Resolução - 034 - Redução Base de Cálculo. Aproveitamento Proporcional dos Créditos
EMENTA: ICMS. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. BENEFÍCIO QUE IMPLICA O APROVEITAMENTO PROPORCIONAL DOS CRÉDITOS DO IMPOSTO. REGRA EXPRESSA NA LEI DE REGÊNCIA, QUE AINDA MAIS SE JUSTIFICA NA HIPÓTESE DO BENEFÍCIO CONCEDIDO AOS ESTABELECIMENTOS DISTRIBUIDORES E ATACADISTAS ESTABELECIDOS NO ESTADO, POR SE TRATAR DE BENEFÍCIO PELO QUAL PODE O CONTRIBUINTE OPTAR LIVREMENTE, CONFORME LHE SEJA FAVORÁVEL.
(Publicado no D.O.E.
de 28.09.02)
CONSULTA Nº: 28/02
PROCESSO Nº: GR02 9.015/01-0
01. CONSULTA
A consulente, entidade
associativa que congrega empresas dedicadas à distribuição e comércio
atacadista estabelecidas em Santa Catarina, formula consulta à COPAT versando
sobre a interpretação dos dispositivos da legislação tributária estadual que
estabelecem o benefício da redução da base de cálculo do ICMS nas operações
realizadas pelas suas afiliadas, questionando se a fruição do benefício implica
a necessidade de aproveitamento proporcional do crédito pelas entradas das
respectivas mercadorias.
Defende a consulente o
entendimento de que tal proporcionalidade não deva ser observada, haja vista
ser o imposto não cumulativo. Menciona, buscando suporte para o seu
entendimento, decisão do Supremo Tribunal Federal que declara inaplicável aos
casos de redução da base de cálculo do ICMS as regras relativas ao
aproveitamento de crédito estabelecidas pela Constituição Federal para os casos
de isenção e não incidência. Refere-se ainda ao teor da Exposição de Motivos
que acompanhou a proposta de edição do Decreto instituidor do benefício, na
qual se consigna a intenção de que deste resultasse para o contribuinte uma
carga tributária equivalente a 12% do valor da operação.
Pergunta a consulente ao
final se está correto seu entendimento.
02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Lei no 10.297/96, art.
23;
RICMS/01, art. 30, Anexo 2, arts. 90 e 91.
03. FUNDAMENTAÇÃO E
RESPOSTA
A matéria objeto da
consulta tem sua disciplina estabelecida de forma bastante clara no art. 23 da
Lei no 10.297, de 26 de dezembro de 1996,que dispõe sobre o ICMS, cujo teor é o
seguinte:
Art. 23. O crédito será apropriado
proporcionalmente, nos casos em que a operação ou prestação subseqüente for
beneficiada por redução de base de cálculo, na forma prevista na legislação
tributária.
Da leitura do
dispositivo, cujo conteúdo é reproduzido pelo art. 30 do RICMS, aprovado pelo
Decreto no 2.870, de 27 de agosto de 2001, resulta bastante clara a incorreção
do entendimento defendido pela consulente. A regra é vazada, com efeito, em
termos inequívocos, que não autorizam dúvida quanto a seu sentido, que não é
outro senão o de que, nas operações beneficiadas com redução de base de
cálculo, "o crédito será apropriado proporcionalmente".
Na verdade, a consulta
ora analisada não expressa propriamente uma dúvida quanto à interpretação do
dispositivo referido. Consiste mais em uma coleção de argumentos que, no
entender da consulente, seriam suficientes para afastar, na hipótese, a
aplicação da regra combatida. A resposta exigida da COPAT, então, é se, diante
de tais argumentos, podem as empresas afiliadas à entidade consulente, deixar
de aplicar, em suas operações a regra do art. 23 da Lei no 10.297/96, e
realizar o aproveitamento integral do crédito, não obstante o benefício da
redução da base de cálculo.
A resposta à questão é
negativa. Inicialmente porque se trata de norma vigente e válida, a que não se
pode negar aplicação, especialmente em sede administrativa, enquanto não
retirada, pelos meios próprios, do ordenamento jurídico vigente. Mas não
somente por isso, uma vez que o dispositivo não padece dos vícios apontados
pela consulente.
Ao contrário do afirmado
pela consulente, o dispositivo não contém ofensa ao princípio da
não-cumulatividade do ICMS. Ofensiva ao princípio seria a regra que
estabelecesse total vedação ao aproveitamento do crédito, como é o caso daquela
declarada inconstitucional pelo STF, no julgado apenas parcialmente trazido à
colação pela consulente, do RE 161.031/MG, cuja ementa é a seguinte:
ICMS. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE.
MERCADORIA USADA. BASE DE INCIDÊNCIA MENOR. PROIBIÇÃO DE CRÉDITO.
INCONSTITUCIONALIDADE.
