CONSULTA 59/2018

EMENTA: ICMS. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA. MERCADORIA SUJEITA A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. O DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA DEVE SER CALCULADO DE CONFORMIDADE COM A FÓRMULA DETALHADA NO ART. 20, II, DO ANEXO 3 DO RICMS-SC. REGRA QUE TEM SUPORTE NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E NA LEI COMPLEMENTAR 87/1996 NÃO AFETADA PELA MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA NA ADI 5.866.

Pe/SEF em 20.07.18

Da Consulta

A consulente identifica-se como empresa varejista atuando no ramo de materiais de construção, móveis e eletrodomésticos. Informa que realiza a aquisição de bens destinados ao ativo imobilizado e ao uso e consumo do estabelecimento, tanto internamente como de fornecedores de outros Estados. Consulta sobre o cálculo do diferencial de alíquota relativo às aquisições mencionadas, na condição de responsável e na de substituído tributário.

Comenta que diversas clausulas do convênio ICMS 52/2017 tiveram sua eficácia suspensa pela ADI 5.866, notadamente a cláusula 8ª que trata da base de cálculo do diferencial de alíquota (cálculo “por dentro”), por se tratar de matéria sob reserva legal.

Ao final, consulta:

“Com a eficácia suspensa de clausulas do Convênio ICMS 52/2017, principalmente no que tange ao diferencial de alíquota nas entradas de mercadorias destinadas ao seu ativo imobilizado ou uso e consumo com mercadorias abrangidas pela sistemática da substituição tributária, se deve continuar a orientar os seus fornecedores a procederem conforme o Decreto 1.432 ou se deve retornar ao procedimento anterior à alteração, sem considerar o imposto próprio por dentro da base de cálculo”?

A repartição fazendária de origem, depois de relacionar todos os CNAE utilizados pela consulente, confirma estarem presentes os requisitos de admissibilidade da consulta e opina pelo envio da presente consulta à esta Comissão.

 

Legislação

CF, Art. 155, § 2º, VII, VIII e XII, “i”;

LC 87/96, art. 13, § 1º, I;

RICMS-SC, arts. 1º, VI; 3º, XIV; e 9º, VII e § 3º; Anexo 3, art. 20, II.

 

Fundamentação

A dúvida exposta pela consulente gira em torno da inclusão do imposto correspondente ao diferencial de alíquota em sua própria base de cálculo. Ou seja, se deve calcular o diferencial de alíquota em favor de Santa Catarina utilizando a fórmula prevista no art. 20, II, do Anexo 3 do RICMS-SC.

O Convênio ICMS 52/2017 dispõe em sua cláusula oitava que “o contribuinte remetente que promover operações interestaduais com bens e mercadorias especificadas em convênio ou protocolo que disponha sobre o regime de substituição tributária será o responsável, na condição de sujeito passivo por substituição, pela retenção e recolhimento do ICMS relativo às operações subsequentes devido à unidade federada de destino, mesmo que o imposto tenha sido retido anteriormente”. O § 1º dessa cláusula acrescenta que “a responsabilidade prevista no caput desta cláusula aplica-se também ao imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna da unidade federada de destino e a alíquota interestadual incidente sobre as operações interestaduais com bens e mercadorias especificadas em convênio ou protocolo que disponha sobre o regime de substituição tributária e destinadas ao uso, consumo ou ativo imobilizado do destinatário”. Até aí, nenhuma novidade!

A inovação surge com a cláusula décima segunda, segundo a qual, “tratando-se de operação interestadual com bens e mercadorias submetidas ao regime de substituição tributária, destinados a uso, consumo ou ativo imobilizado do adquirente, a base de cálculo do imposto devido será o valor da operação interestadual adicionado do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna a consumidor final estabelecida na unidade federada de destino para o bem ou a mercadoria e a alíquota interestadual”. O dispositivo trata de adequar a substituição tributária “para frente” às novas disposições do diferencial de alíquota introduzidos pela Emenda Constitucional 87/2015.

Pela redação original do inciso VII do § 2º do art. 155 da Constituição, nas operações interestaduais que destinassem bens e serviços a consumidor final, adotar-se-ia a alíquota interestadual se o destinatário fosse contribuinte e a alíquota interna (do Estado de origem) se o destinatário não o fosse. No caso de tributação pela alíquota interestadual, deveria ser feita uma complementação correspondente à diferença entre a alíquota interna no Estado de destino e a alíquota interestadual, em favor do Estado de destino. A Emenda Constitucional 87/2015 veio a adotar a alíquota interestadual em todas as hipóteses, atribuíndo o diferencial de alíquota sempre ao Estado de destino. Apenas a responsabilidade pelo recolhimento passou a ser do destinatário, quando fosse contribuinte do imposto ou ao remetente quando o destinatário não fosse contribuinte.

No que a cláusula decima segunda inova? Ela soma o valor do imposto ao valor da operação interestadual para fins de aplicação da diferença entre as alíquotas. Assim, se a alíquota interestadual for de 12% e a alíquota interna no Estado de destino for de 17%, a diferença de 5% será aplicada sobre o valor da operação acrescido do próprio imposto.

