EMENTA: ICMS. A ENTRADA
DE MERCADORIA IMPORTADA DO EXTERIOR DO PAÍS CONFIGURA OPERAÇÃO INTERNA. SENDO
ASSIM, A IMPORTAÇÃO DE PRODUTO CONSIDERADO SUPÉRFLUO ESTÁ SUJEITA À ALÍQUOTA DE
25%, CONFORME DETERMINA O INCISO III, ARTIGO 24 DA LEI 7547/89.
CONSULTA Nº: 83/96
PROCESSO Nº: GR03 -
8423/96-2
01 - DA CONSULTA
A consulente, operando no ramo de
preparação de fumo, esclarece que pretende importar este insumo, o qual será
utilizado como matéria-prima na sua linha de produção.
Em função desta destinação,
entende que na operação de importação deverá ser aplicada a alíquota de 17%,
tal como prevista no inciso II, art. 30 do RICMS/SC-89, não sendo cabível a
regra do inciso III do mesmo artigo, pois esse produto não poderá ser
considerado supérfluo, uma vez que não se destinará a consumidor final.
Indaga se está correto seu
entendimento.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal, art. 155, § 2°, III;
Lei 7547/89, arts. 3°, I; 7°, I; 24, III, § 2°, III;
RICMS/SC-89, art. 30, III, "b" e Anexo II.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Antes que respondamos a pergunta
feita pela consulente é necessário esclarecer que ao contrário do que a mesma
entende, um produto não é considerado supérfluo apenas quando destinado
diretamente a consumidor final.
Quando a Constituição diz que o
ICMS poderá ser seletivo em função da essencialidade dos produtos, está
traçando uma regra para que esse tributo exerça não só a função de arrecadação
mas também de política fiscal, isto é, que as suas alíquotas sejam
diferenciadas de modo que os produtos de primeira necessidade não sejam
tributados ou o sejam por alíquotas menores, ou seja, de modo a tornar menos
onerosa a aquisição daqueles que forem indispensáveis à satisfação das
necessidades básicas da população, como produtos alimentícios, artigos de
vestuário, medicamentos, etc.
Em contrapartida, produtos de
luxo ou suntuários, artigos de jogos ou vícios devem sofrer maior incidência do
tributo pois este é o sentido da tributação de acordo com a essencialidade: as
alíquotas devem ser estabelecidas em razão inversa da imprescindibilidade das
mercadorias.
De acordo com o permissivo
Constitucional, a adoção do princípio da seletividade é uma faculdade a ser ou
não exercida pelo poder tributante estadual.
Coube então ao legislador
ordinário, usando seu discricionarismo, fazer a seleção das mercadorias
consideradas supérfluas, bem como a diferenciação das alíquotas a serem
aplicadas.
A Lei 7547/89, no inciso III, do
§ 2°, do artigo 24, fiel ao espírito da Constituição, considerou como supérfluo
tanto o fumo (matéria-prima), quanto seus derivados (incluindo o cigarro),
classificados no capítulo 24 da NBM/SH, independentemente do fato de se
destinarem a consumo, comercialização ou industrialização.
A questão da alíquota a ser
aplicada nas operações de importação de produto supérfluo é outra discussão.
No tocante a esse assunto, a
Carta Magna de 1988, em seu art. 155, § 2°, inciso IV, tornou competência
exclusiva do Senado apenas o estabelecimento das alíquotas aplicáveis às
operações interestaduais e de exportação, isto é, como a competência, nestes
casos, é plena e excludente, inadmissível qualquer delegação de competência
impositiva para que os Estados estabelecessem alíquotas diversas daquelas
determinadas pelo Senado Federal.
O inciso V do mesmo artigo, por
sua vez, faculta ao Senado estabelecer alíquotas mínimas nas operações
internas. Não faz, portanto, menção a qualquer obrigação de o Senado agir;
permite, apenas, o exercício deste direito.
A faculdade decorre, como bem
esclarece Ives Gandra Martins (in Comentários à Constituição do Brasil,
São Paulo: Saraiva, 1990, 6° vol, Tomo I, pg 427), "... da possibilidade
de adoção de alíquotas concorrenciais, que podem levar a transferências de
operações de um Estado para outro, por força de maiores incentivos. Tal risco é
que deve ter levado o constituinte a exigir uma alíquota mínima a ser
determinada soberanamente pelo Senado, objetivando impedir concorrência
desleal."
Nenhuma restrição foi imposta,
salvo no caso específico previsto no mesmo art. 155, § 2°, V, "b",
pela Constituição no que concerne à fixação de alíquotas interna e de
importação pelas Unidades da Federação.
