CONSULTA N° 021/2012
EMENTA: ICMS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE EM EXPORTAÇÃO PARA O EXTERIOR DO PAÍS. TRANSPORTE NO TERRITÓRIO NACIONAL ATÉ O PORTO DE EMBARQUE. HIPÓTESE NÃO ALCANÇADA PELA IMUNIDADE. ISENÇÃO HETERÔNOMA. PRÓ-CARGAS. EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO.
1. A isenção concedida à prestação de serviço de transporte, no território nacional, de mercadorias exportadas para o exterior, conforme art. 3°, II, da Lei Complementar 87/96 afasta o aproveitamento do crédito presumido previsto no art. 266 do Anexo 6 do RICMS-SC, por força da regra inserta no inciso II do parágrafo único do mesmo dispositivo;
2. Porém, considerando que constitui forma alternativa e simplificada de apuração do imposto a recolher, pode ser mantido o crédito presumido previsto no art. 25, XIII, do Anexo 2.
Disponibilizado na página da
SEF em 10.05.12
01 - DA CONSULTA
A consulente, empresa dedicada ao ramo de
transporte rodoviário de cargas, informa que apura o ICMS na modalidade de
utilização de crédito presumido, conforme arts. 264 a 269 do Anexo
6 do RICMS.
A
consulta trata da utilização cumulativa do crédito presumido de 40%
(Pró-Cargas) e do benefício previsto no art. 5°, XIII, do Anexo 2, nas operações de transporte de mercadorias para os
portos com a finalidade de exportação, onde o ICMS é isento.
A
autoridade fiscal, informação a fls. 35, verificou o cumprimento dos requisitos
formais para formulação de consulta.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição
Federal, art. 155, § 2°, I e II;
Lei
Complementar 87, de 13 de setembro de 1996, arts. 3°, II, e 20, § 3°;
RICMS-SC,
aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, arts. 5°,
XIII e 25, XIII; e Anexo 6, arts. 264 e 269.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E
RESPOSTA
O
direito ao crédito do ICMS radica em sede constitucional, regendo-se pelo disposto
nos incisos I e II do § 2° do art. 155 da Lei Maior: o imposto (i) será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em
cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com
o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito
Federal; e (ii) a isenção ou não-incidência, salvo
determinação em contrário da legislação, (a) não implicará crédito para
compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes; e (b) acarretará
a anulação do crédito relativo às operações anteriores.
O
“crédito” do imposto nada mais é que o próprio ICMS que onerou as operações e
prestações anteriores, vocacionado exclusivamente à compensação do imposto
devido pelas operações ou prestações próprias do contribuinte. Assim, o
“crédito” realiza o princípio da não-cumulatividade, como característica
própria do imposto. Como corolário dessa “vocação”, a
operação ou prestação subseqüente isenta ou não tributada impede a apropriação
do crédito, salvo disposição em contrário
da legislação.
A
expressão “legislação tributária”, conforme comando contido no art. 96 do CTN,
compreende, não só a lei, mas todos os atos normativos, inclusive decretos,
regulamentos e portarias de secretário de Estado que versem, no todo ou em
parte, sobre tributos e relações jurídicas a ele pertinentes.
O
art. 3°, II, da Lei Complementar 87/96, dispõe que “o imposto não incide
sobre operações e prestações que destinem ao exterior
mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados,
ou serviços”. Ao se referir a prestações
que destinem ao exterior mercadorias ou serviços, o
legislador complementar incluiu na isenção o transporte da mercadoria até o
porto de embarque para exportação. Observe-se que a Constituição não incluiu o
transporte na imunidade (CF, art. 155, § 2°, X, a). Portanto, trata-se
da imunidade dita heterônoma (isenção
instituída por pessoa diversa da que detém a competência para instituir o
tributo).
A
competência da União para, mediante lei complementar, instituir isenção heterônoma
de tributos estaduais foi reconhecida pela Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 212.637 MG: “III. - Deixou expresso a C.F., art. 155, § 2º, XII, ‘e’, que as
prestações de serviços poderão ser excluídas, nas exportações para o exterior,
mediante lei complementar”.
Com efeito, o tributo estadual passou a não
incidir sobre o transporte da mercadoria estadual, a partir da edição da Lei
Complementar 87/96, conforme mansa e pacífica jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, REsp 418.957 MT, da Primeira Turma, e REsp
613.785 RO, da Segunda Turma (RDDT 122: 149): “2. O art. 3°, II da LC
87/96 dispôs que não incide ICMS sobre operações e prestações que destinem ao
exterior mercadorias, de modo que está acobertado pela isenção tributária o
transporte interestadual dessas mercadorias”. Do voto da Relatora, Min. Eliana
Calmon, destacamos a seguinte passagem:
“Para demonstrar que a
interpretação literal pretendida é inaceitável, aliás, basta notar-se que seria
inteiramente inútil a norma de isenção que tivesse apenas o efeito de excluir o
imposto das prestações de serviços de transporte internacional, vale dizer, que
iniciam no Brasil e terminam no exterior, em face da própria norma
constitucional atributiva da competência tributária. Realmente, a Constituição
atribui competência aos Estados para tributarem serviços de transportes intermunicipais e interestaduais. Não podem ser tributados, pois, os serviços de
transporte internacionais”.
“....”
“É evidente, portanto, que
não teria sentido uma norma expressamente excludente da tributação, para
afastar o imposto somente daquelas operações que naturalmente, pela própria
norma atributiva de competência, não podem ser por este
alcançadas”.