Essas disposições do Convênio ICMS 52/2017 tiveram sua eficácia suspensa pela concessão de medida cautelar no ADI 5.866. Vale a pena salientar que se trata de medida cautelar concedida ad referendum do plenário do STF. Não só não foi julgado o mérito, como a própria concessão da cautelar é precária. Para a concessão foi considerado apenas o periculum in mora, ou seja, a possibilidade de a demora no julgamento causar prejuízos irreparáveis aos contribuintes. O deferimento da cautelar requerida foi dada sem “a audiência das autoridades responsáveis pela edição da norma questionada e das manifestações da Advogada-Geral da União e da Procuradora-Geral da República”, alegando a urgência qualificada comprovada na espécie. Justifica a Ministra Carmen Lúcia a sua decisão dizendo que “revela-se pertinente o argumento central desenvolvido pela Autora de não obediência, na edição do Convênio ICMS n. 52/2017, da cláusula constitucional de reserva de lei, prevista nos arts. 146, inc. III, 150, § 7º, e 155, § 2º, inc. XII”. Acrescenta que “as determinações dos arts. 146, inc. III, e 155, § 2º, inc. XII, da Constituição da República direcionam-se à lei complementar nacional, na qual devem ser estabelecidas diretrizes básicas para regulamentação geral do imposto discutido na espécie vertente, que, repita-se, a despeito de sua instituição reservada à competência estadual é de configuração nacional”. Enfatiza ainda a magistrada que “a pertinência acolhida por este Supremo Tribunal do caráter nacional do imposto objeto do ato normativo controvertido na espécie, pelo que ‘os imperativos constitucionais relativos ao ICMS se impõem como instrumentos de preservação da higidez do pacto federativo, et pour cause, o fato de tratar-se de imposto estadual não confere aos Estados membros a prerrogativa de instituir, sponte sua, novas regras para a cobrança do imposto, desconsiderando o altiplano constitucional’ (ADI n. 4.628, Relator o Ministro Luiz Fux, Plenário, DJe 24.11.2014)”.

Então, a inconstitucionalidade incorrida pelo Convênio ICMS 52/2017 foi ter normatizado sobre matéria sujeita à reserva absoluta da lei complementar. Somente a lei complementar poderia tratar de modo geral sobre sujeito passivo (inclusive substituto tributário) e base de cálculo. Os convênios sobre substituição tributária não podem legislar sobre a matéria, mas apenas conferir vigência extraterritorial à legislação dos Estados. Nada mais do que isso.

Mas é efetivamente o que sucede no cálculo “por dentro” do imposto devido a título de diferencial de alíquota?

A Constituição da República, no art. 155, § 2º, inciso XII, alínea “i” dispõe que “cabe à lei complementar fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integra, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço”. O que o constituinte procurou evitar com essa regra? Que o produto importado tivesse vantagem sobre o similar nacional, já que o produto nacional vem onerado com o imposto e o produto importado não. A medida visa apenas equalizar tributariamente o produto nacional e o similar importado.

Contudo, o mesmo acontece nas operações interestaduais, em que o produto do Estado de origem tem vantagem sobre o similar do Estado de destino, devido ao tributo. Ora, o mencionado dispositivo constitucional não se refere apenas ao produto importado, mas a qualquer bem mercadoria ou serviço. O sentido do vocábulo “também” é de inclusive, não é de somente ou exclusivamente. Exemplificando, se uma mercadoria é comercializada por R$ 100,00 e tributada a 17%, temos que R$ 83,00 corresponde ao valor percebido pelo vendedor e R$ 17,00 ao ICMS recolhido ao Estado (o imposto integra sua própria base de cálculo, “constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle”). Contudo, se o produto foi importado, ele não sofreu a incidência do imposto. Então a aplicação da alíquota sobre o valor da importação – 17% de R$ 83,00 – resulta em valor inferior à sofrida pelo produto nacional – R$ 14,79 < R$ 17,00.

Já no que se refere ao diferencial de alíquota, no mesmo exemplo, se a mercadoria for adquirida no mesmo Estado, será tributada pela alíquota de 17%. Mas, se for adquirida em outro Estado, será tributada pela alíquota de 12%. Nesse caso, a diferença entre as alíquotas (17% - 12% = 5%) deve ser paga ao Estado destinatário da mercadoria. Ora, se aplicada sobre a mesma base de cálculo, teremos 4,4% < 5%. Também nesse caso, como o ICMS integra a sua própria base de cálculo, o imposto deve ser somado ao valor da operação, para garantir que a diferença de alíquota seja de 5%.

Com efeito, o § 1º do art. 13 da Lei Complementar 87/1996 dispõe que integra a base de cálculo o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle, inclusive no caso de importação do exterior do País. Mais uma vez, o vocábulo “inclusive” tem o sentido de que também na importação, mas não apenas nela, o imposto deve ser calculado por dentro. A norma tem caráter geral: em qualquer hipótese o imposto deve integrar sua base de cálculo e se originalmente o produto não foi onerado pelo imposto, ele deve ser incluído na base de cálculo. Porém, o mais importante é que essa regra não é do questionado Convênio ICMS 52/2017, mas do § 1º do art. 13 da Lei Complementar 87/1996.

Por conseguinte, o cálculo “por dentro” do diferencial de alíquota não foi afetado pela concessão de medida cautelar na ADI 5.866 porque tem respaldo na Constituição e na Lei Complementar 87/1996. A regra não foi criada pelo Convênio ICMS 52/2017. Ele apenas consolidou didaticamente regras que já estavam presentes no ordenamento jurídico tributário brasileiro.

 

Resposta

Isto posto, responda-se à consulente que o diferencial de alíquota deve ser calculado de conformidade com a fórmula detalhada no art. 20, II, do Anexo 3 do RICMS-SC.

À superior consideração da Comissão.

VELOCINO PACHECO FILHO

AFRE IV - Matrícula: 1842447

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 28/06/2018.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome                                                                                Cargo

ROGERIO DE MELLO MACEDO DA SILVA                         Presidente COPAT

CAMILA CEREZER SEGATTO                                             Secretário(a) Executivo(a)