Resolução - 031 - Consulta. Ilegitimidade. Pessoa estranha à relação jurídica tributária
EMENTA: CONSULTA. ILEGITIMIDADE. NÃO É PARTE LEGÍTIMA A PESSOA ESTRANHA À RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA QUE SE INAUGURA A PARTIR DA SITUAÇÃO FÁTICA A QUE SE REFERE A CONSULTA. ARQUIVAMENTO NOS TERMOS DO ART. 6° DA PORTARIA SEF N° 213/95.
(Publicado no D.O.E.
de 18.10.2001)
CONSULTA N°: 062/01 - COPAT
PROCESSO N°: GR08 60.388/97-8
01 - DA CONSULTA
A consulente, acima
identificada, é empresa estabelecida no Estado do Rio Grande do Sul que opera
no ramo de comércio, exportação e importação, entre outros itens, de móveis e
insumos para indústria moveleira.
Informa ser cliente de
diversas empresas catarinenses que operam no ramo de industrialização de
madeira, das quais adquiria, no período entre março de 1989 e julho de 1992,
lâminas de pinho, que eram posteriormente exportadas.
Noticia ainda que as
aquisições realizadas no ano de 1989, de uma empresa catarinense, identificada
nos autos pela consulente com a declinação da razão social e localização,
realizaram-se sem a incidência do ICM, eis que dos respectivos documentos
fiscais constava a observação de tratar-se de mercadorias imunes, vez que
destinadas à exportação. Os dispositivos legais lançados no documento pelo
fornecedor catarinense são apontados pela consulente (Decreto-Lei n° 406/68,
art. 1°, § 3°, I, Convênio ICM 08/89, Convênio ICMS 26/89 e Decreto n°
3.143/89).
Alegando a necessidade
de comprovar judicialmente o tratamento tributário dispensado pelas diversas
unidades da Federação, relativamente ao produto que indica, quando destinado à
exportação, questiona:
a) qual o tratamento
tributário, relativamente à incidência e recolhimento do ICMS, a que estavam
sujeitas as saídas de lamina de pinho destinadas à exportação realizadas pelas
empresas catarinenses, com destino a empresa exportadora gaúcha, no período de
março de 1989 a agosto de 1992. Insta que as informações sejam prestadas "compreendendo os aspectos materiais e
formais, relatando todas as modificações ocorridas e datas de vigência e acostando a lei e/ou legislação específica,
autenticada administrativamente". Ainda nas palavras da consulente,
deve-se "fornecer, inclusive, informações sobre base de cálculo, alíquota,
forma de cálculo do ICMS, créditos, Convênios ICM/ICMS e outros esclarecimentos
julgados necessários";
b) indaga se, nessas
operações, na condição de destinatária das mercadorias tem direito a crédito do
imposto. Especifica o questionamento dizendo que "a resposta deve abranger o período de março de 1989 a
agosto de 1992, em relação a cada um dos procedimentos tributários praticados
no Estado de Santa Catarina quanto ao assunto objeto da presente consulta,
inclusive em caso de não incidência, acostando a lei e/ou legislação
específica, autenticada administrativamente".
c) qual a data da
instituição do ICMS em Santa Catarina e quais
"os procedimentos utilizados enquanto isto não ocorreu, mencionando
tudo o que for julgado necessário sobre o assunto em geral e sobre os produtos
denominados semi-elaborados, destinados à exportação, em especial o produto
(lâmina de pinho) sobre o qual versa o presente pedido de esclarecimento,
inclusive convênios ICM/ICMS e lei estadual do ICMS";
d) se os procedimentos a
que se refere nos dois primeiros questionamentos tiveram, no período
considerado, aplicação uniforme em todo os Estado de Santa Catarina.
02 - LEGISLAÇÃO
APLICÁVEL
Lei n° 3.938/66, arts.
