ESTADO DE SANTA CATARINA |
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA |
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS |
RESPOSTA CONSULTA 5/2024 |
N° Processo | 2370000034175 |
ITCMD
CAUSA MORTIS:
1.
Inventariante tem legitimidade para efetuar a declaração do imposto devido.
2.
O termo inicial da contagem do prazo decadencial para constituição do crédito
tributário é o momento da ocorrência do fato gerador, que na hipótese de
transmissão causa mortis se dá no trânsito em julgado da sentença homologatória
da partilha.
3.
O termo inicial do prazo prescricional para pedido de restituição de indébito
tributário é a data do pagamento indevido.
4.
A base de cálculo do imposto é o montante líquido do quinhão transmitido ao
herdeiro.
Narra o
consulente que há conflito entre inventariante e demais herdeiros em processo
de inventário e partilha judicial. Assim, questiona:
a. O
inventariante possui legitimidade legal para, sem procuração, entregar DIEF
ITCMD em nome dos herdeiros?
b. Qual
o momento de apuração do ITCMD e, por consequência, de entrega da DIEF ITCMD?
c. É
correto apurar o ITCMD em momento anterior ao trânsito em julgado da sentença
que homologa a partilha, quando há apelação com efeito suspensivo impugnando-
a?
d. Se
o momento adequado para apuração do ITCMD for antes do trânsito em julgado,
qual o procedimento de readequação e restituição ou complementação do valor
inicialmente apurado, inclusive quanto ao prazo prescricional, caso haja
modificação posterior do plano de partilha pelo acórdão?
e. Quando há dívidas do autor da herança e não houve reserva financeira no inventário, como deve ser operacionalizada a base de cálculo do ITCMD a fim de considerar, na transmissão, o valor líquido a ser transferido aos herdeiros?
f. Neste
caso, qual o procedimento de cálculo a ser efetuado a fim de considerar as
dívidas do espólio na mensuração dos bens e direitos transmitidos?
O
processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado
pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas
pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de
admissibilidade.
É o
relatório, passo à análise.
Lei 13.136, de 25
de novembro de 2004, art. 2º.
Lei 13.105, de 16
de março de 2015, arts. 75, VII; 617; 618; 619; 637; 638; 642 e 654.
Lei 10.406, de 10
de janeiro de 2002, arts. 115; 116; 1.784; 1.991 e 1.997.
Lei 5.172, de 25
de outubro de 1966, arts. 134; 135; 168 e 197.
RITCMD/SC, art.
12, §3º.
Em relação à legitimidade do inventariante,
temos que o substituto processual do de cujus é seu espólio, e de acordo
com a regra prevista no artigo 75, inciso VII, do Código de Processo Civil, seu
representante legal é o inventariante, de modo que somente ele é parte legítima
para representar o espólio em juízo, ativa e passivamente.
O artigo 115 do Código Civil define que os
poderes de representação conferem-se por lei ou pelo interessado. Nesse
sentido, o artigo 617 do CPC traz o rol das pessoas que poderão ser nomeadas
pelo Juiz como inventariante, para, logo no artigo seguinte, elencar os poderes
conferidos ao escolhido, dos quais, destaca-se:
Art. 618. Incumbe ao inventariante:
I - representar o espólio ativa e
passivamente, em juízo ou fora dele, observando-se, quanto ao dativo, o
disposto no art. 75, § 1º ;
Art. 619. Incumbe ainda ao inventariante,
ouvidos os interessados e com autorização do juiz:
III - pagar dívidas do espólio;
Retornando, então, ao Código Civil, temos que
desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a
administração da herança será exercida pelo inventariante (artigo 1.991) e
que a manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus
poderes, produz efeitos em relação ao representado (artigo 116).
O Código Tributário Nacional atribui, por sua
vez, responsabilidade tributária ao inventariante nos seguintes termos:
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de
exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem
solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que
forem responsáveis:
IV - o inventariante, pelos tributos devidos
pelo espólio;
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos
créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos
praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos:
II - os mandatários, prepostos e empregados;
Art. 197. Mediante intimação escrita, são
obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que
disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros:
V - os inventariantes;
Pelo exposto, e em súmula parcial, a
legislação pátria privada, processual e tributária, atribui a representação
judicial e administrativa do espólio à figura do inventariante, incluindo, aí,
o poder de efetuar as declarações tributárias junto à Administração Fazendária
necessárias ao cumprimento das obrigações tributárias, principal e acessória,
incidentes sobre a transmissão causa mortis.
No que toca ao momento adequado para o cálculo
e recolhimento do ITCMD, bem como o termo inicial do prazo decadencial para
constituição do crédito tributário e do prazo prescricional para pedido de
restituição de indébito tributário deve-se entender que a hipótese de
incidência tributária é a descrição abstrata contida na regra matriz de
incidência tributária de fato juridicamente relevante para a incidência
tributária, enquanto o fato gerador é a ocorrência no mundo fenomênico dos
fatos da hipótese abstratamente prevista em lei.
