Resolução - 009 - Fitas de "video game". ISS
009 - ICMS - AS FITAS DE “VIDEO GAME”, POR SEREM PROGRAMAS DE COMPUTADOR, EXPRIMEM O RESULTADO DE ATIVIDADE INTELECTUAL, CONFIGURANDO BEM IMATERIAL E NÃO MERCADORIA, DE SORTE QUE SUJEITAS À INCIDÊNCIA DO ISS CONFORME ITEM 24 DA LISTA DE SERVIÇOS, ANEXA AO DECRETO-LEI 406/68 - ESTES “SOFTWARES” NÃO SE CONFUNDEM COM O SEU SUPORTE FISICO (CARTUCHO) QUE DEVE SER CONSIDERADO COMO ACESSÓRIO EM RELAÇÃO AO PROGRAMA NELE CONTIDO.
(Publicado no D.O.E
de 18.10.95)
CONSULTA N°: 012/95
PROCESSO N°: UF01-2205/93-9
Comentário: Novo
entendimento
Vide Resolução Normativa nº 022
01 - DA CONSULTA
A empresa acima
identificada, através de sua representante legal, formula consulta a respeito
da interpretação da legislação tributária, nos seguintes termos:
a) fitas de jogos
eletrônicos (“Video Game”) são considerados programas de computador gozando
assim da não incidência do ICMS?
b) a tributação desta
mercadoria ocorreria como na entrada originária do Estado de São Paulo,
conforme o artigo 286, Decreto n° 33118/91 e o artigo 51, Decreto n° 35674/92
do RICMS/SP?
02 - LEGISLAÇÃO
APLICÁVEL
Item 24 da lista de
serviços anexa ao Decreto-Lei 406/68, com a redação dada pela Lei Complementar
n° 56, de 15/12/87.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E
RESPOSTA
O parágrafo único do
artigo 1° da Lei n° 7.646, de 18/12/87 (Lei do “software”), define o
programa de computador como “a expressão de um conjunto organizado de
instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de
qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento
da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos, periféricos,
baseados em técnica digital, para fazê-los funcionar de modo e fim
determinados.”
Partindo desta
definição, não parece restar dúvida de que os jogos eletrônicos (“video game”)
são programas de computador (ou “software”), na medida em que são um
conjunto de instruções definidas em um arquivo (fita), com o propósito de
executar tarefas.
No que concerne à
segunda parte da indagação da consulente, ou seja, se tais programas estariam
ou não sujeitos à incidência do ICMS, tem-se argumentado que somente o “software”
desenvolvido sob encomenda (aquele que é produzido em função das específicas
necessidades do usuário, mediante prévia encomenda deste) estaria fora do
âmbito de incidência do imposto, enquanto que no caso de “software”
concebido e elaborado para a generalidade de certo tipo de usuário, que é
gravado em série, em uma certa quantidade de veículos materiais (discos,
disquetes, fitas), veículos materiais estes que são mantidos em estoque e
colocados à disposição dos interessados em utilizá-lo como é o caso das fitas
de “video game” - incidiria normalmente o ICMS.
Este entendimento, no
entanto, não tem encontrado respaldo nem na doutrina nem mesmo na
jurisprudência dos Estados e a nível de jurisdição federal que a este respeito
se formou.
É que, na realidade,
existem algumas particularidades na comercialização dos programas de computador
que devem ser observadas:
- a primeira é que estes
programas são protegidos pela Lei n° 5.988, de 14 de dezembro de 1973 que
regula os direitos autorais, conforme disposto no artigo 2° da Lei 7.646/87, a
chamada “ Lei do Software”.
Os documentos utilizados
pelos bancos de dados - expressões por meio de palavras ou de símbolos de fatos
e de idéias - são “obras intelectuais”, “criação do espírito”, o resultado de
um esforço mental que se concretiza sob forma diferente das demais, como texto
da linguagem - fonte, incluindo-se, portanto, entre as obras intelectuais
protegidas pelo artigo 6° da Lei n° 5.988 /73: “criações do espírito de
qualquer modo exteriorizadas”.
É, portanto, um
monopólio, sob forma de direito exclusivo, ficando vedada sua cópia e, na
terminologia do item XII do mesmo dispositivo, “as adaptações, traduções e
outras transformações de obras originais”, a não ser com o consentimento do
titular.
