CONSULTA 41/2018
EMENTA: ICMS. RADIODIFUSÃO SONORA DE RECEPÇÃO LIVRE E GRATUITA DE SONS (EMISSORA DE RÁDIO). SERVIÇO SOB A INCIDÊNCIA DO ICMS ATÉ O ADVENTO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 42/2003, QUE LHE CONCEDEU IMUNIDADE. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA NÃO TEM O CONDÃO DE RETIRAR DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA ESTADUAL O PODER DE EXIGIR O CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS, NEM TRANSFERE AO MUNICÍPIO A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA. NECESSIDADE DE EMISSÃO DE NOTA FISCAL DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO, MODELO 21, JÁ QUE É CONTRIBUINTE DO IMPOSTO.
Pe/SEF em 28.03.18
Da Consulta
A consulente presta serviço de radiotransmissão gratuita de sons. Afirma que o município onde é domiciliada passou a obrigá-la à emissão de Nota Fiscal de Serviço Municipal, uma vez que a radiodifusão sonora de recepção livre e gratuita está prevista na exceção insculpida no item 17.25 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003. Diante dessa situação fática, indaga se sua atividade deve levar à emissão de Nota Fiscal de Comunicação (Modelo 21) ou de Nota Fiscal de Serviço Municipal. Inquire, ainda, se o ICMS sobre a operação continua imune.
Legislação
Inc. II, inc. XII do § 2º, todos do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/1988). Emenda Constitucional nº 42/2003. Inc. III do art. 2º, alínea “a” do art. 11, inc. VII do art. 12, todos da Lei Complementar n° 87/1996. Inc. III do art. 2º, inc. VII do art. 4º, alínea “a” do inc. III do art. 5º, todos da Lei n° 10.297/96. Art. 5º e Item 17.25 da Lista de Serviços, todos da Lei Complementar nº 116/2003.
Fundamentação
A CRFB/1988 não cria tributos, mas outorga competência para os entes políticos os criarem por meio de suas leis, com a necessária observância às limitações constitucionais ao poder de tributar (entre elas as imunidades e os princípios tributários) e às normas gerais editadas pela União. A Carta Magna, no seu art. 155, II, atribuiu aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituir o Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
Com base no inc. XII do § 2º do art. 155 da CRFB/1988, cunhou-se a Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir) a qual dispôs no inc. III do seu art. 2º (dispositivo repetido pelo inc. III do art. 2º da Lei nº 10.297/1996) que o imposto incide sobre as prestações onerosas de serviços de comunicação por qualquer meio:
Art. 2° O imposto incide sobre:
[...]
III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza;
[...] (Grifos nossos)
Desta forma, a veiculação de mensagem publicitária por empresa de radiodifusão de sons (popularmente conhecida como rádio) ou sons e imagens (televisão), apesar de incertos e eventuais os seus destinatários – que recebem os sinais gratuitamente –, constitui fato gerador de ICMS, cuja base de cálculo é o valor cobrado do anunciante. Com o advento da Emenda Constitucional nº 42/2003, foi criada mais uma hipótese de imunidade ao inc. X do § 2º do art. 155 da CRFB/1988, na alínea “d”:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
[...]
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
[...]
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
[...]
X - não incidirá:
[...]
d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita;
[...] (Grifos nossos)
A partir de então, houve uma delimitação na competência constitucionalmente dada aos Estados e Distrito Federal, afastando a incidência do imposto nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades sonora e sons e imagens de recepção livre e gratuita a despeito de a propaganda ser cobrada pelos tomadores do serviço de divulgação de propaganda (anunciante). Nesse diapasão, somente faz sentido, a partir da vigência da emenda, a cobrança de ICMS sobre a prestação de serviço de comunicação se feita a título oneroso, ou seja, quando houver cobrança do usuário pela recepção do sinal. Tal posicionamento foi acompanhado no âmbito da Administração Tributária Catarinense, conforme se nota na Resposta à Consulta COPAT nº 12/2006:
EMENTA: ICMS. PRESTAÇÃO ONEROSA DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO. CONSTITUI FATO GERADOR DO TRIBUTO, A VEICULAÇÃO DE MENSAGEM PUBLICITÁRIA POR EMPRESA DE RADIODIFUSÃO. A BASE DE CÁLCULO DA EXAÇÃO É O VALOR COBRADO DO ANUNCIANTE. IMUNIDADE DA PRESTAÇÃO A PARTIR DA EDIÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 42, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2003.
[...]
Posto isto, responda-se à consulente que:
a) a prestação de serviço de radiodifusão, até a edição da Emenda Constitucional nº 42, de 2003, constituía fato gerador do ICMS;
b) a base de cálculo da exação é o valor cobrado do anunciante, pela veiculação de mensagens publicitárias;
c) a partir da suso referida emenda constitucional, estão imunes da incidência do ICMS as prestações de serviço de comunicação, nas modalidades de radiodifusão sonora e de som e imagem de recepção livre e gratuita. (Grifos nossos)
Muito embora não haja incidência do imposto na situação em comento devido à imunidade – assim, não existe obrigação tributária principal, isto é, obrigação de recolher o tributo –, persiste o dever estatuído na legislação tributária (obrigação tributária acessória: fazer ou deixar de fazer) de utilizar e manter documentos, livros e escrita fiscal de suas atividades, com estrita afinidade ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.