O motivo é simples: tais
alíquotas são utilizadas apenas para as relações econômicas que ocorrem dentro
das fronteiras do Estado. Por este fato, à União, por seu Executivo, não cabe
interferência principalmente porque tal atitude atingiria a autonomia dos
Estados.
Estas considerações se fazem
importantes para que possamos situar bem a questão sob enfoque e para que
consigamos sanar a dúvida suscitada pela consulente.
A esse respeito, três são os
pontos que merecem maior atenção:
- o primeiro, é que a Lei
7547/89, em decorrência do exposto anteriormente e com base no princípio da
legalidade inserto no art. 97, IV do CTN, estipulou, em seu artigo 24, inciso
II, que a alíquota do ICMS seria de 17% nas operações internas e nas
interestaduais (nestas últimas quando o destinatário não for contribuinte do
imposto), inclusive na entrada de mercadoria importada.
Além disso, no inciso III do
mesmo artigo, ficou estabelecido, que nas operações com energia elétrica e nas
operações internas ou a consumidor final (portanto, neste caso,
independentemente de ser interna ou interestadual) com produtos supérfluos
(onde o fumo, como vimos se insere) esta alíquota seria de 25%.
Duas conclusões emergem da
análise destes dispositivos:
a) a adoção do advérbio
"inclusive" - e não simplesmente a da conjunção aditiva "e"
(operações internas, interestaduais e de importação, p. ex., o que nos levaria
a concluir que o legislador entendeu as três espécies de operações como
distintas entre si) -, no inciso II do art. 24, no tocante às operações de
importação, deve ser interpretado, por exclusão (já que não se vislumbra
qualquer similitude entre as operações de importação e as interestaduais), de
forma que essas operações sejam consideradas extensões; sejam inerentes;
estejam inseparavelmente ligadas às; tenham as mesmas características das
operações internas.
As operações de importação não
foram tratadas como uma espécie distinta do gênero "operações", senão
como incluídas no conjunto das operações internas;
b) o inciso II do art. 24 é
genérico: estabelece alíquota de 17% para as operações internas de forma
abrangente, isto é, para toda e qualquer mercadoria sujeita à tributação.
Por sua vez, o inciso III é
específico: estabelece alíquota de 25% para todas as operações internas com
produtos supérfluos, logo, por extensão analógica, inclusive na entrada de
mercadoria importada de todo e qualquer produto assim considerado; a regra específica
prevalece sobre a geral;
- o segundo ponto que merece
ressalva é que, como se depreende, se a empresa adquirisse a matéria-prima no
mercado interno, o produto estaria sujeito à alíquota de 25%. Ora, a pretensão
de se importar o mesmo produto, que é considerado supérfluo, à uma alíquota de
17%, negaria vigência ao princípio da seletividade adotado, inviabilizaria a
produção do fumo internamente e, além disso, estabelecer-se-ia odioso
privilégio ao produto alienígena, em detrimento do doméstico.
Com efeito, o tratamento das
mercadorias importadas com respeito às nacionais, deve ser, no mínimo,
igualitário, para que não haja favorecimento daquelas em relação a essas.
Eis porque o referido inciso III
do art. 24 há de ser aplicado inclusive para as operações de importação de bens
supérfluos;
- o terceiro e último diz
respeito ao aspecto temporal da ocorrência do fato gerador nas importações,
isto é, o momento em que ocorre ou se perfaz o fato gerador.
Muito se discutiu, tanto em
termos doutrinários quanto jurisprudenciais, a respeito desta questão, a ponto
do Colendo Supremo Tribunal Federal pacificar o tema através da súmula n° 577,
estabelecendo que na importação de mercadoria do exterior, o fato gerador do
antigo ICM ocorria no momento de sua entrada no estabelecimento importador,
referendando o disposto no art. 2°, inciso II do Decreto-lei n° 406/68.
Mesmo após a promulgação da
Constituição de 88 e da edição do Convênio ICM 66/88 e, portanto, com o advento
do ICMS, esta continuou sendo a orientação predominante adotada pelos Tribunais
do país, notadamente o STJ.
Partindo deste pressuposto e
independentemente do fato deste entendimento vir a ser modificado, o que convém
destacar é que o fato gerador do imposto, neste caso, não é a importação da
mercadoria propriamente dita, o que pressuporia uma operação de circulação
iniciada no exterior, portanto externa, mas, isto sim, ocorre "na
entrada, no estabelecimento destinatário, ou no recebimento pelo importador de
mercadoria ou bem, importados do exterior", conforme conceitua o art. 3°,
I, da Lei 7547/89, repetindo disposições do Convênio 66/88, art. 2°, I, o que
pressupõe uma operação de circulação iniciada dentro dos limites territoriais
do Estado e, portanto, interna.
