CONSULTA 88/2014

EMENTA: ICMS. NA AQUISIÇÃO DE MATÉRIA-PRIMA ISENTA, COM BASE NO ARTIGO 29 DO ANEXO 2 DO RICMS/SC, OU COM DIFERIMENTO, COM BASE NO ARTIGO 8., INCISO XIV DO ANEXO 3 DO RICMS/SC, ESTÁ VEDADO O DESTAQUE DE ICMS E, POR CONSEQUÊNCIA, O DESTINATÁRIO NÃO PODERÁ UTILIZAR  IMPOSTO INDEVIDAMENTE DESTACADO PARA COMPENSAR COM OPERAÇÕES TRIBUTADAS SUBSEQUENTES.

Disponibilizado na página da SEF em 01.08.14

 

Da Consulta

              A consulente, devidamente qualificada e representada nos autos do processo de consulta, que tem como atividade principal a preparação de subprodutos do abate destinados à alimentação animal ou ao emprego na fabricação de ração animal, vem a esta Comissão formular consulta sobre as aquisições de "despojos de abate de animais para a produção de farinhas e gorduras".

A consulente entende que as aquisições de matéria-prima para a produção da ração animal, bem como a saída de farinha de carne, de osso, de penas, de sangue e de vísceras de aves, óleo de aves e sebo bovino estão abrangidas pela isenção do ICMS nas operações internas e pela redução de base de cálculo nas operações interestaduais, com base nos artigos 29, Inciso VI e 30 do Anexo 2 do RICMS/SC.  

 Questiona:

(i)            "está correta a interpretação da Consulente quanto a base legal aplicável as compras de matérias primas (insumos) de seus fornecedores, para os produtos elencados";

(ii)              "na hipótese de a resposta da questão anterior ser positiva e, considerando que alguns fornecedores das matérias primas elencadas no quadro anterior, adotem outros enquadramentos legais (diversos) com incidência de ICMS, faria a Consulente jus ao crédito de ICMS destacados nos documentos fiscais? Ou o crédito é não aplicável porque a operação está enquadrada de forma equivocada na legislação de regência?"

            A autoridade fiscal, no âmbito da Gerência Regional do domicílio do contribuinte, manifestou-se sobre a admissibilidade da consulta e, no mérito, ressaltou que os produtos citados pela consulente estão abrangidos pela isenção nas operações internas e pela redução de base de cálculo nas operações interestaduais e que, no caso de aquisições de mercadorias isentas ou com ICMS diferido, há expressa vedação de apropriação de crédito para compensação com a operação subsequente.

                 É o relatório.

 

Legislação


Constituição Federal, artigo 155,§ 2., II, "b";
RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, artigo 34, Inciso I; Anexo 2, artigos  29, I e 30; Anexo 3, artigo  8.º , Inciso XIV. 

 

Fundamentação

O ICMS é, por determinação constitucional, um imposto não-cumulativo, permitida a compensação do valor devido pelas operações de saídas de mercadorias, com o cobrado nas operações anteriores.  Neste sentido determina o artigo 155, § 2º: O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado ou pelo Distrito Federal."

 A fim de dar efetividade ao princípio da não-cumulatividade, a Lei Complementar nº 87/96 assegurou o crédito decorrente das aquisições de mercadorias:

"Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação."

 Todavia, quando a aquisição da mercadoria se der com isenção ou se tratar de operação não tributada não haverá direito ao crédito. Este é o teor do §2.º, II, "a" do Artigo 155 da Constituição Federal: "II- a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da legislação: a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes".  O artigo 20 da Lei Complementar 87/96 reproduz a norma: "Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento".

 A expressão "não tributadas" refere-se a operações que, embora não  isentas, não se submetem à incidência do tributo, a exemplo daquelas que se encontram fora do seu campo de incidência ou amparadas pela imunidade.

