CONSULTA:                  078/2011

EMENTA:       ICMS. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. O BENEFÍCIO PREVISTO NO INCISO I DO ART. 9º DO ANEXO 2 DO RICMS/SC PODE SER APLICADO ÀS VENDAS PARA CONSUMIDORES FINAIS, NÃO CONTRIBUINTES DO ICMS.

 

1 - DA CONSULTA

DOE de 22.08.11

 

A empresa acima, devidamente qualificada nos autos, dedica-se, dentre outras atividades, à comercialização, industrialização, importação e exportação de máquinas e equipamentos para uso industrial. No exercício de suas atividades, a consulente promove vendas de máquinas amparadas pela redução da base de cálculo prevista no Convênio ICMS nº 52/91.

Quanto à aplicação da redução da base de cálculo do ICMS nas vendas para consumidores finais/não-contribuintes do ICMS, entende que o referido convênio previu expressamente que a redução da base de cálculo do ICMS pode ser aplicada “nas operações interestaduais com consumidor ou usuário final, não contribuintes do ICMS, e nas operações internas.” (grifo da consulente)

No entanto, o inciso I do art. 9º do Anexo 2 do RICMS/SC previu “genericamente” que a redução da base de cálculo do ICMS poderia ser aplicada “nas operações sujeitas à alíquota de 17%”. (idem)

O fato de o citado inciso I não ter sido tão “específico” quanto o inciso II da Cláusula 1ª do Convênio ICMS 52/91, causa dúvida à consulente quanto à possibilidade de redução da base de cálculo nas vendas para consumidores finais não-contribuintes do ICMS.

Seu entendimento é o de que, embora o inciso I não tenha previsto com todas as letras, as vendas para consumidores finais estão, análise última, sujeitas à alíquota de 17% e, por conseguinte, sujeitas ao benefício, nos termos da legislação pertinente.

Apesar disso, a consulente vem recolhendo o ICMS referente a essas operações sem a redução da base de cálculo, motivo pelo qual lhe surge uma segunda dúvida: se teria o direito de reaver, “extemporaneamente”, os recolhimentos efetuados a maior, nos últimos cinco anos (sic!); não só isso, questiona como deve proceder quanto à restituição decorrente desse pagamento a maior que, à sua crítica, poderá ser levada a termo pela escrituração dos créditos diretamente no Livro de Apuração do ICMS.

Por fim, vale assentar que foram atendidos os pressupostos de admissibilidade preconizados pela Portaria SEF nº 226/01.

É o que tinha de ser relatado.

 

2 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

 

RICMS-SC/01, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, art. 9º, I, “a”.

 

3 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

 

Primeiramente, por comodidade, transcrevo os dispositivos sob os quais pairam a dúvida da consulente:

 

Convênio ICMS 52/91

 

(...)

Cláusula primeira - fica reduzida a base de cálculo do ICMS nas operações com máquinas, aparelhos e equipamentos industriais arrolados no Anexo I deste Convênio, de forma que a carga tributária seja equivalente aos percentuais a seguir:

(...)

II - nas operações interestaduais com consumidor ou usuário final, não contribuintes do ICMS, e nas operações internas, 8,80% (oito inteiros e oitenta centésimos por cento).

(...)

 

ANEXO 2 DO RICMS/SC

 

Art. 9º Até 31 de dezembro de 2012, fica concedida redução da base de cálculo do imposto, nas seguintes operações internas e interestaduais (Convênios ICMS 52/91, 158/02, 30/03, 10/04, 124/07, 148/07, 53/08, 91/08, 138/08, 69/09, 119/09 3 01/10):

I - com máquinas, aparelhos e equipamentos industriais relacionados no Anexo 1, Seção VI (Convênios ICMS 87/91, 13/92, 21/97, 23/98, 05/99, 01/00 e 10/01):

a) em 48,23% (quarenta e oito inteiros e vinte e três centésimos por cento), nas operações sujeitas à alíquota de 17%;

b) em 26,66% (vinte e seis inteiros e sessenta e seis centésimos por cento), nas operações sujeitas à alíquota de 12%;

c) em 26,57% (vinte e seis inteiros e cinqüenta e sete centésimos por cento), nas operações sujeitas à alíquota de 7%;

(...)

