EMENTA: ICMS. FRANQUIA.
VENDA DE MÓVEIS SOB ENCOMENDA E SEGUNDO ESPECIFICAÇÕES DO CONSUMIDOR. A BASE DE
CÁLCULO É O PREÇO TOTAL, INCLUSIVE O CUSTO DO PROJETO DO MÓVEL E A SUA
MONTAGEM.
CONSULTA Nº: 13/96
PROCESSO Nº:
UF10-20914/95-4
01 - DA CONSULTA
A consulente relata o seguinte:
a) que clientes de seus
associados pretendem realizar vendas de móveis, produzidos em outra unidade da
federação (não especificada na consulta), na condição de franqueados;
b) que, entre as obrigações de
franqueado está:
b.1- fazer a venda de móvel;
b.2- desenvolver o projeto do
móvel a ser vendido ao consumidor, através de projetista próprio, que, se
aprovado pelo consumidor/comprador, será remetido para a fábrica da
franqueadora para produção;
b.3- fazer a montagem do móvel na
residência ou escritório do consumidor/comprador;
b.4- fazer a cobrança (mesmo
parcelada) e remeter à franqueadora;
c) o móvel será faturado
diretamente, pela franqueadora, para o consumidor/comprador;
d) o projeto, montagem e
assistência técnica serão cobrados do consumidor/comprador, pelo franqueado,
nos mesmos prazos da venda da mercadoria.
Entende a consulente que o
desenvolvimento do projeto e a montagem não se sujeitam ao ICMS, tratando-se de
serviços (embora não especifique o item de lista de serviços em que pretende
estar enquadrada). Assim, propõe o seguinte procedimento:
a) o pedido separará o preço do
móvel e o preço dos serviços de projeto e montagem;
b) por ocasião do faturamento
emitirá nota fiscal de serviços, sem incidência do ICMS e com incidência do
ISS.
Diante do exposto, consulta:
a) o procedimento está correto?
b) caso contrário, qual o
procedimento recomendado por esta consultoria?
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
C.F. art. 155, II.
Decreto-Lei n° 406/68, art. 1°,
2°, I e 8°.
Lei n° 7547/89, arts. 2°, 3°, V e
7°, V, "a".
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Inicialmente, deve-se salientar
que, a teor do disposto na Portaria SEF 213/95, art. 1°, IV, os órgãos de
classe somente poderão formular consulta sobre assunto de interesse geral de
seus filiados, o que não é o caso presente. Os filiados da consulente são os
contabilistas ........, e a consulta versa sobre assunto de particular
interesse de clientes de seus filiados. Feita a ressalva, passemos ao exame da
matéria consultada.
A consulta envolve a discussão
sobre o limite entre as esferas de incidência do ICMS e do ISS. Para dirimir a
questão, torna-se necessário examinar a definição de serviço para a legislação
tributária e seu respectivo campo de incidência.
Para tanto, reportamo-nos à lição
de Bernardo Ribeiro de Morais (Doutrina e Prática do Imposto sobre Serviços,
Revista dos Tribunais, São Paulo, 1978):
... a Emenda Constitucional n° 18, abandonou o
princípio ortodoxo jurídico estabelecido desde a constituição de 1891, o qual
mostrava uma partilha de impostos elaborada através de critérios
nominalísticos, (apresentando o "nomem juris" ou a roupagem jurídica
do imposto), sem atenção alguma ao conteúdo econômico. O novo sistema deixou
para um segundo plano o aspecto jurídico da discriminação, que era predominante,
colocando em seu lugar o aspecto econômico do imposto. Reunindo impostos de
idêntica natureza em figuras unitárias, definidas em referências às suas bases
econômicas, aptas a servirem de base para a tributação, a Emenda Constitucional
n° 18 adotou uma classificação de impostos nitidamente econômica e, com essa
base, estabeleceu nova discriminação constitucional de rendas. (p.75).
O ordenamento jurídico-tributário
brasileiro, como visto, adotou o critério econômico na discriminação das
esferas de incidência dos impostos. Entretanto, não podemos olvidar, que os
fatos econômicos somente tem significação no mundo jurídico na medida em que
são positivados pelo direito. Importa, então, extrair todo o conteúdo jurídico
do conceito econômico de "serviços" para o perfeito entendimento de
sua hipótese de incidência. Ensina o mesmo autor:
A noção de serviço (objeto do ISS) não pode ser
confundida com a simples "prestação de serviços" (contrato de direito
civil, que corresponde ao fornecimento de trabalho). O conceito de
"serviço" nos vem da economia, do trabalho como produto. De fato, o
trabalho, aplicado à produção, pode dar como resultado duas classes de bens:
bens materiais, denominados material, produto ou mercadoria; e bens imateriais,
conhecidos como serviços. Serviço, assim, é expressão que abrange qualquer bem
imaterial, tanto atividades consideradas de "prestação de serviços
"(v.g.: atividades do médico, do advogado, do engenheiro, do corretor,
etc.) como as demais vendas de bens imateriais (v.g.: atividades do locador de
bens móveis, do transportador, do albergueiro, do vendedor de bilhete da
Loteria Federal, etc). Na lição de Aliomar Baleeiro, serviço pode ser tanto o
resultado de uma atividade prestada como o de coisas que as pessoas "põe a
disposição dos outros". Quem aluga um automóvel, na realidade não está
fornecendo trabalho mas estará fornecendo, a terceiros, um bem imaterial, ou
melhor, um serviço (cessão de uso e gozo da coisa). Exame superficial da lista
de serviços, baixada pelo Decreto-lei n° 406, de 1968, nos mostra que o ISS
grava várias atividades que não constituem objeto de contrato de
"prestação de serviços", como tal conceituada pelo direito civil,
sendo exemplos os serviços de locação de bens móveis, de venda de bilhetes da
Loteria Federal, etc.
