EMENTA: ICMS/ISS.
IMPRESSOS GRÁFICOS. ITEM 77 DA LISTA DE SERVIÇOS.
INCIDE O ICMS QUANDO OS IMPRESSOS CONSTITUÍREM MERCADORIA, OU SEJA, FOREM
PRODUZIDOS PARA O FIM EXPRESSO DE COMERCIALIZAÇÃO OU INDUSTRIALIZAÇÃO. NESSE
CASO HAVERÁ EXCLUSÃO DA INCIDÊNCIA DO ISS.
INCIDE O ISS QUANDO OS IMPRESSOS FOREM
PERSONALIZADOS E CONFECCIONADOS SEGUNDO AS ESPECIFICAÇÕES DO ENCOMENDANTE.
MERCADORIAS FORNECIDAS JUNTAMENTE COM A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO INTEGRAM A BASE DE
CÁLCULO DO ISS (DECRETO-LEI 406/68, ART. 8°, § 1°).
CONFORME PORTARIA SEF 116/89 DEVE-SE CONSIDERAR AINDA COMO MERCADORIAS OS
IMPRESSOS QUE FOREM DESTINADOS A INTEGRAR OU ACOMPANHAR MERCADORIA
COMERCIALIZADA PELO ENCOMENDANTE, TAIS COMO RÓTULOS, ETIQUETAS, EMBALAGENS,
MANUAIS DE INSTRUÇÕES ETC. INCIDÊNCIA DO ICMS.
A INCIDÊNCIA DE ISS NA HIPÓTESE CONSIDERADA IMPEDIRIA A COMPENSAÇÃO DO ICMS QUE
ONEROU OS INSUMOS UTILIZADOS PELA INDÚSTRIA GRÁFICA COM O ICMS DEVIDO PELA
COMERCIALIZAÇÃO DA MERCADORIA PRODUZIDA PELO ENCOMENDANTE DOS IMPRESSOS,
RESULTANDO EM INCIDÊNCIA EM CASCATA. VULNERAÇÃO DO PRINCÍPIO DA
NÃO-CUMULATIVIDADE.
CONSULTA Nº: 20/2001
PROCESSO Nº: PSEF
71.759/01-8
01 - DA CONSULTA
A
consulente em epígrafe formulou consulta à douta Procuradoria Geral do Estado
sobre qual o tributo que incide sobre os trabalhos gráficos: se o ICMS, de
competência estadual, ou o ISS, de competência municipal. A questão foi
colocada pela consulente nos seguintes termos:
As empresas recolhem ICMS para os produtos que se
destinam a comercialização ou industrialização e recolhem ISSQN para os
produtos que se destinam ao consumo do encomendante , tudo conforme prevê a
Portaria SEF n° 116/89 da Secretaria da Fazenda e tam-bém conforme é praticado
pelas demais gráficas do país.
Acontece que as empresas estão recebendo notificação da
Procuradoria Geral do Município de Blumenau para que deixem de recolher ICMS e
passem a recolher ISSQN para todos os produtos destinados à industrialização,
que representam mais de 80% do total, com ameaça de serem denunciados por crime
de sonegação fiscal se não adotarem tal procedimento. Ba-seiam sua exigência em
decisões do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.
A
consulta vem instruída com parecer da Consultoria Tributária da Secretaria das
Finanças do Estado da Paraíba que sustenta serem as indústrias gráficas
contribuintes do ICMS. Os impressos gráficos somente não estariam sujeitos à
incidência do imposto estadual se forem personalizados e destinarem-se ao uso
exclusivo do encomendante.
Acrescenta
o parecerista paraibano que comunga do entendimento do fisco paulista para o
qual "não se considera impresso personalizado para fins de não incidência
aquele que, mesmo contendo o nome do encomendante, se destine a uso exclusivo
na industrialização ou na comercialização, tais como rótulos, etiquetas,
materiais de embalagem ou para posterior distribuição, ainda que a título
gratuíto".
A
douta Procuradoria Geral do Estado, em minudente parecer a fls. 10/16 - Parecer
074/PGE/01 - discorre sobre as respectivas hipóteses de incidência do ICMS e do
ISS, citando abundante jurisprudência e doutrina. Conclui nos seguintes termos:
É verdade que muitas vezes a linha divisória entre as
duas incidências não é tão definida e caberá analisar o caso para ver se se
trata de serviços submetidos ao ISS ou se se trata de mercadorias sobre cuja
circulação incidirá o ICMS. Para facilitar a interpretação e uniformizar a
aplicação da legislação tributária, é que a Portaria SEF 116/89 definiu:
Art. 1° Estão sujeitas ao ICMS, as saídas de
impressos, promovidas por estabelecimentos gráficos, que se destinem à
comercialização ou industrialização ou participem, de alguma forma, de etapas
seguintes de circulação de mercadorias.
