EMENTA: ICMS -
IMPORTAÇÃO - MERCADORIA NACIONALIZADA ATRAVÉS DE PORTO CATARINENSE E DEPOSITADA
EM ARMAZÉM-GERAL AQUI SITUADO IMPORTADOR ESTABELECIDO NO ESTADO DO RIO GRANDE
DO SUL. ESTABELECIMENTO DESTINATÁRIO. EXEGESE DO ARTIGO 155, PARÁGRAFO 2°,
INCISO IX, DA CARTA MAGNA, EM FACE DO ARTIGO 11, INCISO I, ALÍNEA “D”, DA LEI
COMPLEMENTAR N° 87/96. LEGITIMIDADE ATIVA DO ESTADO ONDE LOCALIZADO O SUJEITO
PASSIVO DO TRIBUTO, ISTO É, ONDE ESTABELECIDO AQUELE QUE JURIDICAMENTE PROMOVEU
O INGRESSO DOS BENS ESTRANGEIROS NO PAÍS, PARA EXIGIR O CUMPRIMENTO DA
OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PRINCIPAL NO TOCANTE À OPERAÇÃO DE IMPORTAÇÃO. NA SAÍDA DA
MERCADORIA DEPOSITADA NO ARMAZÉM-GERAL, COM DESTINO A QUALQUER OUTRO
ESTABELECIMENTO, FICA RESPONSAVÉL PELO PAGAMENTO DO TRIBUTO DEVIDO, NA
QUALIDADE DE SUBSTITUTO LEGAL TRIBUTÁRIO, O DEPOSITÁRIO DA MESMA.
CONSULTA Nº: 48/98
PROCESSO Nº: GR02 -
7533/97-7
01 - DA CONSULTA
Petroquímica Triunfo S/A, empresa
com sede em Porto Alegre e estabelecida no Pólo Petroquímico do Sul, por seu
representante legal, encaminha expediente a título de consulta sobre a
aplicação da legislação tributária, com base nos seguintes fatos:
1) A empresa pretende receber do
exterior um produto importado denominado polietileno de baixa densidade linear,
devendo a importação entrar no País pelo Porto de Itajaí, neste Estado, local
onde será efetuado seu desembaraço aduaneiro e pagos os tributos aduaneiros
(IPI e II) e o ICMS na importação.
2) Subseqüentemente, do porto as
mercadorias serão depositadas em um armazém-geral localizado na zona secundária
do porto, permanecendo, portanto, neste Estado, por conta e ordem da
consulente.
3) Posteriormente, estas
mercadorias serão vendidas a compradores situados neste Estado, em outros
Estados, ou, eventualmente, poderão ser destinadas ao Rio Grande do Sul.
4) Tendo em vista a tipicidade da
operação haverá a possibilidade de incidência sobre as operações que irá
praticar, de diversas normas constantes dos artigos a seguir referidos, todos
da Lei Complementar n° 87, de 13/09/96: 2°, 4°, 11 e 12.
5) Todavia a consulente está em
dúvida sobre a aplicabilidade das referidas normas, eis que, em consultas
verbais à fiscalização de ambos os Estados, obteve respostas conflitantes relativamente a quem deverá recolher o
ICMS, tanto em relação ao desembaraço aduaneiro, como na hipótese de incidência
pela saída para depósito e venda dos produtos importados, pois o Estado de
Santa Catarina entende que a competência é do Estado do Rio Grande do Sul por
ser o local do estabelecimento importador e o Estado do Rio Grande do Sul
atribui o imposto ao Estado de Santa Catarina por ser o local onde se realizam
fisicamente as operações.
6) Diante do exposto, afirmando
que inexiste ação fiscal contra a mesma, efetua a seguinte consulta:
a) O Estado de Santa Catarina
será o sujeito ativo da operação de entrada da mercadoria e deve arrecadar o
ICMS no desembaraço aduaneiro?
b) Deverá ser emitida Nota Fiscal
da Entrada pelo estabelecimento importador do Rio Grande do Sul, com crédito do
imposto pago na importação?
c) Haverá débito do imposto na
operação de depósito no armazém-geral situado em Santa Catarina? Qual a
documentação fiscal que deve ser utilizada para esta operação? Qual o Estado
que deve arrecadar o ICMS?
d) Nas operações de venda da
mercadoria depositada no armazém-geral situado neste Estado, haverá débito de
imposto? Qual o documentário fiscal que
deve ser utilizado para esta operação? Qual Estado deve arrecadar o ICMS?
e) Na hipótese de o Estado de Santa Catarina entender que não deve
arrecadar o ICMS devido por quaisquer das operações, qual o tratamento que deve
ser dispensado a elas quanto ao documento fiscal, ou seja, em relação às Notas
Fiscais e Livros para atender a operação de importação, depósito em
armazém-geral noutro Estado e posterior venda das mercadorias, tendo em vista
que sobre as operações haverá incidência do IPI? Qual o documentário fiscal que
deve ser utilizado para esta operação? Qual o Estado que deve arrecadar o ICMS?
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal, art. 155, §
2°, IX, “a” e XII “d”;
Lei Complementar n° 87, de
13.09.96, artigos 1°, § 1°, Inciso I; 4°, parágrafo único, I; 6°; 11, I, “c”,
“d”, §§ 1° e 5° e 12, IX;
Código Tributário Nacional, art.
121;
Lei n° 10.297, de 26.12.96,
artigos 2°, I e parágrafo único, I; 4°, IX; 5°, I, “c” e “d”, §§ 1° e 3°; 8°,
parágrafo único, I; 9°, I; 37, IV;
Decreto n° 1.102, de 21 de
novembro de 1903, artigos 1° e 8°, § 4°;
Convênio SINIEF S/N, de 1970,
art. 30;
RICMS-SC/97, aprovado pelo
Decreto n° 1.790, de 29.04.97, Anexo 5, art. 33, § 2° e Anexo 6, art. 38.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
O ICMS é um imposto que incide
sobre operações, aqui empregado o termo como sinônimo de operação mercantil.
Não, porém, qualquer tipo de operação mercantil, mas sim operações que digam
respeito à circulação de mercadorias. O verdadeiro alvo, portanto, da norma
tributária são os negócios jurídicos mercantis.
