CONSULTA      :    113/11

EMENTA: ICMS. A COMERCIALIZAÇÃO DE CD E DVD, CONTENDO CURSOS E PALESTRAS, DE PRODUÇÃO PRÓPRIA, SOMENTE ESTÁ AMPARADA POR ISENÇÃO, SE REALIZADA POR ENTIDADE SEM FINALIDADE LUCRATIVA E DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS, QUE ESTEJA DEVIDAMENTE CERTIFICADA PELO CONSELHO NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - CNAS, E CUJAS VENDAS NÃO TENHAM ULTRAPASSADO O LIMITE DE R$ 100.000,00 NO ANO ANTERIOR, CONFORME DISPÕE O INCISO XXI, DO ARTIGO 2º, DO RICMS/SC.

Disponibilizado na página da SEF em 09.11.11

01 - DA CONSULTA

 

A Consulente é uma entidade de caráter religioso, cultural e de assistência social e sem fins lucrativos.

Para bem cumprir suas finalidades, além das contribuições espontâneas dos seus associados e de recursos provenientes de outras fontes, mantém uma distribuidora de livros espíritas, na qual se encontram também a disposição dos centros espíritas filiados,  palestras e cursos diversos gravados em CDs e DVDs.

Aduz que como a venda de CDs e DVDs não tem intuito comercial, mas tão somente a divulgação da doutrina espírita, a consulente não se configura como contribuinte do ICMS. Informa ainda que a entidade é uma instituição sem fins lucrativos, reconhecida de utilidade pública por lei estadual, razão que a permite usufruir o benefício da isenção na comercialização destes produtos.

Partindo do pressuposto de que há previsão de isenção do ICMS para livros, entende que há possibilidade de proceder a venda de CDs e DVDs com o mesmo benefício, por não se caracterizar intuito comercial, mas tão somente de divulgação. Para certificar-se da correção deste entendimento, requer manifestação desta Comissão.

A consulta foi informada pela autoridade fiscal da GERFE de origem, conforme determina o artigo 152-B, § 2°, II, do RNGDT/SC, aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984, considerando atendidos os critérios para sua admissibilidade.

 

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

 

Constituição Federal, artigo 150, inciso VI, alínea “d”.

Lei Federal nº 12.101 de 30 de novembro de 2009.

RICMS/SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 28 de agosto de 2001, Anexo 2, artigo 2º, inciso XXI.

 

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

 

Preliminarmente cabe tecer algumas considerações sobre os institutos abordados pela consulente para afastar equívocos conceituais.

A comercialização de livros não está amparada por isenção, mas por imunidade de impostos. As imunidades são prescrições normativas previstas na Constituição Federal e que estabelecem a incompetência dos entes públicos (União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios) para legislarem sobre determinadas situações, pessoas ou bens com o intuito de exigir tributo. Diversamente, a isenção se caracteriza como espécie de exoneração tributária estabelecida em lei do ente tributante ou, no caso do ICMS, mediante convênio firmado entre os Estados e pelo Distrito Federal.

A imunidade tributária para livros está prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal, alcançando somente aqueles que tenham por suporte físico o papel, conforme dispôs a Resolução Normativa 038/2003:

 

“EMENTA: ICMS. IMUNIDADE. LIVRO-ELETRÔNICO. SOMENTE ESTÃO AO ABRIGO DA IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 150, VI, “d” DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL OS LIVROS, JORNAIS E PERIÓDICOS QUE TENHAM POR SUPORTE FÍSICO O PAPEL. ASSIM, NÃO ESTÃO AMPARADOS PELA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA OS CHAMADOS “LIVROS-ELETRÔNICOS” QUE TENHAM POR SUPORTE CD, DISQUETE, FITA, HD, OU QUAISQUER OUTROS MEIOS DIVERSOS DO PAPEL.”

