EMENTA: ICMS. REDUÇÃO DA
BASE DE CÁLCULO. LEITE ESTERILIZADO (LONGA VIDA). O APROVEITAMENTO DOS CRÉDITOS
PELAS ENTRADAS DEVE SER PROPORCIONAL À INCIDÊNCIA DO IMPOSTO NA OPERAÇÃO DE QUE
DECORRA A SAÍDA DA MERCADORIA DO ESTABELECIMENTO.
CONSULTA Nº: 47/98
PROCESSO Nº: GR01
4909/976
01 - DA CONSULTA
A consulente, empresa
estabelecida neste Estado, exercendo suas atividades no ramo de importação,
exportação e comércio atacadista de alimentos, informa realizar habitualmente a
importação de leite esterilizado (longa vida), que posteriormente revende neste
Estado, para em seguida expor seu entendimento segundo o qual o imposto pago
por ocasião do desembaraço aduaneiro do produto seria uma antecipação do
imposto que incidirá sobre a ulterior operação de comercialização (saída do
produto de seu estabelecimento).
Tendo em vista que o imposto
incide, na importação, sobre a base de cálculo integral e, nas saídas internas,
sobre uma base de cálculo reduzida, consulta, verbis:
a) “qual o procedimento para se
compensar o valor do imposto recolhido antecipadamente em cada operação
(alíquota de 12%) e o incidente no ato da distribuição do produto (alíquota de
7%), sobre a base de cálculo integral, numa diferença à maior de 5% (cinco por
cento)” (sic);
b) “qual o mecanismo de encaminhamento
contábil para compensar, no futuro, a diferença tributária à maior (5%)” (sic).
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal, art. 155, §
2º, inciso II;
Lei nº 10.297/96, arts. 23 e 28;
RICMS-SC/97,
arts. 30 e 35.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Para o correto deslinde da
questão proposta, faz-se necessário, inicialmente, esclarecer um equívoco em
que incorre a consulente. Ao contrário do que entende, a entrada de mercadoria
importada do exterior constitui fato gerador autônomo, cuja configuração não
depende do destino a ser dado ao produto importado. Assim é que, mesmo que o
contribuinte importasse leite esterilizado para consumo próprio, haveria a
realização material da hipótese de incidência abstratamente prevista em lei.
A incidência do ICMS nesta
hipótese está prevista no inciso I do parágrafo único do art. 2º da Lei nº
10.297, de 26.12.96, que reza:
Art. 2º O imposto tem como fato
gerador:
(...)
Parágrafo único. O imposto incide
também:
I - sobre a entrada de mercadoria
importada do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda quando se tratar de
bem destinado a consumo ou ativo permanente do estabelecimento.
O momento em que se considera
ocorrido o fato gerador, neste caso, é o estabelecido no inciso IX do art. 4º
do mesmo diploma legal, verbis:
Art. 4º Considera-se ocorrido o
fato gerador do imposto no momento:
(...)
IX - do desembaraço aduaneiro das
mercadorias importadas do exterior;
Portanto, no momento do
desembaraço aduaneiro da mercadoria tem-se ocorrido o fato gerador do ICMS, sendo,
por conseguinte, devido o tributo, em função da importação de mercadoria do
exterior do país. Esse fato, no entanto, nada tem a ver com a destinação a ser
dada à mercadoria; independe de que seja ou não realizada “a posteriori” nova
operação tributada tendo-a por objeto. Configurar-se-á a hipótese de incidência
do imposto mesmo que a mercadoria destine-se ao uso ou consumo do próprio
importador.
Dessa forma, é totalmente
descabida a afirmação de que o imposto pago por ocasião da importação da
mercadoria constitui mera “antecipação” do pagamento do imposto que porventura
seja devido em virtude da ulterior realização de nova operação tributada. Não
menos impertinente é a assertiva de que o tributo pago deve, em determinadas
circunstâncias, ser “devolvido” ao contribuinte.
Segundo a regra-matriz
constitucional, o ICMS é imposto plurifásico e não-cumulativo, incidindo nas
várias etapas do ciclo de produção e comercialização da mercadoria sem que
haja, contudo, superposição de incidências.
A sistemática adotada para dar
efetividade a esse princípio da não-cumulatividade foi a do confronto entre os
débitos e os créditos do imposto. Assim, o imposto devido em uma operação é
compensado com o que foi pago na operação anterior.
O fato de que esse imposto pago
na operação anterior poderá ser compensado com o montante devido na operação
tributada subseqüente não configura, no entanto, em absoluto, devolução ao
contribuinte do imposto pago anteriormente. Ao contrário, trata-se de artifício
tendente a evitar a ocorrência de superposição de incidências do mesmo tributo,
ou de outro modo, evitar que ao Estado seja recolhido o mesmo imposto mais de
uma vez.
O chamado crédito do imposto tem,
pois, natureza meramente contábil, escritural. Não se trata de valor de que o
Estado seja devedor para com o
contribuinte, mas apenas um direito deste à compensação com o imposto devido,
com vistas à não ocorrência de tributação “em cascata”.