A referida Portaria excluiu expressamente da
incidência do ICMS os impressos que tenham finalidade de propaganda e que são
objeto de saídas isoladas.
O
Coordenador da Procuradoria Fiscal, em despacho exarado a fls. 17 sugere que a
matéria seja submetida a esta Comissão para que seja providenciada a competente
resposta.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição
Federal, art. 155, II, § 2°, IX, b, e art. 156, III;
Decreto-lei
n° 406/68, art. 8°;
Lei
Complementar n° 56/87, item 77;
Portaria
SEF n° 116/89.
03
- FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
A vexata questio refere-se a conflito
de competência entre as esferas impositivas respectivamente dos Estados (ICMS)
e Municípios (ISS) sobre a tributação de produtos da indústria gráfica no caso
de impressos personalizados produzidos por encomenda mas que se destinem a
integrar produtos comercializados pelo encomendante.
3.1
- Hipótese de incidência do ISS:
A
competência impositiva dos Municípios foi deferida pelo art. 156, III, da
Constituição Federal, compreendendo "os serviços de qualquer natureza, não
compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar". Ora, a
ressalva, refere-se precisamente à competência impositiva dos Estados
("Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre
operações relativas à circulação de mercadorias e sobre a prestação de serviços
de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as
operações e as prestações se iniciem no exterior").
Então, o ISS pode ser instituído sobre
qualquer prestação de serviços, desde que este serviço não esteja compreendido
na competência tributária dos Estados. À evidência, estão fora do campo de
competência dos Municípios a prestação de serviços de transporte (ressalvados
os estritamente intramunicipais, reservados à competência municipal) e de
comunicação. Somente esses serviços? É o que examinaremos a seguir.
Pela
regra da alínea b do inciso IX do § 2° do art. 155 da Constituição, o ICMS
"incidirá também sobre o valor total da operação, quando
mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência
tributária dos Municípios". Então, essa é outra hipótese em que o ICMS
incide sobre prestação de serviços, além dos de transportes e da comunicação. A
condição é que o serviço esteja relacionado ao fornecimento de mercadorias e
que o serviço não esteja compreendido na competência dos Municípios. Daí
podemos tirar duas conclusões: a primeira é que existem serviços não
compreendidos na competência dos Municípios (não é todo e qualquer serviço que
está na competência dos Municípios); a se-gunda, é que, quando o serviço
estiver compreendido na competência dos Municípios, o ICMS poderá incidir parcialmente,
sobre as mercadorias empregadas na prestação do serviço.
Ora, a
dicção do dispositivo constitucional ("serviços não compreendidos
na competência tributária dos Municípios") sugere que existem serviços
(além do transporte e da comunicação) que estão na competência tributária dos
Estados, caso em que, pela regra do art. 156, III, estão excluídos da
competência tributária dos Municípios. Que serviços são esses?
A
Constituição de 1967, na redação dada pela Emenda Constitucional n° 1, de 17 de
outubro de 1969, dava aos Municípios competência para "instituir imposto
sobre serviços de qualquer natureza não compreendidos na competência
tributária da União ou dos Estados, definidos em lei complementar"
(art. 24, II). Então, já aquele ordenamento constitucional ressalvava da
competência tributária dos Municípios os serviços sujeitos a tributos
estaduais. Quais seriam eles?
Note-se que serviços de transporte e comunicação estavam na competência da
União. O art. 23, por sua vez cometia aos Estados e ao Distrito Federal
competência para instituir impostos sobre:
I - transmissão, a qualquer título, de bens
imóveis por natureza e acessão física e de direitos reais sobre imóveis,
exceto os de garantia, bem como sobre a cessão de direitos à sua aquisição; e
II - operações relativas à circulação de
mercadorias realizadas por produtores, industriais e comerciantes, imposto
que não será cumulativo e do qual se abaterá, nos termos do disposto em lei
complementar, o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.
A isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação, não
implicará crédito de imposto para abatimento daquele incidente nas operações
seguintes.
III - propriedade de veículos automotores,
vedada a cobrança de impostos ou taxas incidentes sobre a utilização de
veículos.
Se
esses são os impostos de competência dos Estados, a que serviços refere-se a
Constituição, compreendidos na competência tributária dos Estados, que ela
ressalva expressamente da competência impositiva dos Municípios?