209 e 211;
Portaria SEF 213/95,
arts. 1° e 8°.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E
RESPOSTA
Observa-se de início que
a requerente não é parte legítima para a formulação da consulta em análise. Com
efeito, a Lei n° 3.938, de 22 de dezembro de 1966, ao disciplinar o instituto,
estabelece em seu art. 209 que a consulta sobre a interpretação de dispositivos
da legislação tributária poderá ser formulada a) pelo sujeito passivo do
tributo, b) por órgãos da Administração Pública e c) por entidades
representativas de categorias econômicas, neste caso quando se trate de matéria
de interesse comum de seus representados.
Evidentemente, em
nenhuma dessas situações enquadra-se a requerente. As indagações constantes da
consulta são todas referentes ao tratamento tributário recebido por operações
realizadas por terceiros, seus fornecedores. Estes sim, sujeitos passivos da
relação jurídica tributária que eventualmente se instaure em função da
realização dessas operações, são parte interessada e por isso estão legitimados
a requerer esclarecimentos sobre a legislação aplicável.
A consulente, ao contrário, é pessoa estranha
à relação tributária decorrente dos fatos descritos. O fato de ser destinatária
dos produtos objeto daquelas operações não lhe defere o direito de obter do
Estado de Santa Catarina manifestação relativa à interpretação dos dispositivos
aplicáveis.
Em diversas
oportunidades, manifestou-se esta Comissão a respeito da exigência da
legitimidade da parte consulente, para o atendimento da consulta. Nesse
sentido, cite-se como exemplo a resposta formulada à Consulta n° 18/01, em cuja
ementa se lê:
"CONSULTA FISCAL. ILEGITIMIDADE.
CONTABILIDADE E SUAS ASSOCIAÇÕES DE CLASSE NÃO TEM LEGITIMIDADE PARA FORMULAR
CONSULTA SOBRE A LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA ESTADUAL, POR NÃP SE REVESTIREM DA
CONDIÇÃO DE CONTRIBUINTES".
Do corpo do parecer que
fundamenta a resposta, destaca-se o seguinte:
"O instituto da consulta visa dirimir
dúvidas sobre a 'interpretação de dispositivos da legislação tributária
estadual". O direito de formular consulta prende-se, portanto, ao
interesse do consulente na matéria consultada. Esse interesse é do destinatário
legal tributário ou de terceiro obrigado ao cumprimento da legislação
tributária. Não é o caso dos contadores que, rigorosamente, não têm interesse
na matéria, uma vez que são meros prestadores de serviço, contratados pelo
sujeito passivo. A respeito da noção de interesse como condição para a
formulação de consulta, preleciona Valdir de Oliveira Rocha (A Consulta Fiscal,
São Paulo: Dialética, 1996):
'A noção de parte é fundamental para a
compreensão da consulta fiscal, enquanto modalidade do processo administrativo
em que um interessado apresenta dúvida sobre a situação de fato ao
Fisco-Administração, para obter decisão a respeito, e da resposta, como decisão
do Fisco-Administração que a ela fica vinculada.' "
O instituto da consulta
destina-se ao esclarecimento de dúvidas do sujeito passivo quanto à
interpretação da legislação tributária, e sua correta aplicação às operações
que realiza. Ao Estado, diante do questionamento regularmente formulado, cabe
fornecer sua posição oficial, à qual estará vinculado em relação àquele contribuinte.
Versando as mais das
vezes sobre questões muito específicas, em que as respostas são determinadas em
função de aspectos muito particulares a cada caso concreto, as respostas às
consultas têm - e não poderia ser diferente
- aplicabilidade muitíssimo restrita. Nos termos do art. 211 da Lei n°
3.938/66, "a resposta aproveita apenas a quem a formulou". Daí
inadmitir-se que terceira pessoa, estranha à relação obrigacional tributária
eventualmente inaugurada com a ocorrência do fato objeto da dúvida, imiscua-se
na questão que, ao menos de direito, somente a terceiros interessa.