A regra matriz de incidência tributária é
didaticamente dividida entre critérios: material, espacial, temporal, pessoa e
quantitativo. Somente ocorre a subsunção do fato à norma quando todos os
critérios definidos como necessários e suficientes da regra matriz estão
completos.
Pois bem, o óbito do autor da herança é fato
necessário, mas não suficiente à incidência da regra matriz. É que o óbito diz
respeito tão somente ao critério material da regra matriz. A confusão emerge da
errônea compreensão do droit de saisine, previsto no artigo 1.784 do
Código Civil que diz: aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde
logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.
Neste momento da abertura da sucessão, a
herança se transmite como um todo aos herdeiros, mas essa transmissão não é
suficiente para a incidência da regra matriz. Há que se definir, em momento
oportuno no procedimento de inventariança e partilha, quais bens de cujus
sucessione agitur serão transmitidos aos herdeiros, aos legatários, ao
pagamento da meação, quais dívidas oneram o patrimônio (definição do critério
quantitativo), quantos e quem são os herdeiros e legatários (definição da
sujeição passiva no critério pessoal), qual a localização bens móveis e imóveis
(definição do critério espacial e da sujeição ativa no critério pessoal).
Portanto, a regra matriz somente estará
perfectibilizada e incidirá no momento em que ocorre o trânsito em julgado do
processo de partilha, com a consequente expedição do formal de partilha quando
todos os critérios necessários e suficientes à sua incidência estarão completos
e definidos. Esse é o momento da ocorrência do fato gerador do imposto sobre
transmissão causa mortis, conforme já decidiu o Tribunal Superior:
TRIBUTÁRIO.
IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL. ARROLAMENTO.
HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO. ART. 173, I, DO CTN. ... 5. O
regime do ITCMD revela, portanto, que apenas com a prolação da sentença de homologação
da partilha é possível identificar perfeitamente os aspectos material, pessoal e
quantitativo da hipótese normativa, tornando possível a realização do
lançamento (AgRg no REsp 1.274.227/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, DJe 13/4/2012).
Não por outro motivo o mesmo E. Superior
Tribunal de Justiça assim decidiu:
ITCMD. DECADÊNCIA. SENTENÇA QUE HOMOLOGA A
PARTILHA. TRÂNSITO EM JULGADO. TERMO INICIAL.
1. Esta Corte superior firmou o entendimento
segundo o qual o prazo decadencial, nos casos de ITCMD, tem início a partir do
primeiro dia do exercício seguinte àquela em que ocorreu o trânsito em julgado
da sentença homologatória da partilha, que seria a data em que o lançamento
poderia ter ocorrido (AgInt no AREsp 1.473.610/PR, rel. Ministro Og Fernandes,
Segunda Turma, julgado em 08/06/2020, DJe 15/06/2020).
2. Consolidou-se, ainda, na jurisprudência do
STJ que a circunstância de o fato gerador ser ou não do conhecimento da
administração tributária não foi erigida como marco inicial do prazo
decadencial, nos termos do que preceitua o Código Tributário Nacional, não
cabnendo ao intérprete assim estabelecer (AgRg no REsp 577.899/PR, rel.
Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 13/05/2008, DJe 21/05/2008)
Como visto, o prazo decadencial para
constituição do crédito tributário somente se inicia no momento da ocorrência
do fato gerador que se dá com o trânsito em julgado da sentença homologatória
da partilha e a expedição do formal de partilha.
Note-se, no entanto, que é próprio do direito
criar realidades. Por se tratar de imposto sujeito ao lançamento por
homologação, o sujeito passivo, por força de determinação da legislação
processual, efetua o cálculo do ITCMD devido ao final do processo de
inventariança (artigos 637 e 638 do CPC) e efetua o recolhimento do imposto
como condição sine qua nom para o julgamento por sentença da partilha
(artigo 654 do CPC), ou seja, efetua o cálculo e o recolhimento do imposto em
momento anterior ao da ocorrência do fato gerador.
Trata-se de antecipação tributária legalmente
prevista. O E. Supremo Tribunal Federal em tese de repercussão geral (Tema 456)
firmada pelo seu Plenário no Recurso Extraordinário
num. 598677, em sessão virtual encerrada em 26.03.2015, definiu a
constitucionalidade do instituto, desde que a antecipação esteja prevista em
lei:
"A antecipação, sem substituição
tributária, do pagamento do ICMS para momento anterior à ocorrência do fato
gerador necessita de lei em sentido estrito. A substituição tributária
progressiva do ICMS reclama previsão em lei complementar federal".
Dada a obrigação de antecipação tributária
criada por lei, havendo alterações nos quinhões, herdeiros ou bens sucedidos, o
sujeito passivo deverá proceder conforme disposto no §3º do artigo 12 do
regulamento do ITCMD catarinense:
Art. 12. O imposto será calculado e recolhido
pelo próprio sujeito passivo, que prestará as informações relativas ao imposto
e efetuará o cálculo do valor devido por intermédio da Declaração de
Informações Econômico-Fiscais do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e
Doação de Quaisquer Bens ou Direitos - DIEF-ITCMD, gerada por aplicativo
específico disponibilizado pela Secretaria de Estado da Fazenda, via Internet.