O artigo 29, por sua
vez, reserva ao autor o direito de utilizar, fruir e dispor de sua obra, bem
como o de autorizar sua utilização ou fruição por terceiros, no todo ou em
parte, e o dispositivo seguinte coloca na dependência de autorização do autor
qualquer forma de utilização, assim como: edição, tradução, adaptação,
comunicação ao público, direta ou indireta, e execução, como tal sendo
considerada a que se realiza através de um computador.
Por fim, o art. 32 veda
a reprodução, sem consentimento do autor, e qualquer aproveitamento econômico
de uma obra, nestas condições, incidirão
nas sanções indicadas nos artigos 122 à 128, todos da Lei n° 5.988/73.
Além disso, o titular
dos direitos de comercialização de programas de computador é obrigado a prestar
serviços técnicos aos respectivos usuários, durante determinado prazo (Lei n°
7.646/87, artigo 24) e, o que é mais importante, “a exploração econômica de
programas de computador, no país, será objeto de contratos de licença ou de
cessão, livremente pactuados entre as partes ...” (art. 27 desta mesma Lei
7.646).
Depreende-se, pois, que
o programa de computador não é vendido. Sua exploração econômica (comercialização)
se dá através de “contratos” de licença ou cessão, como visto, onde o autor (do
programa) cede ou licencia a utilização de seus direitos autorais ao
distribuidor. Este, por sua vez, cede ao varejista, ou diretamente ao usuário
final, o direito não exclusivo de utilizar o “software” (obra
intelectual), mediante certas condições, licença esta geralmente formalizada
mediante um contrato impresso no exterior da embalagem (veículo material), na
qual “software” é o oferecido ao varejo.
Orlando Gomes, no livro
“A Proteção jurídica do software”, ed. 1985, entende que:
Na área
de informática, a computação exige o processamento de programas cuja elaboração
pessoal requer do programador criatividade, isto é, um esforço intelectual,
original em sua composição e sua expressão. O conjunto de procedimentos
necessários ao processamento dos dados no computador, universalmente conhecido
como “software”,
indispensável ao seu funcionamento, depende de programas elaborados por
especialistas e transmitidos ao computador em linguagem de máquina como
comandos, em sequência lógica de instruções e dados destinados a informar o
usuário ou utente. (página 02)
Em outra passagem, o
mesmo autor esclarece que:
O
entendimento dominante é de que esse trabalho é atividade criativa de quem
executa e que o seu resultado é uma obra (serviço) original, que exige esforço
intelectual típico da personalidade de seu criador.(pg.02, ob.cit.)
Eis porque para ele,
assim como para a jurisprudência dominante, como veremos, o programa de
computador é um serviço;
- a segunda diz respeito
à distinção que deve ser feita entre o programa de computador propriamente
dito, bem intangível, fruto de um esforço intelectual, do suporte físico
(cartucho, fita, disquete, etc), que o acondiciona, bem corpóreo, material,
fruto de produção industrial.
Um não se confunde com o
outro.
Se analisarmos
atentamente a matéria em exame, veremos que na comercialização de um programa
de computador, como o “video game” por exemplo, o objeto da operação não é a
venda de um veículo material (suporte físico) beneficiado com a gravação de um
“software”; ao contrário, é a circulação de um bem intangível, ou seja, o
direito autoral sobre o “software”, acondicionado, simplesmente, no cartucho ou
fita.
O objeto de circulação
econômica não é, no caso, o veículo material - mero armazenador do conjunto de
instruções que compõem o “software” - mas, isto sim, a obra intelectual ali
contida, bem intocável protegido pelo direito autoral.
Partindo deste
pressuposto, é mister concluirmos que o “software” é coisa principal em relação
a seu veículo físico ou, dito de outra forma, que o cartucho, fita ou disquete
(suportes físicos), devem ser considerados como acessórios em relação aos
programas neles contidos.