Esse entendimento foi firmado no Recurso Extraordinário nº 250.844/SP: “IMUNIDADE – LIVROS FISCAIS. O fato de a pessoa jurídica gozar da imunidade tributária não afasta a exigibilidade de manutenção dos livros fiscais”. Nos termos do voto do Ministro Luiz Fux:
O fundamento jurídico das obrigações ditas acessórias é o dever de todo cidadão colaborar com a Fazenda Pública, independentemente de ser ou não contribuinte de determinada exação. Sua imposição é, portanto, legítima desde que pautada pelo princípio da proporcionalidade e da razoabilidade (CRFB, art. 5º, LIV).
[...] Contraria a lógica, portanto, sustentar que, na hipótese, a inexistência de obrigação principal torna inexigível a obrigação acessória, já que só com cumprimento da obrigação acessória é que se pode afirmar a inexistência de obrigação principal.
Em suma, os deveres instrumentais (como a escrituração de livros e a confecção de documentos fiscais) ostentam caráter autônomo em relação à regra matriz de incidência do tributo, porquanto dotados de finalidades próprias e independentes da apuração de certa e determinada exação devida pelo próprio sujeito passivo da obrigação acessória (Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 250.844/SP. Relator: Ministro Marco Aurélio. Julgamento em: 29 maio 2012). (Grifos nossos)
Ocorre que a Lei Complementar nº 157, de 29 de dezembro de 2016, adicionou um novo item à Lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003 (item 17.25), no sentido de viabilizar a cobrança do Imposto sobre Serviços (ISS) sobre a “Inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade, em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita)” (Grifos nossos). O dispositivo induz à crença de que o serviço de inserção de propaganda e publicidade por meio da radiodifusão seria uma espécie do gênero “qualquer meio”, levando à conclusão de que a veiculação de propaganda e publicidade nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita, estaria sob o manto da competência dos Municípios, mas sem cobrança efetiva do ISS em decorrência da não incidência legal (já que é exceção do item).
Entretanto, como o simples fato de ter ocorrido a imunidade do serviço pela Emenda Constitucional nº 42/2003, resultando na redução da competência tributária dos Estados e Distrito Federal (porquanto não é mais hipótese de incidência para o ICMS) não significa por si só a possibilidade de que tal poder de tributar tenha sido transferido para os Municípios. Destarte, a ressalva presente no item 17.25 da Lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 deve ser encarada apenas como um lembrete do legislador, no sentido de não permitir a cobrança de ISS na hipótese de divulgação de propaganda e publicidade em livros, jornais e periódicos (imunidade contra qualquer imposto, conforme alínea “d” do inc. VI do art. 150 da CRFB/1988), bem como, nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita (alínea “d” do inc. X do § 2º do art. 155 da CRFB/1988), pois a CRFB/1988 não atribuiu aos Municípios o serviço de comunicação em comento. Desta feita não há que se falar em contribuinte do ISS (art. 5º da Lei Complementar nº 116/2003).
O art. 4º da Lei Complementar nº 87/1996 define contribuinte como qualquer pessoa física ou jurídica que realize, com habitualidade, a prestação de serviço de comunicação. Deste modo, nos termos em que reza o art. 15 do Anexo 5 do RICMS/SC há obrigação de emitir documento fiscal de serviço de comunicação (modelo 21):
Art. 15. Os contribuintes do imposto emitirão os seguintes documentos fiscais, de modelo oficial:
[...]
III - quando prestarem serviço de comunicação:
a) Nota Fiscal de Serviço de Comunicação, modelo 21, que terá séries “B” ou “C”;
[...] (Grifos nossos)
O fato de a imunidade tributária não ter o condão de retirar da Administração Tributária o poder de exigir o cumprimento de obrigações acessórias, subsiste, portanto, a necessidade de a consulente emitir Nota fiscal de Serviço de Comunicação (Modelo 21).
Resposta
Diante dos argumentos trazidos à tona, tendo em vista que:
1) A veiculação de propaganda e de publicidade pelas radiotransmissoras de áudio ou áudio e vídeo, cuja recepção dos sinais se dá de forma irrestrita e gratuita, é considerada serviço de comunicação, sujeito, assim, à incidência do ICMS até a Emenda Constitucional nº 42/2003;
2) O simples fato de ter ocorrido a imunidade do serviço pela Emenda Constitucional nº 42/2003, resultando na redução da competência tributária dos Estados e Distrito Federal, não significa por si só a possibilidade de que tal poder de tributar tenha sido transferido para os Municípios, sem que haja alteração na CRFB/1988;
3) A ressalva presente no item 17.25 da Lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 deve ser vista apenas como uma mera ressalva do legislador, no sentido de não permitir a cobrança de ISS na hipótese de divulgação de propaganda e publicidade em livros, jornais e periódicos (imunidade contra qualquer imposto, conforme alínea “d” do inc. VI do art. 150 da CRFB/1988), bem como, nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita (alínea “d” do inc. X do § 2º do art. 155 da CRFB/1988);
4) As obrigações acessórias (como a escrituração de livros e a confecção de documentos fiscais) possuem caráter autônomo em relação à regra matriz de incidência do tributo, porquanto dotados de finalidades próprias e independentes da apuração de certa e determinada exação devida pelo próprio sujeito passivo da obrigação acessória.
SUBSISTE, a necessidade de a consulente emitir Nota fiscal de Serviço de Comunicação (Modelo 21), conforme o art. 15 do Anexo 5 do RICMS/SC.
À superior consideração da Comissão.
ENILSON DA SILVA SOUZA
AFRE III - Matrícula: 9506314
De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 15/03/2018.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.
Nome Cargo
ARI JOSE PRITSCH Presidente COPAT
CAMILA CEREZER SEGATTO Secretário(a) Executivo(a)