CONSULTA               045/2012          

EMENTA:         ICMS. IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIRO. IMPORTADOR BENEFICIADO PELO PROGRAMA PRÓ-EMPREGO.

1. a legislação tributária catarinense não distingue entre importação por conta própria e importação por conta e ordem de terceiro, aplicando-se o benefício indiferentemente a uma e outra modalidade (Convênio ICMS 135/2002);

2. para a caracterização do fato gerador, basta que a saída da mercadoria do estabelecimento importador se caracterize como operação de circulação de mercadorias, não importando qual tenha sido o negócio jurídico, desde que tenha resultado em mudança de titularidade das mercadorias;

3. o art. 8º, III, do Decreto 105/2007, refere-se à destinação dada à mercadoria importada pelo importador, não importando se o adquirente lhe der outra destinação (industrialização, incorporação ao ativo imobilizado etc.).

Disponibilizado na página da SEF em 15.08.12

01 - DA CONSULTA

                     A consulente em epigrafe, identifica-se como empresa que opera no comércio exterior. Informa que realiza importações tanto por conta própria como por conta e ordem de terceiros. Para tanto é detentora de regime especial que lhe permite diferir o ICMS devido por ocasião do desembaraço aduaneiro de mercadorias destinadas à comercialização, nos termos do art. 10, III, do Anexo 3 do RICMS-SC.

                   Isto posto, formula as seguintes questões a esta Comissão:

                   a) o diferimento do ICMS relativo à importação aplica-se a todas as importações autorizadas pela Receita Federal: por conta própria, por conta e ordem de terceiros ou por encomenda?

                   b) o diferimento aplica-se à importação por conta e ordem de terceiro, ainda que a operação subseqüente à importação consigne apenas “remessa por conta e ordem” ao real adquirente e não “venda de mercadorias”?

                   c) as mercadorias importadas revendidas ou remetidas aos seus clientes entende-se como “destinadas à comercialização”, ainda que seja utilizadas pelos adquirentes como matérias-primas em processo de industrialização?

                   A consulta foi informada, fls. 25-36, pela Gerência de origem que verificou os pressupostos formais ao recebimento da consulta. No tocante ao TTD, informa que a consulente é beneficiada pelo Programa Pró-Emprego (Decreto 105/2007, art. 8º, III, § 6º, I e II, e § 10) e não pelo art. 10, III, do Anexo 5, como declara a consulente. No mérito, analisa as diferentes modalidades de importação, revisa as consultas Copat pertinentes à matéria consultada e conclui nos seguintes termos:

                   “a) a legislação catarinense não conceitua ou trata de modo específico e diferenciado a denominada importação por conta e ordem de terceiro;

                   b) tal modalidade de importação é tratada como as demais espécies de modalidades de importação (por conta própria ou por encomenda), respeitadas as respectivas peculiaridades (existe fato gerador para o ICMS no desembaraço aduaneiro e fato gerador para a saída subseqüente, não importando a que título se dê tal fato);

                   c) para fins de fruição dos benefícios fiscais em operações realizadas por trading detentora de TTD relativo à importação para comercialização (diferimento do ICMS devido no desembaraço aduaneiro, crédito presumido na saída subseqüente à importação, e diferimento parcial na saída interna subseqüente), as operações de importação por conta e ordem de terceiro (importação e saída subsequente) são equiparadas à comercialização, embora tecnicamente não o sejam;

                   d) considerando a conclusão da alínea “c” acima, não importa qual o destino a ser dado a mercadoria importada pela trading em nome do adquirente (se para comercialização, para industrialização, para consumo ou para integração ao ativo imobilizado). Para fins fiscais, perante o ICMS catarinense, a operação realizada pela trading é equiparada à comercialização”.

 

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

                   Decreto 105, de 14 de março de 2007, art. 8º, III, § 6º, I e II, e § 10;

                   Convênio ICMS 135/2002.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

                   Antes de entrar na matéria da consulta propriamente dita, seria proveitoso estabelecer alguns conceitos básicos.

                   O direito tributário, a teor do disposto no art. 24, I, da Constituição Federal, é de competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal. Conforme § 1º do mesmo artigo, no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limita-se a estabelecer normas gerais. Já o art. 146 da Carta reserva à lei complementar as seguintes matérias: (i) dispor sobre conflitos de competência, (ii) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar e (iii) estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária. Em suma, a competência da União em matéria de direito tributário somente obriga os Estados e o Distrito Federal apenas nas hipóteses expressamente previstas na Constituição. Por conseguinte, nas demais hipóteses, não há relação de subordinação entre normas tributárias federais e normas tributárias estaduais.

                   Superado esse ponto, examinemos essa modalidade de importação que é a importação por conta e ordem. A Medida Provisória 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, introduziu as seguintes alterações aos arts. 32 e 95 do Decreto-lei 37/66:

                   O parágrafo único do art. 32 passou a prever responsabilidade solidária para o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora.

                   Já o art. 95 teve acrescido inciso dispondo que responde por infração à legislação do Imposto de Importação, conjunta ou isoladamente, o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso da importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora.

                   Como visto, a modalidade de importação por conta e ordem de terceiro não foi criada pelo direito comercial, mas por legislação tributária federal, para fins exclusivamente tributários. Com efeito, as características e definições da nova modalidade foram estabelecidas nas Instruções Normativas SRF 225/2002 e 247/2002: assim, define-se “importador por conta e ordem de terceiros a pessoa jurídica que promover, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria adquirida por outra, em razão de contrato previamente firmado, que poderá compreender, ainda, a prestação de outros serviços relacionados com a transação comercial, como a realização de cotação de preços e a intermediação comercial”. Por outro lado, “entende-se por adquirente a pessoa jurídica encomendante da mercadoria importada”.

