EMENTA: ICMS. O IMPOSTO QUE ONEROU A ENTRADA DE
NITROGÊNIO LÍQUIDO UTILIZADO NO CONGELAMENTO DE PESCADO, OU SUAS CARNES, PODE
SER UTILIZADO COMO CRÉDITO, PARA COMPENSAR O IMPOSTO DEVIDO, DESDE QUE A SAÍDA
SUBSEQUENTE DO PRODUTO INDUSTRIALIZADO SEJA TRIBUTADA.
CONSULTA Nº: 24/2002
PROCESSO Nº: GR02
12556/01-7
01 - DA CONSULTA
A
consulente em epígrafe formula consulta sobre o direito a aproveitar crédito do
ICMS relativamente à aquisição de gás nitrogênio líquido para uso no processo
de industrialização do pescado. O produto mencionado é utilizado como agente
congelante do pescado, aplicado através de um aparelho chamado "túnel de
congelamento". Acrescenta a
consulente:
"Cabe ressaltar ainda que o
nitrogênio líquido não faz parte do equipamento que produz a baixa temperatura,
até porque, como na descrição acima, podemos entender que neste processo
equipamento algum produz a baixa temperatura, e sim, em situação bastante
distinta, o gerador da baixa temperatura é a injeção do nitrogênio líquido,
sendo que o túnel de congelamento é apenas o meio físico onde se acondiciona o
produto (pescado) a ser industrializado durante o processo. Outra
característica que deve ser levada em conta é o fato de não haver reciclo do
nitrogênio líquido, sendo necessário a cada nova operação de congelamento a
utilização de novas quantidades."
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal, art. 155, §
2°, I e II;
Lei Complementar n° 87, de 13 de
setembro de 1996, arts. 19, 20, § 3°, e 21, II e III;
Lei n° 10.297, de 26 de dezembro
de 1996, arts. 21 a 30;
RICMS-SC, aprovado pelo Decreto
n° 2.870, de 27 de agosto de 2001, arts. 28 a 36.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Cuida
a consulta do direito à apropriação de créditos do ICMS relativos ao processo
de industrialização (congelamento) de pescado. Entende-se por industrialização
"qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o
acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para
consumo" (RIPI, art. 3°). A consulente produz "peixes congelados",
posição 0303 da TIPI, ou "filés de peixe ou outra carne de peixe
congelados", posição 0304 da TIPI.
O
crédito pretendido refere-se a nitrogênio líquido empregado no congelamento do
peixe, seus filés ou outras carnes de modo a obter-se "peixe
congelado". O processo pode ser descrito da forma que segue: o peixe é
colocado no "túnel de congelamento", onde é injetado o nitrogênio
líquido. Este, ao passar do estado líquido (no qual é mantido sob pressão) para
o estado gasoso, absorve todo o calor presente naquele ambiente, produzindo o
conseqüente congelamento. Observe-se que o nitrogênio líquido não se integra
fisicamente ao produto, mas é consumido integralmente no processo industrial
(não é mais recuperado).
O
direito ao crédito decorre do princípio da não cumulatividade tal como
enunciado no art. 155, § 2°, I, da Constituição Federal: o imposto será não
cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à
circulação de mercadorias com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou
por outro Estado ou pelo Distrito Federal. Ou seja, o crédito nada mais é que o
próprio ICMS que onerou as mercadorias adquiridas para revenda (caso da empresa
comercial) ou as matérias primas, materiais secundários, intermediários e de
embalagem utilizados na produção (caso da empresa industrial).
Mas
o crédito do imposto tem a vocação específica de compensar o ICMS devido pelas
operações próprias do contribuinte. Se não existe débito do imposto por
qualquer motivo (isenção, imunidade ou não subsunção do fato à hipótese
descrita no antecedente endonormativo), não há que se falar em crédito do
imposto. Esta é a regra insculpida no inciso II, "b", do mesmo
dispositivo constitucional anteriormente mencionado: "a isenção ou
não-incidência acarretará a anulação do crédito relativo às operações
anteriores".
A
Lei Complementar n° 87/96 introduziu no direito tributário brasileiro o chamado
regime de créditos financeiros, ou seja, além da matéria prima, material
secundário, intermediário e de embalagem, passariam a dar crédito também os
bens adquiridos para integração ao ativo imobilizado e os utilizados para uso
ou consumo do estabelecimento. Nesse último caso, o crédito será permitido
apenas a partir de 1° de janeiro de 2003 (LC 87/96, art. 33, I).
Feitas
as considerações acima, podemos enfrentar o questão proposta pela consulente: o
nitrogênio líquido empregado no congelamento de peixe dá direito a crédito?