Já vimos, é princípio de Direito
Tributário que a fixação da alíquota do imposto decorre de comando legal bem
como sua base de cálculo (art. 97, IV, do CTN).
A base de cálculo do imposto
constitui-se de elementos legalmente designados "ou atributos do fato
gerador para sobre eles ser calculada objetivamente a alíquota do tributo,
mediante simples operação aritmética ..." (Aliomar Baleeiro, Direito
Tributário Brasileiro, pág. 362). O fato gerador do ICMS, por império legal
(art. 1°, II, do Decreto-lei 406/68 e art. 3°, I, da Lei Estadual n° 7547/89) é
a entrada da mercadoria importada no estabelecimento do importador (Súmula 577
do Egrégio STF), anotando-se nesse passo que, quando isso se verifica, a
mercadoria não é mais estrangeira, mas nacionalizada. Assim, a
circulação interna da mercadoria verifica-se mercê do desembaraço aduaneiro.
A alíquota, porção da base de
cálculo, deve ser expressa em termos de percentual para que se chegue a
prestação devida pelo sujeito passivo da relação jurídico-tributária;
relativamente a esta, o artigo 24, III da Lei 7547/89 e o artigo 30, III,
"b" do RICMS/SC/89 dispõem que, nas operações internas com produtos
supérfluos, é ela de 25%. Desnecessária, pois, qualquer outra especificidade
legal como se alvitra.
Ratificando nosso entendimento,
não é demais citarmos parte dos fundamentos de um acórdão, contra o qual a
empresa interpôs o agravo de instrumento de n° 140.017 (AgRg)-SP, julgado em
02/03/93, Min. relator o Sr. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF, onde, por
votação unânime, foi negado provimento ao mesmo.
Note-se que, neste caso, a autora
pretendia ver reconhecido o direito de não recolher o imposto sobre a
importação de bens de capital e de bens para seu uso e consumo (não se
tratando, portanto, de bens considerados supérfluos), sob a alegação de que a
lei paulista não havia estabelecido quais seriam a base de cálculo e a alíquota
aplicável para tais operações e de que não havia fundamento jurídico para a
equiparação tácita da entrada dos bens de capital e/ou de consumo, com as
operações internas, como entendeu o acórdão recorrido, verbis:
O fato gerador ou a hipótese de incidência não se dá
com a importação, mas com a entrada da mercadoria importada no estabelecimento
do comprador, além do que, no Estado de São Paulo, por intermédio da Lei n°
440/74, com a nova redação dada pela Lei n° 3.991/83, estabeleceu-se em seu
art. 18, inciso II, a alíquota de 17% em caso de operações internas e
interestaduais. Desta feita a importação é posterior à Emenda Constitucional n°
23/83.
Ora, as operações de circulação de mercadorias são
necessariamente internas, ou refogem ao domínio normativo estadual. Assim,
todos os negócios relevantes para o aperfeiçoamento da exação são internos e, à
míngua de alíquota específica, a operação de importação rege-se pelo critério
genérico, previsto para as operações internas.
(...)
Nos termos postos na RJTJESP 111/120, onde foi Relator
o Desembargador Carlos Ortiz, pode-se aduzir que na sistemática tributária
sempre se entendeu interna a operação de importação para o efeito de incidência
do ICM, a dispensar qualquer especificação legal. Aplica-se, pois, à espécie o
§ 5°, do art. 23, da Constituição da República, com a redação que lhe foi dada
pela Emenda constitucional n° 23, de 1°-12-1983, com o que, em última análise,
a alíquota é a definida no artigo 18, inciso II, da Lei Estadual n° 440, de
24-9- 1974, com a redação do artigo 1°, inciso III, da Lei Estadual n° 3.991,
de 28-12-1983, ou seja, 17%, por isso devido o tributo.
(...)
Em suma, a alíquota incidente é a prevista para toda
operação interna, entendida esta, outrossim, como a operação de importação para
fins do ICM, sem exigir qualquer outra disciplina legal.
O entendimento, portanto, do qual
o STF não discrepa, é de que a entrada de mercadorias importadas do exterior no
estabelecimento do importador se inclui no âmbito das operações internas.
No mesmo sentido, e ainda mais
esclarecedores, os fundamentos da sentença recorrida no qual se baseou o STF
(1ª Turma), através do Sr. relator, Min. Sepúlveda Pertence, para não conhecer
do recurso extraordinário n° 134.581-SP, interposto pela mesma empresa do
agravo precedente, julgado em 13/04/93, verbis:
A pretensão exposta na inicial não merece acolhimento.
O fato gerador do ICM em hipóteses que tais é a
entrada da mercadoria no estabelecimento importador, nos termos do art. 1°,
inciso II, da Lei n° 440/74, com a redação da Lei n° 3.991/83 (e não a
importação propriamente dita).
