CONSULTA
Nº: 24/07
EMENTA: ICMS. COMPEX. PERMANECEM EM VIGOR ATÉ O SEU
TÉRMINO OU ATÉ 31 DE DEZEMBRO DE 2008, O QUE OCORRER PRIMEIRO, OS BENEFÍCIOS
FISCAIS CONCEDIDOS POR PRAZO CERTO, AINDA QUE A RESPECTIVA LEGISLAÇÃO TENHA
SIDO REVOGADA.
CONSIDERAM-SE INSUMOS DE PRODUÇÃO, OS ÓLEOS COMBUSTÍVEIS UTILIZADOS NO PROCESSO
INDUSTRIAL DE FABRICAÇÃO DE PAPEL-HIGIÊNICO.
Informa a consulente que desde 27
de março de 2006 encontra-se enquadrada no “Programa de Modernização e
Desenvolvimento Econômico, Tecnológico e Social de Santa Catarina” (Compex),
nos termos dos arts. 218 a 226 do Anexo 6 do RICMS. Em razão disso, obteve
regime especial autorizando, a consulente, pelo prazo de vinte e quatro meses,
a adquirir, com diferimento do ICMS, os produtos nele relacionados, entre eles,
“combustíveis utilizados como insumos de produção”.
No entanto, o dispositivo que
autorizava o tratamento tributário diferenciado (art. 223) foi revogado pelo
Decreto n° 4.802/2006. Em razão disto, formula a seguinte consulta a esta
Comissão:
a) os óleos combustíveis
adquiridos para emprego no processo industrial da consulente (fabricação de
papel higiênico) são considerados insumos, para fins do diferimento a que se
refere o regime especial concedido?
b) os atos de concessão
individual do Compex permanecem em vigor até o seu término, mesmo após a
revogação da legislação respectiva?
Instada a manifestar-se no
processo, a 10ª Gereg, com sede na cidade de Lages, pondera que a resposta à
dúvida levantada pela consulente encontra-se no art. 17 da Medida Provisória n°
130, de 21 de novembro de 2006. O dispositivo legal invocado determina a
revisão dos tratamentos concedidos com base na legislação do Compex. O § 1° do
artigo referido assegura, enquanto não for revisto, a continuidade do
tratamento concedido, até o término do prazo previsto no ato concessório ou até
8 de dezembro de 2008, o que ocorrer primeiro.
02 -
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Lei Complementar n° 87, de 13 de
setembro de 1996, arts. 19, 20;
Lei n° 10.297/96, arts. 21, 22 e
37, § 6°, II;
Medida Provisória n° 130, de 21
de novembro de 2006, art. 17, § 1°;
RICMS-SC, aprovado pelo Decreto
n° 2.870, de 2001, arts. 28 e 29 e Anexo 3, art. 22, I, a.
03 -
FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
O crédito relativo à entrada de
combustíveis utilizados como insumo de produção já foi tratado por esta
Comissão na resposta à Consulta n° 42/03.
Recapitulando a matéria: o regime
de créditos financeiros, em substituição aos créditos físicos, foi introduzido
no direito tributário brasileiro pela Lei Complementar n° 87/96, no exercício
da atribuição prevista no art. 155, § 2°, XII, “c”, da Constituição Federal:
“cabe à lei complementar disciplinar o regime de compensação do imposto”.
A LC 87/96, entretanto, optou
pela implantação gradual do regime de créditos financeiros, postergando, nos
termos do art. 33, I, o direito ao crédito das mercadorias destinadas ao uso ou
consumo do estabelecimento.
A questão, portanto, reside em
determinar se o combustível utilizado na fabricação de papel higiênico
constitui consumo do estabelecimento ou insumo de produção.
Entende-se por insumo (imput),
a combinação de fatores de produção necessária à produção de determinado bem.
Para fins de crédito do ICMS, interessa saber se a aquisição dos referidos
fatores de produção sofreu ou não a incidência do imposto. Já as mercadorias
destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento, mesmo que tenham sido oneradas
pelo ICMS, não permitem o crédito porque não se relacionam necessariamente com
a produção.
Ora, a conceituação de créditos
físicos, mesmo na vigência da legislação anterior à Lei Complementar n° 87/96
não se restringia aos materiais que integrassem fisicamente o produto. O
autorizado magistério Ruy Barbosa Nogueira (Direito Tributário, 1969, pp.