 As operações diferidas, para as quais há a postergação do pagamento do tributo para etapa futura, não estão entre as operações "não tributadas". Neste sentido, Celso Ribeiro Bastos (Lei Complementar- Teoria e Comentários, 2ª. ed., São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999) "o diferimento é o não recolhimento do ICMS em determinada operação ficando adiado para etapa posterior. Por esta técnica, o pagamento do imposto incidente sobre a saída de determinada mercadoria (no caso do ICMS) é transferido para as etapas posteriores de sua circulação". 

 Conclui-se que o diferimento não se confunde com a isenção ou com operações não tributadas, não retirando a operação do campo da incidência do ICM e, em regra, não se caracteriza como um benefício fiscal, transferindo para etapa futura da operação de circulação, o momento da sua exigência.

 Os questionamentos da consulente tratam de aquisição de mercadorias utilizadas como matéria-prima, em operações ao abrigo da isenção, nos termos do artigo 29 do Anexo 2 do RICMS/SC;  com redução de base de cálculo, com base no artigo 30 do Anexo 2 do RICMS/SC ou  com diferimento do ICMS, com base no artigo 8.º do Anexo 3 do RICMS/SC, dispositivos com o seguinte teor:

 "Art. 29. Ficam isentas as saídas internas dos seguintes produtos (Convênios ICMS 05/99, 10/01, 58/01, 21/02, 18/05, 53/08, 71/08, 138/08, 69/09, 119/09, 01/10, 101/12 e 14/13):(...)

VI - alho em pó, sorgo, milheto, sal mineralizado, farinhas de peixe, de ostra, de carne, de osso, de pena, de sangue e de víscera, calcário calcítico, caroço de algodão, farelos e tortas de algodão, de babaçu, de cacau, de amendoim, de linhaça, de mamona, de milho e de trigo, farelos de arroz, de girassol, de glúten de milho, de gérmen de milho desengordurado, de quirera de milho, de casca e de semente de uva e de polpa cítrica, silagens de forrageiras e de produtos vegetais, feno, óleos de aves, eoutros resíduos industriais, destinados à alimentação animal ou ao emprego na fabricação de ração animal (Convênios ICMS 152/02, 55/09 e 123/11);

  Art. 30. A base de cálculo do imposto fica reduzida em 60% (sessenta por cento) nas operações interestaduais com os produtos alcançados pela isenção prevista no art. 29 deste Anexo, nas condições estabelecidas (Convênios ICMS  05/99, 10/01, 58/01, 21/02, 18/05, 53/08, 71/08, 138/08, 69/09, 119/09, 01/10, 101/12 e 14/13).

 Anexo 3. Art. 8°. Nas seguintes operações, o imposto fica diferido para a etapa seguinte de circulação: (...)

XIV - saída de sucatas de metais, fragmentos, cacos, aparas de papel, papelão, cartolina, plástico, tecido e resíduos de qualquer natureza com destino a estabelecimento inscrito no CCICMS."

 A dúvida inicial da consulente diz respeito à abrangência dos referidos benefícios fiscais, para determinar se aplicáveis a "despojos bovinos (NCM 0511.99.99), despojos suínos (NCM 0511.99.99), óleo saturado (NCM 1518.00.90), osso de mercado (NCM 0506.90.00), penas in natura (NCM 0505.90.90), vísceras in natura (NCM 0511.99.99), sangue in natura(NCM 0511.99.99), graxa in natura (NCM 1501.10.11) e gordura in natura(NCM 1501.10.11)".

                                  

A legislação tributária estadual não fixa o conceito de "outros resíduos industriais", para a delimitação dos produtos abrangidos pela isenção ou pela redução de base de cálculo. O conceito, todavia, é utilizado na legislação federal, como na Norma Regulamentadora n. 25 do Ministério do Trabalho e Emprego (http://portal.mte.gov.br/legislacao/norma-regulamentadora-n-25.htm, acesso em 03/06/2014), que os define como: "25.1 Entende-se como resíduos industriais aqueles provenientes dos processos industriais, na forma sólida, líquida ou gasosa ou combinação dessas, e que por suas características físicas, químicas ou microbiológicas não se assemelham aos resíduos domésticos, como cinzas, lodos, óleos, materiais alcalinos ou ácidos, escórias, poeiras, borras, substâncias lixiviadas e aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como demais efluentes líquidos e emissões gasosas contaminantes atmosféricos".