Leciona-nos Carlos
Augusto da Silveira Lobo, em seu didático trabalho intitulado “Tributação do
Software de Prateleira”, publicado no repertório IOB de jurisprudência, RJ/1,
n° 19/92:
(.....)
na operação em exame circula bem intangível, ou seja, o direito autoral sobre o
software. Com efeito, o
objeto da operação não é a venda de um veículo material beneficiado com a
gravação de um software,
para que o adquirente, tendo o direito de usar, fruir e dispor do meio
material, possa exercer a faculdade do livre uso privado da obra intelectual
nele gravada. Muito ao contrário, o negócio jurídico ajustado no caso tem
exatamente o objetivo de evitar esse efeito. Sub-licencia-se o software ao usuário final precisamente para
denegar-lhe a faculdade de livre uso. Pretende-se que o usuário final utilize a
obra intelectual apenas nas condições autorizadas. Assim, portanto, o veículo
material não é objeto principal da operação de circulação nem pode ser
considerado em si como mercadoria. Na verdade é um mero veículo, como
procedentemente se o designa; é transferido à posse do usuário final apenas
para que a utilidade econômica em circulação, isto é, o software, possa ser utilizado na forma do contrato de
licença.
Este é um dos argumentos
de que este ilustre advogado fez uso para concluir que o ISS (e não o ICMS)
incide sobre a operação em exame.
Ratificando este
entendimento e aditando outros argumentos a favor desta mesma tese, achamos
oportuno reproduzir parte da jurisprudência existente sobre este tema, tanto a
nível de decisões judiciais de outros estados quanto a nível federal.
Neste sentido, ementas
de acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do Tribunal Regional
Federal, 2ª região e do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente:
a) IMPOSTO -
CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS - SOFTWARE - LEI ESTADUAL N° 8.198, DE
1992 - HIPÓTESE EM QUE O QUE SE COMERCIALIZA NÃO É O SUPORTE FÍSICO (DISQUETE)
E SIM PROGRAMAS - SUJEIÇÃO APENAS AO ISS - RECURSO NÃO PROVIDO.
(Apelação Cível n°
206.155-2 - São Paulo - Apelante: Fazenda do Estado - Apelada: Ensyl Sistemas
de Informática Ltda - julgada em 08/02/94 - TJESP - Rel.Min. Roberto Stucchi),
b) ADMINISTRATIVO E
TRIBUTÁRIO IMPORTAÇÃO. PROGRAMAS DE COMPUTADOR GRAVADOS EM DISQUETES. O
DISQUETE (SUPORTE FÍSICO) DEVE SER CONSIDERADO COMO ACESSÓRIO EM RELAÇÃO AO
PROGRAMA NELE CONTIDO. (......). APELAÇÃO DESPROVIDA, POR UNANIMIDADE.
(Apelação em mandado
de segurança n° 90.02.18057-8-RJ - Tribunal Regional Federal - 2ª região -
Rel.Juiz Ney Valadares, julgada em 27/11/91 - DJU 13/02/92 - pg.2.416),
c) TRIBUTÁRIO - ISS -
PROGRAMAS DE COMPUTADOR - LEI 7649, ART. 27 - DECRETO-LEI 406/68, LISTA DE
SERVIÇOS - ITEM 24.
1. OS SISTEMAS DE
COMPUTAÇÃO, CONSTITUÍDOS DE PROGRAMAS, EXPRIMEM O RESULTADO DE ATIVIDADE
INTELECTUAL, DE SORTE QUE CONFIGURAM BEM IMATERIAL E NÃO MERCADORIA, A AFASTAR
A HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ICMS.
2. A EXPLORAÇÃO
ECONÔMICA DE PROGRAMA DE COMPUTADOR, MEDIANTE CONTRATOS DE LICENÇA OU DE
CESSÃO, SUJEITA-SE À COBRANÇA DO ISS (ITEM 24, DA LISTA DE SERVIÇOS, ANEXA AO
DECRETO-LEI 406/68).
3. RECURSO DESPROVIDO,
POR UNANIMIDADE.
(R.Esp n° 39457 - SP
- STJ - Turma 01 - Rel.Min. Humberto Gomes de Barros - julgado em 13/08/94 -
DJU. 05.09.94 - pg.23.040).