Nesse mesmo sentido,
veda ainda a legislação a consulta formulada sobre legislação em tese (Lei n°
3.938/66, art. 213, I). Somente terá cabimento a manifestação oficial da
autoridade tributária diante de problemas concretos e bem definidos,
encontrados pelo próprio sujeito passivo do tributo.
Nem mesmo quanto ao
segundo questionamento formulado, que diz respeito à possibilidade de
aproveitamento de crédito do ICMS pelo destinatário das operações descritas,
pode prosperar a consulta. O aproveitamento de créditos pela consulente, visto
tratar-se de contribuinte estabelecido no Estado do Rio Grande do Sul, e
portanto contribuinte daquele Estado, é regulado exclusivamente pela legislação
gaúcha. Dessa forma, dúvidas quanto a sua interpretação ou aplicação deverão
ser dirimidas pela autoridade fazendária daquele Estado. Na hipótese, é ao
Estado de Santa Catarina que falece legitimidade para manifestar-se a respeito
da questão.
Por fim, lembre-se mais
uma vez que a consulta destina-se ao esclarecimento de dúvidas quanto à
interpretação da legislação tributária. Não comporta, assim, questionamentos
vagos, imprecisos, especialmente porque sua vocação é a de originar uma
resposta vinculante para a Administração, relacionada a uma determinada
situação concreta. Portanto, é absolutamente indispensável que o consulente
aponte com precisão sobre que ponto da legislação repousa sua dúvida. Caso
contrário, a resposta fica iviabilizada.
No caso em tela, pode-se
com facilidade observar que a consulta, tal como formulada, não atende a esse
requisito. Ainda que fosse legítima a parte que a formula, não seria possível
sua resposta.
De fato, vê-se muito bem
que não há dúvida manifestada pela consulente relativamente a dispositivo
determinado da legislação. Ao contrário, a consulente desconhece a legislação
por completo, e é esse o seu problema.
O que busca a
consulente, na verdade, é a obtenção do próprio texto da lei, de que não
dispõe. Fica evidente, pois, não que optou pelo expediente adequado, posto que
a esse fim não se presta a consulta.
Dessa forma, prejudicada
a resposta aos questionamentos formulados, sugiro o arquivamento da consulta,
nos termos do parágrafo único do art. 6° da Portaria SEF n° 213/95,
comunicando-se o fato à requerente.
É o parecer. À
consideração da Comissão.
Getri, em Florianópolis,
9 de agosto de 2001.
Laudenir Fernando
Petroncini
FTE - matr. 301.275-1.
COPAT, em Florianópolis,
17 de outubro de 2001.
Laudenir Fernando
Petroncini
Secretário Executivo
Resolução - 032 - Diferimento. Saída de peixe crustáceo e molusco.
EMENTA: ICMS. DIFERIMENTO PARA A ETAPA SEGUINTE DE CIRCULAÇÃO. SAÍDA DE PEIXE, CRUSTÁCEO E MOLUSCO, CAPTURADOS COM UTILIZAÇÃO DE EMBARCAÇÃO DO PRÓPRIO CONTRIBUINTE. O DIFERIMENTO SOMENTE ALCANÇA A OPERAÇÃO DE QUE DECORRE A ENTRADA DA MERCADORIA NO ESTABELECIMENTO, E NÃO A OPERAÇÃO SUBSEQUENTE, DE SAÍDA, AINDA QUE DESTINADA À COMERCIALIZAÇÃO OU INDUSTRIALIZAÇÃO.
(Publicado no D.O.E
de 31.12. 2001)
CONSULTA Nº: 101/01 - COPAT
PROCESSO N°: GR01 5.216/99-0
01 - DA CONSULTA:
O contribuinte acima
identificado, que afirma ter como atividade principal a "captura de peixes
de água salgada", formula consulta à COPAT relativamente ao correto
tratamento tributário das saídas, de seu estabelecimento, dos peixes que ele
próprio captura.
