CONSULTA 114/2014

EMENTA: ICMS. CRÉDITO DE BENS DESTINADOS AO ATIVO IMOBILIZADO. ESTORNO PROPORCIONAL ÀS SAÍDAS ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS, EM CADA PERÍODO DE APURAÇÃO. O CRÉDITO EXISTE APENAS PARA COMPENSAR O DÉBITO RELATIVO À OPERAÇÃO TRIBUTADA. A EXPRESSÃO "TOTAL DAS SAÍDAS", A QUE SE REFERE O § 1º DO ART. 39 DO RICMS-SC, COMPREENDE APENAS AS SAÍDAS QUE CARACTERIZEM UMA CIRCULAÇÃO ECONÔMICA OU JURÍDICA.

Disponibilizado na página da Pe/SEF em 09.10.14

Da Consulta

Cuida-se de consulta sobre a interpretação do art. 39, I, e § 1º, do RICMS-SC, que dispõe sobre o aproveitamento de crédito no caso de aquisição de bens destinados ao ativo imobilizado da empresa. Questiona:

1. qual o conteúdo e alcance da expressão "total das saídas", para fins de cálculo da proporção do crédito das entradas destinadas ao ativo permanente a ser compensada?

2. é correto considerar no "total das saídas" a que se refere o § 1º do referido art. 39, toda e qualquer saída efetuada pela consulente?

3. caso negativo, quais os CFOP que devem fazer parte do "total das saídas", para fins de cálculo da proporção do crédito das entradas destinadas ao ativo imobilizado passível de compensação?

Para fundamentar sua dúvida, menciona a definição de circulação de mercadorias dada por José Eduardo Soares de Melo, verbis:

"Circulação é passagem das mercadorias de uma pessoa para outra, sob o manto de um título

jurídico, equivale a declarar, à sombra de um ato ou de um contrato, nominado ou inominado.

Movimentação, com mudança de patrimônio".

Menciona as consultas respondidas por esta Comissão de nº 105/2011 (exclui do "total das saídas" as remessas para industrialização) e a de nº 50/2014 (exclui as devoluções de compras e a venda de bens do ativo imobilizado).

A repartição fiscal de origem informa que a consulta satisfaz os requisitos de admissibilidade, podendo ser apreciada por esta Comissão. No mérito, sugere que as indagações da consulente podem ser respondidas, ao menos parcialmente, nos termos da resposta à Consulta 26/2013, desta Comissão ementada como segue:

 

EMENTA: ICMS. CRÉDITO DE BENS DO ATIVO IMOBILIZADO. ESTORNO PROPORCIONAL ÀS SAÍDAS ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS, EM CADA PERÍODO DE APURAÇÃO. O CRÉDITO SOMENTE EXISTE PARA COMPENSAR O DÉBITO RELATIVO À OPERAÇÃO TRIBUTADA SUBSEQUENTE. NO CASO DA OPERAÇÃO NÃO SER TRIBUTADA, INCLUSIVE POR NÃO TER OCORRIDO O FATO GERADOR, DEVE SER ESTORNADO O CRÉDITO CORRESPONDENTE.

 

NO CASO DE SAÍDA DE BEM DO ATIVO IMOBILIZADO, A TÍTULO DE ALUGUEL OU COMODATO, NÃO OCORRE O FATO GERADOR DO IMPOSTO - OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA - MAS, COMO O BEM PERMANECE NO ATIVO IMOBILIZADO DO LOCADOR OU DO COMODANTE, TAMBÉM NÃO ESTÁ OBRIGADO AO ESTORNO DO CRÉDITO.

 

Legislação

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, art. 39, I, e § 1º.

 

Fundamentação

Dispõe o citado art. 39 que a apropriação dos créditos relativos a bens do ativo permanente será feita à razão de 1/48 (um quarenta e oito avos) por mês, devendo a primeira fração ser apropriada no mês em que ocorrer a entrada no estabelecimento. O § 1º do mesmo artigo esclarece que o montante do crédito a ser apropriado será o obtido multiplicando-se o valor total do respectivo crédito pelo fator igual a 1/48 (um quarenta e oito avos) da relação entre o valor das saídas e prestações tributadas e o total das saídas e prestações do período.

Como sabido, o crédito fiscal do ICMS tem origem no art. 155, § 2º, I e II da Constituição Federal. O inciso I caracteriza o crédito como o imposto cobrado nas operações ou prestações anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Já o inciso II, b, dispõe que a isenção ou não incidência, salvo disposição em contrário da legislação, acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores.

Em síntese, o crédito do ICMS existe apenas em função do débito do mesmo imposto - o que foi cobrado nas etapas precedentes do ciclo de comercialização pode compensar o imposto devido. Mas, se não houver débito, não há o que ser compensado e, por conseguinte, o crédito deve ser estornado. O mesmo raciocínio aplica-se aos bens destinados ao ativo imobilizado.

A fórmula prevista - saídas tributadas sobre saídas totais - busca garantir que será aproveitado apenas o crédito correspondente às saídas tributadas seja aproveitado. O crédito que não tiver tal correspondência, de acordo com a citada regra constitucional, deve ser estornado. Podemos, então, enunciar a fórmula do seguinte modo:

Crédito = saídas tributadas/ (saídas tributadas + saídas isentas, imunes etc.)

Não se computa entre as saídas totais operações ou prestações que não estão inseridas no ciclo de comercialização, ou seja, que não constituem circulação econômica ou jurídica.

Como observado pela autoridade fiscal, em suas informações de estilo, a Consulta 26/2013 esclarece bem a questão, razão por que transcrevemos parte de seus fundamentos:

 

Conforme dispõe o art. 155, II, da Constituição Federal, compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.