32-33) conceituava o sistema de crédito físico como o “que admite apenas o
crédito dos produtos que fisicamente se incorporam ao produto ou se consomem
no curso do processo de industrialização”. Não discrepa deste entendimento
Sacha Calmon Navarro Coelho (Curso de Direito Tributário Brasileiro, Rio de
Janeiro: Forense, 1999, p. 479):
“O Decreto-lei n° 406/68, lei complementar ratione
materiae, adotou o crédito físico, pois se no art. 3° dispunha que o ICM
era não-cumulativo, abatendo-se em cada operação o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou por outro estado, já no § 3° do mesmo artigo
estabelecia o não-estorno de mercadorias adquiridas para utilização como
matéria-prima, material secundário e embalagem, indicando na via do estorno que
o direito de crédito era restrito. A jurisprudência fixou-se, então, no
entendimento de que o sistema de compensação era o do crédito físico, ou seja,
somente propiciavam crédito a compensar nas operações subseqüentes as
mercadorias destinadas à revenda ou materiais/insumos que se integrassem
fisicamente ao produto resultante (output) ou que, ao menos, se
consumissem integralmente durante o processo de industrialização.”
Embora não se integrando
fisicamente ao produto ou participando de sua composição, o direito de crédito
resultava do papel do imput na transformação industrial. O raciocínio
vale para qualquer fonte energética utilizada, seja ela óleo combustível,
lenha, energia elétrica, carvão etc.
À mesma conclusão nos leva o
exame da legislação anterior à LC 87/96: o Convênio ICM 66/88 dizia
taxativamente que a entrada de material consumido no processo de industrialização
dava direito a crédito do imposto.
“Art. 31.
Não implicará crédito para compensação com o montante do imposto devido nas
operações ou prestações seguintes:
......................................................
III – a entrada de mercadorias ou produtos que,
utilizados no processo industrial, não sejam nele consumidos ou não
integrem o produto final na condição de elemento indispensável à sua
composição.”
Infere-se a contrario sensu
que a entrada de mercadorias ou produtos implicará crédito para compensação com
o montante do imposto devido nas operações ou prestações seguintes quando,
utilizados no processo industrial:
a) forem nele consumidos;
ou
b) integrarem o produto final na
condição de elemento indispensável à sua composição.
O Convênio ICM 66/88, editado com
base no § 8° do art. 34 do ADCT da Constituição, promulgada em 1988, tratou
provisoriamente de normas gerais aplicáveis ao ICMS até a edição da Lei
Complementar n° 87/96. A disciplina do Convênio 66/88, portanto, trata
estritamente do regime de compensação de créditos físicos, já que o regime de
créditos financeiros somente foi introduzido pela Lei Complementar n° 87/96.
Por via de conseqüência, resulta cristalino que, no regime de crédito físico,
admitia-se o aproveitamento de créditos não só das mercadorias que se
integrassem fisicamente ao produto final, mas também das que se consumissem no
processo de industrialização. Redação semelhante encontramos na Lei n°
7.547/89, também vigente antes da LC 87/96, ainda na vigência do regime de créditos
físicos:
“Art. 34. Não implicará crédito para compensação com o
montante do imposto devido nas operações ou prestações seguintes:
.....................................................................................................................................................................................................................................
II – a entrada de bens destinados a consumo, ou
à integração no ativo fixo do estabelecimento;
III – a entrada de mercadorias ou produtos que, utilizados
no processo industrial, não sejam nele consumidos ou não integrem o
produto final na condição de elemento indispensável à sua composição;”
O legislador, portanto,
distinguia com muita propriedade entre “bens destinados a consumo”, referidos
no inciso II, e as mercadorias ou produtos consumidos no processo industrial,
na condição de elemento indispensável à sua composição, referido no inciso III.
No primeiro caso, o crédito era vedado; no segundo, era permitido.
No mesmo sentido, o antigo
Regulamento do ICM, aprovado pelo Decreto n° 31.425, de 17 de fevereiro de
1987, admitia claramente o crédito relativo a produtos “consumidos no processo
industrial”, quando adotado o regime de créditos físicos:
“Art. 62. Para efeito de apuração do valor a recolher,
poderá ser aproveitado, salvo disposição em contrário, o imposto pago e
escriturado, relativamente:
I – às mercadorias recebidas para comercialização e/ou
emprego na industrialização ou produção agrícola, animal ou extrativa,
incluindo-se o material de acondicionamento e, no caso da industrialização, os
produtos intermediários que, embora não se integrando fisicamente ao novo
produto, sejam consumidos no processo;”
Tanto a legislação do ICM quanto
a do ICMS vigente antes da edição da LC 87/96, ou seja, no período em que era
adotado estritamente o regime de créditos físicos, o direito a crédito incluía
não só os insumos que se integrassem fisicamente ao novo produto como também os
que fossem consumidos na produção.