Informa o consulente
ter-se defrontado com entendimentos divergentes a respeito da matéria, por
parte de agentes do fisco, entendendo alguns que tais operações estão ao abrigo
do diferimento do imposto previsto no art. 7° do Anexo 3 do RICMS/97, aprovado
pelo Decreto n° 1.790, de 29 de abril de 1997.
Vêm anexos à consulta
cópias dos documentos relativos a três embarcações pesqueiras de propriedade do
consulente, certamente aquelas das quais se vale para a captura do pescado
objeto do questionamento.
02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
RICMS/97, arts. 4°, I, i,
e 5°, § 3°, Anexo 3, art. 7°, Anexo 5, arts. 2°, caput e §§ 3° e 4°, e
39, VI;
RICMS/01, arts. 4°, I, i,
e 5°, § 3°, Anexo 3, art. 7°, Anexo 5, arts. 2°, caput e §§ 3° e 4°, e
39, VI.
03. FUNDAMENTAÇÃO E
RESPOSTA
O consulente, segundo
informa, realiza ela mesma a captura do pescado que comercializa, com
utilização de embarcações de sua propriedade. Questiona se às saídas dessas
mercadorias de seu estabelecimento, quando destinadas à comercialização ou
industrialização, é aplicável o diferimento do imposto, na forma prevista no
art. 7° do Anexo 3 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto no 2.870, de
27 de agosto de 2001, verbis:
Art. 7º O imposto fica diferido para a etapa
seguinte de circulação na saída de peixe, crustáceo e molusco, em estado
natural, quando o remetente for o próprio captor ou produtor e o produto se
destinar à comercialização ou industrialização.
Parágrafo único. O diferimento abrange também
a saída de gelo destinado à conservação dos produtos.
Idêntica redação tinha o
regulamento anterior, aprovado pelo Decreto n° 1.790, de 29 de abril de 1997.
A resposta à questão
proposta exige algumas considerações preliminares. Em primeiro lugar, é necessário
lembrar que, para os fins que respeitam à incidência do ICMS, as embarcações
pesqueiras de propriedade do consulente, utilizadas para a captura do pescado,
são considerados estabelecimentos autônimo do contribuinte. Cada um desses
barcos, portanto, é um estabelecimento distinto, que não se confunde com o
estabelecimento cujo endereço é indicado na consulta, situado em Biguaçu, para
o qual certamente é enviado o pescado, após sua captura, para beneficiamento e
acondicionamento. Nesse sentido é o que dispõe inequivocamente o art. 5° do
RICMS/01, verbis:
Art. 5º Estabelecimento é o local, privado ou
público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou
jurídicas exerçam suas ativa em caráter temporário ou permanente, bem como onde
se encontrem armazenadas mercadorias.
(...)
§ 2º É autônomo cada estabelecimento do mesmo
titular.
§ 3º Considera-se também estabelecimento
autônomo o veículo usado no comércio ambulante ou na captura de pescado.
Tratando-se de
estabelecimentos distintos, autônomos entre
si, é preciso distinguir com clareza as operações realizadas por cada um
deles, com vistas à sua correta compreensão e conseqüentemente à perfeita determinação do tratamento
tributário correspondente.
É certo que para fins
cadastrais esses vários estabelecimentos praticamente se confundem, face a uma
série de peculiaridades idealizadas pelo legislador com o objetivo de
simplificar o cumprimento das obrigações acessórias pelo contribuinte. Isso se
verifica com clareza no art. 2° do Anexo 5 do RICMS/01, que logo após
estabelecer em seu caput a exigência de inscrição ande para cada
estabelecimento do contribuinte, autoriza, no § 3°, a concessão de uma
inscrição única, englobando todos os barcos - ou, dito de outro modo, todos os
estabelecimentos - de um mesmo contribuinte, empregados na captura de pescado.
Reza o dispositivo, verbis:
Art. 2º Para cada
estabelecimento será exigi-da inscrição independente.
(...)
