CONSULTA 71/2015

EMENTA: ICMS. LIMITAÇÃO AO CRÉDITO. NAS OPERAÇÕES DE AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS NOMINADAS NOS INCISOS DO ART. 35-B DO RICMS/SC-O1, O CRÉDITO DO IMPOSTO FICA LIMITADO AO PERCENTUAL PREVISTO NO INCISO CORRESPONDENTE QUANDO O VALOR DO IMPOSTO DESTACADO NO DOCUMENTO FISCAL SEJA SUPERIOR A ESSE PERCENTUAL.

Publicada na Pe/SEF em 21.09.15

Da Consulta

A Consulente é contribuinte inscrito no CCIMS/SC que opera com o abate de bovinos. Informa que além das aquisições de gado bovino vivo dentro do estado, adquire também bovinos abatidos inteiros oriundos de outros Estados da Federação, para submetê-los a posterior processamento e venda.

 

 Destaca que a legislação relativa ao ICMS de carne bovina oriundo de outros Estados tem tratamento tributário diferenciado. Ou seja, que o artigo 35-B do RICMS/SC determina que nas operações oriundas das unidades da Federação abaixo indicadas, o crédito do imposto fica limitado aos seguintes percentuais, independentemente do valor destacado no documento fiscal:

 

A interessada faz destaque ao inciso XI desse artigo que determina:

 

XI - 0,1 (um décimo por cento) na entrada de produtos industrializados cuja matéria prima seja resultante do abate de aves ou de gado bovino, equídeo, bufalino, caprino, ovino ou suíno, destinados a alimentação humana, oriundos do Estado de Minas Gerais. (grifo nosso)

    

Sobre este dispositivo argumenta, em síntese, o seguinte:

 

Observe-se que o legislador utilizou o termo produtos industrializados. No nosso entender a aquisição de gado abatido não sofre nenhuma industrialização, somente o corte e o seu acondicionamento resultariam em processo de industrialização.

 

Portanto a aquisição de peça inteira não estaria sujeita ao conceito de industrialização o que autorizaria o creditamento integral do valor destacado no documento fiscal sem sofrer as restrições do artigo 35-B XI do regulamento acima descrito.

 

Após longa exposição argumentativa sobre o fato de que esta hipótese albergaria o conceito constitucional ao direito de crédito pelo princípio da não cumulatividade, a consulente indaga:

 

1) Os créditos de ICMS na aquisição de carne bovina inteira, pode ser aproveitado integralmente, conforme Lei Complementar 87/96 e 102/00 e Regulamento ICMS de Santa Catarina?

2) Poderá a Consulente compensar com o ICMS devido, todo o valor do crédito do ICMS da aquisição das carnes adquiridas inteiras sem processo de industrialização dos últimos cinco anos?

A autoridade no âmbito do Grupo de Especialista - Gesagro - analisou o pedido e manifestou apropriadamente sobre a matéria.

É o relatório, passo a análise. 

Legislação

CF. art. 155, § 2º, XII, g;

LC nº 24/75, arts. 1º e 8º, I;

Lei nº 10.297/96, arts. 29 e 43;

RICMS/SC-01, ART. 35-A E 35-B.

Fundamentação

Preliminarmente, cabe advertir o equívoco na argumentação da consulente ao atrelar a interpretação do caput do art. 35-B ao conceito de produtos industrializados construído a partir do texto do inciso XI do art. 35-B. (0,1% (um décimo por cento), na entrada de produtos industrializados cuja matéria-prima seja resultante do abate de aves ou de gado bovino, eqüídeo, bufalino, caprino, ovino ou suíno, destinados à alimentação humana, oriundos do Estado de Minas Gerais.)

 

De se destacar que a redação, em todos os incisos do art. 35-B, presta-se apenas para identificar o benefício fiscal concedido a operação tomada individualmente. Isto é, o texto objetiva identificar apenas a operação com aquelas mercadorias especificamente nominadas e que sejam oriundas da Unidade da Federação mencionada, a qual concedeu o benefício fiscal ilegal objeto da limitação de crédito previsto no inciso.

 Portanto, a interpretação e aplicação de cada inciso se restringe a hipótese nele descrita. Ou seja, nestes incisos a legislação catarinense busca reproduzir exatamente a redação dos benefícios fiscais ilegais concedidos aos remetentes das mercadorias pelos estados de origem.