No caso da importação, o dever
jurídico de recolher o ICMS não se origina de uma operação relativa à
circulação de mercadorias; não há sequer uma operação anterior, já que a
importação configura a primeira circulação econômica no país, que se inicia com
a nacionalização da mercadoria estrangeira.
Tal dever, portanto, nasce
precisamente da efetivação de um negócio jurídico denominado importação.
Concretiza-se nos casos em que
alguém traz para dentro do território aduaneiro brasileiro bens móveis
importados do exterior, independentemente de sua destinação.
É exatamente por isso que o fato
de haver ou não uma subseqüente operação relativa à circulação destes bens é
irrelevante para que surja a obrigação de pagar o tributo na importação, isto
é, o fato típico necessário e suficiente para que se inaugure a relação
jurídica tributária é o ingresso de bens importados no território brasileiro
(importação), fato este que é dissociado de uma circulação jurídica
subseqüente.
Eis a razão porque ambos os
negócios (importação e venda) devem ser analisados isoladamente, dado que não
guardam, necessariamente, relação entre si.
É o que faremos a seguir na
tentativa de encontrar uma solução à problemática suscitada pela consulente já
que esta, ao nosso ver, não parece ter-se apercebido dos aspectos jurídicos
próprios, inerentes a cada um destes dois negócios.
IMPORTAÇÃO DE MERCADORIA: QUAL
PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO É TITULAR DA COMPETÊNCIA PARA EXIGIR O
CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PRINCIPAL?
A resposta a esta questão é
obtida por mera interpretação lógica da norma.
Já dissemos que na importação o
negócio jurídico mercantil, a compra e venda, é realizada no exterior, fora do
alcance da norma tributária brasileira. Por conveniência e para que não se
deixasse de fora da incidência do imposto estadual as relações comerciais com
outros países, a Constituição inverteu a diretriz básica do ICMS (operações relativas
à circulação de mercadorias) e atribuiu ao importador o dever jurídico de pagar
o tributo. Em razão dessa diferenciação, como visto, o fato típico alcançado
pela norma tributária não é o negócio mercantil que ocorre no exterior, mas sim
o ingresso das mercadorias em nosso território.
A hipótese de incidência do ICMS
na importação tem nesta o seu fato típico, porque tipificado pela própria
Constituição.
Em se tratando de instituto
jurídico de categoria constitucional, é só neste campo que se deve procurar as
respostas para eventuais dúvidas em sua aplicação.
Neste mister, o artigo 155, § 2°,
IX, “a” da Carta Magna descreve exaustivamente a hipótese de incidência nas
operações de importação (“incidirá também ...... sobre a entrada de mercadoria
importada do exterior”), sendo que a parte final do mesmo dispositivo procura
resolver eventuais conflitos de competência entre as unidades da Federação,
porquanto declara caber “o imposto ao Estado onde estiver situado o
estabelecimento destinatário da mercadoria ou do serviço”.
Na singeleza desta dicção, pouca
ou nenhuma margem de discricionariedade sobra para que o legislador (mesmo
complementar) possa regular esta figura tributária. É necessário apenas que se
identifique qual é o estabelecimento destinatário numa operação de importação,
para que se obtenha o critério escolhido pelo comando constitucional para a
definição do Estado que tem competência para cobrar o tributo.
Neste passo, precisa e perfeita a
conclusão a que chegaram os advogados Júlio M. de Oliveira e Victor Gomes no
trabalho intitulado “ICMS devido na Importação - Fundap - Competência Ativa”
(publicado na Revista Dialética de Direito Tributário n° 35, pg. 109), in
verbis:
O estabelecimento destinatário a
que se referiu a Carta é, e só pode ser, aquele que importou os bens. Aquele
que realizou um negócio mercantil (compra e venda) no exterior, pagando o preço
avençado e exigindo a entrega. Aquele que contraiu direitos e obrigações
decorrentes do contrato de compra e venda internacional. Por isso, a nenhuma
outra pessoa, ainda que venha a receber fisicamente os bens importados, se pode
atribuir tal natureza.
O que os nobres advogados querem
com isso dizer é que quem tem legitimidade ativa para exigir o cumprimento da
obrigação tributária decorrente da operação de importação é unicamente o Estado
onde se localiza o sujeito passivo do tributo, isto é, aquele que juridicamente
promoveu o ingresso dos bens estrangeiros no país.
Como se sabe, e o próprio artigo
121 do CTN assim o estabelece, o sujeito passivo da obrigação principal é dito
“contribuinte” quando tenha relação pessoal e direta com o fato imponível
(ingresso de mercadoria importada do exterior). No caso em análise, o único que
tem relação pessoal e direta com o fato jurídico nominado de “importação” é o
importador. Ele é quem celebra o contrato de compra e venda internacional,
recebe os bens importados e providencia seu desembaraço aduaneiro, paga o preço
avençado no contrato, recolhe os tributos incidentes na operação realizada,
etc, ou seja, contrai direitos e obrigações diretamente decorrentes deste
negócio jurídico. É pois, o sujeito passivo na relação jurídica tributária, nos
termos do que estabelece o art. 4°, parágrafo único, I da Lei Complementar n°
87/96. Seguindo ainda a linha de pensamentos destes ilustres advogados......
......... induvidoso também que,
na qualidade de sujeito de direitos e deveres no âmbito da relação comercial
internacional e no âmbito da relação tributária, pode tão-somente ser o
importador o destinatário das mercadorias a que se referiu o comando
constitucional. Bem por isso, o critério espacial (jurídico) escorreito para a
definição da competência para tributar a operação de importação só pode ser o
da localização do estabelecimento importador. (op.cit.pg.109)
A interpretação lógico -
sistemática do artigo constitucional supra mencionado nos leva a concluir que o
único ente público que tem competência para exigir o ICMS na importação é o da
localização do estabelecimento do importador, uma vez que o estabelecimento
destinatário da mercadoria ou serviço é aquele que efetivamente praticou o fato
jurídico, ou seja, aquele que realizou a importação. É irrelevante que a
entrada das mercadorias tenha se dado em Estado diverso.