 

Destarte, para fins tributários, não é possível estabelecer uma relação entre a imunidade conferida pela Constituição Federal aos livros, com uma possível isenção de ICMS para CDs e DVDs contendo cursos e palestras, porque são institutos diversos. Ademais, a Constituição Federal somente contemplou com a imunidade de impostos os livros que tenham por suporte físico o papel, não a estendendo sequer para os “livros-eletrônicos”, reproduzidos noutros meios, tais como CDs e DVDs.

Outra questão a se elucidar é que o intuito comercial a que faz alusão a norma tributária, para fins de caracterização da figura do contribuinte, não diz respeito à finalidade pretendida com a venda de determinada mercadoria, mas ao volume comercializado. Embora a consulente vise a divulgação da doutrina espírita, do ponto de vista tributário o faz mediante a disponibilização de CDs e DVDs de cursos e palestras aos centros espíritas associados, para serem  comercializados, o que pressupõe, inclusive, uma habitualidade.

É neste sentido que dispõe o artigo 7º, do RICMS/SC:

 

“Art. 7º Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadorias ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.” (Grifo nosso)

 

Poderia se perquirir se os CDs e DVDs se encontram inseridos no conceito de mercadoria, para fins de incidência do ICMS. Ao se adquirir um CD ou DVD contendo curso ou palestra, como é o caso, o negócio traz subjacente a observância dos preceitos restritivos dos direitos autorais estabelecidos na Lei nº 9.610, especialmente no que concerne às  vedações previstas no seu artigo 29, sem prévia autorização expressa do autor. É que, consoante o seu artigo 28, “cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica”.

Contudo, para o adquirente de um CD ou DVD, o objeto do negócio não é o direito autoral da obra, mas a aquisição de uma mercadoria. É evidente que não poderá dar-lhe um fim que atente contra os direitos autorais, como por exemplo, reproduzi-la para fins comerciais.

A caracterização de mercadoria é resultado do ato de mercancia a que é submetida. Segundo o Dicionário Aurélio, mercadoria designa “aquilo que é objeto de comércio”. Em interessante distinção entre mercadoria e coisa, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Cunha Peixoto, no Recurso Especial nº 79.951-SP, assim se manifestou:

 

“Mercadoria tem seu conceito muito bem definido no direito comercial, a ponto de Vidari observar que um mesmo objeto pode ser coisa em mãos de uma pessoa e mercadoria em mão de outra. É que a própria palavra põe de manifesto seu destino ao mercado e, assim, será coisa o objeto destinado para fins de consumo e mercadoria o destinado à especulação através da revenda.”

 

Na síntese de Vittorio Cassone, “mercadoria é o bem que se destina à circulação mercantil (habitualidade), até chegar ao consumidor final” (MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de Direito Tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 760). Portanto, infere-se que os CDs e DVDs comercializados pela consulente se inserem no conceito de mercadorias.

Estas conclusões iniciais permitem asseverar que os CDs e DVDs vendidos  pela consulente se enquadram no conceito de mercadoria e, a habitualidade e volume com que são comercializados, conferem-lhe a qualificação de contribuinte do ICMS.

Diante desta conclusão, a questão se altera para a busca de norma isentiva que possa contemplar as operações das mercadorias indicadas. Analisando a documentação apensada à consulta denota-se que os CDs e DVDs são produzidos pela própria consulente e que no seu estatuto consta expressamente que é entidade que desenvolve atividades de assistência social, sem fins lucrativos, cujas receitas são aplicadas integralmente na realização  dos seus fins.

