CONSULTA 27/2014

ICMS. CARNE BOVINA ORIUNDA DE ESTADOS QUE CONCEDEM BENEFÍCIOS FISCAIS À REVELIA DO CONFAZ. POR FORÇA DO ART. 29 DA LEI Nº 10.297/96, O CREDITAMENTO DO ICMS NÃO PODE DAR-SE PELO VALOR DESTACADO NA NOTA FISCAL DE AQUISIÇÃO, DEVENDO LIMITAR-SE AOS PERCENTUAIS DESCRITOS NO ART. 35-B DO RICMS/SC, OBSERVADO O §1º DO MESMO ARTIGO.

Disponibilizado na página da PSEF em 21.02.14

Da Consulta

A consulente é empresa frigorífica de abate de bovinos. Indaga acerca do aproveitamento integral do crédito do ICMS na aquisição de carne bovina inteira, sem industrialização, proveniente de outros Estados e sobre o aproveitamento extemporâneo deste crédito.

Declara que a consulta não se enquadra nos impedimentos do artigo 152-C do Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário - RNGDT/SC.

A consulta foi informada pela Gerência Regional de Fiscalização de origem, conforme determina o artigo 152-B, § 2°, II, do RNGDT/SC, aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984, que se manifestou exclusivamente sobre a observância dos critérios de admissibilidade.

É o relatório, passo à análise.

 

Legislação

Constituição Federal, art. 155, § 2º, inciso XII, alínea "g",

Lei Complementar nº 24, de 07 de janeiro de 1975, art. 1º;

Lei nº 10.297 de 26 de dezembro de 1996, art. 29;

RICMS/SC, artigos 35-A e 35-B.

 

Fundamentação

O princípio da não-cumulatividade tem base constitucional. Encontra-se insculpido no art. 155, § 2º, inciso I, bem com na Lei Complementar nº 87/96, no artigo 20. Em que pese a clareza do princípio constitucional, a análise deve trilhar outro caminho. Ocorre que alguns Estados brasileiros vem concedendo benefícios fiscais à revelia do Confaz - Conselho Nacional de Política Fazendária, contrariando assim ao disposto no art. 155, § 2º, inciso XII, alínea "g", da Constituição Federal e Lei Complementar nº 24/75, que em seu artigo 1º, determina:

"Art. 1º - As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei.

Parágrafo único - O disposto neste artigo também se aplica:

I - à redução da base de cálculo;

II - à devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros;

III - à concessão de créditos presumidos;

IV - à quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais, concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus;

V - às prorrogações e às extensões das isenções vigentes nesta data."

A mesma Lei Complementar nº 24/75, prevê no art. 8º, inciso I, que os créditos fiscais decorrentes de benefícios fiscais concedidos ao arrepio de seus preceitos serão ineficazes:

"Art. 8º - A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente:

I - a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria;"

Visando limitar este crédito que padece de vício de constitucionalidade, o legislador catarinense vetou o creditamento do imposto de mercadorias oriundas de Estados que concederam benefícios fiscais de forma unilateral, sem a concordância do Confaz, através do art. 29, da Lei Estadual nº 10.297/96:

"Art. 29. Fica vedado o aproveitamento de crédito, ainda que destacado em documento fiscal, concedido por outra Unidade da Federação em desacordo com o disposto na lei complementar  de que trata o art. 155, § 2°, XII, "g", da Constituição Federal."

Neste mesmo sentido, o Ministro Dias Tófoli, do STF, no RE 571739, oriundo de Minas Gerais, pronunciou-se pela inconstituicionalidade dos benefícios concedidos sem a observância do art. 155, § 2º, inciso XII, alínea "g", da Constituição Federal. Destaco o seguinte trecho de sua decisão:

"Com efeito, tanto em sede de controle abstrato, como por meio da via extraordinária, esta Suprema Corte já se manifestou no sentido de não ser lícito a apropriação, sob o pálio da não-cumulatividade, de créditos de ICMS constituídos a partir da aquisição de insumos beneficiários de incentivos fiscais no Estado de origem, mormente quando estes forem concedidos em desobediência a disciplina estabelecida na lei complementar mencionada pelo artigo 155, § 2º, inciso XII, alínea "g" , da Constituição Federal."

Regulamentando o art. 29 da Lei nº 10.297/96, o RICMS/SC, nos arts. 35-A e 35-B, de forma objetiva estabeleceram os critérios e limites para o creditamento do ICMS decorrente de mercadorias que recebem este tratamento inconstitucional por parte de outros Estados:

"Art. 35-A. Fica vedado o aproveitamento de crédito, ainda que destacado em documento fiscal, de operações oriundas de unidades da Federação que tenham concedido isenção, incentivos ou benefícios fiscais à revelia da Lei complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975 (Lei  nº 10.297/96, art. 29)."