Em sede de jurisprudência, o
Supremo Tribunal Federal tem entendido de forma lata o conceito de “consumo no
processo industrial”. Assim, a sua Primeira Turma, ao julgar o Recurso
Extraordinário n° 79.601-RS, em 26 de novembro de 1974, em acórdão da lavra de
Aliomar Baleeiro, reconheceu o crédito do ICM aos “produtos intermediários que
se consomem ou se inutilizam no processo de fabricação”. Isto porque os
referidos materiais, “ainda que não integrem o produto final, concorrem direta
e necessariamente para este porque utilizados no processo de fabricação, nele
se consumindo”.
No mesmo sentido, a egrégia
Segunda Turma reconheceu direito ao crédito do ICM para os “materiais
refratários utilizados na indústria siderúrgica, que se consomem no processo de
fabricação, ainda que não se integrando no produto final” (RE 96.643-MG,
julgado em 9 de agosto de 1983). A mesma Turma entendeu também que “peças
que se desgastam no processo de produção, equiparam-se ao material consumível,
para efeitos de aplicação do benefício da não cumulatividade” (RE 107.110-SP,
julgado em 25 de fevereiro de 1986). Do voto do relator, Ministro Carlos
Madeira, extrai-se a seguinte passagem:
“Não integram as peças fabricadas, mas se desgastam no
processo de produção . Também não integram um bem de capital, pois são
materiais consumíveis, que devem ser substituídos com breve tempo de uso. A
circunstância de não se consumirem desde logo, no processo de fabricação, mas
em operações sucessivas, não impede se possa equipará-la ao do material
consumível beneficiado com a não cumulatividade tributária.” (RTJ 102/304)
Ora, não seria consistente com o
ordenamento jurídico-tributário negar o direito a créditos que a legislação
expressamente permitia quando vigorava o regime de créditos físicos após a
entrada em vigor da LC 87/96, que adotou o regime de créditos financeiros,
mesmo gradualmente.
Mais recentemente, a Primeira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgRg no Agravo de
Instrumento n° 438.945-SP (RDDT 93: 229), em 10 de dezembro de 2002, embora
negando direito ao crédito dos produtos intermediários, reconheceu o
crédito gerado, não só pela entrada de insumos que integram o produto final,
mas também dos que se consomem de forma imediata e integral no processo
industrial.
No tocante ao tratamento
concedido, com base na legislação do Compex, efetivamente a Lei n° 13.992, de
15 de fevereiro de 1975 (conversão da Medida Provisória n° 130, de 2006), art.
18, § 1°, assegurou a continuidade dos tratamentos tributários diferenciados
concedidos, até o término do prazo previsto no ato concessório, enquanto não
revistos os enquadramentos, ou até 31 de dezembro de 2008, o que ocorrer
primeiro.
Essa disposição não destoa do
tratamento previsto na Lei Complementar n° 24, de 7 de janeiro de 1975, que, ao
tratar da revogação de benefícios fiscais, ressalvava no § 2° do art. 12 os
benefícios concedidos por prazo certo ou em função de determinadas condições
que já tivessem sido incorporadas ao patrimônio jurídico do contribuinte.
A regra geral é que o benefício
fiscal concedido por prazo certo ou sob determinada condição, continua vigendo
até o término do prazo ou enquanto satisfeita a condição, mesmo após a
revogação da legislação que a previa.
Posto isto, responda-se à
consulente:
a) os óleos combustíveis
adquiridos para emprego no processo industrial da consulente (fabricação de
papel higiênico) são considerados insumos;
b) os atos de concessão
individual do Compex permanecem em vigor até o seu término, ou até 31 de
dezembro de 2008, o que ocorrer primeiro, ainda que a legislação respectiva
tenha sido revogada.
À superior consideração da
Comissão.
Getri, em Florianópolis, 21 de
fevereiro de 2007.
Velocino Pacheco Filho
AFRE – matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 22 de
março de 2007.
Alda Rosa da
Rocha
Ramon
S. de Medeiros
Secretária
Executiva
Presidente da Copat