Marçal
Justen Filho observa que "o núcleo da hipótese de incidência do ISS está
na atividade de prestar serviço e, não, no negócio jurídico do qual decorre tal
prestação". Mas, acrescenta, "é inegável que a prestação do serviço
exige, como pressuposto lógico jurídico, a realização prévia (ainda que
imediatamente) de um contrato". Daí a conceituação que faz do fato gerador
do imposto: "Somente quando a conduta do indivíduo é qualificável como adimplemento
de obrigação de fazer originada de contrato bilateral é que nos deparamos com o
fato relevante para o ISS. Nesses casos é que há serviço economicamente
relevante. Essa relevância econômica decorre de a prestação de serviço
representar uma movimentação de riqueza, exteriorizando riqueza apropriável
pelo Fisco" (Justen Filho, O Imposto sobre Serviços na Constituição, 1985,
p. 96). Prossegue o mesmo autor (op. cit. p. 108):
Ocorrem situações em que a atuação da pessoa é,
inequivocamente, adimplemento de uma obrigação. A questão está, porém, na
determinação de ser essa obrigação de fazer ou de dar. Aí se aplica plenamente
o critério doutrinário civilístico, de a natureza da obrigação derivar da
preponderância do dar ou do fazer. Se o dar é mero acessório do fazer, a
obrigação é de fazer. Mas há obrigação
de dar se o fazer é secundário juridicamente.
Aires
Barreto (ISS - Atividade-Meio e Serviço-Fim, RDDT n° 5, 1996, p. 82) utiliza
como critério de demarcação dos campos de incidência do ICMS e do ISS os
conceitos de atividade-meio e atividade-fim. No caso do ICMS, a utilidade
disponibilizada ao consumidor é um bem material (mercadoria) que não pode ser
separado, para fins de tributação, das ativi-dades-meio incorridas. O
fornecimento da mercadoria ao fornecedor final envolve uma série de serviços
que beneficiam a esse mesmo consumidor, mas que não se constituem em fatos
geradores distintos. Pelo contrário, subsumem-se na atividade preponderante da
empresa, o fornecimento de mercadoria.
Alvo da tributação é o esforço humano prestado a
terceiro como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas
intermediárias, necessárias à obtenção do fim. Não a ação desenvolvida como
requisito ou condição do facere (fato jurídico posto no núcleo da
hipótese de incidência do tributo).
As etapas, passos, processos, tarefas, obras, são
feitas, promovidas, realizadas "para" o próprio prestador e não
"para terceiros", ainda que estes os aproveitem (já que,
aproveitando-se do resultado final, beneficiam-se das condições que o tornam possível).
A seu
turno, o autorizado magistério de Bernardo Ribeiro de Moraes (Doutrina e
Prática do Imposto sobre Serviços, 1978, p. 98) esclarece:
A noção de serviço (objeto do ISS) não pode ser
confundida com a de simples "prestação de serviço" (contrato de
direito civil, que corresponde ao fornecimento de trabalho). O conceito de serviço
nos vem da economia, do trabalho como produto. De fato, o trabalho, aplicado à
produção, pode dar como resultado duas classes de bens: bens materiais,
denominados material, produto ou mercadoria; e bens imateriais, conhecidos como
serviços.
Não
basta, portanto, que haja uma prestação de serviço para incidir o imposto
municipal. É preciso que esse serviço não esteja compreendido na competência
tributária dos Estados. Em que casos isso ocorre? Quando o serviço é prestado
juntamente com o fornecimento de mercadoria e a finalidade do negócio é a
prestação do serviço e não o fornecimento da mercadoria. Caso contrário, o
negócio preponderante sendo o fornecimento de mercadoria, incidirá o ICMS.
3.2
- A natureza da Lista de Serviços:
O art.
156, III, da Constituição, diz in fine que os serviços serão
"definidos em lei complementar". A definição pode ser intensiva ou
conotativa (pelo gênero próximo e pela diferença específica) ou extensiva ou
denotativa. Esta última, afastando-se do formalismo lógico da definição
conotativa, consiste em situar o termo a ser definido mediante enumeração dos
seres nele compreendidos.
Originalmente,
a lista compreendia apenas três itens (fornecimento de trabalho, locação de
bens imóveis e hospedagem), prevista no § 1° do art. 71 do CTN. Posteriormente
foi ampliada (Decreto-lei n° 406/68, Decreto-lei n° 834/69 e Lei Complementar
n° 56/87) chegando a perfazer 100 itens. Passou-se enfim a discutir se a lista
era meramente exemplificativa (n. apertus) ou taxativa (n. clausus),
inclinando-se a jurisprudência para a segunda hipótese.
Ora,
para caracterizar a definição, na modalidade denotativa, a lista há que
ser exemplificativa. A lista, sendo taxativa, abre caminho para o arbítrio e
para o casuísmo, atribuindo ao legislador complementar a prerrogativa de
alterar, ao seu alvedrio, a esfera de competência tributária dos Municípios.