 

A dimensão econômica do fato gerador é dada pela base de cálculo que revela a capacidade contributiva, umbilicalmente ligada ao princípio da isonomia tributária. Justamente por isso sua redução sempre representará benefício fiscal proporcional à diminuição da expressão econômica observada no aspecto material da hipótese tributária. A exemplo das demais hipóteses exonerativas, o caso em análise constitui norma excepcional que outorga privilégio fiscal a reduzido universo de operações, limitando o aplicador às situações expressamente previstas em lei.

Ainda assim, quero dizer, ainda que nos limitemos à literalidade do dispositivo analisado (alínea “a”, acima), ele não exclui as operações interestaduais com consumidor ou usuário final, não-contribuintes do ICMS, tampouco as operações internas (às quais se reporta o Convênio 52/91), já que as operações - com máquinas, aparelhos e equipamentos industriais relacionados no Anexo 1, Seção VI - têm alíquota de 17%.

Quanto à repetição dos indébitos tributários decorrentes da não-aplicação da redução da base de cálculo, algumas observações são oportunas.

De fato, no caso de o imposto ser pago indevidamente em conseqüência de erro, o sujeito passivo poderá creditar-se do valor recolhido, não obstante a inexistência de prévio consentimento da autoridade fiscal, atendidas as exigências escriturais. Este é o teor do artigo 165 e seu inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - o Código Tributário Nacional:

 

Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do art. 162, nos seguintes casos:

I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;

 

Na legislação estadual, a hipótese de restituição em questão está prevista no inciso I, do artigo 80, do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário do Estado de Santa Catarina, aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de junho de 1984, sendo esmiuçada pelos artigos seguintes, transcritos a seguir:

 

Art. 80. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial de tributo, seja qual for a modalidade de seu pagamento, ressalvado o disposto no § 2° do art. 74, nos seguintes casos:

I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;

(...)

Art. 81. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro, somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.

 

Art. 82. A restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa da restituição.

§ 1° A restituição vence juros não capitalizáveis de 1% (um por cento) ao mês, a partir do trânsito em julgado da decisão definitiva que a determinar.

§ 2° Na restituição de quaisquer créditos tributários pagos indevidamente, bem como na devolução de depósito administrativo ou judicial decorrente de notificação fiscal, os valores serão atualizados monetariamente.

 

Art. 83. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:

I - nas hipóteses dos incisos I e II do art. 80, da data da extinção do crédito tributário;

(...)

Art. 84. (...)

 

Art. 85. A restituição será autorizada pelo Secretário da Fazenda, em processo de curso regular, iniciado pelo sujeito passivo, e no qual se declare e prove:

I - a tempestividade do pedido;

II - a efetiva ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no art. 80;

III - a efetiva assunção do encargo, se verificada a hipótese prevista no art. 81.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica à restituição de tributos ou multas exigidas de ofício, quando o lançamento tiver sido modificado em virtude de reclamação ou recurso do sujeito passivo, hipótese em que a própria autoridade ou órgão que proferir a decisão determinará a restituição, sob a forma de crédito fiscal ou em espécie.

 

Art. 86. Sempre que possível a reutilização do tributo, a restituição será feita sob a forma de crédito do mesmo.

 

Os valores argüidos, por certo, foram recolhidos desnecessariamente, o que imputaria à demandante o direito de reavê-los - observado o disposto no art. 83 supra - mediante restituição, que deveria ocorrer preferencialmente, por meio de crédito a ser compensado com o imposto a pagar (art. 86 acima).

Mas há outra questão.

A restituição dos tributos que comportem, por sua natureza, a transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-lo”, eis o teor do art. 166 do CTN, que requer duas observações preliminares.

O Sistema Tributário Nacional (CFB) determina que o sujeito passivo tem o dever jurídico de contribuir com parte de seu patrimônio para a manutenção da máquina estatal; estabelecendo limites objetivos à prática dessa tributação; não só isso, garante ao mesmo sujeito passivo, que será tributado nos estritos termos estabelecidos em lei.

Não se admite a existência de obrigações que não sejam ex lege; o pressuposto da legalidade permeia todos os segmentos do direito brasileiro, alcançando qualquer comportamento obrigatório. No direito tributário, a Lei Maior reiterou o princípio, vedando à União e às Unidades Federativas, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, instituir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça (CFB, art. 150, I). Nem poderia ser diferente, pois o tributo é prestação pecuniária compulsória (“instituída em lei” - art. 3º, CTN); comportamento obrigatório de uma prestação em dinheiro, que independe da vontade do sujeito passivo, mas que se opera em prejuízo de seu patrimônio.

