
Nilson
Ricardo de Macedo
AFRE
IV - matr. 344.181-4
De
acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT
na sessão do dia 8 de dezembro de 2011, ressalvando-se, a teor do disposto no
art. 11 da Portaria SEF 226/01, que as respostas a consultas poderão ser
modificadas a qualquer tempo, nas seguintes hipóteses: a) por deliberação desta
Comissão, mediante comunicação formal à consulente; b) em decorrência de
legislação superveniente; e, c) pela publicação de Resolução Normativa que
veicule entendimento diverso.
Marise Beatriz
Kempa Carlos Roberto Molim
Secretária
Executiva Presidente da Copat