Contrariamente, é incoerente
adotar como critério definidor da competência a entrada física das mercadorias,
no caso desta se dar em estabelecimento de uma pessoa diferente do importador,
ou mesmo, o do destino “final” das mesmas, na tentativa de se interpretar
aquele mesmo artigo. Neste último caso, além do preceito constitucional não se
referir ou tampouco se circunscrever, especificamente, a estabelecimento
destinatário “final”, como o aspecto temporal da hipótese de incidência ficou a
cargo do legislador complementar e o instante em que se considera efetivamente
concretizado o fato e seus efeitos é o do desembaraço aduaneiro das mercadorias
importadas, é impossível estabelecer com precisão nesse momento, na maioria das
vezes, qual o destino último da mercadoria.
Por outro lado, a escolha da
entrada física como meio para determinar tal competência acaba por reduzir dois
negócios jurídicos distintos (importação e revenda dos produtos importados) a
um só. A operação de importação tem, frisamos uma vez mais, natureza jurídica
distinta da compra e venda interna e, por isso mesmo, submete-se à incidência
do ICMS de forma diferenciada. Uma vez nacionalizados os bens e/ou mercadorias,
o destino que lhes for dado é irrelevante para a relação jurídica que já se
esgotou no desembaraço aduaneiro.
A posterior revenda dos bens
importados está, portanto, desvinculada da operação de importação que a
antecedeu, ao menos no que diz respeito à aplicação da legislação tributária.
Com efeito, no momento da revenda destes já não se trata de um importador, mas
de um revendedor de bens importados nacionalizados. Em síntese, durante o ciclo
importação/revenda dos bens, temos duas incidências do ICMS, pois dois são os
negócios jurídicos, cada qual com suas especificidades, sujeitos ao imposto:
por um lado a importação (exteriorizada pelo ingresso dos bens no território
brasileiro) e por outro a revenda (exteriorizada pela saída, real ou simbólica,
dos bens do estabelecimento vendedor).
Tanto isto é verdade que o
próprio Supremo Tribunal Federal, no R.E. 196.663-SP, relator o Exmo. Sr.
Ministro Ilmar Galvão, para citar apenas um exemplo, tem negado às empresas a
pretensão de adotar, em relação ao ICMS incidente na operação de importação, o
sistema de contabilização do correspondente débito na conta-corrente fiscal,
para fins de compensação e recolhimento pelo regime periódico de apuração, sob
o argumento de que há, de fato, dois fatos geradores distintos, ou seja, a
entrada de mercadorias importadas e a saída de mercadorias nacionalizadas,
circunstância suficiente para evidenciar a constitucionalidade e a legalidade
da exigência do recolhimento do tributo sob forma e prazo diferenciados em cada
um dos diferentes fatos geradores previstos na lei.
É interessante que se transcreva
o seguinte trecho das razões de decidir do Sr. Ministro relator, verbis:
Com efeito, como se sabe, o que
se contabiliza na conta gráfica pela entrada da mercadoria, é o crédito do ICMS
embutido no preço pago pelo contribuinte. Assim sendo, não há confundir-se a
operação de entrada de mercadoria provinda do exterior que, por motivos óbvios,
não é tributada pelo ICMS na origem,
com a de mercadoria adquirida no mercado interno, cujo preço traz embutido,
invariavelmente, o tributo pago.
Estando-se diante de situações
diversas, não há falar-se em tratamento tributário análogo que importaria, aí
sim, afronta ao princípio da isonomia.
De outra parte, pela mesma razão
de não ser possível considerar a ocorrência de operações anteriores à
nacionalização da mercadoria importada, não há falar-se em compensação de
créditos, para atendimento ao princípio da não-cumulatividade.
O tributo pago pelo importador,
na operação de entrada, é que é creditado pelo contribuinte, para compensação
quando da revenda do produto, em obediência ao referido princípio.(Excerto do
acórdão publicado no “Boletim Informativo STF” n° 82, de 10/09/97, pg. 4).
Como visto, as operações de
entrada e de saída são completamente distintas e como tal devem ser tratadas.
Se é assim, não é admissível que os efeitos jurídicos da importação fiquem
condicionados ao ingresso físico da mercadoria no estabelecimento destinatário,
para que, então, seja fixado a qual Estado é devido o imposto.
Se é verdade que a sistemática
das importações estabelece procedimentos flexíveis para possibilitar uma
intensa operacionalidade do comércio internacional, permitindo que os bens
importados por empresa estabelecida em um Estado, possam ingressar fisicamente
em porto (ou aeroporto) de outro Estado, e, ainda, destinarem-se a um terceiro
Estado diferente por razões de cunho meramente econômico, associadas à questões
de estratégia de vendas, logística de distribuição ou mesmo redução do custo de
transporte, por exemplo, não é menos verdadeiro que, para fins de tributação,
somente deve ser levado em consideração o fato jurídico.
Em assim sendo, não há como
transladar a figura do contribuinte descrita na Lei Complementar 87/96
(importador) e o momento da concretização da hipótese de incidência
(desembaraço aduaneiro), para um terceiro evento (entrada física), que não
possui qualquer relevância jurídica, como forma de deferir ao Estado de destino
físico do bem, a competência para exigir o tributo devido pela importação.
Aliás, foi exatamente este o erro
que a assessoria tributária do Estado do Rio Grande do Sul cometeu ao responder
idêntica consulta formulada por esta mesma empresa. O equívoco de entender que
o ICMS incidente sobre a importação caberia ao Estado de Santa Catarina por ser
este o Estado de localização do armazém-geral onde ficarão depositadas e,
posteriormente, comercializadas as mercadorias, advém tão-somente do fato de se
procurar interpretar a dicção da lei de forma literal. Se tivessem procurado
compatibilizar os dispositivos que, à primeira vista podem parecer
contraditórios (art. 11, I, “d” da Lei Complementar n° 87/96 versus art. 155, §
2°, IX, “a”, 2ª parte da Carta Magna) não teriam incorrido nesta errônea
conclusão, a qual pode levar ao não-exercício, constitucionalmente assegurado,
da competência tributária, por parte do sujeito ativo de direito, ou seja, o
Estado do Rio Grande do Sul.