O fato gerador do ICMS desdobra-se, portanto, em três situações típicas: (i) operação de circulação de mercadorias, (ii) prestação de serviço de transporte e (iii) prestação de serviço de comunicação. A consulta envolve apenas a primeira situação: operação de circulação de mercadorias.

A doutrina e a jurisprudência nacionais têm convergido no sentido de que as operações a que se refere o constituinte não é o mero deslocamento físico da mercadoria. Entende-se que essa circulação refere-se ao deslocamento da mercadoria, no sentido (vetorial) do produtor para ao consumidor ou, nas palavras de Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética, 1997, p. 25), que se trate de "uma operação que impulsione a mercadoria, na marcha normalmente por esta desenvolvida desde a fonte de produção até o consumidor".

Cada operação de circulação de mercadorias, individualmente considerada, constitui um fato gerador do imposto. O ICMS é um imposto plurifásico (incide em cada fase do ciclo de comercialização), sendo devido em cada operação de circulação de mercadorias.

Por outro lado. O "crédito" do ICMS refere-se ao princípio da não-cumulatividade, insculpido no art. 155, § 2º, I e II, da nossa Carta Magna. Assim, dispõe o inciso I que o imposto "será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal".

"Crédito", portanto, nada mais é que o imposto que onerou a mercadoria (ou os insumos, no caso de indústria) entrada no estabelecimento. Então, o imposto devido em cada operação poderá ser compensado com o imposto (crédito) que onerou a mercadoria nas operações anteriores. O imposto a recolher é a diferença entre o imposto que onerou a saída da mercadoria e o imposto que já havia sido suportado nas fases anteriores de comercialização. O ICMS pode, então, ser definido como um imposto plurifásico não-cumulativo, ou seja, incide em todas as fases de comercialização, mas, em cada fase, é recolhido apenas o imposto correspondente ao valor que foi acrescido à mercadoria (sem entrar na discussão acadêmica, se o ICMS é ou não um imposto sobre o valor acrescido).

Conforme esclarecido magistério de Geraldo Ataliba e Cleber Giardino (ICM - Abatimento constitucional - Princípio da não cumulatividade. RDT 29/30: 110-126, p. 115): "o chamado `princípio da não-cumulatividade do ICM acaba resolvendo-se, em termos jurídicos - porque jurídica é a sua vocação - num singelo direito de abater; um simples direito de abatimento".

O sentido da não-cumulatividade fica melhor esclarecido pela dicção do inciso II, b, do mesmo parágrafo: "a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação, acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores". Vemos, assim, que a própria Constituição já fala em isenção ou não-incidência.

O sentido é claro: o "crédito" do imposto não é propriamente um haver contra a Fazenda Pública, mas um direito de abater do imposto a recolher. Ou seja, trata-se de "crédito" especialmente vocacionado à compensação do imposto devido. Essa a sua razão de existir. Por conseguinte, não havendo débito (não sendo a operação subseqüente tributada), também não haverá crédito. O crédito deve ser anulado, por expressa disposição constitucional.

Se a saída da mercadoria não for tributada, o contribuinte somente estará dispensado de estornar o crédito correspondente se houver expressa disposição em contrário da legislação, como ocorre no caso das exportações para o exterior, em que a legislação assegura expressamente o não estorno do crédito, apesar da saída subseqüente para o exterior estar ao abrigo da imunidade.

A Lei Complementar 87/96 introduziu no direito tributário brasileiro o "regime de créditos financeiros", no lugar do "regime de créditos físicos", até então adotado. Segundo Misabel Derzi e Sacha Calmon Navarro Coelho (Direito Tributário Aplicado. Del Rey, 1997, art. 27), "para a realização do princípio da não cumulatividade, é possível a adoção de dois sistemas diferentes". O regime de crédito físico "restringe o direito à compensação ao imposto pago na aquisição de bens que fisicamente se incorporam ao produto final ou que se consomem no curso do processo de produção, dele se excluindo as máquinas, ferramentas e outros integrantes do ativo fixo". Já o regime de crédito financeiro "abrange o imposto pago relativo a qualquer bem entrado no estabelecimento, essencial e imprescindível à atividade".

Com efeito, o art. 20 da Lei Complementar 87, de 13 de setembro de 1996, assegura "ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação".

No caso da entrada de bens para o ativo imobilizado, o direito ao crédito resulta de dois fatores: (i) a entrada do bem no estabelecimento foi onerada pelo ICMS e (ii) esse bem compõe o custo de produção/comercialização da mercadoria vendida pelo estabelecimento. Assim, se a saída da mercadoria sofrer tributação pelo ICMS, o contribuinte terá o direito de compensar com o ICMS que onerou o bem do ativo imobilizado.

Por outro lado, se a saída da mercadoria não sofrer tributação pelo ICMS, o correspondente crédito do ativo imobilizado terá de ser estornado (conforme regra inserta no art. 155, § 2º, II, b, da Constituição Federal). Essa é a origem da regra do art. 20, § 3º, I, da LC 87/96: "é vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior".

 

Resposta

Responda-se à consulente que, para fins de cálculo do crédito do ativo imobilizado, a expressão "total das saídas" compreende apenas as saídas que caracterizem circulação econômica ou jurídica;

À superior consideração da Comissão.

VELOCINO PACHECO FILHO 
AFRE IV - Matrícula: 1842447

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 25/09/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome

Cargo

FRANCISCO DE ASSIS MARTINS

Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA

Secretário(a) Executivo(a)