                   Assim, teríamos, nessa modalidade de importação a participação de duas empresas, a saber: o importador e o adquirente que contrata o importador para que providencie o despacho de importação da mercadoria em seu nome, além de outros serviços como cotação de preços e intermediação comercial. Assim, nessa modalidade aparece a figura do “importador de fato” que é o adquirente, o qual promove a importação da mercadoria, mediante compra internacional, restando ao “importador de direito” o papel de mero mandatário do adquirente, o qual fornece os recursos financeiros.

                   Conforme Horácio Villen Neto e Leonardo Freitas de Castro (Importação por conta e ordem e por encomenda realizada por trading beneficiária do Fundap: reflexões atuais após o Protocolo ICMS 23/2009 celebrado entre São Paulo e Espírito Santo. RDDT 181: 57):

                   “Assim, na importação por conta e ordem, embora a atuação da empresa importadora possa abranger desde a simples execução do despacho de importação até a intermediação da negociação no exterior, contratação do transporte, seguro, entre outros, o importador de fato é a adquirente, a mandante da importação, aquela que efetivamente faz vir a mercadoria de outro país, em razão de compra internacional”.

                   Contudo, os Estados e o Distrito Federal, coerentemente com o princípio da federação e considerando a competência concorrente em matéria de direito tributário, celebraram o Convênio ICMS 135/2002, cuja Cláusula Primeira dispõe o seguinte:

                   “Cláusula primeira Para efeito de cumprimento das obrigações tributárias relativas ao ICMS, na saída promovida, a qualquer título, por estabelecimento importador de mercadoria ou bem por ele importado do exterior, ainda que tida como efetuada por conta e ordem de terceiros, não tem aplicação o disposto nas Instruções Normativas SRF nº 247, de 21 de novembro de 2002, nos artigos 12 e 86 a 88, e SRF nº 225, de 18 de outubro de 2002, e no Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 7 de 13 de junho de 2002, ou outros instrumentos normativos que venham a substituí-los”.

                   Portanto, para fins de incidência do ICMS, é irrelevante se a importação foi em nome próprio ou por conta e ordem de terceiros. A legislação tributária estadual não trata diferenciadamente uma e outra circunstância. Basta que ocorra o fato gerador do tributo.

                   Dispõe o art. 2º, I, da Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1996, que o ICMS tem como fato gerador as “operações de circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares e restaurantes e estabelecimentos similares”.

                   Discorrendo sobre o fato gerador do ICMS, leciona Roque Antonio Carrazza (ICMS. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 40 que “não é só a compra e venda de mercadorias que abre espaço a este imposto, senão também a troca, a doação, a dação em pagamento etc. Todas estas ‘operações’ propiciam a circulação jurídica de mercadorias e, em tese, são passíveis de tributação por meio do ICMS”.

                   Tratando-se de importação por conta e ordem de terceiro, a saída da mercadoria do estabelecimento do importador para o do adquirente caracteriza uma operação de circulação de mercadorias – ocorre a mudança de titularidade das mercadorias.

                   No presente processo, discute-se ainda a abrangência do diferimento previsto no art. 8º, III, do Decreto 105/2007. O dispositivo referido prevê o diferimento para a etapa seguinte de circulação à da entrada da mercadoria no estabelecimento importador, o ICMS devido por ocasião do desembaraço aduaneiro, na importação realizada por portos, aeroportos ou pontos de fronteira alfandegados, situados neste Estado de mercadorias destinadas à comercialização por empresa importadora estabelecida neste Estado.

                   Com efeito, a redação do dispositivo não esclarece se a mercadoria deve ser destinada à comercialização pelo importador ou por quem a adquirir do importador. Ora, em nome do princípio da razoabilidade não se pode exigir do importador a pesquisa das intenções do adquirente, para o cumprimento da legislação tributária. O princípio da razoabilidade exige a consideração das particularidades individuais dos sujeitos atingidos pelo ato de aplicação concreta do Direito (cf. Humberto Ávila. Proporcionalidade e direito tributário. Direito Tributário: homenagem a Alcides Jorge Costa. Coordenação de Luis Eduardo Schoiueri. Vol. I, São Paulo: Quartier Latin, 2003, pg. 334).

                   Embora o dispositivo citado tenha sido revogado pelo art. 3º do Decreto 544, de 27 de setembro de 2011, a vigência do tratamento tributário diferenciado já concedido fica garantida pelo art. 23 da Lei 15.510, de 26 de julho de 2011.

                   Posto isto, responda-se à consulente:

                   a) a legislação tributária catarinense não distingue entre importação por conta própria e importação por conta e ordem de terceiro, aplicando-se o benefício indiferentemente a uma e outra modalidade;

                   b) para a caracterização do fato gerador, basta que a saída da mercadoria do estabelecimento importador se caracterize como operação de circulação de mercadorias, não importando qual tenha sido o negócio jurídico, desde que tenha resultado em mudança de titularidade das mercadorias;

                   c) o dispositivo refere-se à destinação dada à mercadoria importada pelo importador, não importando se o adquirente lhe der outra destinação (industrialização, incorporação ao ativo imobilizado etc.)      

À superior consideração da Comissão.      

                   Copat, em Florianópolis, 24 de julho de 2012.

 

Velocino Pacheco Filho

AFRE – matr. 184244-7

 

                   De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 2 de agosto de 2012.

                   A resposta à presente consulta poderá, nos termos do art. 11 da Portaria SEF 226/2001, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

 

     Marise Beatriz Kempa                                                             Carlos Roberto Molim

       Secretária Executiva                                                                 Presidente da Copat