A aparente antinomia existente
entre estes dois dispositivos poderia facilmente ser resolvida pelo critério da
hierarquia das normas jurídicas: prevaleceria o mandamento constitucional
porque são os princípios e regras ali insculpidos que conformam o regime
jurídico tributário, acima de quaisquer outros.
A Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional, no entanto, através do Parecer PGFN/CAT/N° 1093/97, em resposta à
questionamento feito pela Secretaria Executiva da Comissão Técnica Permanente do
ICMS (COTEPE-ICMS), enfrentou esta questão, interpretando os dispositivos da LC
87/96 e, com base numa “interpretação corretiva”- a qual conserva ambas as
normas incompatíveis por meio de interpretação que se ajuste ao espírito da lei
e que corrija a incompatibilidade concluiu, verbis:
Nessa linha de raciocínio,
adotando-se a aludida “interpretação corretiva”, sem buscar resolver o impasse
através de critérios hierárquicos, procurando compatibilizar os dispositivos,
temos que o que está disposto no art. 11 deve ser entendido apenas para fixação
de responsabilidade. Na verdade, o imposto é devido no momento do desembaraço
aduaneiro (geralmente no porto ou no aeroporto) e deve ser
recolhido ao Estado da localização do importador, aquele que
juridicamente promoveu a entrada dos bens ou mercadorias no território nacional
(Estado destinatário da importação).
Após discorrer sobre a
responsabilidade solidária, onde o terceiro só assume a obrigação no caso do
contribuinte deixar de cumprir a sua e caber ao terceiro a tomada de alguma
providência, complementa seu pensamento da seguinte forma:
Cremos que é este o tipo de
responsabilidade a que se refere a LC 87/96. O estabelecimento onde se
verificar a entrada física da mercadoria só assume a obrigação de pagar o imposto
quando deixar de adotar alguma providência a que esteja obrigado por lei. Se
isto ocorrer, a lei o responsabiliza solidariamente no que respeita ao
cumprimento do dever de recolher o tributo.
É também este o entendimento dos
nobres advogados, aos quais já nos referimos (op.cit.pg.117), pois,
questionados sobre qual seria o exato entendimento da expressão “entrada
física” contida no artigo 11 da supra citada Lei Complementar, responderam:
Não nos parece que este comando
legal tenha aplicação eficaz no que se refere à definição do Estado competente
para exigir o imposto, uma vez que a construção do campo de competência
impositiva das pessoas políticas é assunto estritamente constitucional, não
tendo sido reservada qualquer parcela desta atribuição para o legislador
complementar. E, nesse sentido, a Constituição é clara ao assinalar que o
imposto cabe ao Estado onde estiver situado o estabelecimento do importador,
nada se referindo à entrada física ou ao local da operação.
A par disso, consideramos tratar-se
de dispositivo ineficaz para a finalidade de eleger o Estado competente,
porquanto a própria Lei Complementar não afirma, em momento algum, que o
imposto é devido para o Estado onde se efetiva a operação. Acreditamos, então, tratar-se de regra
destinada meramente a eleger a pessoa responsável (subsidiariamente) pelo
pagamento do imposto, no caso de inadimplemento pelo contribuinte.
Uma vez termos já exaustivamente
demonstrado, com base no artigo 155, IX, “a” da Carta Magna que o Estado que
tem competência para receber o tributo que incide sobre a entrada de mercadoria
importada do exterior é aquele onde estiver situado o estabelecimento
destinatário da mercadoria, assim entendida a unidade da Federação em
que estabelecido o importador,
independentemente de onde tal
mercadoria tenha sido temporariamente depositada, resta averigüarmos qual ente
tributante tem o direito de exigir o ICMS na ulterior venda da mercadoria que
não tenha transitado pelo estabelecimento do transmitente, mas que tenha sido
remetida para armazém-geral, como é o caso da presente consulta.
MERCADORIA IMPORTADA POR PORTO
CATARINENSE E DEPOSITADA EM ARMAZÉM-GERAL AQUI SITUADO. IMPORTADOR ESTABELECIDO
NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. COMPETÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA PARA
EXIGIR O IMPOSTO NA TRANSMISSÃO A TERCEIRO DA MESMA, ATRAVÉS DESTE DEPOSITÁRIO.
RESPONSABILIDADE POR SUBSTITUIÇÃO DO ARMAZÉM-GERAL PELO PAGAMENTO DO ICMS
DEVIDO.
A resposta a esta parte da
problemática suscitada pela consulente não enseja maiores comentários. Na
verdade, a solução do impasse advém da simples leitura e de um pequeno esforço
interpretativo da legislação tributária aplicável.
De fato, podemos sintetizar as
operações que serão realizadas pela consulente, uma vez desembaraçada a
mercadoria importada, da seguinte forma:
a) o estabelecimento importador
emitirá Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A para fins de entrada, ainda que simbólica,
da mercadoria, sem destaque do imposto. Este, por sua vez, será recolhido ao
Estado do Rio Grande do Sul, devido em função da importação, através da GNRE;
b) a consulente deverá, ainda,
emitir Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, de saída simbólica desta mercadoria, com
destaque do imposto à alíquota interestadual, tendo como destinatário o
armazém-geral depositário, neste Estado. De acordo com o art.33 § 2° do Anexo 5
(Decreto n° 3.250, de 16/10/98, alteração n° 207 ao RICMS/SC-97, com efeitos a
partir de 01/11/98) deverá nela constar uma declaração de que a mercadoria
sairá diretamente da repartição federal em que se processou o desembaraço.
O armazém-geral, por sua vez,
escriturará este documento no seu Registro de Entradas, lançando o crédito do
imposto destacado na nota fiscal referida;
c) na ulterior saída da
mercadoria depositada no armazém-geral, com destino a outro estabelecimento,
ainda que da mesma empresa, tanto o depositante quanto o armazém-geral,
emitirão Notas Fiscais, modelo 1 ou 1-A, nos mesmos termos do disposto no
Convênio SINIEF S/N, de 1970.