§ 3º O Gerente
Regional da Fazenda Estadual poderá conceder inscrição única para os
barcos de um mesmo contribuinte empregados na captura de pescado.
§ 4º Relativamente
aos locais de extração ou produção agropecuária, de caráter permanente ou
temporário:
I - quando exploradas
por empresa comercial ou industrial fica dispensada a inscrição para cada
local de extração ou produção agropecuária;
II - quando tratar-se
de pessoa jurídica que atue exclusivamente na atividade de extração ou produção
agropecuária, será autorizada inscrição única no município onde localizado sua
sede.
O § 3° faz referência
expressa apenas à possibilidade de inclusão, sob uma mesma inscrição, dos
vários estabelecimentos do contribuinte que correspondam a embarcações
pesqueiras, nos termos do art. 5°, § 3°, do Regulamento. Contudo, deve-se
concluir que essa mesma inscrição deva incluir igualmente o eventual
estabelecimento mantido em terra, onde o contribuinte posteriormente promova a
armazenagem, beneficiamento e acondicionamento do pescado, como ocorre no caso
do consulente. A essa conclusão leva o disposto no inciso I do § 4° do art. 2°
do Anexo 5, supra transcrito, embora sem referência expressa à situação das
embarcações pesqueiras. A aplicação da
regra à hipótese, porém, é imperiosa, dada a similaridade entre as situações.
Essa autorização
excepcional de reunião dos vários estabelecimentos de um mesmo contribuinte sob
um único registro cadastral não implica que se passe a considerar a partir de
então como existente apenas um estabelecimento. Continuam sendo vários os
estabelecimentos não obstante comunguem de um mesmo número de inscrição. Essa
identidade assume, assim, relevância apenas para fins de cumprimento de
obrigações acessórias, possibilitando o estabelecimento de um regime
simplificado, em que o contribuinte possa, em relação a todos os estabelecimentos
abrangidos pelo mesmo cadastro, realizar a escrituração de apenas um conjunto
de livros fiscais, por exemplo.
Uma vez que essa reunião
excepcional de vários estabelecimentos de um mesmo contribuinte sob uma mesma
inscrição não lhes retira a autonomia, essa circunstância também não afetará a
natureza jurídica das operações que tais estabelecimentos realizem entre si.
Assim, a transferência de mercadoria de um para outro estabelecimento, estando
esses estabelecimentos cadastrados conjuntamente, salvo em relação à forma como
será documentada, terá o mesmo tratamento tributário que lhe seria dispensado
caso os mesmos estabelecimentos
tivessem inscrições distintas.
A inscrição cadastral
conjunta não elimina, assim, a necessidade de que as operações realizadas entre
os estabelecimentos sejam documentadas, não obstante o fato de que os livros e
documentos fiscais sejam mantidos em apenas um deles. Nessas situações, quando
a remessa seja efetuada por outro estabelecimento que não aquele que serviu de
referência para o cadastramento, no qual os livros e documentos são mantidos,
prevê o inciso IV do art. 39 do Anexo 5 do RICMS/01, que deverá ser emitida
nota fiscal de entrada de bem ou mercadoria, a qual, nos termos do § 1° do
mesmo dispositivo, servirá inclusive para acompanhar o transporte da mercadoria
até o estabelecimento destinatário.
O caso abordado pelo
consulente subsume-se inteiramente à hipótese regulada pela legislação
referida. Há um estabelecimento em terra, inscrito no Cadastro de Contribuintes
do ICMS do Estado de Santa Catarina, em nome do qual é realizada a consulta.
Tem o consulente, porém, outros estabelecimentos, a saber as embarcações
pesqueiras que utiliza para a captura do pescado. Em relação a estes
estabelecimentos, conforme disposto no art. 2° do Anexo 5 do RICMS/01, o
consulente está dispensado de realizar nova inscrição no CCICMS.