Trata-se, portanto, de resíduos provenientes de processos industriais.

 Sendo a consulente fabricante de ração animal, e a isenção prevista no Artigo 29 do Anexo 2 do RICMS/SC, entre outros produtos, aplicar-se a "outros resíduos industriais, destinados à alimentação animal ou ao emprego na fabricação de ração animal", há que se verificar se os produtos elencados estão abrangidos no conceito de "outros resíduos industriais". 

 Verifica-se inicialmente que os produtos classificados no Capítulo 5 da NCM, são produtos de origem animal, entre os quais os classificados na posição 05.05 (Peles e outras partes de aves, com as suas penas ou penugem, penas e partes de penas (mesmo aparadas), penugem, em bruto ou simplesmente limpas, desinfetadas ou preparadas tendo em vista a sua conservação; pós e desperdícios de penas ou de partes de penas); na posição 05.06, (Ossos e núcleos córneos, em bruto, desengordurados ou simplesmente preparados (mas não cortados sob forma determinada), acidulados ou degelatinados; pós e desperdícios destas matérias) e na posição 05.11 (Produtos de origem animal, não especificados nem compreendidos noutras posições; animais mortos dos Capítulos 1 ou 3, impróprios para alimentação humana).

 Tratando-se de resíduos de origem animal e o benefício restringir-se a resíduos industriais, os despojos bovinos (NCM 0511.99.99), os despojos suínos (NCM 0511.99.99), os osso de mercado (NCM 0506.90.00), as penas in natura (NCM 0505.90.90), as vísceras in natura (NCM 0511.99.99), e o sangue in natura(NCM 0511.99.99) somente estarão abarcados pela isenção se resultantes de processo industrial, de um processo de transformação.

Da mesma forma, no que se refere à graxa in natura (NCM 1501.10.11), gordura in natura (NCM 1502.10.11) e ao óleo saturado (NCM 1518.00.90).

 A estrutura da tabela NCM das posições 15.01 e 15.02 é a seguinte:

 NCM       DESCRIÇÃO

15.01       Gorduras de porco (incluindo a banha) e gorduras de aves, exceto as das posições 02.09 ou 15.03.

1501.10.00          -           Banha

1501.20.00          -           Outras gorduras de porco

1501.90.00          -           Outras

15.02       Gorduras de animais das espécies bovina, ovina ou caprina, exceto as da posição 15.03.

1502.10   -           Sebo

1502.10.1              Bovino

1502.10.11          Em bruto

 Verifica-se que se trata de produtos de origem animal, que somente se resultantes de processo industrial poderão ser abarcados pelo conceito de resíduos industriais.

  Finalmente, quanto ao produto óleo saturado, NCM 1518.00.90, verifica-se ser produto que pode ser classificado como resíduo industrial, pois a posição 1518 trata de produtos submetidos a processo industrial:

 1518.00   Gorduras e óleos animais ou vegetais e respectivas frações, cozidos, oxidados, desidratados, sulfurados, aerados, estandolizados ou modificados quimicamente por qualquer outro processo, com exclusão dos da posição 15.16; misturas ou preparações não alimentícias, de gorduras ou de óleos animais ou vegetais ou de frações de diferentes gorduras ou óleos do presente Capítulo, não especificadas nem compreendidas noutras posições.

1518.00.10          Óleo vegetal epoxidado

1518.00.90          Outros

 Portanto, os produtos arrolados, somente estão beneficiados com isenção do ICMS nas operações internas e com redução de base de cálculo nas operações interestaduais se originários de processo industrial.