A legislação catarinense, como
não poderia deixar de ser, repete as disposições deste Convênio no artigo 38 do
Anexo 6 do RICMS/SC-97 (alteração 208 do regulamento, mesmo Decreto n°
3.250/98), o qual transcrevemos:
Art. 38. Na saída de mercadoria
depositada em armazém-geral, estando o estabelecimento depositante e o
armazém-geral situados em unidades da Federação diversas, com destino a outro
estabelecimento, ainda que da mesma empresa, o depositante emitirá Nota Fiscal,
modelo 1 ou 1-A, sem destaque do imposto, consignando, além dos demais
requisitos exigidos, as seguintes indicações:
I - o valor da operação;
II - a natureza da operação;
III - no campo Informações
Complementares que a mercadoria será retirada do armazém-geral, mencionando-se
o seu endereço e números de inscrição estadual e no CGC/MF.
§ 1° No ato da saída da mercadoria,
o armazém-geral emitirá Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A:
I - em nome do estabelecimento
destinatário, consignando, além dos demais requisitos exigidos, as seguintes
indicações:
a) o valor da operação, que
corresponderá ao da Nota Fiscal emitida pelo estabelecimento depositante na
forma do “caput”;
b) como natureza da operação,
“Outras saídas - remessa por conta e ordem de terceiros”;
c) o número, a série e a data da
Nota Fiscal emitida na forma do “caput” pelo estabelecimento depositante e o
seu nome, endereço e números de inscrição estadual e no CGC/MF;
d) o destaque do imposto, se
devido, com a declaração “O recolhimento do ICMS é de responsabilidade do
armazém-geral”, se for o caso;
II - em nome do estabelecimento
depositante, sem destaque do imposto, consignando, além dos demais requisitos
exigidos, as seguintes indicações:
a) o valor da mercadoria, que
corresponderá àquele atribuído por ocasião de sua entrada no armazém-geral;
b) como natureza da operação,
“Outras saídas - retorno simbólico de mercadoria depositada”;
c) o número, a série e a data da
Nota Fiscal emitida na forma do “caput” pelo estabelecimento depositante e o
seu nome, endereço e números de inscrição estadual e no CGC/MF;
d) o nome, o endereço e os
números de inscrição estadual e no CGC/MF do estabelecimento destinatário e o
número, a série e a data da Nota Fiscal referida no inciso I.
§ 2° A mercadoria será
acompanhada no seu transporte pelas notas fiscais referidas no “caput” e no §
1°, I.
§ 3° A nota fiscal a que se
refere o § 1°, II, será enviada ao estabelecimento depositante, que deverá
registrá-la no livro Registro de Entradas dentro de 5 (cinco) dias contados da
saída efetiva da mercadoria do armazém-geral.
§ 4° O estabelecimento
destinatário, ao receber a mercadoria, registrará no livro Registro de Entradas
a Nota Fiscal a que se refere o “caput”, acrescentando, na coluna Observações,
o número, a série e a data da Nota Fiscal referida no § 1°, I, bem como o nome,
o endereço e os números de inscrição estadual e no CGC/MF do armazém-geral, e
lançará nas colunas próprias, quando for o caso, o crédito do imposto pago pelo
armazém-geral.
Fecha-se, assim, o ciclo
débito-crédito do imposto, ficando cada ente tributante envolvido com a parcela
da receita tributária que lhes compete em função das operações praticadas em
cada território ou a ele destinadas.
Resta-nos agora fazer algumas
considerações a título de esclarecimento à consulente com o intuito de espancar
algumas dúvidas surgidas em decorrência de uma interpretação, salvo melhor juízo,
pouco acurada do sentido que se emprestou à norma tributária e, até,
eventualmente, de apontar as contradições que emergiram justamente em função
desta interpretação sem muito rigor jurídico, tanto no que concerne à resposta
à consulta formulada ao Estado do Rio Grande do Sul, quanto ao memorial
apresentado recentemente pela consulente com o intuito de fornecer subsídios
jurídicos ao desate da questão.
Comecemos pela afirmativa de que
“as legislações estaduais, embora disciplinem inúmeras operações, deixaram de
regular as saídas de mercadorias para depósito em armazém-geral situado em
Unidade da Federação diversa do estabelecimento depositante, em nome do próprio
remetente.”
Não o fizeram por motivos óbvios.
Há que se ter em conta que o que
deve ser disciplinado na legislação, justamente por o ser, é a exceção. Já
dissemos que a diretriz básica do ICMS é a tributação das operações relativas à
circulação de mercadorias; é no momento da saída que, de forma geral, ocorre o
fato gerador do imposto. Ora, as saídas de mercadorias para depósito em
armazém-geral situado em Estado diverso daquele onde situado o estabelecimento
depositante fazem parte da regra, isto é, são normalmente oneradas pelo ICMS.
O são, primeiro porque trata-se
de uma transferência de mercadorias entre estabelecimentos independentes entre
si, com personalidades jurídicas distintas. Não se aplica ao caso,
absolutamente, ao contrário do que quer fazer crer a consulente, a Súmula n°
166 do STJ, pois não é o caso de deslocamento de mercadoria entre
estabelecimento do mesmo titular. Segundo, há aqui uma particularidade que
diferencia esta operação daquela praticada por uma empresa que promove a saída
para depósito em armazém-geral situado dentro de uma mesma unidade da Federação
e, portanto, interna: trata-se de uma saída interestadual envolvendo, pois,
duas pessoas jurídicas de direito público. Enquanto que no primeiro caso a
maior parte dos Estados optam por “suspender” ou “diferir” o pagamento do
imposto para a etapa seguinte de circulação da mercadoria (transmissão da
propriedade), abrindo mão da receita tributária num primeiro momento - ao menos
em tese - para arrecadá-la, necessariamente, posteriormente, no caso específico
ora analisado este artifício não pode (e não deve) ser utilizado por um motivo
simples: uma vez que a mercadoria ultrapasse, ainda que simbolicamente (em
virtude das circunstâncias especiais da operação praticada), a fronteira
“fiscal” dos dois Estados, o pressuposto é que a mesma será “consumida”, isto
é, encontrará sua etapa última de circulação, fora dos limites territoriais
onde localizado o estabelecimento depositante.
