EMENTA: ICMS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. APROPRIAÇÃO
PELO ARRENDATÁRIO DO IMPOSTO QUE ONEROU A AQUISIÇÃO DO BEM PELO ARRENDANTE.
BENEFICIO FISCAL CONDICIONADO À INSCRIÇÃO DA ARRENDANTE NO CADASTRO DE
CONTRIBUINTES DO ESTADO, INDEPENDENTEMENTE DE ESTAR OU NÃO ESTABELECIDA NO
TERRITÓRIO CATARINENSE.
O CRÉDITO PODE SER APROPRIADO NO MOMENTO DA ENTRADA DO BEM NO ESTABELECIMENTO
DA ARRENDATÁRIA. CASO NÃO SEJA EXERCIDA A OPÇÃO DE COMPRA - DEVOLUÇÃO DO BEM -
O CRÉDITO DEVERÁ SER ESTORNADO, MONETARIAMENTE ATUALIZADO.
CONSULTA Nº: 87/2001
PROCESSO Nº: GR10
53061/01-2
01 - DA CONSULTA
Informa a consulente que celebrou
contrato de leasing com instituição financeira sediada em Osasco, Estado
de São Paulo, tendo por objeto uma máquina para seu uso. Entende que tem
direito a receber o crédito fiscal a que se refere o art. 53 do Regulamento do
ICMS, aprovado pelo Decreto n° 1.790/97 (ICMS que onerou o bem por ocasião da
sua aquisição pela financeira). Contudo não se conforma com a exigência da
arrendante estar inscrita como contribuinte em Santa Catarina conforme dispõe o
§ 1° do mesmo artigo, verbis:
"Parece inegável que
conceder à arrendatária a faculdade de creditamento do ICMS pago pela
arrendante, desde que seja essa inscrita no CCICMS de Santa Catarina é
estabelecer tratamento diferenciado a contribuintes em situação equivalente.
Isso porque pela própria natureza da exação, o arrendatário torna-se, ao
receber o bem, o contribuinte indireto (de fato) do ICMS. Note-se que para que
isso aconteça é indiferente o estado de localização da arrendante. Ou seja, uma
vez estabelecido um contrato de LEASING e adquirido o bem pela arrendante é
recolhido pela mesma o ICMS, não importando o estado onde esteja situada. De
igual forma, ao repassar o bem para a arrendatária, a arrendante lhe cobra o
montante recolhido a título de ICMS, independente do estado em que ambas
estejam situadas.
Ora, se o princípio da
não-cumulatividade do ICMS deu base à regulamentação dos créditos oriundos de
contratos de leasing, não há como negar que restringir tal direito , em razão
da localização da arrendante, é uma afronta ao princípio da isonomia
estabelecido na Constituição Federal.
Dessa forma, em respeito ao
princípio constitucional da isonomia, é inevitável concluir que um contribuinte
sediado em Santa Catarina que firmar contrato de leasing com instituição ou
empresa sediado em outro estado também tem o direito ao creditamento do valor
recolhido a título de ICMS, aplicando-se os mesmos critérios legais de
aproveitamento determinados ao contribuinte sediado neste estado."
Diante do exposto, a consulente
formula as seguintes indagações:
a) pelo
princípio da isonomia poderia o arrendatário situado no Estado de Santa
Catarina beneficiar-se do creditamento disposto no art. 53 do RICMS/97, ainda
que o arrendante esteja localizado em outro Estado?
b) em que
momento a arrendatária pode creditar-se do imposto pago pela arrendante: quando
do firmamento do contrato de leasing, quando da opção de compra pela
arrendatária ou em qualquer outro momento?
c) quais
os procedimentos contábeis que devem ser adotados pela consulente para
possibilitar o creditamento do ICMS pago quando firmou contrato de arrendamento
mercantil?
O presente não vem informado como
dispõe a Portaria SEF n° 213/95.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Lei Complementar n° 87/96, art.
3°, VIII;
RICMS/SC, aprovado pelo Decreto
n° 1.790, de 1997, Anexo 2, art. 53;
RICMS/SC, aprovado pelo Decreto
n° 2.870, de 2001, Anexo 2, art. 53;
Convênio ICMS n° 04/97, cláusulas
primeira e segunda.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
O questionamento levantado pela
consulente é dos mais interessantes. Se o art. 53 do Anexo 2 do Regulamento
condiciona a transferência de crédito à financeira ser cadastrada no Estado,
não estaria sendo dado tratamento desigual entre o contribuinte que contratasse
o leasing com financeira estabelecida no Estado e aqueloutro que o
contratasse com financeira de outro Estado? Afinal, o art. 150, II, da
Constituição Federal, veda à União, Estados, Distrito Federal e Municípios
instituírem "tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em
situação equivalente". Trata-se do velho e conhecido preceito aristotélico
de "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais". Ou
seja, a razão do discrímem não guarda relação com as diferenças existentes entre
os contribuintes.
Poderia ainda ser invocado o art.
152, também da Lex Legun, que proíbe estabelecer diferenças tributárias
em razão da procedência ou destino dos bens ou serviços.