 Todavia, se a operação não se der ao abrigo da isenção ou da redução de base de cálculo, nos termos dos artigos 29 e 30 do Anexo 2 do RICMS/SC, esta  dar-se-á ao abrigo do diferimento do ICMS nas operações internas, nos termos do inciso XIV do artigo 8.º do Anexo 3 do RICMS/SC, que se estende a "resíduos de qualquer natureza com destino a estabelecimento inscrito no CCICMS".

 Tratando-se de aquisições com isenção ou não tributada, a Constituição Federal expressamente veda o aproveitamento de créditos de ICMS (Art. 155, § 2., II, "a"). Nas operações em que previsto o  diferimento do imposto, não há imposto a destacar no documento fiscal de saída e igualmente fica vedado o aproveitamento de créditos de ICMS.

 Nesta situação, não poderá o contribuinte aproveitar créditos de ICMS, mesmo que eventualmente tenha sido realizado destaque de imposto no documento fiscal de aquisição de matéria-prima, indevidamente. Neste sentido posição desta Comissão, na Resposta de Consulta 05/2013:

"EMENTA: ICMS. NO DIFERIMENTO, A POSTERGAÇÃO DO RECOLHIMENTO DO IMPOSTO NÃO CONSTITUI PRERROGATIVA DO CONTRIBUINTE PORQUE DERIVA DE LEI. (Disponibilizado na página da SEF em 11.02.13)"

 Do texto da referida Resposta de Consulta, extrai-se o seguinte excerto, por tratar obrigatoriedade da aplicação do diferimento, quando previsto em lei: "(...) O pagamento desse imposto é que é transferido para um momento posterior, e essa transferência não é uma prerrogativa do contribuinte, tampouco do responsável tributário porque deriva de lei. Logo, o diferimento do imposto é obrigatório nas referidas operações".

Nas saídas com diferimento do ICMS, havendo imposto destacado na operação de aquisição da mercadoria, a fim de dar efetividade ao princípio da não cumulatividade do tributo, há a previsão de transferência de crédito. Neste sentido, § 2° do  artigo 31 da Lei 10.297/96, considera acumulado saldos credores, dentre outros, os decorrentes de operações subsequentes diferidas:

 "Art. 31. Saldos credores acumulados por estabelecimentos que realizem operações e prestações de que tratam o art. 7°, inciso II, e seu parágrafo único, poderão, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento, ser transferidos, na forma prevista em regulamento:

 I - a qualquer estabelecimento do mesmo titular, neste Estado;

 II - havendo saldo remanescente, a outros contribuintes deste Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito.

 § 1.º. Poderão ainda ser transferidos outros saldos credores acumulados, observando o disposto neste artigo e nas hipóteses prevista em regulamento.

 § 2.°. Consideram-se acumulados, para os fins deste artigo, os saldos credores decorrentes de manutenção expressamente autorizada de créditos fiscais relativos a operações ou prestações subsequentes isentas ou não-tributadas e de diferimento. 

Todavia, os saldos credores acumulados, que não decorram de operações de exportação (Lei 10.297/96, artigo 7º., II), somente poderão ser transferidos nas hipóteses previstas no RICMS/SC.

 A autorização de transferência de eventuais saldos credores acumulados de ICMS, nos restritos casos previstos na legislação tributária, não pode ser burlada mediante o destaque de imposto em operação para a qual está previsto o diferimento do imposto. A ação está capitulada, inclusive, como infração à legislação tributária, nos termos do Artigo 68 da Lei 10.297/96.                  

 

Resposta

Ante o exposto, proponho que se responda à consulente que  nos documentos fiscais relativos a saídas de matéria-prima isenta ou com diferimento do ICMS, nos termos do Anexo 2 do RICMS/SC, artigo 29 e Anexo 3, artigo 8.º, Inciso XIV, está vedado o destaque do ICMS e por consequência, o destinatário não poderá utilizar imposto indevidamente destacado para compensar com as operações tributadas subsequentes.




VANDELI ROHSIG DANNEBROCK 
AFRE IV - Matrícula: 2006472

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 26/06/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome

Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM

Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA

Secretário(a) Executivo(a)