É preciso ter em mente, sempre,
que em termos do país como um todo, não existe um mercado único, totalmente
integrado, com ausência de barreiras físicas ou fiscais. Não chegamos ainda a
este nível de integração em termos regionais. O que há é a circunstância de
tratar-se de um tributo cuja competência exclusiva para sua criação foi
conferida aos Estados e ao Distrito Federal, os quais possuem, como corolário do
regime federativo adotado pela Constituição Federal, autonomia administrativa
e, principalmente, legislativa.
As fronteiras que circunscrevem
cada unidade Federativa funcionam aqui como um limite “virtual” desta
competência: onde termina a de um Estado-membro, inicia a do outro.
É a adoção do princípio de
tributação de forma híbrida: por um lado, o Estado de origem (Rio Grande do
Sul) tributa a operação cujo fato gerador ocorreu internamente, qual seja, a
saída com destino ao armazém-geral aplicando, à espécie, a alíquota
interestadual, usando de sua competência constitucionalmente assegurada; por
outro, o Estado depositário (Santa Catarina) tributará integralmente a operação
de saída se a propriedade desta mercadoria for transmitida definitivamente a destinatário
aqui localizado; do contrário, a alíquota reduzida será novamente aplicada
cabendo ao Estado consumidor da mesma o valor do imposto correspondente à
aplicação do diferencial destas alíquotas (minorada e cheia).
No fundo, há uma repartição da
receita tributária entre o Estado produtor (importador) da mercadoria e o
Estado consumidor dela, ambos com competência para cobrar o tributo nas
operações realizadas dentro dos seus respectivos limites geográficos,
respeitadas as regras impostas pela Constituição Federal. Esta é a lógica que
norteia o tributo. E a operação praticada pela consulente aí se insere
perfeitamente.
Não há nenhuma similitude com uma
operação praticada entre estabelecimentos depositante e depositário situados no
mesmo Estado. Em não havendo, o tratamento não pode ser igualitário.
Há, no entanto, uma terceira
razão subjacente e que está relacionada com um princípio basilar (e
constitucional) do tributo: o da não-cumulatividade. Como veremos a seguir, o
armazém-geral é responsável pelo pagamento do imposto pela saída que realizar,
de mercadoria que tenha recebido de estabelecimento localizado em outra unidade
da Federação. Ora, se esta saída é, neste caso, tributada, nada mais justo que
o armazém-geral, exerça o direito de se utilizar do crédito do imposto que
incidiu na operação anterior (entrada proveniente da operação praticada pelo
estabelecimento depositante) como forma de compensar parcialmente o imposto
devido nesta operação subseqüente.
A contrário senso, se a operação
anterior não fosse onerada pelo imposto, estaríamos exigindo do armazém-geral
que, de acordo com o Decreto n° 1.102, de 21 de novembro de 1903, art. 1° tem
por finalidade precípua a guarda e conservação de mercadorias e a emissão de
títulos que as representem, sendo impedido de comercializá-las em nome próprio
(art. 8°, § 4°, mesmo dispositivo), o ônus integral da carga tributária, sem
direito a qualquer abatimento, como se consumidor final fosse.
Neste ponto é necessário que se
demonstre a incongruência do parecer n° 98122 já referido, da Divisão de
Normativo e Contencioso Fiscais, do Estado do Rio Grande do Sul. Ao responder a
mesma consulta formulada por esta empresa concluiu, como vimos, que “... o ICMS
incidente sobre a importação caberá ao Estado de Santa Catarina por ser este o
Estado de localização do armazém-geral onde ficarão depositadas e,
posteriormente, comercializadas ou transferidas as mercadorias em questão”(fls.
05 do parecer). Além disso, com relação ainda a esta operação, para documentar
a remessa do produto ao destinatário (no caso o armazém-geral aqui situado),
deveria ser emitida Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A, sem destaque do imposto. Para
completar, esta nota fiscal, segundo Instrução Normativa interna, seira
escriturada pelo depositário no Livro Registro de Entradas com o aproveitamento
do crédito fiscal, se cabível.
Perguntamos: crédito fiscal
referente a qual operação? À de importação não pode ser. Muito embora o parecer
não o diga expressamente em qualquer parte, intuímos que, segundo aquela assessoria
quem deverá recolher o ICMS incidente na operação de entrada da mercadoria
importada do exterior é a própria
consulente (importadora), já que o armazém-geral não tem qualquer relação
pessoal e direta com o fato imponível, nem tampouco, há disposição legal
expressa que o nomeie responsável pelo recolhimento nesta operação. Se o
sujeito passivo é o importador mas o tributo foi recolhido para o Estado de
Santa Catarina, então a consulente não faz jus a este crédito já que este seria
um direito oponível ao Estado de Santa Catarina que seria, no caso, o sujeito
ativo da obrigação tributária principal.
Da mesma forma, o armazém-geral
não poderia se beneficiar deste crédito fiscal uma vez que não recolheu
qualquer imposto a título de importação. Tal crédito, se fosse o caso, só
poderia ser utilizado para compensação, pelo sujeito passivo.
Ainda que a assessoria tributária
gaúcha - e argumentamos apenas por hipótese - entendesse que a consulente teria
direito à apropriação deste crédito, como tanto a remessa da mercadoria para
depósito no armazém-geral, quanto a ulterior saída desta quando da transmissão
da propriedade não seriam operações tributadas no Estado do Rio Grande do Sul
(apenas esta última seria de responsabilidade, no tocante ao pagamento do ICMS,
do armazém-geral, a exemplo do disposto no Convênio SINIEF S/N de 1970), o
crédito fiscal utilizado teria de ser estornado na mesma proposição destas
saídas não-tributadas.
Igualmente o crédito não poderia
decorrer da operação de remessa do depositante já que esta, como visto, sairia
sem débito do imposto. Entretanto, como a saída subseqüente seria tributada no
Estado de Santa Catarina, o depositário arcaria com todo o ônus da carga
tributária incidente sobre a mercadoria para si remetida.
Voltamos então a indagar: qual
crédito se só há duas formas, neste caso, de possibilidade de aproveitamento,
ambas inviabilizadas - ou através do lançamento do imposto na guia de
recolhimento, consoante previsão regulamentar, ou através da transferência, via
nota fiscal de remessa?