Disso decorre que, recolhido um “tributo” em desacordo com o ordenamento tributário, nenhuma norma desse mesmo ordenamento poderia denegar o direito subjetivo de o contribuinte reaver o valor pago indevidamente, sem que se afronte a Constituição Federal (estrita legalidade). Dito de outra forma, uma vez concretizado o pagamento indevido, haveria de ser reconhecido o direito de devolução àquele que realizou o fato. E, é aqui que temos o primeiro problema. Se há, com sede constitucional, um direito subjetivo, evidente é a sua incompatibilidade com a norma constante no art. 166 do CTN, pois que esse direito não poderia ter sido limitado por lei infraconstitucional. É o primeiro ponto.

O segundo é que, temos de atentar se nosso Sistema Tributário, no que concerne à repetição de indébito, admite que uma norma atribua relevância a um terceiro pelo fato de este, em certos casos, suportar a carga econômica do tributo. Vejamos.

A relação ou o vínculo existente entre contribuintes de fato e de direito é de natureza privada; o liame existente, de conteúdo econômico, não tributário. Em outros termos, o terceiro nada paga a título de tributo que, para ele, é apenas parte integrante do preço.

Dessume-se, que somente o contribuinte de jure é parte na relação jurídico-tributária, e só a ele caberia o direito de repetição, assim como nenhuma condição lhe poderia ser imposta para o exercício desse direito.

Considerando que o arrimo da norma que estabelece o direito à repetição encontra-se na Lei Maior, genericamente no art. 5º, II e, especificamente no art. 153, I, ambos da Carta, a aplicação do disposto no art. 166 do CTN só poderia ocorrer em vilipêndio ao texto constitucional. Clara é a existência de relação jurídica entre o sujeito passivo da relação tributária e o terceiro que suporta o ônus financeiro do tributo, mas pertence a outro ramo do Direito que não o Tributário.

Ademais, o disposto no art. 166 do CTN, vale assinalar, significa não só a impossibilidade prática de qualquer restituição de ICMS pago indevidamente, mas, o que parece ser muito pior, a criação de imposto sem lei que o estabeleça.

Em que pesem os argumentos anteriormente expostos, a repetição dos indébitos tributários, decorrentes da não-aplicação da referida redução da base de cálculo por parte da consulente, é inexeqüível porque não há qualquer ato exarado pelo Poder Judiciário que ponha em dúvida a constitucionalidade do art. 166 do CTN que, desde o seu advento, ressalte-se, integra o ordenamento jurídico pátrio, tendo, exatamente por isso, de ser respeitado na íntegra. E, como a consulente não atendeu às condições impostas pelo art. 166, a restituição pretendida não poderá ser efetuada.

Ademais, a Súmula 546 do Supremo Tribunal Federal expressa ser cabível a restituição do tributo indireto somente no caso de o contribuinte de direito conseguir comprovar ter assumido o encargo financeiro por não ter transferido o ônus tributário ao contribuinte de fato: “cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido, por decisão, que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de facto o quantum respectivo.”

As observações havidas são suficientes para que se responda à consulente, primeiro, que a redução da base de cálculo prevista no inciso I, do art. 9º do Anexo 2 do RICM/SC pode ser aplicada nas vendas para consumidores finais, não contribuintes do ICMS; segundo, que, nos termos da legislação em vigor e da Súmula 546 do STF, não poderá restituir-se dos valores pagos a maior em razão de não ter aplicado a redução da base de cálculo prevista no dispositivo citado.

 

À crítica desta Comissão.

 

COPAT, 17 de maio de 2011.

 

Nilson Ricardo de Macedo

AFRE IV - matr. 344.181-4

 

 

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 21 de junho de 2011, ressalvando-se, a teor do disposto no art. 11 da Portaria SEF 226/01, que as respostas a consultas poderão ser modificadas a qualquer tempo por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente; em decorrência de legislação superveniente; e, pela publicação de Resolução Normativa que veicule entendimento diverso.

 

 

 

 

Marise Beatriz Kempa                                   Carlos Roberto Molim

Secretária Executiva                                 Presidente da Copat