Na verdade trata-se de
interpretação errônea da consulente, como veremos a seguir. A transferência de
créditos em questão não é simples aplicação do princípio da não-cumulatividade,
mas verdadeiro benefício fiscal. Como tal pode ser condicionado ao registro da
financeira no Cadastro de Contribuintes do Estado. Este, porém é mera obrigação
acessória, com vistas a melhor controle do aproveitamento dos créditos
(principalmente porque correspondem a imposto pago a outra unidade da
Federação), não representando discriminação entre financeiras estabelecidas
neste ou em outro Estado.
3.1 - A incidência do ICMS
no arrendamento mercantil:
Consoante jurisprudência mansa e
pacífica, "no arrendamento mercantil (leasing), não se caracteriza o fato
gerador do ICMS" (STJ, 1ª T, DJ 27/11/00, p. 127). Isto porque a aquisição
do bem pela financeira (arrendante) não se destina à mercancia (revenda do bem)
o que o descaracteriza como mercadoria, na conhecida definição de J. X.
Carvalho de Mendonça. Pelo contrário, o bem destina-se a ser arrendado.
Este é o negócio da empresa de leasing.
Mesmo a venda do bem arrendado ao
arrendatário, por um valor residual, não caracteriza o fato gerador do ICMS,
dado o seu caráter eventual e opcional. Esta sempre foi a interpretação dada ao
negócio, até a edição da Lei Complementar n° 87/96 que inovando o tratamento
tributário do arrendamento mercantil estabeleceu que (art. 3°, VIII): "o
imposto não incide sobre operações de arrendamento mercantil, não
compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário". Assim,
colocada como ressalva da regra de não tributação, resulta em comando de
incidência do imposto. Sobre o tema, comenta Roque Antonio Carrazza (ICMS,
2000, p. 111):
"Insistimos em que não há
incidência de ICMS ainda quando o arrendatário exercita sua 'opção de compra',
porquanto ela corresponde à última etapa do processo de financiamento,
tributável, em tese, pela União (por meio de IOF). Ademais, já não há, aí,
mercadoria, mas, apenas, um bem de uso, extra commercium."
Observe-se que a regra do inciso
VIII do art. 3° não constitui isenção, mas apenas reconhece a não incidência do
tributo no arrendamento mercantil por não subsunção do fato à tipificação
contida na hipótese de incidência tributária. E nem poderia deixar de ser
assim, pois, falece ao legislador complementar federal competência para isentar
tributo de competência estadual (Constituição Federal, art. 151, III).
A Lei Complementar n° 87/96
realmente prevê nova hipótese de incidência do ICMS (sem adentrar na discussão
dos limites da competência do legislador complementar), qual seja, a venda do
bem arrendado ao arrendatário por valor residual, apesar de ser negócio de
caráter eventual e do bem não ter sido adquirido com essa finalidade. Ora, se
há incidência do imposto, há direito a crédito, pela regra da
não-cumulatividade insculpida no art. 155, § 2°, I, da Constituição da
República.
3.2 - Aplicação da técnica
da não cumulatividade:
Hugo de Brito Machado (Aspectos
Fundamentais do ICMS, 1997, p. 130) distingue entre a não-cumulatividade como
princípio e como técnica. Assim se manifesta o mestre cearense:
"É um princípio, quando
enunciada de forma genérica, como está na Constituição, em dispositivo a dizer
que o imposto "será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em
cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com
o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito
Federal". Em tal enunciado não se estabelece exaustivamente o modo
pelo qual será efetivada a não-cumulatividade. Não se estabelece a técnica.
Tem-se simplesmente o princípio ......
A técnica da não cumulatividade,
a seu turno, é o modo pelo qual se realiza o princípio. Técnica é 'maneira ou habilidade especial de executar
algo". Assim, a técnica da não cumulatividade é o modo pelo qual se
executa, ou se efetiva o princípio."
O princípio da não cumulatividade
assegura ao arrendatário (desde que contribuinte do ICMS) o direito de
compensar o ICMS devido com o ICMS cobrado nas etapas anteriores de circulação
de mercadorias. Como técnica, consiste em lançar como crédito em conta gráfica,
o ICMS que onerou as mercadorias (no
caso bens destinados ao ativo imobilizado) por ele adquiridas.
O seguinte exercício deverá
ajudar a elucidar o ponto enfocado: seja um equipamento no valor de R$
1.000.000,00 (um milhão de reais), adquirido pela financeira (arrendante) que,
ao término do contrato foi adquirido
pela arrendatária por um valor residual correspondente a 5% (cinco por cento)
do valor do bem. Para facilitar, suponhamos ainda que a alíquota do imposto é
de 17% (dezessete por cento) uniforme em todas as operações e que não será
considerada a isenção de que trata o Convênio ICMS n° 4/97 (a operação sendo isenta, não há que se falar em crédito).
Temos o seguinte:
Valor da aquisição pela
financeira ................................... R$ 1.000.000,00
ICMS
.............................................................................
R$ 170.000,00
Venda pelo valor residual
............................................... R$ 50.000,00
ICMS
............................................................................. R$
8.500,00
Crédito do ICMS
............................................................ R$
170.000,00
Saldo credor (da
arrendante)............................................ R$
161.500,00
Crédito a apropriar pela
arrendatária ...............................