Bem se vê o quão é ilógico e
incoerente o raciocínio da tributação pelo Estado da entrada física da
mercadoria importada do exterior, bem como a tese da não-incidência (ou
isenção) do ICMS na remessa interestadual de bens para depósito em armazém-geral.
Com a devida vênia dos técnicos
do vizinho Estado, o sentido que se emprestou à norma em termos de sua
aplicação não vem respaldada na lei, na jurisprudência ou na doutrina e, na
melhor das hipóteses, com esta interpretação estar-se-ia concedendo isenção
(exoneração tributária) sem qualquer base legal e em desacordo com a Lei
Complementar n° 24/75; inviabilizando o aproveitamento do crédito fiscal
(direito patrimonial de cunho constitucional) por parte tanto do importador
(consulente) quanto do armazém-geral e delegando competência (a par de se abrir
mão de receita fiscal) para a arrecadação de tributo a ente tributante que não
possui legitimidade ativa para tal (competência esta, frisamos, indelegável).
Para finalizarmos, gostaríamos de
fazer apenas mais um comentário: em dado momento, no memorial apresentado pela
consulente (pg. 08), afirma-se que os armazéns-gerais não são contribuintes do
ICMS por não realizarem operações relativas à circulação de mercadorias, sendo
apenas responsáveis pelas operações realizadas pelos depositantes de outras
Unidades da Federação, isto é, responsáveis por obrigação tributária alheia.
Este argumento serve de
fundamento para a conclusão de que:
a) o local e o momento de
ocorrência da hipótese de incidência, devem corresponder ao local do
estabelecimento do depositante, quando o mesmo transmitir a titularidade da
mercadoria, pela emissão da nota fiscal;
b) a alíquota de ICMS praticada
na saída da mercadoria depositada em armazém-geral situado em Estado diverso do
depositante, por conta e a ordem deste, deverá ser a interestadual, caso o
adquirente for um contribuinte deste imposto, situado em Unidade da Federação
distinta do depositante.
Se a premissa é falsa a conclusão
não pode ser verdadeira. O erro em que labora a consulente é, mais uma vez, dar
um tratamento fiscal igualitário a operações que têm naturezas jurídicas
diversas. Repetimos uma vez mais: não há qualquer semelhança em termos
tributários entre a operação de uma empresa que deposita sua mercadoria num
armazém-geral no mesmo Estado em que situada esta e, posteriormente, a revende
para outra estabelecida no Estado vizinho, por exemplo, e a operação em que a
mesma empresa pratica a mesma venda com saída da mercadoria depositada em
armazém-geral situado em Estado diverso.
Diz a Lei Complementar n° 87/96
em seu artigo 11, I, “c”, §§ 1° e 5°:
Art. 11. O local da operação ou
da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do
estabelecimento responsável, é:
I - tratando-se de mercadoria ou
bem:
......................
c) o do estabelecimento que
transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria por ele
adquirida no país e que por ele não tenha transitado;
...............
§ 1° O disposto na alínea “c” do
inciso I não se aplica às mercadorias recebidas em regime de depósito de
contribuinte de Estado que não o do depositário.
..............
§ 5° Quando a mercadoria for
remetida para armazém-geral ou para depósito fechado do próprio contribuinte,
no mesmo Estado, a posterior saída considerar-se-á ocorrida no estabelecimento
do depositante, salvo se para retornar ao estabelecimento remetente.
O parágrafo 5° do referido artigo
contempla com bastante clareza a primeira situação: somente na hipótese do
estabelecimento depositante e do depositário se situarem no mesmo Estado,
considerar-se-á ocorrida naquele a posterior saída da mercadoria.
Por outro lado, não pode ser
aplicada a regra inserta no caput do art. 11 ao caso da consulente (2ª
situação), em ocorrendo a circunstância prevista na letra “c” deste mesmo
dispositivo, a uma, porque ele faz referência à mercadoria adquirida no país
(mas não importada); a duas, porque não faz qualquer menção à remessa para
depósito, donde inferimos tratar-se apenas das “operações casadas”, isto é,
aquelas em que a mercadoria é adquirida por um estabelecimento e, sem que
transite pelo mesmo, seja diretamente remetida ao comprador, pelo vendedor
originário.
Ainda que assim não o fosse, o §
2° dirime qualquer dúvida, afirmando que esta última alínea é inaplicável quando
as mercadorias forem remetidas para depósito por contribuinte estabelecido em
Estado que não o do estabelecimento depositário.
A dedução lógica, e bastaria a
mera leitura deste dispositivo pela consulente, é que neste caso - por sinal, o
mesmo ora analisado - o local da operação para os efeitos da cobrança do
imposto e definição do estabelecimento responsável (pelo seu pagamento, como é
óbvio) não será o do estabelecimento que transfira a propriedade da mercadoria.
É a própria Lei Complementar,
portanto que, distingue as duas situações, tratando-as de forma diferenciada.
Aonde ocorre a operação então e
qual é o estabelecimento responsável neste segundo caso? É a mesma Lei
Complementar que indica a resposta. Estabelece seu artigo 6°:
Art. 6° Lei estadual poderá
atribuir a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título a
responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que o contribuinte assumirá a
condição de substituto tributário.
Foi exatamente o que fez a lei
estadual n° 10.297, de 26.12.96 (a exemplo do tratamento dado pela lei gaúcha
n° 8.820/89, art.7°, II) que, em seu artigo 9°, I, “a”, assim dispôs:
Art. 9° - São responsáveis pelo
pagamento do imposto devido e acréscimos legais:
I - os armazéns-gerais e os
depositários a qualquer título:
a-) nas saídas ou transmissões de
propriedade de mercadorias depositadas por contribuintes de outro Estado ou do
Distrito Federal.
A atribuição da responsabilidade
pelo pagamento do imposto devido pelas saídas promovidas através de
armazéns-gerais aos Estados é, assim, permitida por Lei Complementar. Se é
verdade que estes depositários, como regra, não são considerados contribuintes
do ICMS, não é menos verdadeiro o fato de serem sujeitos passivos da obrigação
tributária principal, na qualidade de responsáveis legais, ou seja, mesmo sem
revestir a condição de contribuinte, o armazém-geral é obrigado ao recolhimento
do tributo por expressa determinação legal.