Quando realiza a captura
de pescado e, após seu embarque, o remete para o estabelecimento em terra, o
consulente realiza operação relativa à circulação dessa mercadoria. É
necessário também quanto a essa operação, e não somente com relação à posterior
saída do pescado deste último estabelecimento com destino a terceiros,
investigar qual o respectivo tratamento tributário.
A hipótese é regulada no
art. 4°, I, i, do RICMS/01 que estabelece como local da operação, "para os
efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento
responsável", aquele onde ocorrido o embarque do pescado.
O consulente não se
refere, na exposição de seu questionamento, a esta primeira operação,
correspondente à entrada em seu estabelecimento do pescado capturado com a
utilização de embarcação de sua propriedade - um de seus estabelecimentos
autônomo, nos termos do § 3° do art. 5° do RICMS/01 -, mas apenas à operação
posterior, quando se verifica nova saída da mercadoria, desta vez com destino a
estabelecimento de terceiros. Contudo, a resposta ao questionamento formulado,
relativo à aplicação à hipótese das disposições do art. 7° do Anexo 3 do
RICMS/01, exige necessariamente a consideração de ambas essas operações.
Como visto, o referido
art. 7° do Anexo 3 do RICMS/01 estabelece o diferimento do imposto devido na
operação relativa à circulação de peixe, crustáceo ou molusco, em estado
natural, promovida pelo próprio captor, para a etapa seguinte de circulação.
Ocorrendo nova operação relativa à circulação desse produto - a etapa seguinte
-, o estabelecimento que a realizar ficará responsável pelo pagamento tanto do
imposto devido por sua própria operação quanto do imposto relativo à operação
anterior. Nesse sentido o disposto no art. 1° do Anexo 3 do RICMS/01, verbis:
Art. 1º Nas operações abrangidas por
diferimento, fica atribuído ao destinatário da mercadoria a responsabilidade
pelo recolhimento do imposto na condição de substituto tributário.
O diferimento do imposto
é, nos termos do disposto no RICMS/01, Anexo 3, art. 1°, uma das modalidades de
substituição tributária, em que a responsabilidade pelo recolhimento do imposto
devido na operação é atribuída ao destinatário da mercadoria. A instituição do
diferimento do imposto em determinadas operações atende a questões de política
tributária. Em geral, visa contornar situações que tornam excessivamente
difícil o controle tributário de determinada categoria de operações, seja por
parte do fisco, seja por parte dos próprios contribuintes, quando estes
apresentam diminuto grau de organização. Sobre o fenômeno, escreve Carrazza:
"Só para nos situarmos no assunto, é
comum, em face de dificuldades fiscalizatórias, a legislação dos Estados e do
Distrito Federal dispor que pequenos produtores ou comerciantes de incipiente
organização deixarão de recolher o ICMS quando venderem certas mercadorias do
tipo aparas de papel, sucata, leite, cana-de-açúcar etc.
"Ao invés disso, esta mesma legislação
dispõe que o tributo será pago, no futuro, por quem, tendo adquirido tais
mercadorias, promove sua revenda (em geral depois de havê-las submetido a
processo de industrialização). Para melhor aclararmos o assunto, o novo
contribuinte pagará o ICMS devido pela operação mercantil que efetivamente
realizou e, também, o ICMS referente à operação mercantil anterior, beneficiada
pelo diferimento.
(...)
"Estamos notando que o diferimento
existe, na realidade, para favorecer o contribuinte economicamente mais fraco,
que, além de enfrentar maiores dificuldades financeiras, não tem condições
reais de manter sua escrita fiscal em dia. O recolhimento do ICMS e o
cumprimento dos deveres instrumentais tributários a ele conexos ficarão a cargo
do próximo contribuinte (v.g., a distribuidora)." (in ICMS, 4. ed.,
São Paulo: Malheiros, 1998, p. 187 e 188)
As circunstâncias
apontadas pelo autor como justificadoras
e indicadoras da necessidade de adoção do regime do diferimento do
imposto para etapa seguinte de circulação da mercadoria estão perfeitamente
delineadas no caso em tela. Com efeito, pode ser facilmente imaginada a
inconveniência da imposição ao captor
do pescado, tendo em vista que essa atividade é muitas vezes desenvolvida de
forma artesanal, das mesmas obrigações, acessórias ou principais, a que se
sujeita o contribuinte regularmente estabelecido.