O
Decreto-lei n° 406/68, considerado materialmente lei complementar pelo Supremo
Tribunal Federal, dispõe que o fato gerador do imposto é a prestação de serviço
constante da lista (art. 8°) que ficam sujeitos apenas ao ISS,
"ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias" (§ 1°).
Já "o fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não
especificados na lista fica sujeito ao Imposto de Circulação de
Mercadorias" (§ 2°). Finalmente, a própria lista pode fazer a ressalva
quanto à incidência simultânea de ambos os impostos: o ICMS sobre as
mercadorias fornecidas e o ISS sobre o serviço. O tratamento tri-butário pode
ser resumido conforme o seguinte quadro:
SERVIÇO |
COM MERCADORIA |
SEM MERCADORIA |
listado |
incide
apenas o ISS, inclusive sobre a mercadoria |
incide
apenas ISS |
listado
com ressalva de incidência do ICMS |
incide
ISS apenas sobre o serviço e ICMS sobre a mercadoria |
|
não listado |
incide
apenas o ICMS, inclusive sobre o serviço |
não
incide nem ISS, nem ICMS |
Ressalte-se,
contudo, que a simples enumeração do serviço na lista não significa que seja
tributado pelo ISS. É preciso que se caracterize a prestação do serviço e que não
esteja compreendido na competência tributária dos Estados.
A essa
altura, é preciso que esteja bem claro que a competência tributária é dada pela
Constituição e não pela lei complementar. Pois, se o "definido em lei
complementar", do art. 156, III, in fine, significasse delegação à
lei complementar para determinar a competência tributária dos Municípios, a
falta de edição da lei complementar impediria os Municípios de instituir e
cobrar o imposto, o que feriria o princípio da autonomia municipal. José Souto
Maior Borges, com sua conhecida maestria, assim discorre sobre essa espinhosa
questão (Imposto Sobre Serviços, 1974, p. 11):
Taxativa a lista, em qualquer hipótese, independente
de exame, de consulta positiva, tão logo ela fosse revogada, ficaria a
autonomia municipal - que a Constituição diz que seria assegurada - ao sabor da
dependência jurídica e política da União. Quer dizer, é uma posição em que eu
não consigo armar um raciocínio, que compatibilize essas construções com o
princípio básico, cardeal, da autonomia municipal.
Isto
porque, como enfatiza o mesmo autor (p. 17), "a competência tributária do
Município, como a do Estado ou a federal não dependerão de lei complementar
para serem exercidas. Essa competência decorre de mandamento
constitucional". O campo próprio da lei complementar é o das normas gerais
de direito tributário (CF, art. 146), razão porque não é admissível que ela
seja "exaustiva da própria competência tributária municipal" (p. 20).
3.3
- Conteúdo do item 77 da Lista de Serviços:
Leciona
Bernardo Ribeiro de Moraes (op. cit. p. 374) que o referido item da Lista de
Serviços:
.... abrange atividades ligadas com a indústria
gráfica, a qual se encarrega da impressão de trabalhos ou dizeres (impressão de
etiquetas, agendas, papéis de carta, jornal, periódico, impressos, bilhetes de
cinema, prospectos, cadernos, folhinhas, livros etc.) Esta impressão
tipográfica é realizada através de diversos processos (tipográfico,
litográfico, etc.), com a utilização de máquinas manuais, mecânicas ou
elétricas. O ISS evidentemente, não incide sobre a impressão, seja com
máquinas rotativas ou com a utilização de outro sistema, acionadas a mão ou por
outra modalidade, por ser indústria, e nem sobre os serviços da editora
que se obriga a reproduzir determinada obra e divulgá-la.
........................................
O ISS recai, segundo o item em exame, sobre certos
serviços ligados à indústria gráfica, ou melhor, relacionados com a composição
gráfica (composição do texto a ser impresso) e com a impressão gráfica
(processos ou sistemas de impressão).
Em primeiro lugar temos os serviços de composição
gráfica ou tipográfica, que consistem na composição de textos, com a
conveniente escolha dos tipos gráficos e a adequada disposição das linhas e das
letras. Trata-se de uma atividade, manual ou mecânica, realizada através da
própria composição.
..........................................
Em segundo lugar temos os serviços relacionados com a
impressão gráfica, ligados aos sistemas de impressão, quais sejam: clicheria,
zincografia, litografia e fotolitografia.