Neste tipo de responsabilidade o
dever de pagar o tributo já nasce contra a pessoa do sujeito passivo indireto.
É a lei que diz que o depositário é devedor do imposto, ou melhor, que este
substituto legal está compelido a cumprir a obrigação tributária que teve sua
causa jurídica na ocorrência de um fato gerador do qual o substituto não tem
relação pessoal e direta.
Errônea, pois, a assertiva dos
nobres advogados da consulente ao afirmarem que a legislação fiscal enquadra os
armazéns-gerais como responsáveis por obrigação tributária alheia. O substituto
tributário é devedor originário da obrigação tributária, por dívida própria,
ocorrendo uma sujeição passiva indireta e excepcional. Por força de lei, o
encargo da prestação tributária deixa de ser do contribuinte e fica com o
substituto. Na verdade, a obrigação tributária já nasce com a pessoa do depositário
como devedor sendo este obrigado a cumprir as prestações materiais e formais de
tal obrigação.
Para corroborar tal assertiva,
nos permitimos transcrever parte das razões de decidir da Primeira Seção do
Superior Tribunal de Justiça na assentada de julgamento dos Embargos de
Divergência no Recurso Especial n° 59.513 - SP, relator o Exmo. Sr. Min. Ari
Pargendler, julgado em 12 de junho de 1996 (Relatório IOB de Jurisprudência n°
18/96, 2ª quinzena de setembro do mesmo ano, p. 430), verbis:
O artigo 121 do Código Tributário
Nacional trata da sujeição passiva originária ou direta, aquela que resulta da
incidência da norma jurídica tributária; é a sujeição passiva descrita na regra
legal. Se o legislador optar por imputá-la a pessoa “cuja renda ou capital a hipótese
de incidência é fato-signo presuntivo”, estar-se-á diante da figura do
contribuinte, aquele que tem relação pessoal e direta com a situação que
constitua o respectivo fato gerador (artigo 121, parágrafo único, inciso I). Se
a opção for por terceira pessoa, não vinculada ao fato gerador, cuja obrigação
decorra de disposição expressa de lei, estar-se-á diante do substituto legal
tributário (artigo 121, parágrafo único, inciso II).
A obrigação tributária, portanto,
nasce, por efeito da incidência da norma jurídica, originária e diretamente,
contra o contribuinte ou contra o substituto legal tributário, a sujeição
passiva é de um ou de outro, e, quando escolhido o substituto legal tributário,
só ele, ninguém mais, está obrigado a pagar o tributo.
Em síntese, o art. 155, § 2°, IX,
“a”, da Carta Magna traz a consistência material da hipótese de incidência do
ICMS na importação e o critério para definir o Estado competente para cobrá-lo,
sendo aplicável tanto para mercadoria quanto para bem. Qualquer outro critério
é prescindível e irrelevante, dada a clareza com que foi estruturada a locução
constitucional.
O destinatário dos bens
importados só pode ser o próprio importador, já que é este quem celebra o
negócio jurídico de compra e venda internacional. A entrada física no
estabelecimento importador é irrelevante para a caracterização da operação de
importação. Relevante é tão-somente o recebimento jurídico da mercadoria, o
qual se processa por ocasião do desembaraço aduaneiro dos bens importados. Não
tem, pois, qualquer importância o destino dado a estes bens.
Como decorrência lógica, o ICMS
na importação será sempre devido para o Estado em que estiver situado o
estabelecimento do importador, ainda que os bens sejam imediatamente revendidos
e não transitem fisicamente por tal estabelecimento. Nesta hipótese, estaremos
diante de dois negócios jurídicos distintos (importação e revenda) o que
acarreta a incidência do ICMS também nestas duas ocasiões.
No caso de remessa deste produto
a armazém-geral para depósito, em outra Unidade Federada que não a do
estabelecimento depositante, ocorrerá uma entrada física do mesmo no referido
armazém, precedida, logicamente, de uma entrada e uma saída, ambas simbólicas,
dos bens no estabelecimento do remetente. Nesta saída, haverá a tributação
normal do ICMS, à alíquota reduzida, devido ao Estado do depositante.
Na ulterior operação de
circulação com o produto, através do armazém-geral este, na qualidade de
substituto legal tributário, é quem fica no polo negativo da relação jurídica e
não o contribuinte, apenas ocupando o lugar deste sem o substituir. Além disso,
como dito, paga dívida própria e não dívida alheia.
Por todo o exposto, deve ser
respondido à consulente, na mesma ordem das indagações feitas, que:
a) Não, o sujeito ativo é o
Estado do Rio Grande do Sul.
b) Como visto, a legislação
catarinense assim o exige para o caso das operações serem praticadas no seu
âmbito territorial. Como o importador é estabelecido no Estado do Rio Grande do
Sul, é esse o Estado competente a responder a este questionamento. De qualquer
modo, o estabelecimento importador é o único a ter direito ao crédito
decorrente do pagamento do imposto em virtude da operação de importação.
c) Sim, conforme legislação
específica já citada. O documento fiscal a ser utilizado é também competência
do vizinho Estado já que a operação será lá originada sendo assim, a
arrecadação do imposto será do Estado do Rio Grande do Sul, aplicando-se a
alíquota interestadual (reduzida).
d) Sim, conforme legislação
específica já citada. O documento a ser utilizado será a Nota Fiscal modelo 1 ou 1-A conforme artigo retro
transcrito. O ICMS será devido ao Estado de Santa Catarina, aplicando-se a
alíquota de acordo com o destinatário e o tipo de operação. (interna ou
interestadual).
e) Entendemos prejudicada a
questão até porque já foi respondida nas alíneas antecedentes. Além disso, a incidência ou não do IPI não é
matéria afeta a esta comissão.
É o parecer que submeto à
comissão.
Gerência de Tributação, em
Florianópolis, 10 de novembro de 1998.
Neander Santos
FTE- Matr.187.384-9
De acordo. Responda-se a consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 13/11/1998.
Pedro Mendes Isaura Maria
Seibel
Presidente da COPAT Secretária Executiva