§ 3º A alteração das informações contidas na
DIEF-ITCMD cujo imposto declarado já tenha sido objeto de recolhimento
integral, ou parcial no caso de parcelamento, ou cuja imunidade ou isenção
tenha sido reconhecida, deverá constar em DIEF-ITCMD retificadora, que
observará o seguinte:
I - se as alterações implicarem valor do
imposto superior ao declarado inicialmente, será gerado DARE-SC complementar;
II - se as alterações implicarem valor do
imposto inferior ao declarado inicialmente, caberá ao sujeito passivo requerer
restituição da parcela indevida, observado o disposto no art. 18.
Verificando-se que houve recolhimento indevido
do ITCMD, o sujeito passivo terá o prazo prescricional de 05 (cinco) anos
contados da data do pagamento para requerer a restituição do indébito
tributário, conforme artigo 168 do Código Tributário Nacional.
Por fim, note-se que o ITCMD incide sobre a transmissão
causa mortis de bens ou direitos do de cujus aos seus herdeiros e
legatários, conforme artigo 2º da Lei num. 13.136/04. Ora, conforme artigo 1997
do Código Civil, as dívidas do de cujus são suportadas pela herança,
transmitindo-se aos herdeiros somente o patrimônio já líquido das dívidas:
Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento
das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada
qual em proporção da parte que na herança lhe coube.
Essa, inclusive é vetusta orientação da Corte
Suprema:
IMPOSTO DE TRANSMISSÃO 'CAUSA MORTIS'. INCIDE
SOBRE O MONTANTE LÍQUIDO DA HERANÇA, SENDO LÍCITO ABATER DO CÁLCULO AS DESPESAS
FUNERÁRIAS PREVISTAS NO ART. 1.797 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DE
QUE SE CONHECE PELA LETRA 'D' DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL, PARA NEGAR-LHE
PROVIMENTO (RE nº 109.416, Primeira Turma, Relator o Ministro Octavio
Gallottti, DJ de 7/8/87).
Da fundamentação do voto do eminente Ministro
Relator, destaque-se a seguinte lição do mestre Aliomar Baleeiro:
... exigido outrora sobre a herança bruta,
hoje segue critério mais racional: base sobre o valor líquido dos quinhões e
legados. Esse critério veio a coincidir com a tendência a considerar-se tal
imposto como tributo de caráter direto e pessoal sobre o herdeiro, e não o
imposto real sobre o monte ou espólio.
No mesmo sentido, porém em decisão mais
recente, o mesmo E. STF assim decidiu:
ITCMD. Base de cálculo. Vedação às deduções
do montante partilhável. Alegação de que a tributação sobre o valor integral
desse montante não teria caráter confiscatório. Ofensa meramente reflexa.
1. A conformação do critério quantitativo, da
forma elastecida adotada pela lei estadual, com a definição de base de cálculo
que se extrai da norma geral, é questão prejudicial à conclusão pelo
reconhecimento do caráter confiscatório. Resta, assim, evidenciado, tratar-se
de contencioso de mera legalidade.
2. Mesmo se restasse superada a questão de a
ofensa ser de ordem infralegal, cumpre observar que a vedação das deduções
deforma a regra matriz de incidência do imposto, fazendo incidir tributo onde
não há base imponível (AI num. 733976 AgR. P. 06.02.2013).
Do voto do I. relator Dias Toffoli
menciona-se:
Ao vedar as deduções, a lei estadual impede a
tributação sobre a transmissão do patrimônio líquido (quantum efetivamente
transmitido) e assim deforma a regra matriz de incidência. Não foi por outro motivo
que esta Corte já se posicionou no sentido de que a base de cálculo é o
montante líquido da herança.
Assim, conforme artigo 642 e seguintes do CPC,
quando da apresentação do plano de partilha, as dívidas que oneram o espólio já
devem ter sido inventariadas e deduzidas do quinhão dos herdeiros, devendo ser
oferecida à tributação pelo ITCMD na DIEF somente o patrimônio líquido
efetivamente transmitido aos herdeiros e legatários.
Pelo
exposto, responda-se ao consulente que (i) o inventariante possui legitimidade
para apresentar junto à Administração Tributária a DIEF ITCMD, (ii) o termo
inicial do prazo decadencial para constituição do crédito tributário passa a
correr no momento que ocorre o fato gerador do imposto, que na hipótese de
transmissão causa mortis se dá no trânsito em julgado da sentença
homologatória da partilha com a expedição do devido formal, (iii) o termo
inicial do prazo prescricional para apresentação de pedido de repetição de
indébito tributário é a data do pagamento indevido e que (iv) a base de cálculo
do imposto é o quinhão líquido transmitido ao herdeiro ou legatário.
É o
parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos
Tributários.
Nome | Cargo |
DANIELLE KRISTINA DOS ANJOS NEVES | Presidente COPAT |
FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA | Gerente de Tributação |
NEWTON GONÇALVES DE SOUZA | Presidente do TAT |
BERNARDO FRECHIANI LARA MACIEL | Secretário(a) Executivo(a) |
Data e Hora Emissão | 02/01/2024 15:06:35 |