Dessa forma, a
interpretação do alcance do tratamento privilegiado estabelecido pelo art. 7°
do Anexo 3 do RICMS/01, objeto da presente consulta, deve ser feita à luz da
finalidade visada pelo legislador ao estabelecê-lo. Sendo no caso evidente o
propósito de tornar mais simples o cumprimento de suas obrigações pelo
contribuinte mais modesto, com poucas condições pessoais ou materiais de
submeter-se ao mesmo regime previsto como regra geral, não se pode pretender
uma interpretação extensiva daquela norma excepcional, que resulte no gozo de
tal privilégio também pelo contribuinte regularmente instalado, que dispõe já
de razoável nível de organização, e que nenhuma justificativa apresenta para
furtar-se ao cumprimento das obrigações tributárias, principais ou acessórias,
impostas à generalidade dos casos. Seria essa conclusão uma verdadeira ofensa
ao princípio da isonomia, que, se de um lado exige que a todos os contribuintes
que se encontrem numa mesma situação seja reservado tratamento igual, implica,
por outro, em que o tratamento mais benéfico concedido a um em função de certas
circunstâncias justificadoras não possa ser estendido a outros casos em que
tais circunstâncias não se verifiquem. Nesse sentido a velha máxima que define
a justiça como consistindo em se tratar igualmente aos iguais e desigualmente
aos desiguais
É certo que as
peculiaridades da atividade impõem o estabelecimento de procedimentos
simplificados, embora por motivos diferentes, também no caso de a captura ser
realizada por contribuinte melhor estruturado que o pescador artesanal, como é
o caso do consulente. Com efeito, embora nessas situações não se verifique a
"incipiente organização" referida por Carrazza, que justificaria a
simplificação, leva-se em consideração o fato de que a primeira operação de que
é objeto o pescado, quando é desembarcado e remetido a outro estabelecimento do
contribuinte, é realizada no âmbito de uma mesma empresa, relativamente à circulação
da mercadoria entre seus vários estabelecimentos. Há ainda a inconveniência de
se exigir o cumprimento das obrigações por cada um dos estabelecimentos,
especialmente em relação às embarcações. Essa circunstância, aliás, é a mesma
que determina, por exemplo, a excepcional autorização de reunião de todos os
seus estabelecimentos sob uma única inscrição cadastral.
Identificadas, assim,
com clareza, as duas diferentes operações que realiza o consulente, a primeira
da qual resulta a entrada da mercadoria em seu estabelecimento, e a segunda já
decorrente da comercialização dessa mercadoria, destinada a estabelecimentos de
terceiros, há de se concluir, atendidas as disposições do art. 7° do Anexo 3 do
RICMS/01, que o diferimento previsto nesse dispositivo aplica-se tão-somente
àquela primeira operação.
De fato, corresponde
essa primeira operação à circulação de pescado promovida pelo próprio captor,
destinado à comercialização pelo estabelecimento destinatário, não obstante
trate-se de estabelecimento pertencente ao mesmo contribuinte. Por outro lado,
a segunda operação, de saída do pescado do estabelecimento do consulente com
destino a estabelecimento de terceiros, é já a etapa seguinte de circulação de
que trata o dispositivo, para a qual ficou diferido o pagamento do imposto
devido na etapa anterior.
A fase da circulação do
pescado que é beneficiada pelo diferimento do imposto é, assim, aquela de que
decorre a entrada da mercadoria no
estabelecimento do consulente. Quando comercializa essa mercadoria com terceiros,
o consulente está promovendo nova etapa de circulação do produto, não mais
abrangida pelo diferimento.