 Ora, a glosa ao crédito prevista no inciso IX e destacada pela consulente, se refere ao benefício fiscal concedido, pelo Estado de Minas Gerais, aos estabelecimentos mineiros que venderem produtos resultantes do processamento da carne de animais (aves, bovino, equídeo, bufalino, caprino, ovino ou suíno) tais como: hambúrgueres, nugget's, embutidos, etc.).

Nessa mesma matiz, o inciso I do indigitado artigo também limita o aproveitamento do crédito do ICMS destacado no documento fiscal em relação às entradas de carnes e miudezas comestíveis resultantes do abate de gado bovino e bufalino, frescas, resfriadas ou congeladas, bem como charque, carne cozida enlatada e corned beef, dessas mesmas espécies, oriundas do Estado do Mato Grosso.

Ora, é evidente que a aquisição de bovinos abatidos inteiros, conforme descreve a consulente, trata-se de entrada de carne resultante do abate de gado bovino.

Aliás, trazer à discussão o conceito de industrialização e sustentar aplicá-lo indistintamente aos fatos narrados na exordial se traduz num evidente argumento falacioso, cuja clara intenção é induzir a análise e consequentemente obter resposta que lhe favoreça.

 Tem-se também que a análise da indagação proposta não transita necessariamente pelo estudo do princípio constitucional da não cumulatividade aplicável ao ICMS como fez a consulente, isso por que as limitações previstas no art. 35-B não afetam a efetividade desse princípio.

  Destarte, passo a seguir diretamente à análise da indagação formulada: Os créditos de ICMS na aquisição de carne bovina inteira, pode ser aproveitado integralmente, conforme Lei Complementar 87/96 e 102/00 e Regulamento ICMS de Santa Catarina?

 A resposta deve ser um retumbante DEPENDE!   

 Ora, as limitações ao crédito do ICMS previstas no art. 35-B encontram estribo no que dispõe a Lei Complementar nº 24/75, recepcionada pela atual Ordem Constitucional para dar conta do complemento previsto no art. 155, § 2º, XII, g da Carta Magna. Isto é, que cabe à lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

 Estabelece a citada LC 24/75:

Art. 1º As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal.

(...)

Art. 8º - A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente:

I - a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria;

Na esteira dessas normas gerais, o legislador catarinense prescreve na Lei nº 10.297/96:

Art. 29. Fica vedado o aproveitamento de crédito, ainda que destacado em documento fiscal, concedido por outra Unidade da Federação em desacordo com o disposto na lei complementar  de que trata o art. 155, § 2°, XII, g, da Constituição Federal.

Art. 43. Fica o Poder Executivo autorizado, sempre que outro Estado ou o Distrito Federal conceda benefícios fiscais ou financeiros de que resulte redução ou eliminação, direta ou indiretamente, de ônus tributário, com inobservância do disposto na lei complementar  de que trata o art. 155, § 2°, XII, g, da Constituição Federal, a tomar as medidas necessárias para a proteção dos interesses da economia catarinense.

Em respeito à hierarquia do sistema normativo, o Chefe Executivo Catarinense expediu decreto instituindo o Regulamento do ICMS, que dispõe:

Art. 35-A. Fica vedado o aproveitamento de crédito, ainda que destacado em documento fiscal, de operações oriundas de unidades da Federação que tenham concedido isenção, incentivos ou benefícios fiscais à revelia da Lei complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975 (Lei  nº 10.297/96, art. 29).

Art. 35-B. Nas operações oriundas das unidades da Federação abaixo indicadas, o crédito do imposto fica limitado aos seguintes percentuais, independentemente do valor destacado no documento fiscal:

I - 3% (três por cento) na entrada de carnes e miudezas comestíveis resultantes do abate de gado bovino e bufalino, frescas, resfriadas ou congeladas, bem como charque, carne cozida enlatada e corned beef, dessas mesmas espécies, oriundas do Estado do Mato Grosso;

II - 4% (quatro por cento) na entrada de charque, carne e demais produtos e subprodutos comestíveis, simplesmente resfriados, congelados ou salgados, resultantes de abate de gado bovino ou bufalino, oriundos do Estado do Mato Grosso do Sul;

III - 3% (três por cento) na entrada de carnes desossadas, devidamente embaladas e identificadas por cortes padronizados nos termos da legislação federal específica, inclusive charque, resultantes do abate de gado bovino e bufalino, oriundas do Estado do Mato Grosso do Sul.