No caso de carne bovina, a limitação atinge os Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraná e Rondônia, conforme sua especificidade:

"Art. 35-B. Nas operações oriundas das unidades da Federação abaixo indicadas, o crédito do imposto fica limitado aos seguintes percentuais, independentemente do valor destacado no documento fiscal:

I - 3% (três por cento) na entrada de carnes e miudezas comestíveis resultantes do abate de gado bovino e bufalino, frescas, resfriadas ou congeladas, bem como charque, carne cozida enlatada e "corned beef", dessas mesmas espécies, oriundas do Estado do Mato Grosso;

II - 4% (quatro por cento) na entrada de charque, carne e demais produtos e subprodutos comestíveis, simplesmente resfriados, congelados ou salgados, resultantes de abate de gado bovino ou bufalino, oriundos do Estado do Mato Grosso do Sul;

III - 3% (três por cento) na entrada de carnes desossadas, devidamente embaladas e identificadas por cortes padronizados nos termos da legislação federal específica, inclusive charque, resultantes do abate de gado bovino e bufalino, oriundas do Estado do Mato Grosso do Sul.

(...)

X - 3% (três por cento) na entrada de carne fresca, resfriada, congelada, salgada, temperada ou salmourada e miúdos comestíveis resultantes do abate ou da industrialização de asinino, bovino, bufalino, eqüino, muar, ovino, caprino, leporídeo e ranídeo, oriundos do Estado de Goiás;

XI - 0,1% (um décimo por cento), na entrada de produtos industrializados cuja matéria-prima seja resultante do abate de aves ou de gado bovino, eqüídeo, bufalino, caprino, ovino ou suíno, destinados à alimentação humana, oriundos do Estado de Minas Gerais;

(...)

XIII - 1,8% (um inteiro e oito décimos por cento) na entrada de produtos comestíveis resultantes do abate de gado bovino, oriundos do Estado do Pará;

(...)

XV - 0% (zero por cento) na entrada de carne e produtos comestíveis resultantes do abate de aves, leporídeos e gado bovino, bufalino, caprino, ovino ou suíno, frescos, resfriados, congelados, salgados, secos, temperados ou defumados para conservação, e seus industrializados, mesmo que enlatados ou cozidos, oriundos do Estado do Paraná;

XVI - 3% (três por cento) na entrada de carne e demais produtos comestíveis frescos, resfriados, congelados, salgados, secos ou temperados, resultantes do abate de aves, leporídeos e gado bovino, bufalino, caprino, ovino e suíno oriundos do Estado de Rondônia;"

Há que se esclarecer que o termo "inteira", citado pela consulente, não é motivo de exclusão da mercadoria da incidência da norma.

É necessário destacar, ainda, o parágrafo § 1º do mesmo artigo 35-B, o qual determina que a regra aplica-se somente quando o imposto destacado no documento seja superior aos percentuais previstos em seus incisos:

"§ 1º O disposto neste artigo somente se aplica caso o imposto destacado no documento fiscal seja superior aos percentuais previstos nos respectivos incisos."

O crédito presumido quando concedido à revelia do Confaz e de forma a reduzir a carga tributária do contribuinte do Estado de origem, transfere o ônus da diferença desta carga ao Estado destinatário, de forma não autorizada por lei. Assim, a limitação ao creditamento imposta por Santa Catarina não é mais do que a tentativa de não arcar com um ônus que não lhe pertence.

Quanto ao segundo questionamento, o creditamento extemporâneo possui previsão no art. 32 do RICMS, e pode ser efetuado pelo contribuinte dentro do prazo de cinco anos, a partir do fato gerador, independente de anuência do fisco, desde que exista este direito. 

"Art. 32. O direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos 5 (cinco) anos contados da data de emissão do documento."

 

Resposta

Diante do exposto, responda-se à consulente que, esta somente poderá creditar-se do ICMS destacado nas notas fiscais relativas à aquisição de carne bovina, oriunda de Estados listados no art. 35-B, do RICMS/SC, no limite do percentual ali estabelecido, e que, o creditamento extemporâneo, quando legal, pode ser efetuado sem prévia anuência do fisco, não sendo o caso da consulta..

É o parecer que se submete à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

CLOVIS LUIS JACOSKI

AFRE IV - Matrícula: 3441652

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 30/01/2014.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome          Cargo

CARLOS ROBERTO MOLIM Presidente COPAT

MARISE BEATRIZ KEMPA               Secretário(a) Executivo(a)