Enunciada a questão de outra forma: estamos diante de um insumo consumido no
processo industrial ou de um consumo do estabelecimento (hipótese em que o
crédito somente seria permitido após 1° de janeiro de 2003)? Para responder à
questão devemos determinar se, para dar direito a crédito do imposto, é
necessário que o insumo integre fisicamente o produto final ou basta que
seja consumido no processo industrial.
O
Supremo Tribunal Federal, em reiteradas decisões, vinha admitindo crédito do
imposto no caso do insumo ser consumido no processo industrial, mesmo quando
esse consumo não era completo (o material consumido tornava-se imprestável para
o uso a que se destinava). Assim, foi reconhecido o direito ao crédito relativo
a materiais refratários utilizados na indústria siderúrgica (RE 96643-MG), bem
como de cadinhos, lixas, feltros etc. (RE 79601-RS).
Com
efeito, o art. 20 da Lei Complementar n° 87/96 assegura ao sujeito passivo
"o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de
que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no
estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo
permanente, ou ao recebimento de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal ou de comunicação". O dispositivo refere-se apenas a
"mercadorias" sem distinguir se será utilizada em processo
industrial, integrando-se fisicamente ao produto ou consumida no mesmo
processo.
O
§ 3°, I, do mesmo artigo, entretanto, veda o crédito "relativo a
mercadoria entrada no estabelecimento para integração ou consumo em processo
de industrialização quando a saída do produto não for tributada ou estiver
isenta do imposto". A contrario sensu, se a saída do produto sofrer
a incidência do imposto, fica assegurado o crédito relativamente à mercadoria
consumida no processo de industrialização. Da mesma forma, o art. 21, II, manda
efetuar o estorno do imposto creditado "sempre que a mercadoria entrada no
estabelecimento for integrada ou consumida em processo de industrialização,
quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do
imposto".
A
lei, portanto, distingue entre consumo do estabelecimento e mercadoria
consumida no processo de industrialização. No primeiro caso, temos aqueles
bens que são utilizados ou consumidos no estabelecimento, mas sem uma relação
direta com o processo industrial, como, por exemplo, as mercadorias utilizadas
pela área administrativa. Essas mercadorias, destinadas ao consumo do
estabelecimento, somente darão direito a crédito após 1° de janeiro de 2003. No
segundo caso, há uma relação direta com o processo industrial, onde essas
mercadorias são consumidas. A essas mercadorias, consumidas no processo
industrial, o Supremo Tribunal Federal vinha reconhecendo que davam direito ao
crédito, mesmo antes da entrada em vigor da Lei Complementar n° 87/96, quando
vigorava o regime estrito de créditos físicos. No caso vertente, o
produto comercializado pela consulente é "peixe congelado". Há
portanto uma relação direta entre o consumo do gás congelante e o produto.
A
distinção entre os dois casos aparece de forma cristalina no tratamento dado
pela Lei n° 7.547, de 27 de janeiro de 1989, no seu artigo 34 que dispunha:
"Art.
34. Não implicará crédito para compensação com o montante do imposto devido nas
operações ou prestações seguintes:
I
- omisso;
II
- a entrada de bens destinados a consumo ou à integração no ativo fixo do
estabelecimento;
III
- a entrada de mercadorias ou produtos que, utilizados no processo industrial,
não sejam nele consumidos ou não integrem o produto final na condição de
elemento indispensável à sua composição."
A
vigência da Lei n° 7.547/89 corresponde ao período em que era adotado o regime
de crédito físico. Ela trata separadamente do consumo do estabelecimento
(inciso II) e do consumo no processo industrial (inciso III). O crédito
relativo ao consumo do estabelecimento era expressamente vedada pela Lei n°
7.547/89. Com a adoção do regime de créditos financeiros, pela Lei Complementar
n° 87/96, passaram a ser admitidos, mas apenas a partir de 1° de janeiro de
2003. Não se confundem com as mercadorias consumidas no processo de
industrialização cujo direito ao crédito sempre foi assegurado pela legislação.
Isto
posto, responda-se à consulente:
a)
o ICMS que onerou a aquisição de nitrogênio líquido utilizado para congelamento
de peixes ou suas carnes pode ser aproveitado como crédito para abater o ICMS
devido por ocasião da saída do produto industrializado;
b)
o crédito não poderá ser utilizado caso não incida o imposto sobre a operação
de saída, ressalvada a hipótese de exportação para o exterior do país.
À superior consideração da
Comissão.
Getri, em Florianópolis, 19 de
fevereiro de 2002.
Velocino Pacheco Filho
FTE - matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 11 de setembro de 2002.
Laudenir Fernando Petroncini João Paulo Mosena
Secretário Executivo Presidente
da Copat