Por fim, a ementa no
julgamento do Recurso Especial n° 39.797-9-SP, do Superior Tribunal de Justiça,
sendo a recorrente a Fazenda do Estado de São Paulo e o recorrido “MUMPS
Processamento de Dados Ltda,” julgado em 15/12/93:
EMENTA: ICMS -
PROGRAMAS DE COMPUTADOR - NÃO INCIDÊNCIA.
A EXPLORAÇÃO
ECONÔMICA DE PROGRAMAS DE COMPUTADOR, MEDIANTE CONTRATOS DE LICENÇA OU CESSÃO,
ESTÁ SUJEITA APENAS AO ISS. REFERIDOS PROGRAMAS NÃO SE CONFUNDEM COM SEUS
SUPORTES FÍSICOS, NÃO PODENDO SER CONSIDERADOS MERCADORIAS PARA FINS DE
INCIDÊNCIA DO ICMS.
RECURSO IMPROVIDO.
Do acórdão, publicado na
Revista do Superior Tribunal de Justiça, n° 58, pgs.409 à 412, extraímos parte
do voto do relator Min. Garcia Vieira que, após tecer várias considerações a
respeito tanto da Lei n° 7.646/87 quanto da Lei n° 5.988/73, já citadas ,
inclusive se referindo à de n° 7.547/89, esta instituidora do ICMS no Estado de
Santa Catarina, concluiu que:
O
imposto a ser cobrado é apenas o ISS que tem como fato gerador “a prestação por
empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço
constante da lista anexa” (artigo 8°, “caput” do Decreto-lei n° 406/68). O
serviço de programação pode ser incluído nos itens 22 e 24 e está sujeito
apenas ao ISS (artigo 8°, parágrafo 1° do Decreto-lei n° 406/68).
Assim,
não resta a menor dúvida de que a exploração econômica de programas de
computador, mediante contratos de licença ou de cessão, está sujeita apenas ao
ISS. Sobre ela não incide Imposto de Circulação de Mercadorias.
Nego
provimento ao recurso.
Para concluirmos, uma
última observação:
Poder-se-ia argumentar
que, no caso da comercialização deste tipo de “software” em que uma única
operação é constituída inseparavelmente por bem intangível e tangível ou seja,
onde circula, concomitantemente, serviço e mercadoria, ficaria particularmente
difícil separá-las e atribuir-lhes os respectivos valores, para o efeito de
ensejar a incidência cumulativa do ISS, que compete ao município, e do ICMS,
que compete ao Estado.
Sem que entremos no
mérito da discussão se é correto considerarmos o veículo material que contém o
“video game” como mercadoria, no direito vigente esta discussão fica resolvida
em função das seguintes regras: (a) se o serviço está previsto na lista de
serviços sujeitos ao ISS, aprovada pela Lei Complementar 56/87, o ISS incide
sobre o valor total da operação, não incidindo portanto o ICMS sobre a
componente mercadoria, salvo nos casos excepcionais em que a própria lista o
determina (Decreto-Lei 406/68, artigo 8°, parágrafo 1°, recepcionado pela
Constituição de 1988); (b) se o serviço não está previsto na lista, o ICMS
incide sobre o valor total da operação, não incidindo, portanto, o ISS sobre o
componente serviço (Constituição, artigo 155, I, b).
Como, na espécie, o
serviço de programação está incluído no item n° 24 da lista de serviços anexa à
Lei Complementar 56/87 e como não há neste qualquer observação a respeito da
incidência do ICMS no que concerne ao suporte físico, não há que se falar na
cobrança deste imposto nas saídas dos cartuchos, fitas, etc, incidindo, tão
somente, o ISS, sobre o valor total da operação (serviço).
A resposta, portanto, à
segunda parte da indagação da consulente (item “a”) é igualmente positiva: as
fitas de “video game” gozam da não incidência do ICMS porque a ocorrência do
fato gerador enseja a incidência de outro tributo, de competência municipal.
Com relação ao item “b”
da consulta, esta restou prejudicada em função dos argumentos anteriores.
É o parecer que submeto
à Comissão.
GETRI, em Florianópolis,
11 de setembro de 1995.
Neander Santos
FTE - matr. 187.384-9
De acordo. Responda-se a
consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia
09/10/1995.
Renato Luiz Hinnig João Carlos Kunzler
Presidente da COPAT Secretário Executivo