Com o
desenvolvimento da tecnologia no setor gráfico, principalmente a relacionada ao
processamento de dados, muitos desses processos caíram em desuso. É o que
sucede com processos quase artesanais como a feitura de clichês em placas de
metal, com imagens e dizeres em relevo para impressão ou a gravação em folhas
de zinco, alumínio ou outros materiais.
Quanto
à composição gráfica propriamente dita, a difusão da tecnologia dos
computadores tornou obsoleto o processo de compor o texto com tipos móveis. Na
verdade, as gráficas não mais fazem a composição do texto, recebendo-o,
inclusive com o trabalho artístico, já pronto do encomendante, digitalizado em
meio magnético.
Disto
resulta que é preciso fazer uma integração analógica dentro do próprio item 77,
incluindo os novos processos proporcionados pela tecnologia da informática que
vieram a substituir os processos mencionados. Caso contrário, a literalidade do
texto torná-lo-ia inaplicável.
Superado
esse ponto, devemos considerar que o processo de impressão gráfica ocorre sobre
um substrato material (basicamente papel e tinta), resultando no produto da
indústria gráfica, o impresso gráfico.
O
impresso gráfico, quando produzido para comercialização no mercado (e.g. vários
tipos de formulários, cartões de natal etc. para revenda em papelarias e
congêneres) constitui nitidamente mercadoria, sujeitando-se exclusivamente à
incidência do ICMS.
Situação
completamente distinta é a do impresso gráfico personalizado e produzido por
encomenda. Nesse caso estamos diante de prestação de serviço, sujeita portanto
ao ISS de competência municipal. Conforme a regra do § 1° do art. 8° do
Decreto-lei n° 406/68, a base de cálculo do ISS inclui o valor do material
empregado (papel e tinta), ou seja o imposto é calculado sobre o valor total do
impresso.
Devemos
ainda considerar que não há qualquer dúvida quanto à incidência tributária
quando o impresso gráfico destinar-se ao consumo exclusivo do encomendante. A
questão enfocada na presente consulta refere-se porém ao impresso gráfico
destinado, não ao consumo do próprio encomendante, mas a ser integrado à
mercadoria que será comercializada, como é o caso de rótulos, embalagens,
folhetos explicativos etc. Em que medida a destinação dada ao impresso pelo
encomendante o caracteriza como mercadoria, sujeita à incidência do ICMS? Ou,
pelo contrário, para caracterizar a incidência do ISS basta que o impresso seja
personalizado e confeccionado por encomenda, não interessando o destino que lhe
será dado pelo encomendante?
A
destinação não é questão de somenos importância, pois, define-se mercadoria
como "o bem móvel adquirido com intuito de revenda". A esse
propósito, leciona Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS, 1997,
p. 29):
O que caracteriza uma coisa como mercadoria é a
destinação. Mercadorias são aquelas coisas móveis destinadas ao comércio. São
coisas adquiridas pelos empresários para revenda, no estado em que as adquiriu,
ou transformadas, e ainda aquelas produzidas para venda.
3.4
- Entendimento jurisprudencial:
O
serviço de impressão gráfica está previsto na lista de serviços, no item 77:
"composição gráfica, fotocomposição, clicheria, zincografia, litografia e
foto litografia". Não há qualquer ressalva de incidência simultânea dos
dois impostos. Portanto, em princípio, tratando-se de prestação de serviço, os
impressos estão sujeitos exclusivamente à tributação pelo ISS. Pela regra do DL
406/68, art. 8°, § 1°, o valor das mercadorias empregadas (papel, tinta etc.)
integra a base de cálculo do serviço: "os serviços incluídos na lista
ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação
envolva fornecimento de mercadorias".
Pelo
contrário, se o fornecimento de impressos gráficos não caracterizar prestação
de serviços (predominar a obrigação de dar e não a de fazer) incidirá
exclusivamente o ICMS e o valor do serviço integra a base de cálculo da
imposição estadual (§ 2° do artigo 8° citado acima).
Trata-se
de matéria pacificada no Superior Tribunal de Justiça que editou a Súmula n°
156: "A prestação de serviço de composição gráfica, personalizada e sob
encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, está sujeita, apenas,
ao ISS." O mesmo entendimento foi adotado pelo Supremo Tribunal Federal no
julgamento do RE 94.939-RJ (1ª T, j. 3/11/81):
Nos impressos, porque o papel e a tinta são apenas a
base física indispensável a ocasionar a manifestação do bem incorpóreo que
apresentam, mas como o objeto da aquisição por terceiro está exclusivamente
nesse bem incorpóreo, a obra gráfica, por eles apresentada, que é criada por
serviço (ISS), não dá lugar à operação negocial de bem corpóreo (ICM),
prevalecendo a obra imaterial constante da figuração de símbolos e linhas do
impresso (ISS).