A própria Lei Complementar
87/96, outrossim, encarregou-se de assegurar o direito à manutenção do crédito:
dispõe o § 3° do art. 20 do referido pergaminho que é vedado o crédito
relativo a prestação de serviços feita ao estabelecimento,
para comercialização, quando a saída subseqüente não for tributada ou estiver
isentas do imposto, exceto a destinada ao exterior. A contrario sensu, quando a mercadoria for
destinada ao exterior (imune), fica assegurada a manutenção do crédito relativo
à prestação de serviço (transporte).
Contudo,
discute-se nessa consulta, crédito presumido, concedido em substituição do
crédito efetivo do imposto, na prestação de serviço de transporte rodoviário de
cargas. Pergunta-se: a manutenção do crédito relativo ao transporte de
mercadoria exportada para o exterior do País compreende esse crédito presumido?
Na
verdade, a legislação prevê dois créditos presumidos nessa hipótese. O primeiro
está previsto no art. 25, XIII, do Anexo 2 do RICMS-SC
e tem por supedâneo o Convênio ICMS 106/96: “os estabelecimentos prestadores de
serviço de transporte, em substituição aos créditos efetivos do imposto,
observado o disposto no art. 23, poderão optar por um crédito presumido de 20%
(vinte por cento) do valor do ICMS devido na prestação”.
Contudo,
o art. 266 do Anexo 6 do RICMS-SC, com fundamento na
Lei 13.790/2006 (Pró-Cargas), veio a conceder um crédito presumido, em
substituição aos créditos efetivos do imposto, substancialmente maior, de 40% (quarenta por cento) do imposto devido na prestação de
serviço de transporte exclusivamente de cargas. O inciso I do parágrafo único
desse artigo, porém, dispõe que o referido benefício “não se aplica
cumulativamente com qualquer outro” previsto no Regulamento.
Ora,
o Supremo Tribunal Federal (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 481.314
RS; RDDT 183: 148) já decidiu que por tratar-se de regime alternativo e
opcional para apuração do imposto, constituiria exceção admitida ao direito de
crédito:
“2. Situação peculiar. Regime
alternativo e opcional para apuração do tributo. Concessão de benefício
condicionada ao não-registro de crédito. Pretensão voltada à permanência do
benefício, cumulado ao direito de registro de créditos proporcionais ao valor
cobrado. Impossibilidade. Tratando-se de regime alternativo e facultativo de
apuração do valor devido, não é possível manter o benefício sem a contrapartida
esperada pelas autoridades fiscais, sob pena de extensão indevida do incentivo”.
Por conseguinte, depreende-se
que o crédito presumido substitui, para todos os efeitos, o crédito efetivo
(i.e. o imposto que onerou a entrada dos insumos utilizados no transporte),
considerando-se a dificuldade de determinar quais insumos dão direito ao
crédito e quais podem ser apropriados, já que o sujeito ativo tributário
depende do local em que tenha início a prestação.
Em
síntese, como o direito ao crédito correspondente ao imposto que onerou as
entradas de mercadorias ou insumos – como já salientado – tem assento
constitucional, então a vedação a esse crédito somente poderá ser considerada
legítima se o crédito presumido (ou a redução da base de cálculo) caracterizar
modalidade alternativa de apuração do imposto a recolher e se sua adoção for
facultativa para o sujeito passivo.
Se
o tratamento tributário previsto no art. 25, XIII, do Anexo 2 pode ser entendido como forma alternativa e simplificada de apuração do
imposto, o mesmo não pode ser dito do disposto no art. 266 do Anexo 6,
que constitui declaradamente incentivo fiscal para o setor de transporte de cargas.
Com efeito, o art. 264 desse Anexo dispõe textualmente que o tratamento
tributário previsto para o setor de transporte de cargas (Pró-Cargas) “tem por objetivo fomentar o desenvolvimento da atividade,
mediante tratamento tributário especial no campo do imposto”.
Por
outro lado, podemos afirmar que o tratamento previsto no art. 25, XIII, do Anexo 2 está contido no tratamento previsto no art. 266 do
Anexo 6. Somente por essa razão pode-se admitir que o tratamento referido exclua o
aproveitamento dos créditos efetivos do imposto, a despeito da regra do art.
155, § 2°, I, da Constituição Federal.
Por
conseguinte, como o crédito não é cumulativo com qualquer outro benefício – no
caso, com a isenção prevista no 3°, II, da Lei Complementar 87/96 –,
fica vedado o aproveitamento do crédito presumido previsto no art. 266 do Anexo 6, no que exceder o crédito presumido a que se refere
o art. 25, XIII, do Anexo 2. A manutenção do crédito presumido deve-se ao seu
caráter substitutivo dos crédito efetivos, sobre cuja
manutenção não paira dúvida.
Posto
isto, responda-se à consulente:
a)
a isenção concedida à prestação de serviço de transporte, no território
nacional, de mercadorias exportadas para o exterior, conforme art. 3°,
II, da Lei Complementar 87/96 afasta o aproveitamento do crédito presumido
previsto no art. 266 do Anexo 6 do RICMS-SC, por força
da regra inserta no inciso I do parágrafo único do mesmo dispositivo;
b)
porém, considerando que constitui forma alternativa e simplificada de apuração
do imposto a recolher, pode ser mantido o crédito presumido previsto no art.
25, XIII, do Anexo 2.
À superior consideração da Comissão.
Copat,
em Florianópolis, 4 de abril de 2012.
Velocino Pacheco
Filho
AFRE – matr. 184244-7
De
acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat
na Sessão do dia 19 de abril de 2012.
A
resposta à presente consulta poderá, nos termos do
art. 11 da Portaria SEF 226/2001, ser modificada a qualquer tempo, por
deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em
decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução
Normativa que adote diverso entendimento.
Marise Beatriz Kempa Carlos Roberto Molim
Secretária Executiva Presidente
da Copat