R$ 8.500,00
Este é o crédito fiscal a que a
arrendatária teria direito (se não fosse a regra isencional), conforme a
técnica da não-cumulatividade. Esse crédito seria apropriado apenas quando do
exercício da opção de compra e está condicionado a que a arrendatária seja
contribuinte do ICMS.
Entretanto, não é este o crédito
de que trata o art. 53 do Anexo 2 do
Regulamento do ICMS/SC que tem o caráter de verdadeiro benefício fiscal.
3.3 - O Crédito como benefício
fiscal:
O art. 53 do Anexo 2 do
Regulamento do ICMS autoriza "o estabelecimento arrendatário de bens
creditar-se do imposto pago na aquisição do referido bem pela empresa
arrendadora". No exercício, seria o crédito de R$ 170.000,00 e não o de R$
8.500,00.
Esse crédito é transferido da
arrendante (financeira) diretamente para a arrendatária, mediante identificação
da arrendatária na nota fiscal de aquisição do bem pela arrendante e emissão de
nota de entrada por aquela.
O aproveitamento do crédito é
claramente um favor fiscal, pois, somente é permitido porque está expressamente
previsto pela legislação. Como benefício fiscal, nos termos do art. 150 § 6°
c/c art. 155, § 2°, XII, g, ambos da Constituição Federal, sua concessão
depende de deliberação entre os Estados. O crédito está previsto na cláusula
primeira do Convênio ICMS n° 4/97, celebrado nos termos da Lei Complementar n°
24/75. O § 1° da mesma cláusula condiciona o benefício à empresa arrendadora
possuir inscrição no cadastro do Estado onde localizada a arrendatária.
Ao contrário do crédito a que se
refere o item (3.2), este crédito pode ser aproveitado no momento do
recebimento do bem pelo arrendatário, ou seja, antes do exercício da opção de
compra. À evidência, o exercício da opção é condição para o crédito. Caso
contrário, não há incidência do imposto. Por isso, a cláusula segunda do
Convênio ICMS 4/97 prevê o estorno do crédito, atualizado monetariamente, caso
não seja exercida a opção de compra e devolvido o bem para a arrendante.
3.4 - Precedentes desta
Comissão: Consulta n° 26/01:
A temática do arrendamento
mercantil já foi tratada por essa Comissão na resposta à Consulta n° 26/01. Dos
quesitos respondidos, destacamos os seguintes:
"a) inscrição
no cadastro do ICMS:
A
legislação tributária estadual atinge os contribuintes estabelecidos no
território do Estado e aos estabelecidos em outros Estados nos limites em que
lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem (CTN, art.
102). Ora, o Convênio ICMS n° 4/97
obriga a arrendante (instituição financeira) a ter inscrição estadual no Estado
onde localizado o arrendatário, regra esta reproduzida no § 1° do art. 53 do Anexo 2 do Regulamento do ICMS. Não há
portanto necessidade da instituição financeira manter estabelecimento neste
Estado, apenas que, nos termos do Convênio referido, esteja cadastrada como
contribuinte neste Estado. A situação não é inédita, sendo semelhante ao do
contribuinte substituto localizado em outro Estado que também se cadastra como
contribuinte deste Estado, sem precisar manter estabelecimento aqui.
.............................................................
d) venda
do bem ao arrendatário por opção de compra:
A
operação de venda do bem (opção de compra) será isenta apenas quando o
arrendatário/comprador for contribuinte do imposto (Anexo 2, art. 54). No caso
do arrendatário/comprador não ser contribuinte, a operação será onerada pelo
imposto que não resultará em crédito, posto que a venda foi a consumidor final.
e) estorno
do crédito no caso de venda do bem pelo arrendatário:
O
arrendatário não pode vender o bem pela simples razão de não ter a sua
propriedade. O bem arrendado continua de propriedade do arrendante. Somente
após o exercício da opção de compra, ao final do contrato, o arrendante poderá
dispor da coisa, inclusive de aliená-la."
Isto posto, responda-se à
consulente:
a) o
aproveitamento do crédito a que se refere o art. 53 do Anexo 2 do RICMS/SC está
condicionado a que a financeira esteja inscrita no CCICMS deste Estado (pela
qual deve ser adquirido o bem), não que seja estabelecida neste Estado;
b) o
crédito pode ser apropriado por ocasião do recebimento do bem pelo
arrendatário, mediante emissão de nota fiscal nos termos do § 3°, sob condição
resolutória do não exercício da opção de compra - se o bem for devolvido, o
crédito deverá ser estornado atualizado monetariamente;
c) a
contabilização do crédito é independente da contabilização do bem que, enquanto
não exercida a opção de compra, constará do ativo imobilizado da arrendante.
À superior consideração da
Comissão.
Getri, em Florianópolis, 4 de
setembro de 2001.
Velocino Pacheco Filho
FTE - matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 11 de dezembro de 2001.
Laudenir Fernando Petroncini João
Paulo Mosena
Secretário Executivo Presidente da
Copat