Assim, o ISS recai sobre serviços de qualquer
natureza, entendendo-se como tal a circulação (venda) de bens imateriais. Em
nosso direito, com algumas modificações, o conceito de serviço corresponde à
mesma noção que dele tem a doutrina e o ordenamento positivo dos diversos
países que adotaram o imposto sobre o valor agregado (prestação de serviços é
toda operação que não constitua venda de um bem material). (p.98)
A seu turno, o ICMS compreende em
sua hipótese de incidência dois fatos típicos:
a) operações de circulação de
mercadorias;
b) prestação de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
À evidência, os serviços
nominados em (b) estão expressamente excluídos da esfera de incidência do ISS.
Já quanto às operações relativas à circulação de mercadorias, em princípio, não
haveria hipótese de conflito com o fato gerador do ISS, pois trata-se, no caso,
de obrigação de dar (coisa móvel, objeto de mercancia) e não de fazer (hipótese
de incidência do ISS). O problema surge no caso de operações mistas (ou
impropriamente mistas) que envolvem tanto uma obrigação de dar quanto de fazer.
É o caso de venda de uma mercadoria em que o vendedor assume o encargo de
entregá-la montada na residência do comprador, ou seja, a operação mercantil é
acompanhada de prestação de serviços (transporte e montagem), mas o serviço tem
caráter acessório em relação ao negócio mercantil, configurando hipótese de
incidência do ICMS. Da mesma forma, há prestações de serviços que incluem o
fornecimento de materiais (v.g. confecção de cartões de visita em que o papel e
a tinta são fornecidos pelo prestador do serviço).
O nosso direito positivo
considera que o material empregado na prestação de serviço inclui-se no
serviço, assim como os serviços que acompanham a operação de circulação de
mercadorias subsumem-se no negócio mercantil (Decreto-lei 406/68, art.8°, §§ 1°
e 2°). Em tais operações, salvo expressa disposição da lista de serviços incide
exclusivamente o ICMS ou o ISS, conforme o caso. O critério distintivo entre
uma e outra situação consiste em determinar se o núcleo da obrigação é de dar
ou de fazer, ou seja se o serviço é principal e o fornecimento de mercadoria é
acessório, ou o contrário. Esclarece Marçal Justem Filho (O Imposto sobre Serviços
na Constituição, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1985, p. 90):
Haverá um grupo de obrigações de fazer caracterizado
por envolver prestação consistente na realização de um negócio jurídico -
juridicamente inconfundível com a obrigação de fazer anteriormente existente. E
outro grupo seria o das obrigações de fazer cuja prestação não consiste na
prática de novo negócio jurídico, mas em uma atividade que se esgota em si
mesma, que é bastante para satisfazer as partes. Diriamos que as primeiras
poderiam dizer-se obrigações (de fazer) meio, enquanto as últimas seriam
obrigações (de fazer) fim. Somente as últimas podem interessar ao
presente estudo, já que aqueloutras não produzem prestação de serviço.
No caso em tela, conforme
relatado pela consulente, cuida-se de comercialização, pela franqueada, de
móveis produzidos pela franqueadora. Esta é a atividade principal e
preponderante do negócio. A venda, habitual e com intuito de lucro de bens
móveis situa-se no campo de incidência do ICMS.
A natureza do contrato entre a
vendedora e seu cliente é de compra e venda e não de prestação de serviço. O
comprador não está contratando com a franqueada a elaboração de um projeto. Ele
está adquirindo um móvel. A obrigação é de dar e não de fazer. O referido
projeto não se esgota com a sua elaboração, mas é mera etapa preparatória do
negócio celebrado entre as partes, que é de compra e venda.
O serviço, no caso, não é
prestado ao adquirente (que não está comprando um projeto, e sim um móvel) mas
à franqueadora. Sobre esta operação (entre a franqueadora e a franqueada)
pode-se cogitar de incidência, ou não, do ISS, nos termos da legislação
municipal. Mas o negócio celebrado com o adquirente do móvel sujeita-se
exclusivamente ao imposto estadual. Isto porque o negócio é único (compra e
venda). Não são dois contratos, um de elaborar o projeto e outro de venda do
móvel. A prestação de serviços (projeto e montagem) é contratada entre a
franqueadora (indústria) e a franqueada. O serviço não é um fim em si, não se
esgota na sua realização, mas subsume-se no fabrico e na venda do móvel ao
consumidor final.
A franqueada não está
simplesmente prestando um serviço, mas vendendo móveis, como representante da
franqueadora. O projeto é executado em função dessa venda.
Diante do exposto, responda-se à
consulente:
a) a venda do móvel sujeita-se ao
ICMS e tem por base de cálculo o preço total cobrado do consumidor;
b) a operação deve ser
documentada por nota fiscal, modelo 1, emitida pela vendedora, com destaque do
ICMS.
c) o sujeito passivo da obrigação
tributária é quem pratica operações de circulação de mercadorias.
No caso em tela, caso se
verifique que a franqueadora pratica operações de circulação de mercadorias
(venda dos referidos móveis) será exigível o imposto correspondente.
Esse é o parecer que submeto à
superior consideração da Comissão.
GETRI, em Florianópolis, aos 16
de janeiro de 1996.
Velocino Pacheco Filho
FTE - mat. 184.244-7
De acordo. Responda-se a consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 04/03/1996.
Renato Luiz Hinnig João Carlos Kunzler
Presidente da COPAT Secretário Executivo