Conflita com o princípio da
não-cumulatividade norma vedadora da compensação do valor recolhido na operação
anterior. O fato de ter-se diminuição valorativa da base de incidência não
autoriza, sob o ângulo constitucional, tal proibição. Os preceitos das alíneas
"a" e "b" do inciso II do § 2o do artigo 155 da
Constituição Federal somente têm pertinência em caso de isenção ou não-incidência,
no que voltadas à totalidade do tributo, institutos inconfundíveis com o
benefício fiscal em questão.
Ocorre que não se trata,
na hipótese objeto da consulta, de aplicação aos casos sujeitos à redução da
base de cálculo das regras constitucionais reservadas à isenção ou não
incidência. Trata-se, isto sim, de regra própria, estabelecida pelo legislador
estadual especificamente para os casos em que seja concedida redução da base de
cálculo do imposto. Neste caso, tem-se que o próprio legislador, exercendo sua
competência tributária exclusiva - que abrange naturalmente a competência de
exonerar - cuidou de estabelecer o alcance do benefício fiscal nas hipóteses em
que entender por bem conceder redução da base de cálculo.
É certo que em
decorrência da regra insculpida no art. 23 da Lei no 10.297/96 o montante da
desoneração tributária da operação sujeita a redução da base de cálculo será um
pouco menor que aquela que resultaria do mesmo benefício sem a necessidade de
creditamento proporcional. Mas é igualmente certo que o legislador não está
vinculado a conceder benefícios fiscais em montante determinado. A intensidade
da exoneração é matéria que se insere no âmbito de sua competência
discricionária, exercida com atenção a critérios de política tributária.
Pode, assim, entender
que determinadas situações devam sofrer maior grau de exoneração do ônus
tributário, e que outras a necessitem em grau menor. Para atingir tais
objetivos de forma adequada às necessidades de cada situação, vale-se o
legislador de uma série ampla de instrumentos, por meio dos quais pode exercer
sua competência exonerativa em diferentes graus de intensidade.
O benefício fiscal pode,
pois, variar desde a concessão de uma isenção do imposto com autorização para
que o contribuinte aproveite-se integralmente do crédito relativo ao imposto
pago em operações anteriores - abrindo exceção à regra do art. 155, § 2o II, a
e b, da Constituição Federal -, passando pelas isenções normais, em que o
crédito é vedado e pelas concessões de créditos presumidos, até as reduções de
base de cálculo. Nos casos em que concede créditos presumidos ou reduções da
base de cálculo do imposto, o legislador goza ainda de ampla liberdade para a
fixação do benefício, que pode consistir num crédito de pequeno valor, ou na redução
quase integral da base sobre a qual é calculado o imposto.
Essa liberdade revela a
possibilidade de, mediante o manejo dessa ampla gama de instrumentos,
implementar, no âmbito do ICMS, o princípio da seletividade da tributação,
mediante o dimensionamento da carga tributária de forma adequada às
circunstâncias de cada caso, princípio igualmente reconhecido por julgado do
Pleno do STF, também parcialmente transcrito na consulta.
Na hipótese sobre que
versa a consulta, verifica-se que o montante da exoneração tributária fixado
pela legislação não é, segundo o entendimento da consulente, satisfatório.
Porém é ao legislador que cabe fazer esse julgamento, e não ao destinatário da
norma. Ao texto expresso da norma exonerativa deve ceder a insatisfação do contribuinte
beneficiado, não importa quão grande seja essa insatisfação ou o montante em
que entenda seria justo fixar o favor fiscal.
Nesse sentido, é
essencial para a análise da consulta observar que a fruição do benefício fiscal
referido constitui mera faculdade posta pelo legislador estadual à disposição
do contribuinte. Não se trata de um benefício "imposto" ao
contribuinte. Caso este entenda que lhe seja mais vantajoso permanecer no
sistema normal de tributação, sem a redução da base de cálculo, aproveitando-se
integralmente do crédito pelas suas entradas, nenhum obstáculo lhe será
imposto.
É o que se verifica com
bastante clareza das disposições dos arts. 90 e 91 - especialmente deste último
- do Anexo 2 do RICMS/01, verbis:
Art. 90. Até 30 de junho de 2003, fica
reduzida a base de cálculo do imposto nas seguintes operações promovidas por
distribuidores ou atacadistas estabelecidos em território catarinense,
atendidas as disposições desta Seção:
I - em 29,411% (vinte e nove
inteiros e quatrocentos e onze milésimos por cento), nas saídas de mercadorias
sujeitas a alíquota de 17% (dezessete por cento);
II - em 52% (cinqüenta e dois por
cento), nas saídas de mercadorias sujeitas a alíquota de 25% (vinte e cinco por
cento).
Parágrafo único. O benefício não
se aplica às mercadorias:
I - alcançadas por qualquer
outro benefício fiscal;
II - sujeitas ao regime de
substituição tributária.
III - saídas com destino a
consumidor final.