Analisando questão
semelhante, teve oportunidade o Conselho Estadual de Contribuintes do Estado de
Santa Catarina de manifestar-se a respeito da matéria aqui tratada, em acórdão
unânime proferido no julgamento do processo n° GR06 18.054/96-0, em cuja ementa
se lê:
"ICMS, EMISSÃO DE DOCUMENTOS FIS-CAIS
INDICANDO INDEVIDAMENTE A OPERAÇÃO COMO SEM DÉBITO DO IMPOSTO. A SAÍDA DE
MERCADORIA DO ESTABELECIMENTO QUE A RECEBEU COM O BENEFÍCIO DO DIFERIMENTO É
TRIBUTADA NORMALMENTE PELO IMPOSTO. INFRAÇÃO CARACTERIZADA. NOTIFICAÇÃO
MANTIDA. DECISÃO CONFIRMADA. UNÂNIME."
Destaca-se do corpo do
acórdão:
"A recorrente, pessoa jurídica inscrita
no Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado de Santa Catarina, efetuou a
venda de mercadorias recebidas de outro estabelecimento da mesma empresa,
inscrito no Cadastro de Produtores Rurais, consignando nas notas fiscais
operação beneficiada com o diferimento do imposto. Fundamenta sua pretensão no
in. XXI, do artigo 5° do RICMS/SC, que tem a guiante redação:
'Art. 5° Nas situações seguintes o
pagamento do imposto fica diferido para a etapa seguinte da circulação:
..................
XXI - saída, em operação interna, de produto
agropecuário em estado natural, promovida por seu próprio produtor, quando o
destinatário for pessoa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS e receber
o produto para fins de comercialização.'
"No caso dos autos, a operação
beneficiada pelo diferimento do imposto já havia sido realizada quando o
estabelecimento inscrito no Cadastro de Produtor Rural remeteu o produto
(madeira em tora) para o estabelecimento da recorrente, que se dedica à
serragem ou desdobramento de madeira. A operação promovida pela recorrente e
alvo da presente notificação é justamente a 'etapa seguinte da circulação',
prevista no artigo 5° do Regulamento do ICMS, que sofre tributação normal do
imposto."
Observe-se que o
dispositivo sobre que versa essa decisão - art. 5°, XXI, do RICMS/89, aprovado
pelo Decreto n° 3.017, de 28 de fevereiro de 1989 - traz disposição idêntica à
do art. 7° do Anexo 3 do RICMS/01, sobre que versa a presente consulta. Em
ambos os casos cuida-se de diferimento concedido à operação que constitui a
etapa inicial do ciclo de circulação econômica das mercadorias a que se referem
- no primeiro caso, produtos agropecuários em estado natural, e no segundo, peixes, crustáceos e moluscos. Em ambos os
casos também o imposto é diferido para a etapa seguinte de circulação da
mercadoria, quando produzida por estabelecimento comercial ou industrial. E
tanto na situação fática a que se refere a decisão, quanto naquela sobre que
versa a presente consulta, essa etapa seguinte da circulação dos respectivos
produtos é realizada por estabelecimento do mesmo contribuinte que realizou a
primeira, cujo imposto fora diferido. A mesma conclusão impõe-se, pois, a
ambas, qual seja a de que esta segunda operação já não está mais abrangida pelo
diferimento, sendo devido normalmente o imposto.
Face ao exposto,
responda-se ao consulente que as saídas de peixe capturados através de suas
próprias embarcações não estão alcançadas pelo diferimento previsto no art. 7°
do Anexo 3 do RICMS/01. O diferimento, na hipótese, aplica-se apenas à operação
de que decorre a entrada dessa mercadoria em seu estabelecimento.
É o parecer. À
consideração da Comissão.
Gerência de Tributação,
em Florianópolis, 13 de dezembro de 2001.
Laudenir Fernando
Petroncini
FTE - Matr. 301.275-1
COPAT, em Florianópolis,
28 de dezembro de 2001.
Laudenir Fernando
Petroncini
Secretário Executivo