Depreende-se
da jurisprudência supra que o ICMS incide apenas quando o impresso não se
destina ao uso específico do encomendante (serviço prestado a alguém), mas à
revenda ao público em geral (mercadoria). Nesse sentido, o seguinte aresto da
Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (REsp. 89.385-SP, j. 28/04/98,
Repertório IOB de Jurisprudência n° 13/98, pg. 299):
Tributário. ICMS. Impressos não personalizados.
Mercadoria de estoque, que não se diferencia em razão do consumidor, está
sujeita ao ICMS, ainda que produzida em razão de encomenda (STJ - Súmula n°
156, a contrario sensu).
Os
critérios de demarcação contidos na Súmula 156 são a personalização e a
prestação de serviço sob encomenda.
Mas, se o impresso não for personalizado (i. e. não atende a necessidades
específicas do consumidor), mesmo que produzido em razão de encomenda
(conforme especificações do encomendante), será mercadoria que não se
diferencia em razão do consumidor. Nesse caso, incide apenas o ICMS, com
exclusão do ISS.
Avançando
um pouco mais, chegamos ao caso do impresso gráfico produzido mediante
encomenda (segundo especificações do encomendante) para ser agregado a outra
mercadoria que será comercializada. A incidência do ICMS ou do ISS dependerá de
quem for considerado o consumidor, se o encomendante ou o adquirente
(para uso próprio) da mercadoria produzida pelo encomendante à qual foi
agregado o impresso gráfico.
Se
entendermos que o consumidor (do impresso gráfico) é o encomendante,
devemos, por coerência, igualmente entender que qualquer indústria que utilize
um insumo, produzido por encomenda, para agregá-lo à mercadoria que produz, é consumidor
desse insumo. Seria o caso, v.g., de uma montadora de veículos que encomenda
autopeças, conforme suas especificações, inclusive ostentando a sua logomarca,
para agregá-las ao veículo. A montadora deveria ser considerada consumidora
das autopeças. Felizmente, a Lista de Serviços não prevê a montagem de
veículos.
3.5
- Critério de demarcação: o entendimento dos Estados:
Procurando
definir um critério de demarcação da incidência dos dois impostos, os Estados
celebraram o Convênio ICM 11/82, que autoriza a "não exigir o recolhimento
do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias - ICM, na saída
de impressos personalizados, promovida por estabelecimento gráfico a usuário
final". Estabelece ainda o convênio que "... considera-se usuário
final, a pessoa física ou jurídica que adquira o produto personalizado, sob
encomenda, diretamente de estabelecimento gráfico, para seu uso
exclusi-vo." Finalmente a cláusula segunda do convênio exclui "a
saída de impressos destinados à comercialização, à industrialização ou à
distribuição a título gratuito".
O
Estado de Santa Catarina, no mesmo espírito que animou os signatários do
con-vênio 11/82, editou a Portaria SEF n° 116/89, que assim dispôs sobre a
matéria:
Art. 1º Estão
sujeitas ao ICMS, as saídas de impressos, promovidas por estabelecimentos
gráficos, que se destinem à comercialização ou industrialização ou participem,
de alguma forma, de etapas seguintes de circulação de mercadorias.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo aos
impressos que acompanhem as mercadorias a que se referem, mesmo que contenham
indicações de nome ou marca do encomendante, tais como etiquetas, bulas,
materiais de embalagem, manuais de instrução e assemelhados.
O
tratamento tributário dos impressos gráficos pode, então ser resumido da
seguinte forma:
a) se o impresso gráfico for produzido, ainda que por
encomenda, para o fim de comercialização, "não se diferenciando em razão
do consumidor", incidirá apenas o ICMS;
b) entretanto, se o impresso gráfico personalizado
for produzido por encomenda para uso próprio do encomendante, incidirá apenas o
ISS (Súmula STJ n° 156).
Até
aqui concordam a doutrina, a jurisprudência e os fiscos estaduais. A
divergência ocorre no que se refere aos impressos gráficos, ainda que
personalizados, produzidos por encomenda, para serem agregados a mercadorias
produzidas pelo encomendante. O entendimento dos Estados, conforme Convênio
11/82, é que incide, nessa hipótese, o ICMS. Os im-pressos gráficos, na visão
dos fiscos estaduais, são insumos (materiais de embalagem) que vem a compor o
produto final. Esse entendimento foi introduzido na legislação tributária
catarinense através da Portaria SEF n° 116/89.