IV - saídas de atacadista ou
distribuidores de:
a) auto peças;
b) material de construção;
c) produtos agropecuários;
d) tecidos, confecções e
calçados.
Art. 91. A aplicação do
benefício dependerá de regime especial concedido pelo Diretor de Administração
Tributária ao interessado.
§ 1º Ao requerer a concessão do regime especial o interessado deverá
no período abrangido pelo regime especial, comprometer-se a:
I - aumentar o nível de
empregos;
II - ampliar as áreas de
armazenagem e a frota de veículos;
III - incrementar o
recolhimento de ICMS.
§ 2° Além do disposto no § 1º, a
fruição do benefício condiciona-se a que o contribuinte:
I - transfira aos adquirentes das mercadorias, sob forma de redução nos preços, o resultado
da redução do imposto.
II - não incorra em
inadimplemento de tributos estaduais.
§ 3° O não cumprimento do disposto
nos §§ 1° e 2°, implica cassação do regime especial, com a conseqüente
exigência do imposto dispensado, sem prejuízo da multa e dos acréscimos legais
cabíveis.
Importa observar que, em
situação semelhante, já reconheceu o Supremo Tribunal Federal, em votação
unânime, a legitimidade de mecanismos destinados à redução da carga tributária
do imposto, que impliquem em substituição do crédito normal do imposto por
alguma espécie de benefício fiscal. É o que fica evidenciado na ementa da Ação
Direta de Inconstitucionalidade 1.502/DF, em que se lê:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
CONVÊNIOS ICM Nº 46/89 E ICMS Nº 38/89 (PARÁGRAFO ÚNICO DAS RESPECTIVAS
CLÁUSULAS SEGUNDAS), QUE ESTARIAM A IMPEDIR O PRESTADOR DE SERVIÇO DE
TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE UTILIZAR CRÉDITOS FISCAIS RELATIVOS A ENTRADAS
TRIBUTADAS, COM OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, DA NÃO-CUMULATIVIDADE E DA
COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA ESTADUAL. REQUERIMENTO DE CAUTELAR. Dispositivo que, ao
revés, se limita a estabelecer compensação automática para a redução da
carga tributária operada por efeito da cláusula anterior, como parte do
sistema simplificado de contabilização e cálculo do tributo incidente sobre as
operações sob enfoque, constituindo, por isso, parte do sistema idealizado e
posto à livre opção do contribuinte. Assim, eventual suspensão de sua
vigência, valeria pela conversão do referido sistema em simples incentivo
fiscal não objetivado pelos diplomas normativos sob enfoque , transformado, por
esse modo, o Supremo Tribunal Federal em legislador positivo, papel que lhe é
vedado desempenhar nas ações da espécie. Conclusão que desveste de qualquer plausibilidade
os fundamentos da inicial. Cautelar indeferida.
Também
aqui, como na situação objeto desse acórdão, o benefício consiste num sistema
alternativo da apuração do montante do tributo devido pelo contribuinte. Por
esse sistema alternativo pode ou não, com absoluta liberdade, optar o
contribuinte, caso entenda que o benefício lhe seja mais favorável que a
tributação sem benefício algum. Fácil concluir, como de fato concluiu o STF,
que a legislação expressa nesses termos não traz qualquer prejuízo ao contribuinte
do imposto.
Não
se vislumbra como possa o contribuinte, após admitir - ao optar pelo benefício
e requerer ao fisco sua fruição, mediante solicitação da concessão de regime
especial - que a sua aplicação lhe é favorável, que a carga tributária a que
fica sujeito em razão de suas operações resta reduzida, pretender demonstrar
qualquer prejuízo em razão da fruição do mesmo benefício fiscal, ainda que seja
a título de cumulatividade do imposto.
Se
o contribuinte opta pelo benefício em substituição ao aproveitamento integral
dos créditos, não pode ser por outra razão senão pelo fato de que os créditos
não lhe proporcionam diminuição do imposto a pagar tão grande quanto a redução
da base de cálculo. Incabível, portanto, falar em cumulatividade. Afinal,
verifica-se a cumulatividade do imposto apenas quando esse venha a incidir mais
de uma vez sobre uma mesma base tributável, de forma que o ônus tributário a
que sujeito o contribuinte resulte agravado, o que evidentemente não ocorre na
hipótese.
Face
ao exposto, responda-se à consulente que não está correto o seu entendimento,
devendo os contribuintes seus afiliados observar, quando da fruição do
benefício previsto nos arts. 90 e 91 do Anexo 2 do RICMS/01, a regra traçada
pelo art. 23 da Lei no 10.297/96, que determina o creditamento proporcional do
imposto
É
o parecer. À consideração da Comissão.
Gerência
de Tributação, em Florianópolis, 7 de agosto de 2002.
Laudenir Fernando Petroncini
FTE - Matr. 301.275-1
COPAT,
em Florianópolis, 16 de setembro de 2002.
Laudenir
Fernando Petroncini
Secretário
Executivo