Desse modo, cuida-se de operação interna eis que,
antes dela, já ocorrera a internação da mercadoria no país.
E, cuidando-se de operação interna, a alíquota só
poderia ser de 17% prevista no art. 18 da Lei n° 440/74.
Aliás, a Súmula n° 577 do Colendo Supremo Tribunal
Federal dispõe que "na importação de mercadoria do exterior, o fato
gerador do Imposto de Circulação de Mercadorias ocorre no momento de sua
entrada no estabelecimento importador".
Desse modo, a base de cálculo, na hipótese de
importação, é aquela prevista no art. 19, inciso IV da Lei n° 440/74.
Nada importa a circunstância de o legislador ter
discriminado as alíquotas para as operações interestaduais e de exportação e
não para as entradas de mercadorias importadas.
Fê-lo, certamente, porque as últimas caracterizam
operações internas, sendo mesmo redundante pretender que recebessem tratamento
destacado.
Também desnecessário que a lei dispusesse que as
operações de entrada de mercadorias importadas do exterior consideram-se
operações internas.
Nessa ordem de raciocínio emerge claro que a lei
previu a alíquota a ser aplicada nas entradas de produtos importados no país.
(...)
Não se vislumbra qualquer vício na Lei Estadual n°
3.991/83, quer formal, quer de inconstitucionalidade.
Nessa mesma esteira de pensamento
é conveniente que citemos:
1 - o acórdão do Agravo n°
141.906-7, DJ 14/08/92, 2ª Turma do STF, com a seguinte ementa:
Imposto sobre circulação de mercadorias - Bem de
Capital - Importação - Lei do Estado de São Paulo n° 3.991/83. A citada Lei, no
que previu a incidência do imposto sobre Circulação de Mercadorias considerada
a entrada de bens de capital importados não se mostra defeituosa.
O silêncio quanto à base de cálculo e à alíquota atrai
a aplicação da norma geral alusiva ao tributo, devendo ser observada, assim, a
Lei n° 440/74, que estabeleceu a base de cálculo relativa aos casos de
importação de mercadorias do exterior e dispôs sobre a alíquota única para as
operações internas e de exportação. Inexistência de vulneração ao disposto nos
artigos 19, inciso I, e 153, §§ 2° e 29, da Constituição Federal anterior.
Nego seguimento ao agravo.
2 - o acórdão unânime da 2ª Turma
do STJ - REsp 19.475-0 - SP - Rel. Min. Hélio Mosimann, julgado em 29/06/94,
DJU 1 de 15/08/94, p. 20.321 que tem a seguinte ementa:
Tributário. Importação. Bens destinados ao ativo fixo
da empresa. ICM devido. Sendo o fato gerador do ICM a entrada do produto no
estabelecimento do importador, a operação interna conta com a alíquota prevista
na legislação estadual. Devido o tributo, não se conhece do recurso.
3 - o Agravo regimental no Agravo
de Instrumento n° 39.428-8 - SP - Rel. Min. Humberto Gomes de Barros (1ª Turma
do STJ), julgado em 02/03/94 e publ. no DJU de 06/06/94, pg. 14.239,
sintetizado nesta ementa:
ICMS - Importação de bem destinado ao ativo fixo.
É lícito cobrar ICMS sobre a importação de bem
destinado ao ativo fixo. Em tal hipótese, considera-se a entrada no
estabelecimento importador, como operação interna, para efeito de base de
cálculo e adoção de alíquotas.
A conclusão a que se chega,
também com a análise desses julgados, é por demais óbvia: se a operação de
importação configura uma operação interna, qualquer operação de importação de
produtos considerados supérfluos ainda que a expressão "inclusive na
entrada de mercadoria importada" não conste expressamente do inciso III do
art. 24 como ocorre no inciso II da Lei 7547/89 - de resto, desnecessária -,
estará sujeita à alíquota ali especificada e, se de acordo com a mesma lei, em
seu artigo 24, § 2°, item III, o fumo e seus sucedâneos manufaturados são
considerados produtos supérfluos, independentemente de sua destinação, então a
alíquota a ser aplicada quando da importação desses produtos, há de ser,
necessariamente, 25%.
Por isso, deve ser respondido à
consulente que seu entendimento não está correto devendo ser aplicado, no caso,
o disposto no inciso III, art. 24 da Lei 7547/89.
É o parecer que submeto à
Comissão.
Gerência de Tributação, em
Florianópolis, 31 de outubro de 1996.
Neander Santos
FTE - Matr. 187.384-9
De acordo. Responda-se a consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 13/11/1996
Lauro José Cardoso João Carlos Kunzler
Presidente da COPAT Secretário Executivo