CONSULTA 75/2014

EMENTA: ICMS. ARROZ ADQUIRIDO DE PRODUTOR RURAL ESTABELECIDO EM OUTRO ESTADO. IMPOSTO CALCULADO SOBRE PREÇO DE PAUTA, DIVERSO DO PREÇO EFETIVAMENTE PRATICADO NA OPERAÇÃO. CRÉDITO LIMITADO À APLICAÇÃO DA ALÍQUOTA SOBRE O PREÇO EFETIVO. POSSIBILIDADE DE GLOSA DO CRÉDITO EXCEDENTE, COM SUPEDÂNEO NO ART. 29 DA LEI 10.297/1996.

CONTRA-NOTA: DEVERÁ SER CONSIGNADO O VALOR REAL DA OPERAÇÃO E NÃO O PREÇO DE PAUTA. CARACTERIZAÇÃO DO CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA.

Disponibilizado na página da SEF em 01.08.14

 

Da Consulta

A consulente em epígrafe atua no ramo de beneficiamento de arroz. Relata que, nas aquisições de produtores rurais do Estado do Rio Grande do Sul (Nota Fiscal de Produtor), o imposto é exigido na saída, calculado pelo preço de pauta que hoje é de R$ 0,83 por Kg do produto.

No recebimento do arroz, é emitida Nota Fiscal de Entrada (contra-nota), considerando o preço de pauta do Estado de origem.

Contudo, o preço pactuado com o vendedor é bem inferior (R$ 0,67 por Kg).

Isto posto, indaga qual a base de cálculo a utilizar na Entrada do Estado de Santa Catarina, a pauta fiscal do Estado de origem ou o preço negociado com o produtor rural?

Conforme informação da Gerfe, a consulente satisfaz os requisitos de admissibilidade da consulta. 

 

Legislação

Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1996, arts. 21, 22 e 29;

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, arts. 28 e 29; Anexo 5, arts. 39, I, § 1º, 42, § 2º;

Convênio s/nº, arts. 18, 19 e 54.

 

Fundamentação

A dúvida do contribuinte, em rápidas palavras, reporta-se à aquisição de arroz de produtores rurais no Rio Grande do Sul, matéria-prima empregada em sua atividade industrial. Sucede que o ICMS exigido pelo Fisco gaúcho na saída do Estado é calculado sobre preço de pauta, superior ao efetivamente negociado com o produtor.

Daí decorrem implicações sobre (a) o valor do crédito que pode ser apropriado e (b) o preenchimento da contra-nota relativa à entrada de arroz, documentada por nota fiscal de produtor emitida no Estado do Rio Grande do Sul.

Vejamos, em primeiro lugar, a questão do crédito.

Dispõe o art. 21 da Lei 10.297/1996 que o imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores por este ou por outro Estado ou pelo Distrito Federal.

O art. 22 do mesmo pergaminho assegura ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

Contudo, o art. 29 da mesma Lei, veda o aproveitamento de crédito, ainda que destacado em documento fiscal, relativo a benefício fiscal concedido por outra Unidade da Federação em desacordo com o disposto na lei complementar  de que trata o art. 155, § 2°, XII, "g", da Constituição Federal.

Ora, a lei complementar prevista no art. 155, § 2º, XII, "g" da Constituição é a Lei Complementar 87/1996 que dispõe no inciso I de seu artigo 13 que a base de cálculo do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte é o valor da operação.

O valor da operação, no caso presente, nada mais é senão o preço do arroz acordado entre a consulente e o produtor rural no Rio Grande do Sul. Se o imposto foi calculado sobre preço de pauta, diferente do valor da operação, o crédito destacado no documento fiscal está em desacordo com o disposto na Lei Complementar 87/1996 e, portanto, passível de ser glosado pelo Fisco catarinense, com supedâneo no art. 29 da Lei 10.297/1996.

Com efeito, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Agravo Regimental no Agravo 673.905 MG, rel. Min. José Delgado (DJ de 8-8-2005, p. 195), manifestou-se sobre a questão nos seguintes termos:

5. Assentamento consolidado na jurisprudência da 1ª Seção do STJ de que é impossível, segundo as regras do ordenamento jurídico tributário, erigir-se pautas fiscais, pautas de preços ou de valores fixados mediante Portaria do Fisco como contendo elementos materiais determinantes da base de cálculo do ICMS. A base de cálculo do ICMS há de ser, em face de força do princípio da legalidade, o valor da operação de que decorrer na saída da mercadoria.

Esse entendimento consolidou-se na Súmula 431/STJ: "É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal".

Já no tocante à emissão da contra-nota, dispõe o inciso IV do art. 19 do Convênio s/nº, que instituiu o Sistema Nacional Integrado de Informações Econômico-Fiscais (SINIEF), que a nota fiscal, modelos 1 e 1-A, consignará, no quadro "Dados do Produto", g) o valor unitário dos produtos e h) o valor total dos produtos.

Já o § 2º do art. 42 do Anexo 5 do RICMS-SC dispõe que no recebimento de mercadorias remetida por produtor, será emitida, como contra-nota, nota fiscal, modelo 1 ou 1-A, consignando (a) na nota fiscal de produtor a quantidade, peso e valor aproximados e (b) na contra-nota, a quantidade, peso e valor efetivos.

Assim, quando da emissão da contra-nota, deve ser consignado o valor efetivamente pago ao produtor.

A declaração de outro valor que não o preço efetivamente praticado pode caracterizar o crime de falsidade ideológica, previsto no art. 299 do Código Penal: "omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante".

 

Resposta

Responda-se à consulente que no caso de recebimento de produto agrícola de outro Estado, em que o ICMS recolhido tiver sido calculado sobre preço de pauta, superior ao valor real da operação:

a) o crédito excedente poderá ser glosado pelo Fisco, nos termos do art. 29 da Lei 10.297/1996;

b) a contra-nota deverá consignar o valor real da operação e não o preço de pauta, sob pena de ficar caracterizada falsidade ideológica.

À superior consideração da Comissão.

VELOCINO PACHECO FILHO 
AFRE IV - Matrícula: 1842447

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 26/06/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

Nome

Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM

Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA

Secretário(a) Executivo(a)