Fácil concluir, portanto, que
somente terá cabimento essa compensação se a operação praticada pelo
contribuinte for onerada pelo imposto. Caso contrário, não há que se falar em
crédito, já que não há o que compensar. Nesse sentido são as disposições do
art. 155, § 2º, II, da Constituição Federal, verbis:
Art. 155. .....................
§ 2º O imposto previsto no inciso
II atenderá ao seguinte:
....................
II - a isenção ou não-incidência,
salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para
compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do
crédito relativo às operações anteriores;
A Constituição Federal, ao
atribuir aos entes federados a competência para instituir e cobrar os tributos
que expressamente prevê, delimita, ao traçar o arquétipo genérico desses
tributos, seu campo de incidência. No
caso do ICMS, o próprio constituinte impede que algumas das situações do mundo
fático encontradas dentro dos limites desse campo de incidência sejam oneradas
pelo imposto. São as chamadas imunidades, previstas na Constituição Federal
(art. 155, § 2º, X).
Em relação a outras situações,
também incluídas no campo de incidência do imposto, poderá a lei ordinária
estadual afastar tal incidência (isenções).
Segundo o magistério de José
Souto Maior Borges (In Isenções Tributárias, 2ª ed. 1980, Ed. Sugestões
Literárias S/A, pp. 249 e 250), as isenções podem ser classificadas em totais e
parciais:
As isenções podem, ainda, ser
classificadas em totais e parciais. As isenções totais excluem o nascimento da
obrigação tributária, enquanto que, nas isenções parciais, surge o fato gerador
da tributação, constituindo-se, portanto, a obrigação tributária, embora o
“quantum” do débito seja inferior ao que normalmente seria devido se não
tivesse sido estabelecido preceito isentivo.
(...)
A isenção parcial consiste, mais
propriamente, numa redução ou bonificação do débito tributário.
(...)
As isenções parciais podem
revestir-se de diversas modalidades técnicas, segundo o elemento de
quantificação da relação tributária que se utiliza para provocar o efeito
liberatório desejado, podendo, assim, falar-se em bonificações na base de
cálculo, nos tipos de gravame ou na alíquota. (grifos nossos)
Destarte, a norma isencional pode
exonerar do imposto determinada operação em sua totalidade ou apenas
parcialmente, sendo exemplo dessa última hipótese a redução da base de cálculo.
Sendo total a isenção, como dito
acima, nenhum crédito haverá para o contribuinte, posto que não haverá imposto
a compensar. Por outro lado, se a isenção for apenas parcial, é dizer, se a
operação for apenas em parte onerada pelo imposto em virtude de ser reduzida a
base de cálculo, por exemplo, o direito ao crédito será proporcional à parte
onerada pelo tributo.
No caso em tela, a mercadoria é
onerada normalmente em sua entrada, estando a operação integralmente sujeita à
incidência do imposto. Já na sua saída, há a exoneração parcial da incidência,
sendo apenas parte do valor da operação alcançada pelo tributo. Se essa
incidência fosse total, todo o imposto que onerou a entrada seria considerado
na apuração do imposto a recolher. Se fosse isenta integralmente, não havendo
imposto a compensar, nenhum crédito haveria para o contribuinte. Por
conseguinte, sendo a incidência apenas parcial, apenas parte do imposto que
normalmente seria devido caso inexistisse a isenção (parcial) há que ser
compensado, de sorte que o crédito pela entrada está limitado à proporção em
que a nova operação sofre a incidência, conforme determina o art. 155, § 2º, II
da Constituição Federal. Nesse sentido expressamente dispõe o art. 23 da Lei nº
10.297, de 26.12.96:
Art. 23. O crédito será
apropriado proporcionalmente, nos casos em que a operação ou prestação
subseqüente for beneficiada por redução da base de cálculo, na forma prevista
na legislação, exceto em relação às mercadorias de consumo popular (Seção II do
Anexo Único) produzidas no Estado, as quais farão jus ao crédito integral.
Diante do exposto, responda-se à
consulente que está incorreto seu entendimento de que o imposto devido pela
realização da importação de mercadorias do exterior do país constitui
antecipação do recolhimento do que incide na sua ulterior saída. O imposto pago
por ocasião da importação será computado na apuração do imposto devido na saída
subseqüente da mercadoria, como crédito. Esse crédito, contudo, está limitado à
proporção em que a operação subseqüente sofre a incidência do imposto. Ficam,
assim, prejudicadas as questões formuladas ao final da consulta por serem
impertinentes e não se coadunarem com a disciplina legal da matéria.
É o parecer que submeto à
Comissão.
Gerência de Tributação, em
Florianópolis, 01 de julho de 1998.
Laudenir Fernando Petroncini
FTE - Matr. 301.275-1
De acordo. Responda-se a consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 06/11/98.
Pedro Mendes Isaura Maria Seibel
Presidente da COPAT Secretária Executiva