3.6
- Positivação do critério de demarcação:
A
conseqüência da Portaria SEF n° 116/89 ao referendar o entendimento de que os
impressos personalizados quando forem integrados à mercadorias comercializadas
pelo encomendante fiquem sujeitos exclusivamente ao ICMS é a incorporação desse
entendimento à legislação tributária estadual. Com efeito, trata-se de ato
administrativo geral e abstrato e, portanto, de natureza normativa.
Classifica-se como ato-regra, que Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de
Direito Administrativo, 8ª ed., 1996, p. 248) define como "os que criam
situações gerais, abstratas e impessoais e por isso mesmo a qualquer tempo
modificáveis pela vontade de quem os produziu, sem que se possa opor direito
adquirido à persistência destas regras."
As
portarias de Secretário de Estado, quando caracterizados como atos-regra, são
normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e
dos decretos (CTN, art. 100, I), estando compreendidas na expressão
"legislação tributária" (art. 96).
Ora, o
instituto da consulta tem por objeto "a interpretação de dispositivos da
legislação tributária estadual" (Lei 3.938/66, art. 216), na qual se
incluem os atos normativos do Secretário da Fazenda. A interpretação está
limitada às possibilidades semânticas do texto interpretado e jamais poderia
chegar ao ponto de negar-lhe cumprimento (ao menos em sede administrativa).
3.7
- Princípio da não-cumulatividade:
Mas
não é apenas porque foi positivado pela legislação tributária catarinense que
deve prevalecer o entendimento dado à matéria pela Portaria SEF n° 116/89. A
tributação, pelo ISS, dos impressos gráficos personalizados, produzidos por
encomenda, para serem agregados a mercadorias de produção do próprio
encomendante, leva à incidência em cascata do ICMS, o que é vedado pelo art.
155, § 2°, I, da Constituição Federal.
Os
materiais empregados para a confecção dos impressos, graças ao avanço técnico,
principalmente devido à aplicação da informática à indústria gráfica,
representam parcela significativa do produto final (o impresso gráfico). Ora,
sendo, o encomendante considerado consumidor dos impressos (usuário do
serviço), a incidência do ISS, nessa etapa, funciona como uma cunha,
impedindo a comunicação dos créditos do ICMS correspondentes aos materiais
empregados na fabricação dos impressos com os débitos relativos à
comercialização subseqüente das mercadorias comercializadas pelo encomendante
dos impressos gráficos.
O
ICMS, mercê da incidência, em fase intermediária, do ISS, é pago em duplicidade
(incidência em cascata). Observe-se que a cumulatividade é do ICMS. Não estamos
falando de cumulatividade entre impostos diferentes (ICMS e ISS). O ISS, ao
afastar naquela fase a incidência do ICMS, propicia a incidência em cascata
do imposto estadual.
O
quadro abaixo simula uma operação hipotética, comparando a repercussão
tributária caso seja tributada pelo ICMS ou pelo ISS.
Operação
tributada pelo ............................. |
ICMS |
ISS |
Papel adquirido
pela gráfica ........................... |
R$ 70,00 |
R$ 70,00 |
A
coluna da direita, que mostra os valores no caso dos impressos gráficos serem
tributados pelo ISS, acusa um ônus tributário total de R$ 101,90, sendo R$
96,90 de ICMS e R$ 5,00 de ISS. Na coluna da esquerda, que corresponde à
tributação apenas pelo ICMS, o ônus tributário é somente de R$ 85,00. Assim, a
tributação pelo ISS, eleva a incidência do ICMS de R$ 85,00 para R$ 96,90, o
que demonstra a incidência em cascata. A diferença apontada corresponde
a uma sobretaxação suportada pela indústria gráfica o que fere o prin-cípio da
não-cumulatividade.
Sobre
a abrangência do princípio da não-cumulatividade, oportuna se revela a
advertência da Professora Misabel Derzi (apud Sacha Calmon Navarro Coelho, Curso de Direito Tributário
Brasileiro, 1999, p. 489):
É importante notar que tanto o ICMS quanto o IPI não
são impostos que devam ser suportados, economicamente, pelo contribuinte de
direito (o comerciante ou industrial). São, a rigor, impostos sobre o consumo,
não devendo onerar a produção ou o comércio, como alerta Klaus Tipke. Disso
resulta que, numa operação entre empresas, cada uma delas pode se livrar,
basicamente, através da dedução do imposto anterior, do imposto dela cobrado
pela outra e transferir, na etapa de circulação, o ônus do imposto devido pelo
adquirente, e assim sucessivamente, até o consumidor final.