O RICMS/SC, em seu Anexo 2, artigo 2º, inciso XXI, confere isenção para as instituições de assistência social, observados alguns requisitos, conforme se depreende do teor do seu texto:

 

“Art. 2°  São isentas as seguintes operações internas e interestaduais:

XXI - a saída de mercadoria de produção própria, promovida por instituição de assistência social e de educação, sem finalidade lucrativa, cujo resultado das vendas líquidas seja integralmente aplicado na manutenção de suas finalidades assistenciais ou educacionais, no País, sem distribuição de qualquer parcela a título de lucro ou participação e cujas vendas no ano anterior não tenham ultrapassado o limite de R$ 100.000,00 (Cem mil reais) sendo que o benefício abrange a transferência da mercadoria do estabelecimento que a produziu para o estabelecimento varejista da mesma entidade (Convênios ICM 38/82, 47/89, ICMS 52/90 e 121/95)”

 

As isenções devem ser interpretadas literalmente, em atendimento ao disposto no artigo 111, do Código Tributário Nacional. A exigência de interpretação literal deve ser entendida com o sentido de interpretação restritiva, em contraposição à extensiva. A exigência da adoção do método restritivo às normas isentivas tem o condão de evitar a incidência da lei para além do que nelas foi estabelecido pelo legislador. Significa que os requisitos que delimitam o benefício devem ser plenamente observados e atendidos.

Da redação do inciso XXI, do artigo 2º, extraem-se quatro requisitos nesta ordem: a) a entidade deve se configurar juridicamente como entidade de assistência social; b) não pode ter finalidade lucrativa; c) o resultado da receita deve ser integralmente aplicado nas atividades assistenciais ou educacionais, e; d) o valor anual das vendas no ano anterior não pode ultrapassar R$ 100.000,00.

Para que a entidade se configure como de assistência social, deve estar inscrita no Conselho Municipal de Assistência Social, conforme dispõe o artigo 9º, da Lei nº 8.742/93, por se tratar de requisito essencial para obtenção da respectiva certificação no Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS. É com a certificação que a entidade alcança a qualidade de instituição de assistência social, mantida enquanto desempenhar as atividades de acordo com os critérios legais. A matéria está disciplinada pela Lei nº 12.101/2009, que em seu artigo 18, estabelece:

 

Art. 18. A certificação ou sua renovação será concedida à entidade de assistência social que presta serviços ou realiza ações assistenciais, de forma gratuita, continuada e planejada, para os usuários e a quem deles necessitar, sem qualquer discriminação, observada a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993.

§ 1º As entidades de assistência social a que se refere o caput são aquelas que prestam, sem fins lucrativos, atendimento e assessoramento aos beneficiários, bem como as que atuam na defesa e garantia de seus direitos.

 

A manutenção da inscrição no Conselho Municipal de Assistência Social e a certificação no CNAS exigem o cumprimento dos requisitos relacionados à finalidade não lucrativa e à destinação da receita ao fim para o qual a inscrição e a certificação foram concedidas. No que se refere ao limite das vendas realizadas pela entidade, trata-se de prerrogativa cujo controle compete à Secretaria de Estado da Fazenda.

Isto posto, responda-se à consulente que a comercialização de cursos e palestras gravados em CDs e DVDs, de produção própria, somente está amparada por isenção, se realizada por entidade sem finalidade lucrativa e distribuição de lucros, que esteja devidamente certificada pelo Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS, e cujas vendas não tenham ultrapassado o limite de R$ 100.000,00 no ano anterior, conforme dispõe o inciso XXI, do artigo 2º, do RICMS/SC.

É o parecer que se submete à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

COPAT, em Florianópolis, 17 de outubro de 2011.

 

 

Joacir Sevegnani

AFRE IV – Matr. 184.933-6

 

 

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 27 de outubro de 2011, ressalvando-se, a teor do disposto no art. 11 da Portaria SEF 226/01, que as respostas a consultas poderão ser modificadas a qualquer tempo, nas seguintes hipóteses: a) por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente; b) em decorrência de legislação superveniente; e, c) pela publicação de Resolução Normativa que veicule entendimento diverso.

 

 

    

         Marise Beatriz Kempa                                               Francisco de Assis Martins

           Secretária Executiva                                                    Presidente da COPAT