(...)(*)

X 3% (três por cento) na entrada de carne fresca, resfriada, congelada, salgada, temperada ou salmourada e miúdos comestíveis resultantes do abate ou da industrialização de asinino, bovino, bufalino, eqüino, muar, ovino, caprino, leporídeo e ranídeo, oriundos do Estado de Goiás;

(...) (*)

XIII 1,8% (um inteiro e oito décimos por cento) na entrada de produtos comestíveis resultantes do abate de gado bovino, oriundos do Estado do Pará;

XIV 1% (um por cento) na entrada de charque, defumados, embutidos e outros derivados da industrialização de carne, oriundos do Estado do Pará;

XV 0% (zero por cento) na entrada de carne e produtos comestíveis resultantes do abate de aves, leporídeos e gado bovino, bufalino, caprino, ovino ou suíno, frescos, resfriados, congelados, salgados, secos, temperados ou defumados para conservação, e seus industrializados, mesmo que enlatados ou cozidos, oriundos do Estado do Paraná;

XVI - 3% (três por cento) na entrada de carne e demais produtos comestíveis frescos, resfriados, congelados, salgados, secos ou temperados, resultantes do abate de aves, leporídeos e gado bovino, bufalino, caprino, ovino e suíno oriundos do Estado de Rondônia;

XVII 0% (zero por cento) na entrada de carne e produtos comestíveis, resultantes do abate de aves, frescos, resfriados, congelados, salgados, secos, temperados ou defumados para conservação, desde que não enlatados ou cozidos, oriundos do Estado de São Paulo.

§ 1º O disposto neste artigo somente se aplica caso o imposto destacado no documento fiscal seja superior aos percentuais previstos nos respectivos incisos.

§ 2º É permitido o crédito do imposto consignado em documento de arrecadação vinculado à Nota Fiscal que acobertou a entrada da mercadoria no estabelecimento, ainda que em limite superior ao previsto neste artigo.

(*) os textos destes incisos foram omitidos por se referirem à mercadorias diversas do caso em estudo.

Observa-se que, em cada um dos incisos acima transcritos, encontra-se os termos de determinado benefício fiscal concedido pelo estado da Federação nele nominado à revelia das disposições legais pertinentes.

Para jogar uma pá de cal sobre a pretensão da consulente em obter resposta no sentido de que todas as entradas interestaduais de carne bovina geram direito ao crédito integral do ICMS destacado no documento fiscal, transcreve-se abaixo a posição do Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina por ocasião do julgamento da Apelação Cível n. 2012.088682-3, da Comarca de Rio do Sul, cuja ementa do acórdão está assim emoldurada:

TRIBUTÁRIO. ICMS. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. NOTIFICAÇÃO LAVRADA EM DECORRÊNCIA DA APROPRIAÇÃO DE CRÉDITOS VEDADA PELA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS (ISENÇÃO OU CREDITAMENTO PRESUMIDO) OUTORGADOS NO ESTADO DE ORIGEM (RIO GRANDE DO SUL). IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 35-A E 35-B DO RICMS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO

Há outras decisões semelhantes a essa. Todas sinalizam para a possibilidade jurídica da vedação ou limitação ao crédito de ICMS.  Nas palavras do Ministro Celso de Mello, (ADIN 930 MC/MA. DJU 08.09.95), a concessão, mediante ato do poder público local, de isenções, incentivos e benefícios fiscais, em tema de ICMS, depende, para efeito de sua válida outorga, da prévia e necessária deliberação consensual adotada pelos Estados-membros e pelo Distrito Federal, observada, quanto à celebração desse convênio intergovernamental, a forma estipulada em lei complementar nacional editada com fundamento no art. 155, § 2º, XII, g, da Carta Política. Este preceito constitucional, que permite à União Federal fixar padrões normativos uniformes em tema de exoneração tributária pertinente ao ICMS, acha-se teleologicamente vinculado a um objetivo de nítido caráter político-jurídico: impedir a 'guerra tributária' entre os Estados-membros e o Distrito Federal.

Resposta

 Posto isso, proponho que a indagação da consulente já respondida nos seguintes termos: Nas operações de aquisições de mercadorias nominadas nos incisos do art. 35-B do RICMS/SC-01, o crédito do ICMS fica limitado aos percentuais neles previstos quando o imposto destacado no documento fiscal seja superior ao percentual correspondente.  

LINTNEY NAZARENO DA VEIGA 
AFRE IV - Matrícula: 1914022

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 27/08/2015.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome                                                                                      Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM                                           Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA                                             Secretário(a) Executivo(a)