A mesma autora, nos seus
excelentes comentários à alentada obra de Aliomar Baleeiro (Direito Tributário
Brasileiro, 11ª ed. 1999, p. 370), acrescenta o seguinte:
É que a Constituição brasileira assegura, como de
resto o fazem os países europeus e latino-americanos, que o contribuinte, nas
operações de venda que promova, transfira ao adquirente o ônus do imposto que
adiantará ao Estado e, ao mesmo tempo, possa ele creditar-se do imposto que
suportou em suas aquisições (embora na posição de adquirente apenas tenha sofrido
a transferência e nada tenha pessoalmente recolhido aos cofre públicos). Tal
tributo não onera, assim, a força econômica do empresário que compra e vende ou
industrializa, porém a força econômica do consumidor, segundo ensina Herting. A
rigor, quer do ponto de vista jurídico - pois há expressa licença
constitucional para isso - quer do ponto de vista econômico, o imposto foi
modelado para ser suportado pelo consumidor, jamais pelo
contribuinte-comerciante. Explicam os juristas franceses que ".... em cada
estágio da produção e da comercialização de um produto, um contribuinte tem a
possibilidade de deduzir do imposto sobre o valor acrescido (TVA) que ele
faturou para seu cliente sobre o preço de venda, aquele imposto que lhe foi
faturado por seus fornecedores e que oneram o preço de revenda; ...".
A
desoneração do aparelho produtivo, como repisa com propriedade a autora acima
citada, é característica essencial dos impostos não-cumulativos. É o que
garante a neutralidade do tributo em relação ao sistema econômico. Nesse
sentido, atuou a Lei Complementar n° 87/96, que trata de normas gerais em
matéria de ICMS, ao adotar o regime de créditos financeiros, em
substituição ao regime de créditos físicos (art. 20). O reconhecimento
do direito ao crédito sobre bens destinados à integração ao ativo imobilizado e
sobre bens de uso e consumo do estabelecimento, bens esses que não se integram
fisicamente ao produto vendido, visa claramente desonerar o aparelho produtivo,
na medida que o imposto que onerou tais bens possa ser recuperado pelo
contribuinte.
Fez
mais ainda o legislador complementar: previu mecanismo para o ressarcimento do
crédito fiscal relativo a operações pretéritas. Trata-se do disposto nos §§ 3°
e 6° do mesmo artigo 20. A critério do legislador estadual, tais créditos podem
ser apropriados por quem praticar a primeira operação tributada.
3.8 - Conclusões:
O
critério de demarcação entre as respectivas esferas de incidência do ICMS e do
ISS, em operações que envolvam fornecimento de mercadorias e prestação de
serviços, reside na atividade preponderante. Se no negócio jurídico celebrado
preponderar a obrigação de dar, estamos diante de operação de circulação de
mercadorias (ICMS). No caso, a prestação de serviço subsume-se no fato gerador
do imposto estadual. Caso contrário, se preponderar, no negócio jurídico
celebrado, um obrigação de fazer, estaremos diante de uma prestação de serviço
(ISS), ficando o valor dos materiais fornecidos incluídos na base de cálculo do
imposto municipal.
A vexata
questio consiste em determinar qual o tributo que incide sobre o
fornecimento de impressos gráficos que serão agregados a mercadorias produzidas
pelo encomendante. Com a devida vênia às doutas opiniões em contrário, esta
Comissão sustenta a imposição do ICMS. A uma, porque trata-se de matéria
disciplinada pela legislação tributária estadual, cuja vigência não pode ser
negada por órgão integrante da Administração Tributária estadual. A duas,
porque a incidência do ISS impede a compensação dos créditos do ICMS relativos aos
insumos utilizados pela indústria gráfica com o mesmo imposto devido pela
comercialização da mercadoria produzida pelo encomendante. A incidência em
cascata do imposto estadual representa clara violação ao princípio da
não-cumulatividade, prestigiado pela Constituição da República, art. 155, § 2°,
I.
Isto
posto, responda-se à consulente:
a) sujeitam-se ao ISS os impressos gráficos
personalizados e produzidos por encomenda, para uso privativo do encomendante;
b) sujeitam-se ao ICMS os produtos da indústria
gráfica destinados à venda ao público em geral, sem levar em conta as
características ou necessidades do consumidor, sejam eles produzidos por
encomenda ou não (Súmula STJ n° 156, a contrario sensu);
c) sujeitam-se ainda ao ICMS os produtos da indústria
gráfica que serão agregados à mercadoria produzida pelo encomendante e
destinada à venda (Portaria SEF n° 116/89), tais como rótulos, etiquetas, embalagens e manuais de instrução.
À superior consideração da
Comissão.
Getri, em Florianópolis, 21 de
maio de 2001.
Velocino Pacheco Filho
FTE - matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 31/05/01.
Laudenir Fernando Petroncini
João Paulo Mosena
Secretário Executivo Presidente
da Copat